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AÇÃO RESCISÓRIA. CONTRATO DE ADESÃO. LINHAS TELEFÔNICAS. RECONHECIMENTO DE CLÁUSULA ABUSIVA. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NORMA JURÍDICA. NÃO OCORRÊNCIA. TRF4. 500...

Data da publicação: 21/11/2020, 07:01:00

EMENTA: AÇÃO RESCISÓRIA. CONTRATO DE ADESÃO. LINHAS TELEFÔNICAS. RECONHECIMENTO DE CLÁUSULA ABUSIVA. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NORMA JURÍDICA. NÃO OCORRÊNCIA. 1. Na ação rescisória, o que se ataca é a coisa julgada formada no processo originário, não se tratando de simples direito indisponível das partes, sendo inadmissível a confissão nesse tipo de ação. 2. É firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que, para a ação rescisória fundada no inciso V do artigo 966 do CPC ("violar manifestamente norma jurídica"), é indispensável que haja afronta direta e induvidosa à lei. Hipótese não configurada. 3. Ação rescisória improcedente. (TRF4, ARS 5000292-81.2019.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 13/11/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Ação Rescisória (Seção) Nº 5000292-81.2019.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

OI S.A

ADVOGADO: ANA TEREZA BASILIO (OAB RJ074802)

ADVOGADO: LUIZ RODRIGUES WAMBIER (OAB PR007295)

ADVOGADO: PAULO CEZAR PINHEIRO CARNEIRO (OAB RJ020200)

RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

INTERESSADO: AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES - ANATEL

INTERESSADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

RELATÓRIO

Trata-se de ação rescisória ajuizada pela empresa OI S/A, sucessora de Telepar Celular S.A., pretendendo rescindir acórdão proferido pela 3ª Turma deste Tribunal no julgamento da apelação cível n. 2002.04.01.057186-0, com fundamento no inciso V do artigo 966 do CPC ("violar manifestamente norma jurídica").

No processo originário, a sentença julgou a ação improcedente. O autor da ação de origem (MPF) apelou e a 3ª Turma desta Corte deu provimento ao recurso, reconhecendo a abusividade da cláusula introduzida pela Portaria n. 1.028/96 nos contratos de adesão discutidos naqueles autos, em acórdão ementado nos seguintes termos (4-ANEXOSPET10, Página 41):

ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE ADESÃO. LINHAS TELEFÔNICAS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DANO MORAL. 1. Caracterizada como de consumo a relação entre a companhia telefônica e o contratante aderente, as respectivas avenças estão vinculadas ao Código de Defesa do Consumidor - Lei n. 8.078/90. 2. Ao desincumbir-se da sua missão, cumpre ao Judiciário sindicar as relações consumeristas instaladas quanto ao respeito às regras consignadas no CDC, que são qualificadas expressamente como de ordem pública e de interesse social (art. 1º), o que legitima mesmo a sua consideração ex officio, declarando-se, v.g., a nulidade de pleno direito de convenções ilegais e que impliquem excessiva onerosidade e vantagem exagerada à companhia telefônica, forte no art. 51, IV e § 1º, do CDC. 3. Reconhecida a abusividade da cláusula introduzida pela Portaria nº 1.028/96 nos contratos de adesão, acarretando a diminuição do número de ações para aqueles que firmaram contrato após 25 de agosto de 1996. 4. A subscrição das ações deve pautar-se pelo seu valor patrimonial. Precedentes jurisprudenciais. 5. A simples restituição de lotes com número diferente de ações não é suficiente para configurar o dano moral, já que não decorre de ato ilícito premeditado da companhia telefônica, mas, sim, de equivocada interpretação das cláusulas contratuais. (TRF4, AC 2002.04.01.057186-0, TERCEIRA TURMA, Relator LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON, D.E. 19/12/2007)

As partes opuseram embargos declaratórios, os quais foram providos por esta Corte para sanar omissões, em julgado ementado nos seguintes termos (4-AENXOSPET10, Páginas 175-176):

