APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5016684-49.2013.4.04.7100/RS
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | PAULO ROBERTO SOARES |
ADVOGADO | : | PAULO ANDRÉ FERNANDES SOLANO |
: | LUIZ MARCELO TASSINARI |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INSS. PRESCRIÇÃO. AFASTADA. CERTIDÃO DE AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO EM QUE NÃO SE CONSIDEROU TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. DANO MATERIAL. NEXO CAUSAL ENTRE AÇÃO ESTATAL E DANO NÃO CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAÇÃO INEXISTENTE.
- Pelo princípio da actio nata, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação visando à indenização por danos materiais - diferenças decorrentes da alteração na proporção da aposentadoria do autor retroativamente à data de concessão do benefício - é a data da revisão do benefício, operada em virtude da emissão da certidão de tempo de serviço pelo INSS e da respectiva averbação de tempo especial pela autarquia determinadas.
- Passados menos de cinco anos entre a revisão administrativa da aposentadoria e a data de ajuizamento da presente demanda, não há falar em prescrição.
- A Carta de 1988, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte pode-se dizer que, de regra os pressupostos dar responsabilidade civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.
- Em se tratando de comportamento omissivo, a situação merece enfoque diferenciado. Decorrendo o dano diretamente de conduta omissiva atribuída a agente público, pode-se falar em responsabilidade objetiva. Decorrendo o dano, todavia, de ato de terceiro ou mesmo de evento natural, a responsabilidade do Estado de regra, assume natureza subjetiva, a depender de comprovação de culpa, ao menos anônima, atribuível ao aparelho estatal. De fato, nessas condições, se o Estado não agiu, e o dano não emerge diretamente deste não agir, de rigor não foi, em princípio, seja natural, seja normativamente, o causador do dano.
- Para atingir o objetivo de aproveitamento de tempo de serviço especial (desempenhado sob o RGPS) junto ao ente público, perante o qual obteve a aposentadoria, duas questões diferentes devem ser solucionadas: (I) uma entre o antigo segurado e o INSS, para que este reconheça o tempo de atividade anterior à conversão do regime como especial, à luz, obviamente, da legislação do Regime Geral de Previdência Social; e (II) outra, entre o servidor e a entidade à qual ele está vinculado profissionalmente, para que o tempo especial de serviço celetista eventualmente reconhecido junto ao INSS seja averbado, no regime estatutário, com contagem privilegiada. Precedentes do STJ.
- Não se pode pretender, assim, que o INSS possa ser responsabilizado pelo fato de o acolhimento da segunda pretensão ter ocorrido tardiamente e sem reconhecimento de efeitos pretéritos.
- Inexistente nexo de causalidade entre a omissão do INSS (quanto à expedição da certidão) e os alegados danos experimentados pelo demandante (que dizem respeito, como demonstrado, a valores de proventos que, se for o caso, devem ser pagos pelo ente responsável pela concessão da aposentadoria), não há se falar na indenização ora postulada em desfavor da autarquia previdenciária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 02 de dezembro de 2015.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5016684-49.2013.4.04.7100/RS
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RELATÓRIO
PAULO ROBERTO SOARES ajuizou ação ordinária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em 02/04/2013, objetivando indenização por danos materiais, em razão da expedição de Certidão por Tempo de Contribuição (CTC), para fins de obtenção de benefício de aposentadoria em regime previdenciário municipal, sem a inclusão de tempo de serviço laborado em condições especiais. Informou que, como decorrência do reconhecimento judicial de seu direito à conversão do tempo especial (processo sob o nº 2001.71.00023897-9), obteve perante o Município a majoração do seu benefício de aposentadoria proporcional (concedido em 29/06/2004), passando a perceber aposentadoria integral somente a partir de setembro de 2010. Aduziu que os danos materiais são mensurados pelo valor equivalente à diferença entre os proventos de aposentadoria a que o servidor fazia jus (100%) em 29/06/2004 e o valor do benefício concedido (80%), em todo o período de 29/06/2004 até 31/08/2010.
Sobreveio sentença em 15/12/2014 (evento 27 na origem), julgando procedente o pedido nos seguintes termos:
Ante o exposto, rejeito a preliminar e julgo procedente o pedido para condenar o INSS ao pagamento de indenização por danos materiais ao autor relativamente ao montante de 20% do valor de seus proventos que deixou de auferir no período de 29/06/2004 a 31/08/2010, com o acréscimo de correção monetária pelo IPCA-E, desde quando cada parcela deveria ser paga, e juros de mora de 6% ao ano, a partir da citação.
