| D.E. Publicado em 10/08/2016 |
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0005606-35.2015.4.04.0000/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
AUTOR | : | LUIZ CARLOS SACHI |
ADVOGADO | : | Wolney Cesar Rubin e outro |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INDEFERIMENTO. ART. 11 DA LEI 8.213/91. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ERRO DE FATO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ART. 485, INCISOS V E IX DO CPC/73. AÇÃO PROPOSTA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. INADMISSÃO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A ação rescisória, instrumento processual de caráter desconstitutivo destina-se a sanear coisa julgada defeituosa, nas hipóteses contempladas pelo artigo 485 do CPC. Considerada a natureza do instituto, que abala a estabilidade de relações jurídicas cobertas pelo manto da res judicata, cediço que a interpretação do permissivo legal deve fazer-se restritivamente, sem extensões hermenêuticas que comprometam indevidamente a segurança jurídica dos que constituíram vínculos e hauriram expectativas a partir do pronunciamento judicial, a priori, definitivo - porquanto irrecorrível. 2. Não importa em violação literal a dispositivo de lei, a solução do acórdão transitado em julgado que, com observância da legislação de regência não concedeu o benefício de aposentadoria rural por idade ao Autor, porquanto este não preencheu os requisitos do art. 11, § 1º da Lei nº 8.213/91. 3. A caracterização do erro de fato (previsão do 485, IX, CPC/73) como causa de rescindibilidade de decisão judicial transitada em julgado supõe a afirmação categórica e indiscutida de um fato, na decisão rescindenda, que não corresponde à realidade dos autos. Também deve ser admitida a rescisória na hipótese de o julgador ter considerado um fato inexistente ou quando considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido (§ 1º do artigo 485 do CPC). Ou seja, quando se funda em erro que exsurge dos autos e dos documentos da causa, aferível de plano no processo. 4. Não é o caso dos presentes autos, em que não houve inadvertência do julgador na apreciação da causa. A circunstância de ter o acórdão ter assentado que o autor laborou em regime de economia familiar em período anterior ao de 2007, por si só, não autoriza a rescisão daquele julgado, uma vez que tal fato não foi considerado inexistente e, sendo pronunciado como existente, entendeu o Colegiado da 5ª Turma que aquele período anterior de labor rural - conforme a previsão contida na legislação de regência - não autorizava seu reconhecimento para fins de concessão do benefício previdenciário, uma vez que, comprovadamente, durante o período de carência exigido, o Autor, afastou-se do regime de economia familiar. 5. A ação rescisória não pode e nem deve ser utilizada como sucedâneo recursal em caso de inconformidade da parte com acórdão que decidiu de forma contrária á sua pretensão. O uso da rescisória (em sendo uma exceção á regra geral da imutabilidade da coisa julgada) é reservado para hipóteses restritas, nos casos taxativamente enumerados nos incisos do art. 485 do CPC/73. 6. Em razão da improcedência da presente ação, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor da ré no patamar de 10% sobre o valor da causa, suspensa, todavia, a sua exigibilidade em face da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que integram o presente julgado.
Porto Alegre (RS), 04 de agosto de 2016.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0005606-35.2015.4.04.0000/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
AUTOR | : | LUIZ CARLOS SACHI |
ADVOGADO | : | Wolney Cesar Rubin e outro |
REU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
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RELATÓRIO
Luiz Carlos Sachi propôs ação rescisória, fundamentada no art. 485, incisos V (violar literal disposição de lei) e IX (erro de fato), do Código de Processo Civil de 1973, com o propósito de desconstituir acórdão da Quinta Turma que não reconheceu o direito ao benefício de aposentadoria rural, em razão de estar descaracterizada atividade campesina sob o regime de economia familiar.
Sustenta que o acórdão rescindendo afrontou literalmente o disposto no art. 11, inc. VII e § 1º da Lei nº 8.213/91, porquanto, pelo menos até outubro de 2007, comprovadamente desenvolvia labor rural em sua propriedade. Assevera que a condição de contribuinte individual não tiraria o enquadramento do Autor, pelo menos até 10/2007, da sua cotidiana atividade de segurado especial, sob o regime de economia familiar, a qual foi reconhecida pelo acórdão rescindendo desde o ano de 1996. Pede seja julgada procedente a demanda para, em juízo rescisório, ser restabelecido o benefício de aposentadoria por idade rural desde a cessação em 14/06/2011. Igualmente, pugna pela rescisão do acórdão, com o novo julgamento do feito, para que seja considerado o trabalho rurícula do Autor sob o regime de economia familiar até o mês de outubro/2007, determinando-se a sua averbação para o INSS, o que oportunizaria, nos termos do § 3º do art. 48 da Lei 8.213/91 requerimento de novo benefício previdenciário, com a base no § 12 do art. 11 da mesma Lei de Benefícios.
