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ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8. 213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA. TRF4. 5002329-61.2014...

Data da publicação: 07/07/2020, 16:47:46

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA. A constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 restou reconhecida por esta Corte, nos autos da Argüição de Inconstitucionalidade na AC nº 1998.04.01.023654-8. Portanto, se o benefício é custeado pelo INSS, este é titular de ação regressiva contra o responsável negligente, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, sem que tal previsão normativa ofenda a Constituição Federal. O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas àquela destinada ao seguro de acidente de trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. O artigo 120 da Lei nº 8.213/91 é claro ao vincular o direito de regresso da autarquia previdenciária à comprovação da negligência por parte do empregador quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, indicadas para a proteção individual e coletiva. O conjunto probatório carreado aos autos demonstra fartamente a ocorrência do acidente de trabalho, bem como demonstra a ocorrência de nexo causal entre a conduta lesiva da apelante e o acidente de trabalho que vitimou o segurado, cabendo ressaltar a inexistência de documentos comprovando o treinamento do falecido na função, a falta de orientação expressa (ordem de serviço, PPRA, material de treinamento etc.) na cautela de reabrir o dreno por onde já tinha sido escoado o caldo. Impende salientar que tais irregularidade forma inclusive objeto de implementação de melhorias no ambiente de trabalho pela CIPA da empresa (Comissão Interna em Prevenção de Acidentes), algumas delas inclusive apontadas pelos fiscais do trabalho e alvo de autos de infração (evento 1, PROCADM6, p. 13-14). Logo, cabe ser confirmada a sentença monocrática. (TRF4, AC 5002329-61.2014.4.04.7015, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 05/04/2018)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002329-61.2014.4.04.7015/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELADO: RENUKA VALE DO IVAI S/A (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação processada sob o rito ordinário objetivando o INSS o ressarcimento dos valores despendidos com a manutenção do benefício previdenciário de pensão por morte por acidente do trabalho (NB 160.547.595-2, deferido aos dependentes do Sr. Elcio Escolástica de Oliveira), concedido em virtude de óbito em acidente ocorrido por negligência da ré relativamente ao cumprimento das normas de segurança do trabalho, com fundamento no art. 120 da Lei nº 8.213/1991. Aduz que o segurado sofreu no dia 12/04/2013 acidente do trabalho que culminou na sua morte. Segundo relatório de fiscalização do Ministério do Trabalho, o falecido trabalhava no setor de evaporadores na fábrica de açúcar em São Pedro do Ivaí/PR, tendo concorrido para o acidente, dentre outras causas, o defeito na válvula gaveta ascendente, que fez com que o caldo quente atingisse-o, causando-lhe queimaduras.

Sobreveio sentença cujo dispositivo dispôs:

Ante o exposto, com fulcro no art. 269, I, do Código de Processo Civil, julgo procedentes os pedidos formulados na petição inicial, para o fm de, nos termos do art. 120 da Lei nº 8.213/1991:

a) condenar a ré RENUKA VALE DO IVAI S/A a ressarcir o INSS dos valores decorrentes da concessão do benefício previdenciário de pensão por morte por acidente do trabalho (NB 21/160.547.595-2 deferido aos dependentes do Sr. Elcio Escolástica de Oliveira em 18/04/2013), acrescidos de correção monetária (IPCA-E / IBGE) e juros de mora de 1% ao mês, ambos incidentes a contar de cada parcela paga dos benefícios previdenciários.

b) condenar a ré RENUKA VALE DO IVAI S/A a ressarcir o INSS no tocante às parcelas vincendas dos NB 21/160.547.595-2, com fundamento na regra do art. 290 do Código de Processo Civil, devendo a ré promover o depósito das parcelas sempre até o dia 20 de cada mês em conta a ser indicada pelo INSS, passando a incidir correção monetária e juros de 1% ao mês em caso de depósito a destempo.

