APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005688-05.2012.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | CROMOFIX CROMO DURO LTDA. |
ADVOGADO | : | Luiz Carlos Branco da Silva |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA. PRESCRIÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI 8.213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. NEGLIGÊNCIA. VALORES PAGOS A TÍTULO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO.
Nas ações onde o INSS visa recompor os cofres públicos dos valores que possuem natureza jurídica de recursos públicos a prescrição aplicada não é a prevista no Código Civil, trienal, mas, sim, a quinquenal, prevista no Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932.
A Corte Especial deste Tribunal, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade, declarou constitucional a redação do art. 120 da Lei nº 8.213/91 em face das disposições do art. 7º, XXVIII, art. 154, I, e art. 195, §4º, todos da Constituição Federal.
O fato de a empresa contribuir para a Previdência Social, mediante o pagamento das contribuições sociais de caráter tributário, que custeará as verbas previdenciárias decorrentes de acidente do trabalho, não a isenta de responsabilidade civil pela prática de ato ilícito.
De acordo com o artigo 120 da Lei n.º 8.213/91, a responsabilidade do empregador pressupõe a existência de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para proteção individual ou coletiva (responsabilidade subjetiva).
Considerando que a empregadora ré não se desincumbiu do ônus de provar que não agiu com culpa ao valer-se das cautelas para evitar acidentes - fornecendo treinamento, material seguro e equipamentos de segurança à empregada -, tem-se como corretas as conclusões do relatório, no sentido de que houve negligência. E, uma vez comprovado o nexo causal entre a conduta negligente da ré e o dano causado pelo acidente de trabalho ao segurado, procede o pleito regressivo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de novembro de 2015.
Salise Monteiro Sanchotene
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Salise Monteiro Sanchotene, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7854928v5 e, se solicitado, do código CRC CDE421F5. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005688-05.2012.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | CROMOFIX CROMO DURO LTDA. |
ADVOGADO | : | Luiz Carlos Branco da Silva |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS propôs ação regressiva, com fundamento no artigo 120 da Lei nº 8.213/91, contra CROMIX CROMO, objetivando a restituição de valores relativos a benefícios de auxílio-doença acidentário concedidos ao segurado Anderson Angra de Senne.
Instruído o feito, sobreveio sentença de parcial procedência do pedido, cujo dispositivo foi assim redigido:
Julgo procedente o pedido para condenar a requerida a ressarcir ao INSS os valores pagos em razão da concessão dos benefícios de auxílio-doença nºs 91/520.505.204-6, no período de 28/04/2007 a 15/11/2007, e 91/524.649.664-0, pago de 15/02/2008 a 02/04/2009, nos termos da fundamentação.
O montante devido deverá ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora de 6% ao ano, desde a citação.
Condeno a requerida no pagamento dos ônus da sucumbência, quais sejam, as custas processuais e os honorários advocatícios devidos à parte adversa, que fixo em 10% do valor da condenação.
A parte autora alega em seu recurso: a) a ocorrência da prescrição trienal; b) a inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91; c) Inexistência de culpa da empresa no acidente que sofreu seu empregado; d) Inexistência de prova.
Com contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
PREJUDICIAL DE MÉRITO
Prescrição
Cumpre ressaltar, por oportuno, que, por ser a prescrição matéria de ordem pública, pode ser arguida em qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição. Ademais, a parte apelada pode, em suas contrarrazões, manifestar-se a respeito, restando mantido o devido processo legal.
A pretensão da autarquia previdenciária tem por escopo restituir aos cofres públicos prestações relativas a benefícios previdenciários concedidos a vítimas de acidente do trabalho decorrente, supostamente, de culpa do empregador. Ou seja, busca o INSS recompor os cofres públicos dos valores que possuem natureza jurídica de recursos públicos, razão pela qual a prescrição aplicada não é a prevista no Código Civil, trienal, mas, sim, a quinquenal, prevista no Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932.
