APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002582-80.2013.4.04.7113/RS
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | FARINA S/A COMPONENTES AUTOMOTIVOS |
ADVOGADO | : | CESAR LOEFFLER |
APELADO | : | GISELIA LUCIA RACHELE |
ADVOGADO | : | Guilherme Rachelle Accordi |
APELADO | : | AYRTON LUIZ GIOVANNINI |
ADVOGADO | : | CESAR LOEFFLER |
: | ANA MERI PAGOT |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA PROPOSTA PELO INSS. ACIDENTE DE TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. RESSARCIMENTO DE VALORES PAGOS PELO INSS COMO BENEFÍCIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CONTRIBUIÇÃO DE SAT/RAT - NÃO EXCLUI OBRIGAÇÃO DA EMPRESA EM RESSARCIR O INSS. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA. NÃO CONFIGURADA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
- Tratando-se de pedido de ressarcimento de valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário, quanto à prescrição, é aplicável ao caso, pelo princípio da simetria, o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32 (prescrição quinquenal). Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
- É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas consequências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada.
- O fato de as empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.
- Não restando demonstrada a negligência da empregadora quanto à adoção e à fiscalização das medidas de segurança do trabalhador e, por outro lado, configurada a culpa exclusiva da vítima, a ação regressiva proposta pela autarquia deve ser julgada improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de agosto de 2015.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7738467v6 e, se solicitado, do código CRC 9A2AF261. | |
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RELATÓRIO
O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - ajuizou ação ordinária, em 21/07/2013, contra FARINA S.A. COMPONENTES AUTOMOTIVOS; AYRTON LUIZ GIOVANNINI; e GISÉLIA LÚCIA RACHELE RIGHESSO, objetivando o ressarcimento dos valores despendidos com o pagamento de benefício de pensão por morte decorrente do acidente de trabalho que levou a óbito o segurado Leandro Garcia.
Instruído o feito, sobreveio sentença em 29/01/2015, julgando improcedente o pedido. Condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, divididos em partes iguais entre os três réus, na forma do art. 20, § 4º, do CPC. Autor isento de custas; deferido o benefício da Assistência Judiciária Gratuita à ré Gisélia Lúcia Rachele Righesso. Sentença sujeita ao reexame necessário.
Apela a parte autora (evento 92 na origem), sustentando que os réus incorreram em culpa nas circunstâncias geradoras do acidente de trabalho que levou a óbito o segurado Leandro Garcia, de modo que procede o pedido de ressarcimento dos valores despendidos com o pagamento do benefício de pensão por morte.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7738465v10 e, se solicitado, do código CRC 64477BA8. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002582-80.2013.4.04.7113/RS
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VOTO
PRESCRIÇÃO
No que se refere à prescrição, a jurisprudência deste Tribunal tem entendimento no sentido de que, ante à inexistência de prazo prescricional geral expressamente fixado para as ações movidas pela Fazenda Pública contra o particular, há que se aplicar, por simetria, o Decreto nº 20.910/32, o qual prevê:
Art. 1º - As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
Nesse sentido, precedente da 2ª Seção desta Corte:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO REGRESSIVA DE INDENIZAÇÃO. RESSARCIMENTO DE VALORES PAGOS PELO INSS A TÍTULO DE AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.
1. Tratando-se de pedido de ressarcimento de valores pagos pelo INSS a título de auxílio-doença acidentário concedido a empregado, quanto à prescrição, é aplicável ao caso, pelo princípio da simetria, o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32 (prescrição quinquenal). Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
2. Nulidade da sentença, afastando-se a prescrição, e determinado o retorno dos autos à origem para regular processamento do feito, com produção probatória, para que seja aferido se a hipótese dos autos (doença ocupacional) está albergada na previsão legal de direito de regresso, nos termos dos arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213/91.
(EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5006331-06.2011.404.7201, 2ª Seção, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 15/10/2012)
No caso dos autos, o acidente de trabalho ocorreu em 09/11/2009 e o primeiro pagamento do benefício foi no próprio mês de novembro de 2009. A presente ação foi ajuizada em 21/07/2013.
Desse modo, sendo o prazo quinquenal, não restou operada a prescrição, uma vez que não transcorreu mais de cinco anos entre o primeiro desembolso da autarquia e a propositura da ação.
MÉRITO
A ação de regresso proposta pelo INSS encontra fundamento no artigo 120 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Estamos diante de responsabilidade civil subjetiva, na qual, além dos pressupostos (a) da ação ou omissão do agente, (b) do dano experimentado pela vítima e (c) do nexo causal entre a ação e omissão e o dano, deve ficar comprovada também (d) a culpa do agente, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil, que dispõem:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Logo, torna-se necessária, no caso dos autos, a verificação de conduta negligente dos requeridos no evento que ocasionou o acidente do empregado da empresa, para que se proceda à restituição pugnada pela autarquia.