Condeno o réu ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, parágrafos 3º e 4º, do CPC.
Publicação e registro pelo sistema eletrônico. Intimem-se.
Eventuais apelações regularmente interpostas pelas partes serão recebidas no duplo efeito (art. 520, caput, do CPC), cabendo à Secretaria abrir vista à parte contrária para contrarrazões e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Feito sujeito a reexame necessário.
Irresignado, o INSS interpôs apelação (EVENTO34). Inicialmente, afirma que a prescrição (tanto faz se trienal ou quinquenal) resta consumada, pois a ação foi ajuizada somente em 02/04/2013 e, a seu turno, o prejuízo se materializou com a aposentadoria, deferida em 29/06/2004, ou, entendendo-se diferente, com o trânsito em julgado da ação ordinária que determinou a expedição da nova certidão com a contagem ponderada do tempo laborado sob condições insalubres, precisamente em 22/08/2007. Quanto ao mais, refere a autarquia razões legítimas para a demora na expedição da certidão de tempo de serviço/contribuição com o tempo de serviço especial, não restando caracterizados, ademais, todos os requisitos para a responsabilização civil como pleiteado.
Com contrarrazões, subiram os autos.
A decisão da Corte Especial, proferida no bojo do Conflito de Competência sob o n° 5027246-09.2015.4.04.0000, firmou a competência da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região para o julgamento do recurso voluntário e da remessa oficial, sob o entendimento de que não se discute, no presente feito, qualquer questão de cunho previdenciário, senão pleito meramente indenizatório.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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VOTO
DA PRESCRIÇÃO
A alegação de prescrição de fato não pode ser acolhida, merecendo confirmação a sentença no ponto.
Trata-se de pleito indenizatório direcionado contra o INSS. Impõe-se, assim, a observância do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, que regula a prescrição de todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública:
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
A propósito a manifestação do Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar recurso representativo da controvérsia:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ARTIGO 543-C DO CPC). RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL (ART. 1º DO DECRETO 20.910/32) X PRAZO TRIENAL (ART. 206, § 3º, V, DO CC). PREVALÊNCIA DA LEI ESPECIAL. ORIENTAÇÃO PACIFICADA NO ÂMBITO DO STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. A controvérsia do presente recurso especial, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC e da Res. STJ n 8/2008, está limitada ao prazo prescricional em ação indenizatória ajuizada contra a Fazenda Pública, em face da aparente antinomia do prazo trienal (art. 206, § 3º, V, do Código Civil) e o prazo quinquenal (art. 1º do Decreto 20.910/32).
2. O tema analisado no presente caso não estava pacificado, visto que o prazo prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública era defendido de maneira antagônica nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial. Efetivamente, as Turmas de Direito Público desta Corte Superior divergiam sobre o tema, pois existem julgados de ambos os órgãos julgadores no sentido da aplicação do prazo prescricional trienal previsto no Código Civil de 2002 nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública. Nesse sentido, o seguintes precedentes: REsp 1.238.260/PB, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 5.5.2011; REsp 1.217.933/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 25.4.2011; REsp 1.182.973/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 10.2.2011; REsp 1.066.063/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe de 17.11.2008; EREspsim 1.066.063/RS, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 22/10/2009). A tese do prazo prescricional trienal também é defendida no âmbito doutrinário, dentre outros renomados doutrinadores: José dos Santos Carvalho Filho ("Manual de Direito Administrativo", 24ª Ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2011, págs. 529/530) e Leonardo José Carneiro da Cunha ("A Fazenda Pública em Juízo", 8ª ed, São Paulo: Dialética, 2010, págs. 88/90).
3. Entretanto, não obstante os judiciosos entendimentos apontados, o atual e consolidado entendimento deste Tribunal Superior sobre o tema é no sentido da aplicação do prazo prescricional quinquenal - previsto do Decreto 20.910/32 - nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002.
