APELAÇÃO CÍVEL Nº 5017091-94.2014.4.04.7108/RS
RELATORA | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
APELANTE | : | COTICA ENGENHARIA E CONSTRUCOES LTDA |
ADVOGADO | : | JEANI RUDIGER |
: | ALOYCIO RÜDIGER | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO.
1. O artigo 120 da Lei nº 8.213/91 é claro ao vincular o direito de regresso da autarquia previdenciária à comprovação da negligência por parte do empregador quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, indicadas para a proteção individual e coletiva.
2. No presente caso, é incontroversa a ocorrência do acidente de trabalho e o nexo de causalidade entre este e as lesões que resultaram na concessão do benefício pelo órgão previdenciário. Contudo, não há provas suficientes no sentido de que a requerida tenha negligenciado as normas de proteção e saúde do trabalhador.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação da parte ré, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de agosto de 2016.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8481645v6 e, se solicitado, do código CRC 1818ABB6. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5017091-94.2014.4.04.7108/RS
RELATORA | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
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: | ALOYCIO RÜDIGER | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente ação regressiva proposta com fundamento nos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91, em virtude de acidente de trabalho que acarretou em recebimento de benefício previdenciário por segurado/empregado com data de início em 29/10/2012.
O INSS recorre argumentando que no caso afigura-se despicienda a aferição de culpa eventual culpa exclusiva ou concorrente da vítima. Sustenta que a culpa do empregado não afasta a responsabilidade da empresa. Aponta que a ré não proporcionou um ambiente seguro para os seus colaboradores. Ainda assim, destaca a existência de culpa da ré ao não proporcionar a linha de vida para se conectar o cinto de segurança, conforme reconhecido em sentença trabalhista. Por fim, requer a aplicação da taxa SELIC como índice de atualização sobre a condenação.
Alega que a decisão proferida em processo trabalhista proposto pelo funcionário acidentado Sr. Claudemir não poderia ser utilizada como fundamento para a presente ação, porquanto se trataria de responsabilidades de naturezas diferentes. Aduz que ofereceu os equipamentos de proteção individual adequados para o acidentado, mormente a "linha de vida", bem como houve o seu devido treinamento para o trabalho. Destaca que a plataforma de proteção não serve para "segurar" pessoas e sim serve como "apara lixo", motivo pelo qual a inexistência daquele equipamento não acarreta sua culpa pelo acidente. Faz menção aos depoimentos testemunhais, os quais foram no sentido da existência de culpa exclusiva da vítima ao não usar o cinto de segurança. Assim, requer o provimento da apelação para reconhecer a inexistência de culpa por parte da empresa ré no acidente que vitimou um de seus empregados.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A questão em debate refere-se à ação de regresso proposta pelo INSS com fundamento no artigo 120 da Lei nº 8.213/91, que preceitua:
Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Trata-se, assim, de responsabilidade civil subjetiva, na qual, além dos pressupostos (a) da ação ou omissão do agente, (b) do dano experimentado pela vítima e (c) do nexo causal entre a ação e omissão e o dano, deve ficar comprovada também (d) a culpa do agente, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil, verbis:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Logo, torna-se necessária, no caso dos autos, a verificação de conduta negligente da requerida no evento que ocasionou o acidente do empregado da empresa, para que se proceda à restituição pleiteada pelo INSS.
Atento que a ação regressiva está condicionada à prova inequívoca por parte do INSS do dano (consubstanciado no pagamento efetivo do benefício previdenciário), da culpa do empregador em relação às regras inerentes a saúde e segurança no trabalho.
A controvérsia, portanto, circunscreve-se em verificar se houve de fato negligência por parte da empresa ré quanto às normas de segurança do trabalho, a influenciar para a ocorrência do sinistro.
Inicialmente destaco que não há óbice em considerar as provas produzidas no processo trabalhista que versou sobre os mesmos fatos ora discutidos. A jurisprudência pátria é remansosa no sentido de permitir a prova emprestada, desde que submetida ao contraditório da outra parte.