Ainda no que tange à responsabilidade civil nas situações envolvendo acidente do trabalho, duas situações merecem destaque. A primeira, de que há presunção de culpa por parte do empregador quanto à segurança dos trabalhadores a ele vinculados, recaindo sobre aquele o ônus de provar a adoção de medidas preventivas ao acontecimento de infortúnios no ambiente laboral. A segunda, o fato de que cabe ao empregador a direção e a fiscalização no andamento das atividades com observância das diretrizes de segurança e saúde do trabalho.
A propósito, o seguinte julgado deste Tribunal:
PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. COMPETÊNCIA. PROVA ORAL. LEGITIMIDADE DO INSS. CULPA DO EMPREGADOR. AÇÃO REGRESSIVA. POSSIBILIDADE. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BENEFÍCIOS SUCESSIVOS AINDA NÃO EFETIVADOS. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS.
1 a 12 (...)
13. Vale notar, no tocante, que, em se tratando de responsabilidade civil por acidente do trabalho, há uma presunção de culpa do empregador quanto à segurança do trabalhador, sendo da empregadora o ônus de provar que agiu com a diligência e precaução necessárias a evitar ou diminuir as lesões oriundas do trabalho repetitivo, ou seja: cabe-lhe demonstrar que sua conduta pautou-se de acordo com as diretrizes de segurança do trabalho, reduzindo riscos da atividade e zelando pela integridade dos seus contratados.
14. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas conseqüências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada, afirmando de modo simplista que cumpriu com seu dever apenas estabelecendo referidas normas.
15. Demonstrada a negligência da empregadora quanto à instalação e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito à ação regressiva prevista no art. 120 da Lei n° 8.213/91.
16 a 20 (...)
(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003484-56.2010.404.7107, 3ª TURMA, Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 08/05/2014) (grifei)
Sob outro aspecto, é pacífica a jurisprudência desta Casa em afirmar que o empregador privado não se exime da responsabilidade civil em face de acidente do trabalho sofrido por seus trabalhadores contratados, em razão do recolhimento de tributos e contribuições que custeiam o Regime Geral de Previdência Social, em especial o SAT - Seguro de Acidente do Trabalho. Assim, não há dúvida sobre a constitucionalidade do art. 120 da Lei de Benefícios, dispondo sobre a ação regressiva de que dispõe a Previdência Social quando imputável ao contratante da força laborativa negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva.
Observe-se o seguinte julgado:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO REGRESSIVA DE INDENIZAÇÃO. CONTUTUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI 8.213/91. SAT. COMPENSAÇÃO. NEGLIGÊNCIA E IMPRUDÊNCIA DO EMPREGADOR.
1. A constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 restou reconhecida por esta Corte, nos autos da Argüição de Inconstitucionalidade na AC nº 1998.04.01.023654-8. Portanto, se o benefício é custeado pelo INSS, este é titular de ação regressiva contra o responsável negligente, nos termos do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, sem que tal previsão normativa ofenda a Constituição Federal.
2. O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas àquela destinada ao seguro de acidente de trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.
3. Impossibilidade de devolução/compensação dos valores despendidos a título de seguro de acidente de trabalho - SAT. O SAT possuiu natureza de contribuição para a seguridade social (arts. 114, VIII, e 195, I, "a", da CF/88), e não de seguro privado.
4. O nexo causal foi configurado diante da negligência e imprudência da empresa empregadora, que desrespeitou diversas normas atinentes à proteção da saúde do trabalhador. 5. Recurso da parte ré improvido na totalidade. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003462-60.2013.404.7117, 3ª TURMA, Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 12/02/2015) (grifei)
Inclusive em sede de Arguição de Inconstitucionalidade afirmou-se o mesmo, senão vejamos:
CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF.
Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120.
Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos.
Interpretação conforme a Constituição.
Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato.
Argüição rejeitada, por maioria.
(INAC 1998.04.01.023654-8, Corte Especial, rel. p/ acórdão MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO, DJU DE 13-11-2002) (grifei)
Por fim, destaca-se a redação do §10, art. 201 da CF/88: "§10º. Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado".
De sua simples leitura infere-se que o setor privado também deve arcar com os riscos atinentes aos acidentes de trabalho, principalmente quando o sinistro decorrer de culpa do empregador.
Por tudo isso, não há falar no acolhimento da pretensão da parte ré em afastar o cabimento da ação regressiva em face do pagamento da SAT/RAT.