Nesse sentido, colaciono precedente da Segunda Seção desta Corte:
AÇÃO DE REGRESSO. INSS. PRAZO PRESCRICIONAL. RECURSOS PÚBLICOS.Os fundos da previdência social, desfalcados por acidente havido hipoteticamente por culpa do empregador, são compostos por recursos de diversas fontes, tendo todas elas natureza tributária. Se sua natureza é de recursos públicos, as normas regentes da matéria devem ser as de direito público, porque o INSS busca recompor-se de perdas decorrentes de fato alheio decorrente de culpa de outrem.Quando o INSS pretende ressarcir-se dos valores pagos a título de pensão por morte, a prescrição aplicada não é a prevista no Código Civil, trienal, mas, sim, a qüinqüenal, prevista no Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932.(TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5000510-12.2011.404.7107, 2ª Seção, Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 19/06/2012)
Esse também é o posicionamento adotado pela 3ª e 4ª Turmas deste Regional, acrescentando que o termo inicial da contagem do prazo é a data de início do benefício:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA DE INDENIZAÇÃO. RESSARCIMENTO DE VALORES PAGOS PELO INSS A TÍTULO DE AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TERMO INICIAL. OCORRÊNCIA. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS.
1. Tratando-se de pedido de ressarcimento de valores pagos pelo INSS a título de auxílio-doença acidentário, quanto à prescrição, é aplicável ao caso, pelo princípio da simetria, o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32 (prescrição quinquenal). Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
2. Considerando o prazo quinquenal, restou operada a prescrição, porquanto a jurisprudência deste Tribunal Regional Federal é no sentido de que a contagem do prazo prescricional para o Instituto Nacional do Seguro Social propor ação regressiva tem início com a concessão do benefício.
3. Na hipótese vertente, considerando o disposto nos artigos 20, §4º, do Código de Processo Civil, o tempo de tramitação do feito, o trabalho desenvolvido pelo advogado, a natureza e complexidade da causa, bem como seu valor (R$ 350.738,86), a verba honorária fixada em R$ 500,00 é irrisória, devendo ser majorada para o percentual de 2%, consoante os precedentes da Turma em casos análogos. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5002933-66.2011.404.7002, 3a. Turma, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 28/06/2013)
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS. ACIDENTE DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. OCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. É quinquenal o prazo prescricional da ação regressiva proposta pelo INSS postulando o ressarcimento dos valores pagos ao segurado em razão de acidente de trabalho, conforme previsto no Decreto nº 20.910/32. A prescrição atinge o fundo do direito de ação, ou seja, o próprio direito de regresso postulado pelo INSS. O valor a ser fixado a título de honorários advocatícios deve resultar em remuneração condigna com a atuação do profissional do advogado, na forma art. 20, § 4º, do CPC. (TRF4, Apelação Cível Nº 5000541-20.2011.404.7111, 4a. Turma, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 02/05/2013)
No caso dos autos, sendo o marco inicial da contagem do prazo prescricional a data do pagamento do benefício ao segurado, o que aconteceu em 28/04/2007, e tendo sido a ação ajuizada em 27/04/2012, não está, portanto, prescrita a ação.
Inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91.
Insta referir que a Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade, declarou constitucional o art. 120 da Lei n.º 8.213/91, em face das disposições do art. 7º, XXVIII, art. 154, I, e art. 195, § 4º, todos da Constituição Federal, consoante ementa que segue:
CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF. Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos. Interpretação conforme a Constituição. Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato. Argüição rejeitada, por maioria.'