Por sucumbente, a teor do art. 20, caput, e §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil, condeno a ré ao pagamento dos honorários advocatícios em favor da parte contrária, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, e das custas processuais.

Em suas razões de apelação, a empresa apelante requereu o sobrestamento do feito até trânsito em julgado da Ação Trabalhista, o reconhecimento da sentença ser extra petita, a ocorrência de cerceamento de defesa e violação direta ao art. 5º, LV da Constituição Federal, eis que não balizado escorreitamente os elementos probatórios constante dos autos. No mais, aduziu a existência de culpa exclusiva do obreiro ou concorrente no fatídico acontecimento ou, senão, a ausência de culpa da empregadora.

Com as contrarrazões, vieram os autos.

É o relatório.

VOTO

Quanto à preliminar de suspensão do processo, rejeito essa preliminar porque não é caso de suspensão do processo até julgamento definitivo da reclamatória trabalhista. É que nesta ação de regresso e na reclamatória trabalhista são discutidas questões distintas, não havendo prejudicialidade de uma em relação à outra. Aliás, sequer o INSS é parte na reclamatória trabalhista, não havendo, portanto, como pretender que a sentença proferida na reclamatória trabalhista eventualmente prejudicasse a ação de regresso. São juízos distintos, com cargas probatórias distintas.

A alegação de sentença extra petita pelo fato do MM. Juiz a quo decidir pela condenação com fundamento diverso do posto na exordial se mostra totalmente descabida, seja porque o juiz não está adstrito aos fundamentos do pedido da petição inicial para prolatar a sua decisão, seja porque a compreensão da petição inicial não exige maior esforço cognitivo, o que, inclusive, permitiu à apelante exercer plenamente o contraditório em contestação e manifestações no decorrer do processo.

Em relação à escorreita apreciação de provas, esquece-se a apelante do princípio do livre convencimento motivado a que se atém o juiz, o que leva a sua liberdade de apreciação das provas, portanto não há que se falar em cerceamento de defesa.

Resta verificar os parâmetros em que uma conduta do empregador pode ser considerada negligente a ensejar o ressarcimento do INSS.

Para caracterização da responsabilidade do empregador em face do INSS são necessários os seguintes elementos: a) culpa, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho; b) dano; c) nexo causal entre a conduta culposa e o dano.

Feitas tais considerações, passo à análise do caso concreto, cabendo transcrever excerto da sentença monocrática que bem analisou a responsabilidade da empresa apelante:

No caso em julgamento, afirma o INSS que o segurado Elcio Escolástica de Oliveira sofreu lesões que o levaram a óbito em acidente ocorrido em virtude de negligência da ré relativamente ao cumprimento das normas de segurança do trabalho.

O Sr. Elcio exercia o cargo de auxiliar operador de evaporação no setor evaporador da fábrica de açúcar do estabelecimento empresarial da ré há mais de quatro anos (evento 7, OUT13).

Da leitura do relatório de fiscalização (evento 1, PROCAMD2-6) elaborado por fiscais do trabalho que apuraram as causas do acidente sofrido por Elcio na data de 12/04/2013, às 4h:00min, o qual veio a óbito em 18/04/2013, extrai-se que o falecido foi alvo de grave queimadura por caldo de cana-de-açúcar quente, quando do procedimento de preparação para limpeza por hidrojateamento da máquina evaporadora, cuja função industrial é retirar a água do caldo da cana-de-açúcar.

Os auditores fiscais explicaram que tal procedimento preparatório, efetuado no dia anterior à limpeza por Elcio, consiste em fechar a válvula de vapor; fechar outra válvula pela qual entra o caldo de cana quente vindo do pré-evaporador; abrir a válvula do dreno para retirar o caldo de cana quente restante; e, por fim, encher de água fria e escoá-la em seguida por outro dreno; tudo para o necessário resfriamento do equipamento e limpeza com segurança no dia seguinte.