4. O principal fundamento que autoriza tal afirmação decorre da natureza especial do Decreto 20.910/32, que regula a prescrição, seja qual for a sua natureza, das pretensões formuladas contra a Fazenda Pública, ao contrário da disposição prevista no Código Civil, norma geral que regula o tema de maneira genérica, a qual não altera o caráter especial da legislação, muito menos é capaz de determinar a sua revogação. Sobre o tema: Rui Stoco ("Tratado de Responsabilidade Civil". Editora Revista dos Tribunais, 7ª Ed. - São Paulo, 2007; págs. 207/208) e Lucas Rocha Furtado ("Curso de Direito Administrativo". Editora Fórum, 2ª Ed. - Belo Horizonte, 2010; pág. 1042).
5. A previsão contida no art. 10 do Decreto 20.910/32, por si só, não autoriza a afirmação de que o prazo prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública foi reduzido pelo Código Civil de 2002, a qual deve ser interpretada pelos critérios histórico e hermenêutico. Nesse sentido: Marçal Justen Filho ("Curso de Direito Administrativo". Editora Saraiva, 5ª Ed. - São Paulo, 2010; págs. 1.296/1.299).
6. Sobre o tema, os recentes julgados desta Corte Superior: AgRg no AREsp 69.696/SE, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 21.8.2012; AgRg nos EREsp 1.200.764/AC, 1ª Seção, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 6.6.2012; AgRg no REsp 1.195.013/AP, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 23.5.2012; REsp 1.236.599/RR, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 21.5.2012; AgRg no AREsp 131.894/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 26.4.2012; AgRg no AREsp 34.053/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 21.5.2012; AgRg no AREsp 36.517/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 23.2.2012; EREsp 1.081.885/RR, 1ª Seção, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 1º.2.2011.
7. No caso concreto, a Corte a quo, ao julgar recurso contra sentença que reconheceu prazo trienal em ação indenizatória ajuizada por particular em face do Município, corretamente reformou a sentença para aplicar a prescrição quinquenal prevista no Decreto 20.910/32, em manifesta sintonia com o entendimento desta Corte Superior sobre o tema.
8. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.
(RECURSO ESPECIAL 1251993. Relator Min. MAURO CAMPBELL MARQUES. Primeira Seção do STJ. DJE:19/12/2012) (grifei)
Por outro lado, observado o princípio da actio nata, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação visando à indenização por danos materiais no caso em apreço- diferenças decorrentes da alteração na proporção da aposentadoria do autor retroativamente à data de concessão do benefício -, é a data da revisão do benefício (conforme publicação no Diário Oficial de Porto Alegre do evento 01/12, p. 21, a modificação da aposentadoria se deu em 21/05/2010), operada em virtude da emissão da certidão de tempo de serviço pelo INSS e da respectiva averbação de tempo especial pela autarquia determinadas no processo n° 2001.71.00023897-9, transitado em julgado em 22/08/2007.
Assim, iniciando-se o prazo quinquenal em 21/05/2010 e tendo a presente ação sido ajuizada em 02/04/2013, não há falar em prescrição.
QUESTÃO DE FUNDO - PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS
O autor postulou a expedição de certidão de tempo de serviço, com conversão de tempo especial, ao INSS. Indeferida a pretensão de expedição do documento com conversão de tempo especial, ajuizou em 27/07/2001 ação contra a citada autarquia junto à Justiça Federal.
Em 2003 o autor requereu aposentadoria como servidor público municipal (Biólogo - DMAE - autarquia municipal), benefício que restou deferido em 29/06/2004 de forma proporcional.
O pedido formulado na ação que ajuizou na Justiça Federal (2001.71.00.023897-9) foi julgada procedente e a decisão transitou em julgado em 2007. Em maio de 2010 o autor requereu, de posse da certidão, a revisão de seu benefício, que em setembro do mesmo ano passou a ser pago de forma integral.
Pretende nestes autos a condenação do INSS a pagar as diferenças entre o benefício proporcional e o integral verificadas entre 29/06/2014 e 31/18/2010.
A responsabilidade do Estado está prevista no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal:
"Art. 37.
...
§6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.".
A Carta de 1988, pois, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte, pode-se dizer que, de regra os pressupostos dar responsabilidade civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.