O INSS apresentou contestação (fls. 106-12) sustentando que o caso dos autos não trata de erro de fato na acepção legal e nem de violação à lei. Pede seja julgada improcedente a ação, condenando-se a parte autora nos ônus sucumbenciais.
Encerrada a instrução, os autos foram remetidos à Procuradoria Regional da República que, exarando parecer, opinou pela improcedência do pedido (fls. 117-9).
VOTO
Inicialmente, verifico que a presente demanda rescisória foi proposta tempestivamente em 05-11-2015 (fl. 03), tendo em conta que o acórdão rescindendo transitou em julgado no dia 07-11-2013 (fl. 28). Fica, também, confirmado o deferimento do benefício da gratuidade judiciária postulado na inicial.
Examinando detidamente os elementos jurídicos e probatórios, verifico ser improcedente a pretensão de desconstituição do acórdão proferido na apelação cível 0013252-43.2013.404.9999, cujos fundamentos foram externados nas seguintes letras:
(...) O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporâneo do período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, em princípio, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ. Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, como o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", no mais das vezes os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como boias-frias, diaristas ou volantes especificamente, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento pacífico desta Corte é no sentido de que a exigência de início de prova material deve ser abrandada, permitindo-se, em algumas situações extremas, até mesmo a prova exclusivamente testemunhal. A propósito, nesse sentido manifestou-se o Min. Luiz Vicente Cernicchiaro por ocasião do julgamento do RESP 72.216-SP, em 19-11-1995 (DJU de 27-11-1995), afirmando que "o Poder Judiciário só se justifica se visar à verdade real. Corolário do princípio moderno de acesso ao Judiciário, qualquer meio de prova é útil, salvo se receber o repúdio do Direito. A prova testemunhal é admitida. Não pode, por isso, ainda que a lei o faça, ser excluída, notadamente quando for a única hábil a evidenciar o fato. Os negócios de vulto, de regra, são reduzidos a escrito. Outra, porém, a regra geral quando os contratantes são pessoas simples, não afeitas às formalidades do Direito. Tal acontece com os chamados 'boias-frias', muitas vezes impossibilitados, dada à situação econômica, de impor o registro em carteira. Impor outro meio de prova, quando a única for a testemunhal, restringir-se-á a busca da verdade real, o que não é inerente do Direito Justo".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 16 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também desimportar a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Cumpre salientar também que muitas vezes a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante.
Registro, por fim, que em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16.04.94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, dá-se após a comprovação junto à Seguradora das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que a própria Seguradora já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.
DO CASO CONCRETO
No caso em apreço, para fazer prova do exercício de atividade rural foram acostados aos autos documentos, dentre os quais se destacam:
a) certidão de casamento do autor, realizado em 1981, em que foi qualificado como agricultor (fl. 17);
b) certidões de registro de nascimento de filhos do autor, lavradas respectivamente em 1982, 1985 e 1991, em que foi qualificado como agricultor (fls. 18/20);
c) notas e contranotas fiscais de produtor rural emitidas em nome do autor, nos anos de 1991/1992, 1998/2004, 2006/2007 e 2009/2011 (fls. 22/35);
d) certidões de registro de imóveis rurais adquiridos pelo autor respectivamente em 1985, 1989 e 1986 (fls. 36/42).
Na audiência de instrução e julgamento, realizada em 29/11/2012, foram colhidas as declarações do autor e das testemunhas Antonio Santo Pissinati, Pedro Dorigon e João Rossi Pissinati, as quais afirmaram o exercício de atividades rurais pelo autor, em regime de economia familiar, ao longo dos 30 anos em que o conhecem (fls. 75/80 e CD acostado à capa dos autos).
No caso, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material. A prova testemunhal, por sua vez, corrobora o labor rural do autor em regime de economia familiar, no período de carência legalmente exigido.