No entanto, há de ser destacado que a sistemática trabalhista adota uma análise diferente da presente ação regressiva. Como dito alhures, enquanto esta requer prova suficiente a demonstrar a negligência da empresa em cumprir com as normas de proteção ao trabalhador, na seara trabalhista, ao contrário, a culpa do empregador é presumida, diante da relação de desigualdade entre as partes litigantes.
Neste diapasão, entendo que não restou provada a conduta culposa por parte da ré de modo a configurar o nexo causal entre a negligência da empresa e o resultado danoso.
Com efeito, por meio da Reclamatória Trabalhista nº 0001195-60.2012.5.04.0261, a testemunha da reclamante, Sr. Guilherme Puchulu Fernandes, evento 1, PROCJUDIC89, informou "que o reclamante, na ocasião do acidente, caiu de um andaime no qual estava realizando um acabamento em uma parede; que na ocasião estava utilizando o cinto de segurança, em função do que o reclamante o estava fixando no andaime; o reclamante se ausentou para tomar um café e quando retornou não fixou o cinto; de qualquer forma, se engatasse o cinto no andaime, cairia da mesma forma, e o andaime cairia sobre ele;"
Por outro lado, as testemunhas e informantes da empresa reclamada ouvidas no processo trabalhista, e também neste processo, noticiaram que:
JANESCA LAMPERT DA SILVA (...) sabe que o reclamante se acidentou em função de não estar usando o cinto de segurança e não estar clipado na linha de vida.
JOÃO CARLOS VIANA (...) sabe que na oportunidade o reclamante estava utilizando o cinto, desceu para pegar uma mola e quando retornou não engatou o cinto novamente; no dia o reclamante poderia ter engatado o cinto em uma linha de vida disponível.
A douta juíza trabalhista julgou procedente o pedido por entender que no caso em questão deveria ser atribuído menor peso aos depoimentos do informante João Carlos e da testemunha Janaina, haja vista esta ser empregada da reclamada e aquele ter interesse no não reconhecimento de falhas no seu trabalho, já que era responsável pela segurança dos trabalhadores.
Em que pese a fundamentação da douta juíza, para os fins de demonstração de culpa nesta ação regressiva, considerar a empresa culpada com base apenas no depoimento de uma testemunha não me parece razoável, mormente quando se há várias outras provas em sentido contrário.
Com efeito, a requerida apresentou em sua contestação: documentos que atestam a realização de simulados de segurança; Cartilha sobre Procedimentos para Segurança do Trabalho; Recibo de Entrega de EPI ao acidentado Claudemir José Corso, dentre vários itens o cinto de segurança; Certificado de Aprovação pelo MTE do cinto de segurança trava quedas; bem como registros de treinamentos para trabalhos em altura ministrados ao Sr. Claudemir.
Consta, ainda, Ata Notarial realizada um dia após o acidente, em 13/09/2012:
Declaração de Daiana Cristina de Lima Goes (Servente): "Atividade: Estava trabalhando junto com o Claudemir a colocação de massa e pediu ajuda para movimentar o andaime. Estava sem cinto de segurança mas sem o risco de queda. Claudemir estava sem cinto também. Claudemir brincou sobre a queda e foi segurado pela Daiana, a Roselaine durante esta brincadeira informava para ele colocar o cinto e ter cuidado para não cair. Trabalhou o turno da manhã todo com o cinto de segurança. O turno da tarde começou a trabalhar sem o cinto. Diariamente recebe orientação sobre o uso correto do equipamento de segurança. Senhor Edemundo cobra bastante o uso do equipamento de segurança (Evento 1, Processo Judicial 47, fl. 5)".