Em se tratando de comportamento omissivo, a situação merece enfoque diferenciado. Decorrendo o dano diretamente de conduta omissiva atribuída a agente público, pode-se falar em responsabilidade objetiva. Decorrendo o dano, todavia, de ato de terceiro ou mesmo de evento natural, a responsabilidade do Estado, de regra, assume natureza subjetiva, a depender de comprovação de culpa, ao menos anônima, atribuível ao aparelho estatal. De fato, nessas condições, se o Estado não agiu, e o dano não emerge diretamente deste não agir, de rigor não foi, em princípio, seja natural, seja normativamente, o causador do dano.
A sentença assim solucionou litígio:
Com efeito, o demandante recebeu 80% da remuneração que lhe era devida no período de jun/2004 a ago/2010 em função da negativa do réu em lhe fornecer a certidão de tempo de contribuição com a contagem ponderada do tempo trabalhado em regime especial. Tal indeferimento estava fundado na Instrução Normativa nº 57/2001.
Ocorre que na ação judicial nº 2001.71.00023897-9 restou declarada a ilegalidade do ato praticado pelo INSS, por acórdão transitado em julgado.
A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da CF. Ou seja, é desnecessária a comprovação de dolo ou culpa do agente público.
Dessa forma, tendo havido ato ilícito praticado pelo INSS, já reconhecido por decisão judicial definitiva, e tendo o autor sofrido manifesto prejuízo financeiro por ter recebido seu benefício de aposentadoria com a redução de 20% no período de jun/2004 a ago/2010, resta configurada a obrigação de indenizar os danos materiais provocados pelo demandado.
A demora no julgamento da ação supramencionada é própria do sistema judicial brasileiro e não exime o INSS da sua responsabilidade pelo indeferimento de pedido administrativo com base em entendimento jurídico equivocado e baseado em ato infralegal, com as consequências jurídicas e patrimoniais daí decorrentes. Ressalte-se também que se o TCU, ainda no ano de 2006, tinha reconhecido aos servidores públicos o direito à contagem do tempo de contribuição fictício, nada impedia que o INSS expedisse de imediato a certidão de tempo de serviço, nos moldes postulados pelo autor, para por fim ao litígio.
Tenho que a decisão merece reforma.
Não diviso, no caso, nexo de causalidade entre ato ou omissão atribuível ao INSS e o alegado dano que o autor pretende ver indenizado.
Trata-se de situação peculiar, na qual, de todo modo, o que pretende a parte demandante, em última análise, é obter os efeitos pretéritos, em relação à sua a aposentadoria estatutária (que é de responsabilidade do Departamento Municipal de Previdência dos Servidores - Previmpa, entidade gestora do Regime Próprio de Previdência Social-RPPS do Município de Porto Alegre.
A verdade é que em rigor, quanto ao tempo especial discutido na ação que tramitou na Justiça Federal, duas lides em tese se faziam presentes desde a origem.
De fato, quando o servidor pretende averbar tempo especial sob regime celetista para efeito de obtenção de benefício estatutário, estabelecem-se, em tese, duas discussões:
(I) Uma entre o antigo segurado e o INSS, para que este reconheça o tempo de atividade anterior à conversão do regime como especial, à luz, obviamente, da legislação do Regime Geral de Previdência Social.
(II) Outra, entre o servidor e a entidade à qual ele está vinculado profissionalmente, para que o tempo especial de serviço celetista eventualmente reconhecido junto ao INSS seja averbado, no regime estatutário, com contagem privilegiada.
Em ação direcionada contra o INSS, a discussão necessariamente se limitar à questão eminentemente ligada ao Regime Geral de Previdência Social, devendo se restringir, em conseqüência, à comprovação do tempo de serviço e à consideração de sua especialidade ou não. Já quanto à possibilidade de utilização ou não do tempo especial celetista para a obtenção de aposentadoria junto ao Regime Próprio de Previdência dos servidores, trata-se de matéria que somente pode ser discutida, se for o caso, em ação direcionada contra a entidade à qual vinculado o servidor, por ostentar índole administrativa.
O entendimento acima exposto foi inclusive aquele que inspirou o acórdão proferido na ação 2001.71.00.023897-9 ajuizada pelo autor, como se percebe de excerto do voto do Des. Federal João Batista Pinto Silveira:
Por conseguinte, cumpre ao INSS apenas expedir a certidão de tempo de serviço pleiteada, não lhe incumbindo questionar possível requerimento de benefício que a parte autora venha a formular no futuro, perante a própria Autarquia Previdenciária ou a outro regime de previdência.