Considerando que a limpeza por hidrojateamento injeta muita água no evaporador, necessário uma última providência pelo empregado, qual seja, a abertura de uma porta para melhor escoamento da água. Justamente nesta derradeira etapa do procedimento de preparação para limpeza da evaporadora, ao abrir esta porta, chamada de "porta de visita do fundo", por ela mesma saiu surpreendentemente caldo quente de cana a 115 ºC.

Afirmaram os ficais do trabalho que o caldo quente somente entrou no evaporador principal, mesmo tendo Elcio fechado a válvula que o trazia do pré-evaporador, em razão de defeito apresentado na válvula de segurança, denominada de "válvula gaveta ascendente". Foi realizada perícia técnica nesta válvula, a pedido da ré, tendo sido contatado que realmente ela era defeituosa, pois, em suma, o material empregado na sua fabricação não era do padrão recomendado, e havia um trinca no dispositivo gerada pelo manuseio regular.

Seguem os auditores fiscais, no que toca ainda às causas acidente, analisando se o empregado teria cometido algum erro ou equívoco no procedimento em comento, à luz do alegado pela empregadora ré no processo administrativo.

Em sua defesa, a ré, da mesma forma em que alega na contestação, afirmou que se o falecido Elcio, antes de abrir a "porta de visita do fundo" tivesse tido a cautela de subir até o terceiro andar e aberto as bocas do evaporador, poderia perceber que ainda saia vapor do equipamento, concluindo assim por algum tipo de vazamento.

Os auditores fiscais de plano rechaçaram o argumento, justificando que essa etapa do procedimento não era praxe entre os empregados do setor, tanto que uma da citadas portas do terceiro andar exigiu uma chave para abertura forçada.

Além disto, deveria haver no primeiro andar, enquanto dispositivo de segurança, um termômetro na porta do evaporador interligado com um dispositivo de intertravamento, viabilizando a detecção imediata de eventual vazamento do caldo.

Ainda, defendeu a ré que se o empregado acidentado tivesse tido a cautela de reabrir o dreno por onde já tinha sido escoado o caldo, eventual vazamento iria ser descoberto e dissipado-se nesta nova etapa. Todavia, argumentaram os fiscais do trabalho que tal etapa não consta de quaisquer documentos da ré (ordem de serviço, PPRA, material de treinamento etc.), não sendo assim de observância obrigatória pelo empregado.

Por conta disso, foi lavrado auto de infração em desfavor da ré por deixar de elaborar um manual com procedimentos de trabalho e concretizá-lo ofertando treinamento efetivo aos empregados.

De fato, lendo os documentos trazidos pela ré "Instrução de Trabalho", "Parada de 1º Efeito de Evaporação" e "Parada de 2º Efeito de Evaporação", datados do ano de 2008 (evento 7, OUT54-57), não se observa em nenhum momento a alegada necessidade de reabertura do dreno por onde escoara o caldo remanescente. Eles traçam, ao revés, um roteiro bem sucinto e insuficiente das etapas preparatórias para limpeza do evaporador. Tampouco o recente roteiro de "Procedimento de Parada dos Evaporadores para Limpeza", datado de 25/08/2014, é didático e elucidativo, não deixando, ao final, de forma clara e objetiva, se o referido dreno por onde saiu o caldo deverá ser reaberto pelo empregado (evento 7, OUT69).

Ademais, o falecido Elcio trabalhava no setor evaporação há bastante tempo, tendo feito o procedimento preparatório para limpeza várias vezes, não havendo registro de acidentes nesta natureza com ele, de sorte que, por consectário lógico, o procedimento por ele até então seguido estava correto, não obstante os potenciais riscos de acidentes por falta de instalação de mecanismos de segurança pela empregadora ré.

Ante esse contexto em que ocorreu o acidente do trabalho, imprescindível a análise da Norma Regulamentadora n.º 12 (NR-12), que trata da segurança no trabalho em máquinas e equipamentos, aprovada pela Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego nº 3.214/1978.