Contudo, o INSS apresenta documentos comprovando que o autor efetuou recolhimentos para a Previdência Social no período compreendido entre o mês de 10/2007 e o mês de 03/2011, conforme seu CNIS à fl. 21, na qualidade de contribuinte individual, bem como figurar o autor como sócio de uma sociedade empresária rural e vários carros, camionete e caminhões registrados em seu nome (fls. 101/110), o que reforça a conclusão de que tem outras fontes de renda.
Em suas contrarrazões (fl. 119), o autor esclarece que é sócio da referida empresa, apenas ficticiamente, a pedido do irmão, mas que nunca trabalhou bem como, jamais teve qualquer retirada ou participação nos dividendos, não figurando como administrador. Em relação aos veículos, o autor explica que os mesmos embora figurem como de sua titularidade, em verdade foram de seu irmão, que por motivos particulares não colocou em seu nome. Ressalva, entretanto, que apenas um carro, referente ao documento trazido à fl. 104 dos autos, lhe pertence de fato, o qual comprou financiado.
Porém, em que pese tenha rebatido as alegações do INSS, não apresentou qualquer elemento para desconstituir os documentos juntados aos autos pela Autarquia.
Nesse contexto, não há como acolher a pretensão, porquanto descaracterizada a atividade rural em regime de economia familiar.
Invertidos os ônus da sucumbência, fixo a verba honorária em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja execução fica suspensa, por ser o autor beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita (fl. 47).
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação. (fls. 69-79)
De plano, consigno que não há falar em violação à literal disposição de lei (art. 485, V, do CPC/73).
A doutrina esclarece que a violação a literal disposição de lei ocorre quando a decisão rescindenda importa afronta expressa e direta a conteúdo explícito da norma, bem como quando tiver sido olvidado o seu sentido ou finalidade, considerando o significado razoável dos seus termos, extraído a partir da interpretação que lhe é conferida pelos jurisconsultos.
É cediço que a atividade jurisdicional, de aplicar a lei ao caso concreto, exige que se abstraia a inteligência da norma, por meio da persecução de sua finalidade, de sua contextualização no ordenamento, histórica e cultural, dos direcionamentos obtidos pelos princípios e da solução de conflitos normativos que podem existir.
No caso, não importa violação literal a dispositivo de lei a solução do acórdão transitado em julgado que, com observância da legislação de regência, deixou de conceder o benefício de aposentadoria rural por idade ao Autor, porquanto este não preencheu os requisitos do art. 11, § 1º da Lei nº 8.213/91.
Consoante examinado no acórdão que ora se pretende rescindir, o INSS juntou documentos dando conta que, entre o mês outubro de 2007 e março de 2011, a parte autora efetuou recolhimentos como contribuinte individual, sendo sócio de empresa rural, com vários bens móveis (carros, caminhões e camionetes) em seu nome. Tais circunstâncias descaracterizam, completamente, o regime de economia familiar, não se enquadrando, portanto, o autor como segurado especial rural para fins da vindicada aposentadoria rural por idade.
Todos esses contornos afastam a alegação de violação à lei, porquanto não há uma relação de incompatibilidade das conclusões do julgador que se traduza em infringência direta e literal das normas da Lei de benefícios aplicadas para solucionar a lide originária.
Por sua vez, a caracterização do erro de fato (previsão do 485, IX, CPC/73) como causa de rescindibilidade de decisão judicial transitada em julgado supõe a afirmação categórica e indiscutida de um fato, na decisão rescindenda, que não corresponde à realidade dos autos. Também deve ser admitida a rescisória na hipótese de o julgador ter considerado um fato inexistente ou quando considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido (§ 1º do artigo 485 do CPC). Ou seja, quando se funda em erro que exsurge dos autos e dos documentos da causa, aferível de plano no processo.