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRATO DE ADESÃO. LINHAS TELEFÔNICAS. PRELIMINARES. OMISSÃO. PREQUESTIONAMENTO. . O Tribunal não fica obrigado a examinar todos os artigos de lei invocados no recurso, desde que decida a matéria questionada sob fundamento suficiente para sustentar a manifestação jurisdicional, dispensável a análise dos dispositivos que pareçam para a parte significativos, mas que para o julgador, se não irrelevantes, constituem questões superadas pelas razões de julgar. . A jurisprudência tem admitido o uso dos embargos de declaração para fins de prequestionamento de matéria a ser resolvida nos Tribunais Superiores. . Detectada omissão no voto condutor e no respectivo acórdão, impõe-se sua complementação. . Afastada a preliminar de ilegitimidade passiva das rés, uma vez que todas, em maior ou menor grau, serão atingidas pela decisão proferida nestes autos. . Em face do grande número e dispersão das pessoas atingidas, bem como tratando-se de questão relevante e de expressão para a coletividade, é de ser reconhecida a legitimidade do Ministério Público para interpor a presente ação. . Deve ser publicada a decisão proferida nestes autos, em jornal de grande circulação, uma vez que em se tratando de direitos coletivos, é a forma mais simples e direta de divulgar aos beneficiados, o direito que está sendo reconhecido. . Embargos de declaração parcialmente providos. (TRF4, AC 2002.04.01.057186-0, TERCEIRA TURMA, Relatora SILVIA MARIA GONÇALVES GORAIEB, D.E. 07/01/2010)

Os recursos interpostos posteriormente não alteraram o mérito do julgado, tendo sido apenas, em sede de recurso especial, reconhecida a ilegitimidade passiva da União (negado seguimento ao recurso especial da Telepar Celular e da Brasil Telecom e provido o recurso especial da União - 4-ANEXOSPET12, páginas 113-117 e 169-173).

É contra o acórdão da 3ª Turma desta Corte, cuja ementa foi transcrita acima, transitado em julgado em 05/10/2016 (4-ANEXOSPET12, Página 184), que foi ajuizada esta rescisória.

Na petição inicial, a parte autora alegou que (4-INIC2):

(a) o acórdão rescindendo, ao reconhecer a ilegalidade da Portaria 1.028/96 do Ministério das Comunicações, violou normas jurídicas essenciais e direitos fundamentais, como a liberdade contratual, a autonomia privada e a liberdade de iniciativa;

(b) não existe direito adquirido a regime jurídico, de forma que não poderia ser assegurado um regime contratual pretérito estabelecido entre partes distintas;

(c) assim, o acórdão violou as normas previstas no artigo 421 do Código Civil, no artigo 170 da Constituição Federal e no artigo 51, XIII, do Código de Defesa do Consumidor

(d) o acórdão ampliou o pedido formulado na inicial, na medida em que reputou aplicável o critério de emissão de ações de acordo com o balanço anterior à integralização e, assim, o acórdão violou os artigos 128 e 460 do CPC/73 (arts. 141 e 492 do CPC/2015);

(e) o acórdão violou o artigo 170, §1º, II, da lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações), ao conceder critério ilegal, entendido como ilegal por Corte Superior, conforme consolidado na Súmula n. 371 do STJ.

Pede o deferimento de tutela de urgência, para suspender os efeitos do acórdão até o julgamento final da ação rescisória. Ao final, pede a procedência da ação rescisória, para rescindir o acórdão rescindendo.

Atribuiu à causa o valor de R$ 44.000,00.

O pedido de antecipação de tutela foi indeferido (4-DESPADEC19).

A parte autora interpôs agravo interno (4-PET21), o qual foi improvido pelo órgão colegiado desta Corte (4-ACOR30).

A União manifestou não possuir interesse em participar da ação rescisória (4-PET27).

A ANATEL manifestou não possuir interesse em participar da ação rescisória (4-PET29).

O MPF apresentou contestação (4-CONTEST26). Alegou que: (a) a autora pretende obter nova interpretação do texto legal e inexiste violação à norma jurídica no acórdão rescindendo; (b) a empresa de telefonia não poderia ter estabelecido cláusula abusiva em contrato de adesão; (c) a autora inova no conteúdo da defesa que havia apresentado na ação de origem, o que demonstra que pretende se valer da ação rescisória como sucedâneo recursal; (d) o precedente do STJ alegado pela autora, o qual subsidiou a edição da Súmula 371 do STJ, não se aplica ao caso concreto, porque é posterior ao acórdão rescindendo e porque tratou de discussão diversa da tratada no acórdão rescindendo; (e) o fundamento essencial da procedência da ação de origem é a violação à isonomia e as alegações da autora não afastam esse fundamento.