Nesse passo, exige a NR-12 em seus itens 12.130, 12.136 e 12.138, que os empregadores realizem procedimentos de trabalho e segurança, incluindo o treinamento dos empregados para exercerem suas funções com segurança, sob a supervisão de profissional legalmente habilitado, o que, no caso em apreço inexistiu, nos seguintes termos:

12.130. Devem ser elaborados procedimentos de trabalho e segurança específicos, padronizados, com descrição detalhada de cada tarefa, passo a passo, a partir da análise de risco.

12.136. Os trabalhadores envolvidos na operação, manutenção, inspeção e demais intervenções em máquinas e equipamentos devem receber capacitação providenciada pelo empregador e compatível com suas funções, que aborde os riscos a que estão expostos e as medidas de proteção existentes e necessárias, nos termos desta Norma, para a prevenção de acidentes e doenças.

12.138. A capacitação deve:

a) ocorrer antes que o trabalhador assuma a sua função;

b) ser realizada pelo empregador, sem ônus para o trabalhador;

c) ter carga horária mínima que garanta aos trabalhadores executarem suas atividades com segurança, sendo distribuída em no máximo oito horas diárias e realizada durante o horário normal de trabalho;

d) ter conteúdo programático conforme o estabelecido no Anexo II desta Norma; e

e) ser ministrada por trabalhadores ou profissionais qualificados para este fim, com supervisão de profissional legalmente habilitado que se responsabilizará pela adequação do conteúdo, forma, carga horária, qualificação dos instrutores e avaliação dos capacitados.

O aprendizado informal com outros colegas acerca do funcionamento dos equipamentos em absoluto supre a exigência das normas de segurança do trabalho veiculadas na NR-12, em especial aquela que exige trabalhador/profissional qualificados com supervisão de profissional habilitado, que seria um técnico em segurança do trabalho.

Logo, considerando a inexistência de documentos comprovando o treinamento do falecido Elcio, conclui-se ter a ré Renuka cometido um ilícito no âmbito das normas de segurança do trabalho, o que evidencia sua conduta negligente e certamente contributiva ao acontecimento do acidente.

No decorrer da mesma fiscalização, os auditores fiscais lavraram outro auto de infração por ter a ré infringido outros dispositivos da NR-12, em especial aqueles que tratam sobre instalação de dispositivos de segurança em zonas de perigo da máquina evaporadora, ou seja, aqueles locais em que exposto o trabalhador a riscos de lesão a sua incolumidade física.

Inicialmente, a ré descumpriu o item 12.153 da NR-12 por não possuir "inventário atualizado das máquinas e equipamentos com identificação por tipo, capacidade, sistemas de segurança e localização em planta baixa, elaborado por profissional qualificado ou legalmente habilitado". Os dispositivos de segurança serem implementados pela ré evitariam que na eventualidade de falhas nas válvulas, as zonas de perigo ficariam inacessíveis aos operadores dos equipamentos (evaporadoras).

Por oportuno, informação não determinante mas relevante ao deslinde da lide consiste nos demais acidentes do trabalho ocorridos no mesmo setor evaporadora, todos relacionados ao mal funcionamento dos dispositivos de segurança do setor (vide evento 1, PROCADM6, p. 1).

É incontroverso nos autos, pois, que o equipamento em questão não continha dispositivo de segurança hábil a paralisar o seu funcionamento em caso de eventuais falhas e impedir que o empregado tivesse acesso à zona de perigo (tubo pelo qual passava o caldo quente vindo do pré-evaporador), tudo nos termos expressos da NR-12 , e de observação obrigatória pelos empregadores:

(...)