Nessa linha, o seguinte julgado:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DA LITERALIDADE DA NORMA. NECESSIDADE. ERRO DE FATO. INEXISTÊNCIA. DOLO E FALSIDADE DA PROVA. DOCUMENTO NOVO. PRESSUPOSTOS PARA CONFIGURAÇÃO. 1. Somente se autoriza a rescisão do julgado por violação legal quando contrariada a norma em sua literalidade, não se justificando a desconstituição por injustiça ou má interpretação da prova. 2. O erro de fato ensejador da rescisória decorre do desconhecimento da prova, exigindo-se a inexistência de pronunciamento judicial a respeito, de modo que o equívoco na apreciação daquela não ampara o pedido. 3. Afasta-se o dolo ou a falsidade da prova se não houve impedimento ou dificuldade concreta para atuação da parte, sobretudo quando os elementos dos autos, em seu conjunto, denotam o acerto do julgado rescindendo. 4. Admite-se a rescisão por documento novo quando o autor, ao tempo do processo primitivo, desconhecia-o ou era-lhe impossível juntá-lo aos autos. 5. Ação rescisória improcedente. (AR 1.370/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/12/2013, DJe 19/12/2013)
Não é o caso dos presentes autos, em que inexiste inadvertência do julgador na apreciação da causa. A circunstância de ter o acórdão, ora hostilizado, assentado que o autor laborou em regime de economia familiar em período anterior ao de 2007, por si só, não autoriza a rescisão daquele julgado, uma vez que tal fato não foi considerado inexistente e, sendo pronunciado como existente, entendeu o Colegiado da 5ª Turma que aquele período anterior de labor rural - conforme a previsão contida na legislação de regência - não autorizava seu reconhecimento para fins de concessão do benefício previdenciário, uma vez que, comprovadamente, durante o período de carência exigido, o Autor afastou-se do regime de economia familiar.
A Seção Previdenciária do TRF4 já decidiu que "o erro de fato que dá margem à propositura da ação rescisória é aquele que ocorre no mundo dos fatos, no mundo do ser. O erro de direito, por óbvio, não o configura. (...) o erro de fato é um erro de percepção, e nunca de interpretação, nem um falso juízo" (TRF4ªR, AR nº 2002.04.01.007075-5, Terceira Seção, rel. Des. Fed. João Batista da Silveira, DJ de 12-07-2006).
Nessa linha, vejam-se as percucientes palavras do douto Procurador Regional da República Carlos Eduardo Copetti Leite (fls. 117-9):
(...) O Autor considera erro de fato o acórdão não ter reputado válido, como de labor rural trabalhado sob regime de economia familiar, o período anterior ao ano de 2007, não contestado documentalmente pelo INSS. Conforme já abordado alhures, contudo,o Tribunal não se manifestou expressamente acerca do tema porque não era este o pedido principal e por não haver qualquer menção neste sentido nos requerimentos da inicial originária. Não se admitiu, portanto, um fato inexistente ou se considerou existente o que não existia.
Calha ponderar, contudo, que não há prejuízo ao autor no ponto, eis que pode pleitear tal reconhecimento administrativamente ou via judicial, em ação autônoma. Incogitável apenas que tal tema seja utilizado como fundamento da vertente ação rescisória ante a ausência de violação literal de dispositivo de legal e também de erro de fato.
Convém salientar, ainda, que a ação rescisória não pode e nem deve ser utilizada como sucedâneo recursal em caso de inconformidade da parte com acórdão que decidiu de forma contrária á sua pretensão. O uso da rescisória (em sendo uma exceção á regra geral da imutabilidade da coisa julgada) é reservado para hipóteses restritas, nos casos taxativamente enumerados nos incisos do art. 485 do CPC.
Vale frisar que a inobservância das hipóteses previstas de forma rígida no CPC viola o princípio do livre convencimento judicial, bem como transforma a ação rescisória em recurso destinado a reexaminar matéria já julgada, indiretamente atingindo os efeitos da coisa julgada material.
Em verdade, a parte autora se utiliza desta ação rescisória como uma nova via recursal, com clara tentativa de perpetuação da lide até que lhe seja favorável o resultado, o que se mostra inadmissível.
Assim, à míngua de enquadramento legal, é de rigor a rejeição do pedido.
Em razão da improcedência da presente ação, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor da ré no patamar de 10% sobre o valor da causa, suspensa, todavia, a sua exigibilidade em face da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, voto por julgar improcedente a ação rescisória.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/08/2016
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0005606-35.2015.4.04.0000/PR
ORIGEM: PR 00132524320134049999
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz |
PROCURADOR | : | Dra. SOLANGE MENDES DE SOUZA |
AUTOR | : | LUIZ CARLOS SACHI |
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Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/08/2016, na seqüência 78, disponibilizada no DE de 14/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª SEÇÃO, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A SEÇÃO, POR UNANIMIDADE, DECIDIU JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Juiz Federal MARCELO CARDOZO DA SILVA | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Jaqueline Paiva Nunes Goron
Diretora de Secretaria
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