A parte autora apresentou réplica (11-RÉPLICA1).

A parte autora apresentou alegações finais, ocasião em que reiterou as alegações anteriores e afirmou que a parte ré teria apresentado confissão expressa na contestação (14-PET1).

A parte ré (MPF) apresentou alegações finais, rebatendo as alegações da autora (19-ALEGAÇÕES1).

Por fim, o MPF se manifestou no sentido de ser desnecessária nova manifestação (23-PARECER1).

O processo foi incluído em pauta.

É o relatório.

VOTO

1. Procuração, custas e depósito prévio:

Registro a presença da procuração do advogado da parte autora (4-PROCAUTO4 e 4-SUBSAUTOR5). Também registro que as custas iniciais e o depósito prévio previsto no artigo 968, II, do CPC, foram pagos (4-GUIAS_DE_CUSTAS3).

2. Decadência:

Não ocorreu a decadência desta ação rescisória porque o acórdão rescindendo transitou em julgado em 05/10/2016 (4-ANEXOSPET12, Página 184) e a rescisória foi ajuizada em 30/10/2017 (4-CAPA1, Página 2). Quando ajuizada, portanto, não havia ainda decorrido o prazo de dois anos previsto no art. 975 do CPC.

3. Admissibilidade da ação rescisória:

A presente ação rescisória se mostra em tese cabível e deve ser admitida, porque estão presentes os requisitos legais que eventualmente poderão autorizar a rescisão da sentença, a saber:

(a) há acórdão que enfrentou o mérito e transitou em julgado (art. 966, caput, do CPC);

(b) o fundamento invocado pela parte autora está previsto como hipótese legal de cabimento de ação rescisória, conforme consta no artigo 966, inciso V, do CPC;

(c) se houve ou não violação da norma jurídica, isso é questão de mérito e nessa condição deve ser examinada.

Com essas considerações, tenho que em tese é cabível e deve ser admitida a ação rescisória proposta, passando ao exame de eventuais preliminares, ao exame do juízo rescindendo e, superado este, realizando então o exame do juízo rescisório.

4. Juízo rescindendo:

Hipótese do artigo 966, V ("violar manifestamente norma jurídica”).

Sobre a hipótese em questão, é firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que, para a ação rescisória fundada nesse inciso V do artigo 966 do CPC, é indispensável que haja afronta direta e induvidosa à lei.

Nesse sentido, precedentes do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO. QUESTÃO NÃO APRECIADA PELO ACÓRDÃO RESCINDENDO. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. OFENSA REFLEXA. IMPOSSIBILIDADE (...) 5. A pretensão rescisória, fundada no art. 485, inciso V, CPC, conforme o entendimento doutrinário e jurisprudencial, tem aplicabilidade quando o aresto ofusca direta e explicitamente a norma jurídica legal, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta. Nesse sentido: AR 1.192/PR, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, Primeira Seção, DJe 17/11/08. Ação rescisória improcedente. (AR 4.264/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2016, DJe 02/05/2016)

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. CONCURSO DE REMOÇÃO PARA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO. INSCRIÇÕES DISTINTAS PREVISTAS NO EDITAL. SEGURANÇA CONCEDIDA PARA ANULAR LISTA CLASSIFICATÓRIA UNIFICADA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. INEXISTÊNCIA. (...) 8. De acordo com a jurisprudência do STJ, a rescisão de julgado com base no art. 485, V, do CPC somente é cabível quando houver flagrante violação de norma legal, e não mero descontentamento com a interpretação que lhe foi dada. (...). 12. Ação rescisória julgada improcedente. (AR 3.920/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2016, DJe 25/05/2016).

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. REVISÃO DE APOSENTADORIA. SUBSTITUIÇÃO DE PROVIDÊNCIA QUE DEVERIA TER SIDO ADOTADA NO CURSO DO PROCESSO ANTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. MANEJO DA AÇÃO RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. DESCABIMENTO. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA 283/STF. 1. É vedado o manejo da ação rescisória para substituir providência que deveria ter sido adotada no curso do processo rescindendo. 2. A verificação da violação de dispositivo literal de lei requer exame minucioso do julgador, porquanto a ação rescisória não pode ser utilizada como sucedâneo de recurso, tendo lugar apenas nos casos em que a transgressão à lei é flagrante. O fato de o julgado haver adotado interpretação menos favorável à parte, ou mesmo a pior dentre as possíveis, não justifica o manejo da rescisória, porque não se cuida de via recursal com prazo de dois anos. (...) 4. Agravo regimental improvido." (AgRg no REsp 1284013/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2011, DJe 01/02/2012)

No caso dos autos, embora as alegações da parte autora, entendo que a ação deve ser julgada improcedente.