12.39. Os sistemas de segurança devem ser selecionados e instalados de modo a atender aos seguintes requisitos:

a) ter categoria de segurança conforme prévia análise de riscos prevista nas normas técnicas oficiais vigentes;

b) estar sob a responsabilidade técnica de profissional legalmente habilitado;

c) possuir conformidade técnica com o sistema de comando a que são integrados;

d) instalação de modo que não possam ser neutralizados ou burlados;

e) manterem-se sob vigilância automática, ou seja, monitoramento, de acordo com a categoria de segurança requerida, exceto para dispositivos de segurança exclusivamente mecânicos; e

f) paralisação dos movimentos perigosos e demais riscos quando ocorrerem falhas ou situações anormais de trabalho.

(...)

12.42. Para fins de aplicação desta Norma, consideram-se dispositivos de segurança os componentes que, por si só ou interligados ou associados a proteções, reduzam os riscos de acidentes e de outros agravos à saúde, sendo classificados em:

(...)

b) dispositivos de intertravamento: chaves de segurança eletromecânicas, com ação e ruptura positiva, magnéticas e eletrônicas codificadas, optoeletrônicas, sensores indutivos de segurança e outros dispositivos de segurança que possuem a finalidade de impedir o funcionamento de elementos da máquina sob condições específicas;

(...)

12.44. A proteção deve ser móvel quando o acesso a uma zona de perigo for requerido uma ou mais vezes por turno de trabalho, observando-se que:

a) a proteção deve ser associada a um dispositivo de intertravamento quando sua abertura não possibilitar o acesso à zona de perigo antes da eliminação do risco; e

b) a proteção deve ser associada a um dispositivo de intertravamento com bloqueio quando sua abertura possibilitar o acesso à zona de perigo antes da eliminação do risco.

12.45. As máquinas e equipamentos dotados de proteções móveis associadas a dispositivos de intertravamento devem:

a) operar somente quando as proteções estiverem fechadas;

b) paralisar suas funções perigosas quando as proteções forem abertas durante a operação; e

c) garantir que o fechamento das proteções por si só não possa dar inicio às funções perigosas

12.54. As proteções, dispositivos e sistemas de segurança devem integrar as máquinas e equipamentos, e não podem ser considerados itens opcionais para qualquer fim.

Nesse passo, é de somenos importância a averiguação de eventuais defeitos em si na "válvula gaveta ascendente" e a eventual culpa da ré na sua correta aquisição, instalação e manutenção, na medida em que, conforme acima fundamentado, ela cometeu uma série de ilícitos nas órbitas civil e trabalhista, os quais evidenciam sua conduta negligente no que tange às normas de segurança do trabalho.

As irregularidades cometidas foram inclusive objeto de deliberação da CIPA - "Comissão Interna em Prevenção de Acidentes", a qual reunida no dia 12/04/2013 para discussão do acidente com o Sr. Elciol, decidiu que deveriam ser implementadas as seguintes melhorias no ambiente de trabalho, muita delas já apontadas pelos fiscais do trabalho e alvo de autos de infração (evento 1, PROCADM6, p. 13-14):

i) utilizar termômetro quando da abertura da porta de visita;

ii) instalação de dreno no fundo de cada caixa de evaporação direcionado na calha de escoamento;

iii) melhorias de acesso à porta de visita;

iv) criar procedimentos por escrito e elaborar treinamentos em relação aos procedimentos de limpeza dos evaporadores discutidos nesta ata.

Do exposto, hígidos o relatório de fiscalização elaborado por fiscais do trabalho e os autos de infração deles decorrentes (evento 1, PROCAMD2-14), os quais, em análise com os demais dados probatórios constantes dos autos, são hábeis, de forma cristalina e concreta, a atribuírem à ré a total responsabilidade pelo acidente de trabalho com o falecido Elcio.

Registre-se que, regra geral, os atos administrativos são dotados de presunção iuris tantum de legitimidade e veracidade, cabendo ao destinatário do ato o encargo de provar que o agente administrativo agiu de forma ilegítima. Nesse sentido leciona o professor José dos Santos Carvalho Filho (in Manual de Direito Administrativo, 23ª ed.: 2010; Livraria e Editora Lumen Juris Ltda.):

(...)