Em sintonia com essa compreensão, já decidiu esta Colenda Sexta Turma, em acórdão proferido pelo Des. Federal Nylson Paim de Abreu. Veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB O REGIME CELETISTA. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO. MUDANÇA DE REGIME JURÍDICO. INSS. COMPETÊNCIA PARA A EMISSÃO DA CTS.
1. Pertencendo o servidor público a regime previdenciário próprio, tem direito à emissão da certidão de tempo de serviço, para fins de contagem recíproca, considerando a especialidade do trabalho desenvolvido anteriormente à mudança de regime.
2. A emissão de certidão de tempo de serviço com o acréscimo decorrente da conversão das atividades especiais em comuns, para fins de contagem recíproca, não viola o contido nos artigos 40, parágrafo 4º, e 201, parágrafo 9º, da Constituição Federal de 1988, tampouco o artigo 96, incisos I e II, da Lei n.º 8.213, de 1991.
3. Incumbe ao INSS, em relação ao trabalho prestado sob as regras do Regime Geral de Previdência Social, a expedição de certidão de tempo de serviço prevista na legislação previdenciária, devendo nela constar, de forma discriminada, o cômputo simples desse período, o acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum, assim como o total geral obtido desse somatório, não cabendo questionar a respeito de possível pedido de aposentadoria ou de algum outro tipo de benefício que o interessado venha a requerer no futuro, perante a Autarquia Previdenciária ou em outro regime próprio de previdência. Precedentes deste Tribunal. 4. Omissis. (AMS n.º 2002.70.07.00543-0/PR, 6ª Turma, j. sessão de 24-03-2004, DJU, Seção 2, de 09-06-2004, p. 558-591).
A questão também foi muito bem apreciada pelo eminente Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, ao concluir, em processo análogo, que se a ação é direcionada contra o INSS a discussão deve se limitar à questão eminentemente ligada ao Regime Geral de Previdência Social, devendo se restringir, em conseqüência, à comprovação do tempo de serviço e à consideração de sua especialidade ou não. Já quanto à possibilidade de utilização ou não do tempo especial celetista para obtenção de aposentadoria junto ao Regime Próprio de Previdências dos servidores, trata-se de matéria que somente pode ser discutida, se for o caso - até porque pressupõe o prévio requerimento administrativo e análise da legislação específica (pois pode se tratar de servidor público federal, estadual ou municipal, cada qual com regime próprio)-, em ação direcionada contra a entidade à qual vinculado o servidor, por ostentar índole administrativa (AC 1999.70.01.006984-5/PR).
Por fim, cumpre explicitar que na certidão de tempo de serviço a ser expedida deve constar, de forma discriminada, o cômputo simples desse período, o acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum, assim como o total geral obtido desse somatório, no âmbito do Regime Geral de Previdência Social.
O que se assegurou na ação anterior, como se percebe, foi o direito à expedição da certidão, uma vez que a efetiva possibilidade de aproveitamento privilegiado do tempo especial certificado dependeria de requerimento e/ou ação judicial contra a parte legitimada (pessoa jurídica à qual vinculado o servidor).
Ao apreciar o pedido de certidão, o INSS restringiu-se a exercer jurisdição administrativa, e isso nos limites que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico. A propósito, conquanto não lhe coubesse, como restou consignado no acórdão, recusar o direito à certidão com base no argumento de que inviável o cômputo privilegiado de tempo especial para a obtenção de aposentadoria estatutária (pois isso diz respeito à relação do servidor com o ente respectivo), não custa registrar que o Superior Tribunal de Justiça tem diversos precedentes, quanto a este tema, contrários ao que restou deferido ao demandante. Segue exemplo:
PREVIDENCIÁRIO E ADMINISTRATIVO - TEMPO DE SERVIÇO - CONTAGEM RECÍPROCA - ATIVIDADE INSALUBRE PRESTADA NA INICIATIVA PRIVADA - CONTAGEM ESPECIAL PARA FINS DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA NO SERVIÇO PÚBLICO - IMPOSSIBILIDADE - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS.