(TRF 4ª Região, Corte Especial, INAC 1998.04.01.023654-8, Rel. p/ Acórdão Manoel Lauro Volkmer de Castilho, DJU 13/11/2002)
Transcrevo trecho do voto proferido pelo eminente Relator:
Salvo engano, não há incompatibilidade entre o art. 7º, inciso 28, da Constituição, e o art. 120 da Lei 8.213/91. Assim porque estou lendo o inc. 28 de modo diverso ao que faz a eminente Relatora. Penso que, quando a Constituição garante aos trabalhadores esse direito de seguro contra acidente de trabalho a cargo do empregador, é o custeio que ele faz perante a Previdência. Diz a Constituição em seguida: ... 'sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa'. A Constituição não diz que essa indenização é ao empregado. A Constituição diz que o empregador fica responsável por uma indenização se ele der causa ao acidente por culpa ou dolo. O direito dos trabalhadores urbanos e rurais é o seguro contra acidente de trabalho; foi isso que se garantiu na Constituição. Se essa leitura é compatível do jeito que estou a propor, não há divergência entre o art. 120 da Lei nº 8.213 e este inciso, porque, quando o art. 120 diz que a Previdência vai propor ação de regresso, é justamente para se ressarcir daquilo que pagou por responsabilidade objetiva ao empregado, tendo o empregador tido culpa ou dolo. (...)
De modo que, se isso é verdadeiro, o ressarcimento ou a indenização, conforme o termo da Constituição, se é devido, o é à Previdência Social, que atendeu o direito, garantido pela Constituição, ao empregado. Não estou vendo a incompatibilidade que se quer extrair, e mais, a inconstitucionalidade que se quer ler no dispositivo mencionado. De qualquer modo, se a regra tivesse a leitura afirmada pela Relatora, também não seria incompatível com a Constituição, pois que, tendo títulos diversos, tanto o empregador tem de contribuir, quanto, sendo culpado, haverá de indenizar quem pagou o seguro, isto é, o INSS e a quem causar dano, e nessa perspectiva, não acontece inconstitucionalidade.
MÉRITO
Da responsabilidade civil de natureza extracontratual do artigo 120 da Lei nº8.213 de 1991
No que tange à ação regressiva, para que seja caracterizada a responsabilidade da empresa, nos termos da responsabilidade civil extracontratual, imperioso que se verifique a conduta, omissiva ou comissiva, o dano, o nexo de causalidade entre esses e a culpa lato sensu da empresa.
O artigo 120 da Lei nº 8.213/91 é específico em vincular o direito de regresso da autarquia previdenciária à comprovação da negligência por parte do empregador, na observância e fiscalização quanto ao cumprimento das normas padrão de segurança e higiene do trabalho, indicados para a proteção individual e coletiva.
Trata-se, portanto, de responsabilidade civil subjetiva, na qual, além dos pressupostos da ação ou omissão do agente, do dano experimentado pela vítima e do nexo causal entre a ação e omissão e o dano, deve ficar comprovada também a culpa do agente, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil, verbis:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
No caso dos autos, assim como a sentença, também verifico a ocorrência de culpa por parte da empresa, haja vista estar plenamente demonstrado o nexo causal entre a sua conduta omissiva na fiscalização e exigência do cumprimento das normas de segurança do trabalho e a doença laboral suportada pelo segurado, então empregado da ré.
Acerca da prova da culpa por parte da empresa, valer-me-ei do percuciente exame efetuado pela sentença (evento 50):
No caso dos autos, o acidente sofrido por Anderson Angra de Senne e as despesas suportadas pela Previdência Social em razão do pagamento dos benefícios de auxílio-doença nºs 91/520.505.204-6 e 91/524.649.664-0 são fatos incontroversos.
Da mesma forma, não se discute as circunstâncias em que se deu o sinistro: perfuração do olho esquerdo enquanto manipulava um arame que serviria na montagem de uma peça.
Assim, o cerne da questão reside em saber, diante das circunstâncias em que se deu o acidente, se a empresa, de alguma forma, concorreu para o infortúnio. Por outras palavras, o ponto nodal da questão está centrado em verificar se houve negligência do empregador quanto às normas padrão de segurança do trabalho e, em caso positivo, se tal negligência concorreu para o evento danoso.
Segundo o INSS, a empresa não contava com uma política de segurança adequada para evitar acidentes no desempenho daquela atividade, o que conclui também a partir das observações declinadas no julgado da Reclamatória Trabalhista nº 0136500-77.2009.5.04.0404, que tramitou perante a 4ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul (anexo PROCADM7, evento 01), cuja sentença restou mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (PROCADM9, evento 01).