Os atos administrativos, quando editados, trazem em si a presunção de legitimidade, ou seja, a presunção de que nasceram em conformidade com as devidas normas legais, como bem anota DIEZ.[343] Essa característica não depende de lei expressa, mas deflui da própria natureza do ato administrativo, como ato emanado de agente integrante da estrutura do Estado.

Vários são os fundamentos dados a essa característica. O fundamento precípuo, no entanto, reside na circunstância de que se cuida de atos emanados de agentes detentores de parcela do Poder Público, imbuídos, como é natural, do objetivo de alcançar o interesse público que lhes compete proteger. Desse modo, inconcebível seria admitir que não tivessem a aura de legitimidade, permitindo-se que a todo momento sofressem algum entrave oposto por pessoas de interesses contrários. Por esse motivo é que se há de supor que presumivelmente estão em conformidade com a lei.

É certo que não se trata de presunção absoluta e intocável. A hipótese é de presunção iuris tantum (ou relativa), sabido que pode ceder à prova em contrário, no sentido de que o ato não se conformou às regras que lhe traçavam as linhas, como se supunha.[344]

(...)

Nessa linha, a argumentação da ré, tampouco as provas documentais por ela produzidas foram suficientes a ilidir a presunção de legitimidade dos autos de infração lavrados pelos agentes públicos (fiscais do trabalho), em especial aqueles afetos à ausência de treinamentos dos funcionários do setor evaporador e de instalação de mecanismos de segurança, dos mais elementares, no equipamento que permitissem detectar eventuais falhas numa das válvulas de segurança.

Somando-se a isso, em se tratando de responsabilidade civil por acidente do trabalho, há uma presunção de culpa do empregador quanto aos riscos à segurança do trabalhador, considerando à imprescindível observância cogente da respectivas normas de segurança do ambiente de trabalho. É ônus, pois, da empregadora provar que agiu com a diligência e precaução necessárias a evitar ou diminuir a probabilidade de acidente no ambiente trabalhado, ou seja, cabe-lhe demonstrar que sua conduta pautou-se de acordo com as diretrizes de segurança do trabalho, reduzindo riscos da atividade e zelando pela integridade dos seus contratados.

Neste sentido, veja jurisprudência do TRF da 4ª Região que vem se consolidando acerca da questão representada pela seguinte decisão colegiada:

CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. ACIDENTE DE TRABALHO. AUXÍLIO-DOENÇA. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. AGRAVO RETIDO. PERÍCIA MÉDICA. PROVA ESSENCIAL. CULPA EXCLUSIVA. SEGURO ACIDENTE DO TRABALHO - SAT. COMPENSAÇÃO.

(...)

Demonstrada a negligência da empresa empregadora quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito à ação regressiva prevista no art. 120 da Lei nº 8.213/91. Em se tratando de responsabilidade civil por acidente do trabalho, há uma presunção de culpa do empregador quanto à segurança do trabalhador, sendo da empregadora o ônus de provar que agiu com a diligência e precaução necessárias a evitar ou diminuir as lesões oriundas do trabalho repetitivo, ou seja: cabe-lhe demonstrar que sua conduta pautou-se de acordo com as diretrizes de segurança do trabalho, reduzindo riscos da atividade e zelando pela integridade dos seus contratados.. É dever de a empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas consequências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada..

(...)

(TRF4, AC 5001473-17.2011.404.7205, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, juntado aos autos em 25/08/2015)

Por consequência lógica da fundamentação acima, não há falar em concorrência de culpas (art. 945 do Código Civil), tampouco de culpa exclusiva da vítima (Elcio).