Declaração de Talia Carolina Marques (Servente): "Atividade: Trabalhando na loja no segundo piso no mesmo andar que o senhor Claudemir. Informou que ele estava sem proteção e pediu para que ele tivesse cuidado para não cair. Não está utilizando cinto: Após o aviso o acidentado falou "eu vou cair e vou morrer você quer vir junto comigo" em tom de brincadeira para a Daiana. Pisou em uma tabua e houve o desequilíbrio que provocou a queda. Talia informou que ele recebeu o epi e possui o cinto de segurança, No turno da manhã estava trabalhando com o cinto clipado. Durante a visita da direção da empresa estava utilizando o equipamento de segurnaça após a saída ele retirou. Ao ver o risco da queda gritou informando o senhor Claudemir para ter cuidado, instantes após ocorreu a queda. É informado que todos os dias há o comunicado sobre o correto uso do equipamento de segurança. Senhor Claudemir é uma pessoa teimosa que sempre é avisada para utilizar os equipamentos de segurança, mas não aceita o aconselhamento dos colegas (Evento 1, Processo Judicial 47, fl. 6)".
Declaração de Renan de Vargas dos Santos (Servente): "Atividade: Ajudando a puxar massa para o segundo piso. Senhor Claudemir estava rebocando e precisou ajustar um grampo houve o desequilíbrio e ocorreu a queda. O Senhor Claudemir estava com o cinto, o retirou o cinto para alterar a posição do andaime, quando retornou a atividade que estava realizando não clipou o cinto novamente. Comunicou o Claudemir que ele precisava clipar o cinto. Informa que recebe o equipamento de segurança e é comunicado diariamente sobre o uso correto dos equipamentos. Senhor Claudemir ignorou a questão de segurança por estar sem o cinto e a Daiana o segurou por receio da queda, momentos antes do acidente (Evento 1, Processo Judicial 47, fl. 7)".
A testemunha Daiana foi ouvida em juízo e ratificou as informações prestadas extrajudicialmente, no sentido de que o acidentado não observou o adequado uso do cinto de segurança, evento 189.
Ademais, consta foto realizada no dia seguinte ao acidente em que as testemunhas afirmam a existência da linha de segurança, equipamento que impediria a queda do acidentado.
Anoto que o não houve realização de perícia de acidente de trabalho por parte do Ministério do Trabalho e Emprego. O único laudo técnico apresentado no processo foi realizado a pedido da própria ré. Neste, o técnico é categórico ao afirmar que:
"- Plataforma de proteção não tem por finalidade aparar pessos (isto é feito com o uso de linha de vida) e sim aparar resíduos que porventura caiam dos pavimentos superiores.
- Registro na Ata Notarial apresentada demonstra a existência de cabos de linha de vida junto a fachada do prédio."
O INSS, por sua vez, além de não apresentar elementos aptos a comprovar a culpa da empresa pela inobservância das normas de segurança do trabalho, não desconstitui as provas produzidas pela ré.
Logo, não restando comprovada conduta negligente da empresa Ré, não há que se falar em ressarcimento dos valores suportados pelo INSS a título de auxílio-doença por acidente de trabalho como pretendido.
Sendo a autarquia a sucumbente, não há condenação em custas, tendo em vista a isenção prevista no art. 4º, I, Lei 9289/96. Todavia, referida isenção não desobriga o INSS a reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora.
Considerando o grau de zelo profissional e o tempo exigido para o seu serviço, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, além da modificação do julgado, nos termos do art. 20 do CPC, condeno a autora ao pagamento de custas processuais, devendo a parte sucumbente pagar os honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, art. 85, §2º, CPC/2015.
Diante da reforma da sentença, fica prejudicada a análise dos demais pontos apelativos apresentados pelo INSS.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e dar provimento à apelação da parte ré.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5017091-94.2014.4.04.7108/RS
ORIGEM: RS 50170919420144047108
RELATOR | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | do Adv. ALOYCIO RÜDIGER pela apelante CÓTICA ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA. |
APELANTE | : | COTICA ENGENHARIA E CONSTRUCOES LTDA |
ADVOGADO | : | JEANI RUDIGER |
: | ALOYCIO RÜDIGER | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/08/2016, na seqüência 131, disponibilizada no DE de 02/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE RÉ.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
| Documento eletrônico assinado por José Oli Ferraz Oliveira, Secretário de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8558404v1 e, se solicitado, do código CRC 4CA30F93. | |
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