Com efeito, as provas carreadas aos autos demonstram que a ré foi negligente no que respeita à observância das normas de segurança do trabalho, discussão que inclusive já foi objeto de análise nos autos do processo trabalhista aludido, de cuja sentença se extrai o seguinte trecho (anexo PROCADM7, página 10):
(...)
Importante ressaltar que restou incontroverso nos autos a ocorrência do acidente de trabalho, bem como o dano físico sofrido pelo autor, conforme relatado pelo perito nomeado pelo Juízo. Também, restou incontroversa a existência de nexo causal entre o acidente e a seqüela ortopédica.
Assim sendo, a reclamada não observou normas básicas de segurança de trabalho, insculpidas na NR-1, inserta na Portaria 3214/78, respondendo com negligência, e por decorrência, culpa, no infortúnio em análise. Destaque-se que o reclamante contava com apenas 20 anos à época do acidente, sendo indispensável a supervisão efetiva das atividades realizadas e, principalmente, do uso correto de EPIs, não podendo ser imputado o cometimento de ato inseguro pelo reclamante, de forma absoluta - ainda que não deva ser desconsiderada tal circunstância na estipulação das indenizações.
Assim, concluo pelo nexo causal entre as tarefas executadas e o acidente ocorrido, e culpa da reclamada evidenciada pelas circunstâncias supra identificadas, parcialmente atenuada pelo descuido do autor.
Corroboraram tais conclusões os depoimentos colhidos nos autos da reclamatória, bem como a perícia produzida.
Da oitiva da testemunha se depreende que (anexo PROCADM6, evento 01, destaques do original, sic):
TESTEMUNHA DA PARTE AUTORA: Paulo Sérgio Ribeiro da Silva (...) que trabalhou para a reclamada de 2001 a 2010; que estava próximo ao reclamante quando do acidente; que estava montando peças, e o reclamante pegou um rolo de arame e de repente saiu gritando e dizendo: 'acho que furei meu olho', que o reclamante ia freqüentemente buscar arame, por era a mesma área de trabalho; que o reclamante estava usando óculos, bem como o depoente; que confirma que mesmo usando óculos, passa arame pelo óculos; que o óculos não é o que a reclamada junta neste ato, mas um 'branquinho', sendo que o apresentado pela reclamada passou a ser usado depois do acidente. Quesitos do autor: que confirma o horário de 5h20min do acidente, quase no fim da jornada; que no setor havia o líder; que não havia treinamento para fiscalização do uso de EPIs, e na época não havia esse tipo de controle: que na ocasião do acidente o reclamante foi atendido pelo líder, não lembrando se se tratava de Juliano ou Glauber; que naquele horário não havia técnico de segurança. Quesitos da ré: que o óculos utilizado pelo reclamante não era o apresentado pela reclamada neste ato; que perguntado se o reclamante estando com o óculo e salta um arame em direção aos olhos, onde deveria marcar primeiro o arame, respondeu: depende do óculos e do modo como estava usando; que à vista do documento da fl. 188, responde que assinou várias vezes esse tipo de documentos, referindo-se a vários cursos dados pelos donos da empresa; que Irineu Fischer era um dos líderes, Felipe dos Santos era um dos donos; que em relação aos EPIs, não conferiam o número do CA a preencher a ficha de recebimento; que à vista do documento da fl. 192, afirma que assinavam o recebimento e quem preenchia era o líder; que não controlavam se contava o número do CA conforme o EPI recebido. Nada mais.
Por sua vez, o laudo pericial médico produzido nos autos da demanda interposta perante a Justiça do Trabalho foi conclusivo no sentido de que do acidente de trabalho resultou a lesão ocular que acarretou a perda total da visão do olho esquerdo do segurado.
Observa-se, portanto, que diversos foram os apontamentos de irregularidades na operação do maquinário que acabou por vitimar o empregado Anderson Angra de Senne, sobretudo a falta de treinamento apropriado quanto à utilização segura dos equipamentos de proteção individual e à manipulação das ferramentas e instrumentos de trabalho.