Isso porque ele se colocou em risco cumprindo ordens de seus superiores e também porque não foi devidamente orientado e treinado para desempenho de suas atribuições. Além disto, restou suficientemente comprovado que a ré Renuka não adotava as medidas de segurança necessárias a evitar que acidentes, tal qual o ocorrido com o falecido empregado, viessem a eclodir. Veja que, por exemplo, bastava um termômetro no piso inferior, onde se situa a "porta de visita do fundo", para que então o empregado notasse eventual anormalidade com o equipamento, decorrente de falhas nas válvulas, já que, neste momento, já tinha vencido todas as etapas do ritual preparatório e de segurança para limpeza.

Assim, possível, sem dúvidas, imputar a responsabilidade pelo acidente de trabalho com o Sr. Elcio Escolástica de Oliveira unicamente à ré Renuka, razão pela qual é obrigada, nos termos do art. 120 da Lei nº 8.213/1991 a indenizar regressivamente o INSS pelo dispêndio com a manutenção do benefício previdenciário.

O conjunto probatório carreado aos autos demonstra fartamente a ocorrência do acidente de trabalho, bem como demonstra a ocorrência de nexo causal entre a conduta lesiva da apelante e o acidente de trabalho que vitimou o segurado, cabendo ressaltar a inexistência de documentos comprovando o treinamento do falecido na função, a falta de orientação expressa (ordem de serviço, PPRA, material de treinamento etc.) na cautela de reabrir o dreno por onde já tinha sido escoado o caldo.

Impende salientar que tais irregularidade forma inclusive objeto de implementação de melhorias no ambiente de trabalho pela CIPA da empresa (Comissão Interna em Prevenção de Acidentes), algumas delas inclusive apontadas pelos fiscais do trabalho e alvo de autos de infração (evento 1, PROCADM6, p. 13-14). Logo, cabe ser confirmada a sentença monocrática.

Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000397855v10 e do código CRC f7f087ee.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002329-61.2014.4.04.7015/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELADO: RENUKA VALE DO IVAI S/A (RÉU)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA.

A constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 restou reconhecida por esta Corte, nos autos da Argüição de Inconstitucionalidade na AC nº 1998.04.01.023654-8. Portanto, se o benefício é custeado pelo INSS, este é titular de ação regressiva contra o responsável negligente, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, sem que tal previsão normativa ofenda a Constituição Federal.

O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas àquela destinada ao seguro de acidente de trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.

O artigo 120 da Lei nº 8.213/91 é claro ao vincular o direito de regresso da autarquia previdenciária à comprovação da negligência por parte do empregador quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, indicadas para a proteção individual e coletiva.

O conjunto probatório carreado aos autos demonstra fartamente a ocorrência do acidente de trabalho, bem como demonstra a ocorrência de nexo causal entre a conduta lesiva da apelante e o acidente de trabalho que vitimou o segurado, cabendo ressaltar a inexistência de documentos comprovando o treinamento do falecido na função, a falta de orientação expressa (ordem de serviço, PPRA, material de treinamento etc.) na cautela de reabrir o dreno por onde já tinha sido escoado o caldo.

Impende salientar que tais irregularidade forma inclusive objeto de implementação de melhorias no ambiente de trabalho pela CIPA da empresa (Comissão Interna em Prevenção de Acidentes), algumas delas inclusive apontadas pelos fiscais do trabalho e alvo de autos de infração (evento 1, PROCADM6, p. 13-14). Logo, cabe ser confirmada a sentença monocrática.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de abril de 2018.



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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/04/2018

Apelação Cível Nº 5002329-61.2014.4.04.7015/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PROCURADOR(A): MARCELO VEIGA BECKHAUSEN

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)

APELADO: RENUKA VALE DO IVAI S/A (RÉU)

ADVOGADO: ROSÂNGELA CRISTINA BARBOZA SLEDER

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/04/2018, na seqüência 511, disponibilizada no DE de 19/03/2018.

Certifico que a 4ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª Turma , por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

LUIZ FELIPE OLIVEIRA DOS SANTOS

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 13:47:46.

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