Analisando os autos de origem, observo que o reconhecimento da abusividade da cláusula introduzida pela Portaria n. 1.028/96, contra o qual se insurge o autor da rescisória, foi devidamente fundamentado pela 3ª Turma desta Corte, conforme se verifica no seguinte excerto do voto condutor do acórdão rescindendo (4-ANEXOSPET10, Páginas 34-39):

(...)

É de relevo, todavia, que a atividade controladora do Judiciário deve procurar preservar a pactuação, restringindo-se à poda das sobras. Mister que o juiz se empenhe em ajustar o conteúdo do contrato de consumo (art. 51, § 2º do CDC), fazendo a exegese mais favorável ao consumidor (art. 47 do CDC), o qual, no caso concreto, ostenta idêntico benefício à luz da lei civil (art. 423), porquanto é aderente ao contrato de adesão para compra de linhas telefônicas, típico de negócio jurídico no qual a participação de um dos sujeitos sucede pela aceitação em bloco de uma série de cláusulas formuladas antecipadamente, de modo geral e abstrato, pela outra parte, para constituir o conteúdo normativo e obrigacional de futuras relações concretas (ORLANDO GOMES, in Contrato de Adesão, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1972, p. 03).

Afastada, portanto, qualquer discussão acerca da aplicabilidade do CDC à hipótese vertente, cabe-me referir o que dispõe o art. 51, XIII, da Lei nº 8.078/90:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração.

No caso ora em tela, os contratos de adesão firmados até 25 de agosto de 1996 tiveram garantia de que a restituição das ações seria calculada com base no seu valor patrimonial, acarretando para o contratante um lote equivalente a 2.154 ações. Todavia, com a alteração da cláusula contratual nº 2, pela Portaria nº 1.028/96, as ações passaram a ser calculas com base no valor de mercado, resultando em lotes de 1.615 ações.

É de ver-se, assim, que a referida Portaria nº 1.028/96 alterou o contrato de adesão de aquisição de linhas telefônicas, introduzindo cláusula que fere diretamente o princípio da isonomia.

A respeito, valho-me do parecer do douto Parquet Federal (fls. 422/426), in verbis:

"(...)

A cláusula abusiva mencionada refere-se à alteração na quantidade de ações recebidas pelos compradores de linhas telefônicas a partir do dia 25 de agosto de 1996: enquanto até a referida data o consumidor adquiria, compulsoriamente, 2.154 ações, passou a adquirir apenas 1.615 ações a partir do dia 25 de agosto de 1996. Tal discrepância entre o número de ações instituído pela Portaria nº 1.028/96 e o número anterior à Portaria revela a necessidade de anulação da cláusula abusiva e discriminatória, nos termos do art. 51, XIII, da Lei nº 8.078/90, Código de Defesa do Consumidor.

(...)"

Em recente julgado do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Apelação Cível nº 70021334974, Décima Sexta Câmara Cível, sessão de 26 de setembro de 2007), o digno Relator, Des. Paulo Augusto Monte Lopes, manifestou-se:

"(...)

Outrossim, não importa houvesse determinação em contrário contida em Portaria pelo Governo Federal porquanto semelhante ato administrativo não pode se sobrepor à norma cogente da lei federal que estatuiu a respeito do sistema de proteção ao consumidor, de modo que o procedimento adotado pela CRT amparado em portarias ministeriais mencionadas nos autos revelou-se benéfica somente para a Companhia e extremamente prejudicial ao consumidor, prática vedada pelo artigo 51, e seguintes, do Código de Defesa do Consumidor, aplicável no caso concreto.

Aliás, como bem ressalta Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, 25ª ed, São Paulo, Malheiros, 2000, p. 174), 'As portarias, como os demais atos administrativos internos, não atingem nem obrigam os particulares, pela manifesta razão de que os cidadãos não estão sujeitos ao poder hierárquico da Administração Pública'."