É importante referir, neste ponto, que ainda que a empregada tenha concorrido para o acidente, mediante a prática de 'ato inseguro', como referiu a demandada em contestação, não se pode olvidar que os óculos de proteção individual, depois do infortúnio, tiveram seu modelo substituído. Além disso, a testemunha ouvida nos autos da reclamatória trabalhista foi enfática ao afirmar que mesmo com o uso dos óculos do modelo anterior 'passa arame pelo óculos', ou seja, o modelo não conferia efetiva proteção aos trabalhadores contra objetos que eventualmente pudessem atingir suas faces durante o processo produtivo (partículas multidirecionais).
Acresça-se a isso o fato de que o segurado foi contratado em 12/02/2007 e sofreu o acidente em 12/04/2007, ou seja, apenas com dois meses de labor na empresa e tão somente 20 anos de idade. Tais elementos reforçam a idéia de responsabilidade da contratante pelo zelo e fiscalização do cumprimento das normas de trabalho, sobretudo no tocante aos empregados com pouca experiência. Não obstante, também de acordo com o depoimento da testemunha Paulo Sérgio (anexo PROCADM6, evento 01), 'não havia treinamento para fiscalização do uso de EPIs, e na época dos fatos não havia este tipo de controle; que na ocasião do acidente o reclamante foi atendido pelo líder (...); que naquele horário não havia técnico de segurança'.
Conclui-se, de todo o exposto, que o acidente poderia ter sido evitado, tanto com a providência de fornecimento de equipamento de proteção (óculos) adequado à atividade de risco, como até mesmo com a tomada de medidas fiscalizatórias do correto uso do EPI fornecido.
Assim, restou devidamente demonstrado que o empregado estava submetido a condições inseguras de trabalho.
Não há, pois, como afastar a responsabilidade da empresa ré pelo sinistro. Ora, os elementos coligidos aos autos são suficientes para demonstrar que o infortúnio ocorreu porque o funcionário não havia sido adequadamente instruído e monitorado, bem como porque não foram adequados os elementos destinados à anulação dos riscos, especialmente o óculos de proteção fornecido, conforme acima explicitado. Em resumo, é possível concluir que o sinistro não teria ocorrido se a empresa tivesse observado todos os procedimentos de segurança.
Não é demasiado recordar que a Consolidação das Leis do Trabalho define a relação de trabalho como sendo de subordinação do empregado, cumprindo ao empregador dirigir e fiscalizar a execução dos serviços prestados: 'Artigo 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário'.
Portanto, não basta a existência de normas de conduta, ou que os avisos e os equipamentos de proteção estejam à disposição dos trabalhadores, uma vez que a responsabilidade do empregador não é obstada por esses motivos, sobretudo se a omissão restar consubstanciada no seu dever de implementar as políticas de segurança cabíveis. Frise-se, as normas de segurança são de caráter obrigatório, assumindo o empregador a responsabilidade pela sua negligência em cobrar de modo efetivo sua observância ou em promover a instalação/fornecimento dos equipamentos respectivos nos locais onde podem ocorrer acidentes, além de instruir os trabalhadores sobre a forma de manejar seus instrumentos e equipamentos de trabalho.