1. O REsp n. 534.638/PR, relatado pelo Excelentíssimo Ministro Félix Fischer, indicado como paradigma pela Autarquia Previdenciária, espelha a jurisprudência sedimentada desta Corte no sentido de que, objetivando a contagem recíproca de tempo de serviço, vale dizer, a soma do tempo de serviço de atividade privada (urbana ou rural) ao serviço público, não se admite a conversão do tempo de serviço especial em comum, ante a expressa proibição legal (artigo 4º, I, da Lei n. 6.226/75 e o artigo 96, I, da Lei n. 8.213/91). Precedentes.
2. Embargos de divergência acolhidos para dar-se provimento ao recurso especial do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, reformando-se o acórdão recorrido para denegar-se a segurança.
(EREsp 524267/PB, Terceira Seção, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe de 24-03-2014)
Nesse sentido, ainda, os seguintes precedentes: REsp 925.359, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 17-03-2009; ED no REsp 640.322, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJ de 12-09-2005; e REsp 534.638, Quinta Turma, Rel. Ministro Felix Fischer, julgado em 03-02-2004. As seguintes decisões monocráticas também são na mesma linha: REsp 1151024, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe de 18-02-2014; REsp 1088568, Rel. Ministro Og Fernandes, DJe de 02-05-2012; REsp 1295443, Rel. Ministro Francisco Falcão, DJe de 12-03-2012; Ag 1143623, Rel. Ministra Thereza de Assis Moura, DJe de 24-10-2011; e Ag 1215059, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 04-08-2011. De todo modo, não está em discussão o direito do autor à contagem privilegiada do tempo especial, que já foi deferido pelo Município (com acerto, me parece, a despeito dos precedentes do STJ referidos).
Como para atingir o objetivo final (aproveitamento junto ao ente ao qual vinculado do tempo especial convertido) duas questões deveriam ser solucionadas, como já esclarecido, não se pode pretender que o INSS possa ser responsabilizado pelo fato de o acolhimento da segunda pretensão ter ocorrido tardiamente e sem reconhecimento de efeitos pretéritos.
Os efeitos pecuniários pretéritos, tendo o INSS se limitado apreciar o direito de certidão, deveriam -ou devem- ser postulados junto à pessoa jurídica responsável pelo pagamento da aposentadoria. Se havia possibilidade, ou não, de propositura de ação contra o PREVIMPA concomitantemente com a ação dirigida contra o INSS, ou se é que se mostra possível ainda a cobrança dos valores pretéritos em face da referida pessoa jurídica, trata-se de problemas que dizem respeito à relação do demandante com aquela autarquia.
O que não se mostra possível é pretender, a título de indenização, obter do INSS diferenças de proventos que, em tese, ao PREVIMPA competiria pagar.
A possível ocorrência de prescrição em favor do ente municipal quanto às parcelas pretéritas em nada altera a situação. Trata-se de questão prejudicial controversa a ser dirimida, se for o caso, entre as os sujeitos da relação jurídica. Se é que eventualmente se consumou prescrição em favor do PREVIMPA (e trata-se de questão controversa, pois haverá necessidade de decidir sobre os efeitos da ação deflagrada contra o INSS em relação ao lapso prescricional para cobrança de valores) isso teria decorrido não de omissão do INSS, mas de omissão do próprio autor, por não ter demandado contra o PREVIMPA a tempo e modo.
O que não se mostra possível é que o credor, antevendo obstáculos para cobrar do ente legitimado os valores que entende devidos, seja por possível alegação de prescrição, seja em razão de possíveis percalços para receber judicialmente os valores que entende devidos, venha a escolher o devedor; muito menos que venha a postular de terceiro a título de indenização, valores que não lhe foram pagos pelo pretenso devedor.
Não há nexo de causalidade entre a omissão do INSS (quanto à expedição da certidão) e os alegados danos experimentados pelo demandante, que dizem respeito, como demonstrado, a valores de proventos que, se for o caso, deve ser pagos pelo ente responsável pela concessão da aposentadoria.
O pedido deve ser julgado improcedente, condenada a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, fixados em R$ 1.500,00.
Ante o exposto, voto dar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 02/12/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5016684-49.2013.4.04.7100/RS
ORIGEM: RS 50166844920134047100
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | do adv Luiz Marcelo Tassinari pelo apelado Paulo Roberto Soares |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | PAULO ROBERTO SOARES |
ADVOGADO | : | PAULO ANDRÉ FERNANDES SOLANO |
: | LUIZ MARCELO TASSINARI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 02/12/2015, na seqüência 139, disponibilizada no DE de 18/11/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
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