Outrossim, imperioso ressalvar que o adquirente de linha telefônica tem direito à subscrição de ações pelo valor patrimonial - o qual deverá ser apurado no balanço anual realizado ao final do exercício anterior ao da data da integralização -, bem assim a seus dividendos (TJ/RS, AC 70021334974), entendimento este já consolidado também no Egrégio STJ.

(...)

Do teor do trecho do voto acima transcrito, verifica-se que o acórdão rescindendo reconheceu que a Portaria n. 1.028/96, ao dispor sobre a forma de cálculo das ações recebidas pelos compradores de linhas telefônicas, implicou em violação ao princípio da isonomia, motivo pelo qual a conclusão foi pelo reconhecimento da abusividade da cláusula dos contratos de adesão alterada pela referida portaria.

As alegações trazidas pelo autor da rescisória não demonstram afronta direta e induvidosa à lei.

O artigo 51, XIII, do Código de Defesa do Consumidor, foi expressamente analisado no voto condutor do acórdão rescindendo (conforme trecho acima transcrito) e interpretado de forma contrária ao pretendido pelo autor da rescisória, tendo sido enquadrada a situação concreta na hipótese prevista no artigo, com o reconhecimento da nulidade da cláusula contratual debatida. Não há violação à norma jurídica no ponto em questão.

Também não verifico qualquer violação ao artigo 421 do Código Civil, o qual dispõe sobre a liberdade contratual entre as partes, bem como não verifico violação ao artigo 170, caput, da Constituição Federal, o qual dispõe sobre a livre iniciativa, porque, na situação concreta tratada na ação de origem, a discussão era referente a contrato de adesão e o acórdão rescindendo entendeu pela abusividade da cláusula debatida, reconhecendo sua nulidade, com fundamento no artigo 51, XIII, do Código de Defesa do Consumidor (transcrito no voto condutor do acórdão rescindendo), bem como com fundamento no princípio da isonomia, o qual possui previsão constitucional (artigo 5º da Constituição Federal). Esse foi o entendimento do julgado de origem e não há demonstração de afronta direta e induvidosa à lei no ponto.

Igualmente não verifico que o acórdão teria ampliado o pedido formulado na inicial, o que, segundo o autor, violaria os artigos 128 e 460 do CPC/73 (arts. 141 e 492 do CPC/2015). Da análise da inicial da ação de origem, verifico que há pedido expresso para que fosse reconhecida a nulidade da Portaria n. 1.028/96 e a abusividade da cláusula discutida. Nesses termos foi o pedido da inicial da ação de origem (4-ANEXOSPET6, página 33 - grifei):

(...)

Ante o exposto, observado o rito ordinário, requer a citação dos réus para responder aos termos da presente ação, assim como para, querendo, contestá-la, no prazo legal, sob pena de revelia (artigos 285, 297 e 319 do Código de Processo Civil), prosseguindo-se até final prestação jurisdicional, para que, julgada procedente a ação e confirmada a medida liminar, seja declarada a nulidade da Portaria n. 1.028/96, e, em consequência, afastada a aplicação da cláusula abusiva e discriminatória nos contratos celebrados a partir de 25 de agosto de 1996, confirmando in totum a liminar pleiteada.

(...)

Portanto, inexiste violação à norma jurídica no ponto alegado.

Sobre as alegações de que teria havido violação ao disposto no artigo 170, §1º, II, da lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações) e que o acórdão teria concedido critério já reputado ilegal pelo STJ, conforme estaria consolidado na súmula n. 371 daquela Corte Superior, novamente entendo que não prosperam as alegações.

Primeiro, observo que o acórdão rescindendo foi proferido em 06/11/2007 (4-ANEXOSPET10, Página 41), ou seja, antes mesmo da edição da súmula n. 371 do STJ (publicada no DJe de 30/03/2009).

Segundo, não verifico que a interpretação adotada na súmula em questão ou nos precedentes que embasaram a sua edição possuíssem caráter vinculante de forma a permitir se cogitar a rescisão do acórdão de origem, unicamente por estar em desacordo com entendimento do STJ. Observo que eventual divergência na aplicação da lei não significa violação manifesta a norma jurídica.