Deste modo, inexistem elementos nos autos alteram ou eximem as obrigações do empregador, o qual não se desincumbiu do ônus de comprovar que adotou as precauções recomendáveis de fiscalizar e implementar as normas de segurança pertinentes à operação do maquinário de cuja atividade decorreu o incidente. Nesse sentido (grifos acrescidos):
'PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA CONTRA EMPREGADOR. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. CULPA EXCLUSIVA. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. ART. 602 DO CPC. (...). 4. A pessoa jurídica responde pela atuação desidiosa dos que conduzem suas atividades, em especial daqueles que têm o dever de zelar pelo bom andamento dos trabalhos. 5. Para avaliarmos, diante de um acidente de trabalho, se a eventual conduta imprudente de um empregado foi causa do evento, basta um raciocínio simples: se essa conduta imprudente fosse realizada em local seguro, seria, ela, causadora do sinistro? (...). (TRF 4ª Região, AC 1998.04.01.023654-8/RS, Rel. Marga Inge Barth Tessler, DJU-II de 02-07-2003, p. 599)'
'ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. CABIMENTO. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA. RESPONSABILIDADE. PROVA DO PAGAMENTO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. 1. É constitucional o art. 120 da Lei 8.213/91. O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. 2. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança do trabalho. Nesse prisma, a não-adoção de precauções recomendáveis, se não constitui a causa em si do acidente, evidencia negligência da empresa que, com sua conduta omissiva, deixou de evitar o acidente, sendo responsável, pois, pela reparação do dano, inclusive em ação regressiva ajuizada pelo INSS. 3. A efetiva execução da sentença condenatória proferida na ação regressiva (processo de conhecimento) se fará mediante comprovação dos pagamentos efetuados pelo inss, vencidos e vincendos.' (TRF 4ª Região, AC 2000.72.02.000687-7, Rel. Francisco Donizete Gomes, DJU-II de 13-11-2002, p. 973)
Deste último acórdão, convém colacionar o seguinte excerto, extraído do voto proferido pelo relator:
'É fato incontroverso nos autos, por exemplo, a inexistência de ordens de serviço por escrito dando instruções ao operador sobre os riscos da atividades e como evitá-los, não se prestando a suprir tal exigência, que consta da Norma Regulamentadora nº 1, do Ministério do Trabalho, o fato dos trabalhadores terem recebido treinamento quanto à operação da máquina e procedimentos de segurança. (...). Não há dúvida que o trabalhador foi imprudente ao não utilizar o pilão para pressionar a carne, isto sobre um piso escorregadio. Todavia, se houvesse uma fiscalização mais rigorosa para forçar o uso do pilão pelos empregados ou se houvesse um mecanismo de proteção que impedisse a mão de escorregar para dentro do moedor ou, ainda, se a plataforma estivesse fixada ao piso (escorregadio) certamente o acidente teria sido evitado. Ou seja, embora não constituam a causa única do acidente, se as medidas preventivas citadas tivessem sido adotadas, o acidente teria sido evitado. É aí que reside a culpa da ré pelo acidente, impondo-lhe o dever de ressarcir o inss pelas despesas efetuadas.' (grifos acrescidos)
Em suma, não há como afastar a responsabilização da empresa ré pelo acidente sofrido pelo Sr. Anderson, já que se tivessem sido instalados os dispositivos pertinentes e implementadas as medidas de segurança cabíveis, além da orientação ao acidentado quanto às precauções a serem tomadas no sentido de evitar acidentes, o infortúnio certamente não teria ocorrido.
Assim, uma vez comprovada a culpa da ré no evento danoso, o pedido é procedente, devendo a empresa ser condenada a ressarcir ao INSS os valores despendidos com o pagamento dos benefícios auxílio-doença nºs 91/520.505.204-6, no período de 28/04/2007 a 15/11/2007, e 91/524.649.664-0, pago de 15/02/2008 a 02/04/2009.
Assim, entendo que ficou perfeitamente provada a negligência da ré quanto às normas de proteção à saúde de seus empregados, estando cabalmente comprovada sua culpa por descumprir as normas de saúde e higiene do trabalho.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte ré.
É o voto.
Salise Monteiro Sanchotene
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Salise Monteiro Sanchotene, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7854560v9 e, se solicitado, do código CRC A95E3BD0. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/11/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005688-05.2012.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50056880520124047107
RELATOR | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR |
PROCURADOR | : | Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira |
APELANTE | : | CROMOFIX CROMO DURO LTDA. |
ADVOGADO | : | Luiz Carlos Branco da Silva |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/11/2015, na seqüência 637, disponibilizada no DE de 22/10/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE | |
: | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Luiz Felipe Oliveira dos Santos, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7950472v1 e, se solicitado, do código CRC C6C1910E. | |
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| Signatário (a): | Luiz Felipe Oliveira dos Santos |
| Data e Hora: | 05/11/2015 16:13 |