Terceiro, conforme já afirmado, o acórdão rescindendo foi fundamentado na aplicação do princípio da isonomia e do Código de Defesa do Consumidor, tendo concluído que a cláusula alterada pela Portaria n. 1.028/96 era abusiva. Essa interpretação foi contrária ao pretendido pelo autor da rescisória, o que não significa se tratar de manifesta violação à norma jurídica. Ressalto que não cabe, por meio da ação rescisória, rever posicionamento adotado pelo julgador ou a justiça da decisão proferida.

Nesse sentido é o entendimento desta Corte:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. NÃO CONFIGURAÇÃO. REEXAME DAS PROVAS E DA JUSTIÇA DA DECISÃO. INADMISSIBILIDADE. IMPROCEDÊNCIA. 1. A ação rescisória não pode ser manejada com a pretensão de revisar a justiça da decisão rescindenda por meio de simples reinterpretação das provas. Precedentes do STJ e do TRF4. 2. No caso, o autor, sob o fundamento de violação de disposições normativas, busca o mero reexame do material probatório do processo originário. 3. Ação julgada improcedente. (TRF4 5042989-59.2015.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 26/03/2018)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL AÇÃO RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO. OPÇÃO PELO FGTS. JUROS PROGRESSIVOS. DOCUMENTO JÁ ANALISADO NA AÇÃO ORIGINÁRIA. Por documento "novo", idôneo a ensejar a propositura de ação rescisória, entende-se não aquele que inexistia quando da prolação da sentença ou acórdão rescindendo, mas cuja existência a parte ignorava, ou que não pôde ser utilizado no respectivo processo, por motivo alheio à sua vontade. Além de "novo", o documento deve ser suficiente, por si só, para assegurar julgamento favorável à parte, caso tivesse constado na ação originária Já tendo sido o documento apresentado na ação originária, não pode ser qualificado como "novo". Não cabe ao Tribunal rever o posicionamento adotado pelo julgador ou a justiça da decisão proferida, uma vez que nela foi eleita a interpretação que se afigurava mais adequada no caso concreto. (TRF4, AR 0000934-18.2014.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, D.E. 15/10/2014)

Por fim, sobre a alegação trazida em alegações finais pelo autor (evento 14 destes autos), no sentido de que a parte ré teria confessado expressamente que o acórdão rescindendo teria violado jurisprudência do STJ, ressalto que, da análise da contestação apresentada pela parte ré (4-CONTES26), absolutamente nada verifico ter sido confessado. Pelo contrário, observo que a parte ré expressamente alegou que o precedente citado pelo autor trata de discussão diversa da debatida na ação de origem (4-CONTES26, página 9):

“Não bastasse isso, é de se notar que o acórdão paradigma (tanto o repetitivo, como o proferido no REsp 965.834/RS) jamais subsidiarão a resposta pretendida pela autora. Basta ler o seu teor para notar que o objeto de discussão naqueles casos é claramente diverso daquele debatido na ação civil pública cujo acórdão se pretende desconstituir. “

Além disso, ainda que existisse qualquer afirmação da parte ré concordando com as alegações da parte autora, tal circunstância não traria qualquer efeito processual para o pleito rescisório do autor, pois, na ação rescisória, o que se ataca é a coisa julgada formada no processo originário, não se tratando de simples direito indisponível das partes, sendo inadmissível a confissão nesse tipo de ação. Nesse sentido, cito o seguinte precedente desta Corte:

AÇÃO RESCISÓRIA. ADMINISTRATIVO. PENA DE CONFISSÃO. INAPLICÁVEL. VIOLAÇÃO DE LEI. DOCUMENTO NOVO. ERRO DE FATO. HIPÓTESES NÃO CONFIGURADAS. 1. Na ação rescisória, o que se ataca é a coisa julgada formada no processo originário, não se tratando de simples direito indisponível das partes, sendo inadmissível a confissão nesse tipo de ação. 2. Existe erro de fato apto a ensejar a pretensão rescisória quando a sentença/acórdão admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, ademais, que não tenha havido controvérsia nem pronunciamento judicial sobre o fato. Hipótese não configurada no caso concreto. 3. É firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que é indispensável que haja afronta direta e induvidosa à lei. Não há como se entender pela afronta direta e induvidosa à lei no caso concreto. 4. O documento novo, hábil a ensejar a propositura da aça rescisória, não deve ser aquele que inexistia quando da prolação da sentença ou acórdão rescindendo, mas aquele cuja existência a parte ignorava, ou que não pôde ser utilizado no respectivo processo, por motivo alheio à vontade da parte. Além disso, documento deve ainda ser capaz de, por si só, assegurar julgamento favorável, se constasse dos autos da ação originária, o que não resta configurado no caso concreto. 5. Ação rescisória improcedente. (TRF4, ARS 5017191-04.2012.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relator MARCOS JOSEGREI DA SILVA, juntado aos autos em 15/02/2020)

Assim, entendo que não se está diante de situação apta a ensejar a rescisão da decisão já transitada em julgado.

5. Consectários legais.

Condeno a parte autora ao pagamento dos encargos da sucumbência nesta ação rescisória, fixando agora os honorários advocatícios em 10% do valor atualizado da causa, com base no art. 85, §2º do CPC e considerando a sucumbência havida nesta ação.

6. Dispositivo.

Ante o exposto, voto por conhecer da ação rescisória e julgar improcedente a ação, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001939611v9 e do código CRC 4fe9f28b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Data e Hora: 13/11/2020, às 14:30:15


5000292-81.2019.4.04.0000
40001939611.V9


Conferência de autenticidade emitida em 21/11/2020 04:01:00.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Ação Rescisória (Seção) Nº 5000292-81.2019.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

OI S.A

ADVOGADO: ANA TEREZA BASILIO (OAB RJ074802)

ADVOGADO: LUIZ RODRIGUES WAMBIER (OAB PR007295)

ADVOGADO: PAULO CEZAR PINHEIRO CARNEIRO (OAB RJ020200)

RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

INTERESSADO: AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES - ANATEL

INTERESSADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

EMENTA

ação rescisória. CONTRATO DE ADESÃO. LINHAS TELEFÔNICAS. reconhecimento de cláusula abusiva. violação manifesta à norma jurídica. não ocorrência.

1. Na ação rescisória, o que se ataca é a coisa julgada formada no processo originário, não se tratando de simples direito indisponível das partes, sendo inadmissível a confissão nesse tipo de ação.

2. É firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que, para a ação rescisória fundada no inciso V do artigo 966 do CPC ("violar manifestamente norma jurídica”), é indispensável que haja afronta direta e induvidosa à lei. Hipótese não configurada.

3. Ação rescisória improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer da ação rescisória e julgar improcedente a ação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 12 de novembro de 2020.



Documento eletrônico assinado por CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001939612v4 e do código CRC b147fe22.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Data e Hora: 13/11/2020, às 14:14:28


5000292-81.2019.4.04.0000
40001939612 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 21/11/2020 04:01:00.

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Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 04/08/2020 A 13/08/2020

Ação Rescisória (Seção) Nº 5000292-81.2019.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PROCURADOR(A): RICARDO LUÍS LENZ TATSCH

AUTOR: OI S.A

ADVOGADO: ANA TEREZA BASILIO (OAB RJ074802)

ADVOGADO: LUIZ RODRIGUES WAMBIER (OAB PR007295)

ADVOGADO: PAULO CEZAR PINHEIRO CARNEIRO (OAB RJ020200)

RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/08/2020, às 00:00, a 13/08/2020, às 16:00, na sequência 81, disponibilizada no DE de 24/07/2020.

Certifico que a 2ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

RETIRADO DE PAUTA.

PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 21/11/2020 04:01:00.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 12/11/2020

Ação Rescisória (Seção) Nº 5000292-81.2019.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: LUIZ RODRIGUES WAMBIER por OI S.A

AUTOR: OI S.A

ADVOGADO: ANA TEREZA BASILIO (OAB RJ074802)

ADVOGADO: LUIZ RODRIGUES WAMBIER (OAB PR007295)

ADVOGADO: PAULO CEZAR PINHEIRO CARNEIRO (OAB RJ020200)

RÉU: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 12/11/2020, na sequência 111, disponibilizada no DE de 29/10/2020.

Certifico que a 2ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 2ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DA AÇÃO RESCISÓRIA E JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

Votante: Juiz Federal GIOVANI BIGOLIN

Votante: Juíza Federal CARLA EVELISE JUSTINO HENDGES

PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 21/11/2020 04:01:00.

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