Passemos à análise do caso concreto.
O segurado Leandro Garcia era eletricista na empresa ré e, em 09/11/2009, enquanto prestava serviços à empresa, sofreu acidente de trabalho que o levou a óbito, do qual resultou o benefício de pensão por morte mantido pela autarquia previdenciária (nº 148.403.357-1).
Para evitar tautologia, reproduzo a sentença lançada pelo Juízo de origem, a qual bem analisou os fatos e o direito aplicado, cujos fundamentos tomo como razões de decidir (processo originário, evento 81):
Na hipótese, o acidente, ocorrido quando o empregado consertava uma célula fotoelétrica de iluminação, foi assim descrito em investigação levada a efeito pelo Ministério do Trabalho (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 17):
"3.1 Descrição do acidente detalhado:
O funcionário foi chamado para verificar que a iluminação externa não estava funcionando, podendo ser problema de fotocélula. A vítima informou após uma tentativa que não conseguiu resolver o problema. A vítima chamou um colega para ajudar a identificar um fio elétrico, mas como estava escuro no local (interno) pegaram uma lanterna. Leandro a vítima acessou o telhado através de uma escada externa que dá acesso a caixa d'água. Logo após, ouviu-se um grito e barulho. O disjuntor foi desligado e os funcionários avistaram a vítiva desfalecida, foi chamado o corpo de bombeiros e a ambulância. Segundo o atestado de óbito, a causa foi eletroplessão - choque elétrico acidental."
As conclusões do agente de inspeção do trabalho quanto às causas prováveis que deram origem ao acidente foram a pouca visibilidade no local e o difícil acesso ao local do defeito (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 18), in verbis:
"4.1 Causas prováveis que deram origem ao acidente:
A primeira causa provável de origem do acidente deve ter sido a pouca visibilidade no local e difícil acesso ao local do possível defeito."
Já as infrações constatadas pela fiscalização foram a falta de acesso melhor e a falta de orientação para deixar o conserto aproveitando a luz natural que propiciaria melhores condições (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 18).
Por outro lado, ressalte-se que a própria fiscalização do trabalho, respondendo à pergunta se o acidente de trabalho, ora analisado, seria evitável caso as medidas de proteção coletivas e/ou individual fossem adotadas pela empresa (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 19), afirmou que "especificamente não é o caso de adoção de algumas destas medidas - coletivas e ou individuais. O acesso ao local do acidente é que sugere a dificuldade de trabalho. A decisão a tomar, provavelmente seria não realizar o trabalho à noite ou sem luz natural."
Fica claro, dessa forma, que não se trata de averiguar se a vítima usava ou não equipamentos de proteção, porquanto a fiscalização assinalou que não é caso de adoção de medidas de proteção coletivas ou individuais. É necessário averiguar, portanto, as condições de segurança do local do acidente e se houve ordem da parte ré para que Leandro efetuasse o reparo naquele horário (20h e 30min).
As testemunhas ouvidas prestaram as seguintes declarações (grifos acrescidos):
Testemunha João Alves (evento 74 - video2): disse que era eletrotécnico e que trabalhava com o falecido no setor de elétrica; que o falecido era eletricista; que o falecido solicitou sua ajuda para consertar uma fotocélula; que estava lá no dia do acidente; que não viu o acidente, apenas ouviu o barulho provocado pelo acidente; que subiu no telhado e viu o corpo da vítima caído; que procurou ajuda para socorrer a vítima; que o falecido não estava usando cinto, mas que a queda não foi de um lugar muito alto; que talvez não fosse necessário cinto de segurança naquela ocasião; que sempre usavam equipamento de proteção; que sempre receberam cursos e treinamentos pela empresa; que era um serviço simples, apenas identificar um fio, e que, por isso, a vítima não achou necessário desligar a eletricidade; que acha que a escada girou, escorregou e amassou um fio; que via a Sra. Gisélia na empresa; que Gisélia dava treinamento para os funcionários; que o Sr. Airton era o diretor da empresa; que não é comum fios elétricos ficarem soltos; que acha que o fio enrolou na escada e foi arrancado; que usavam botina, macacão, máscara, protetor auricular, capacete, cinto de segurança, proteção para alta tensão; que a empresa obrigava os funcionários a usarem os EPIs; que usavam escadas de fibra e alumínio; que o Sr. José Paese era o supervisor do setor; que ninguém imaginava que num serviço tão simples iria acontecer o que aconteceu; que o certo seria ter sido utilizada uma escada de fibra; que o que ofereceu o risco foi o tombo; que teve curso NR10 e operações em altura; que o pessoal responsável pela segurança do trabalho estava sempre presente; que tinha CIPA na empresa; que trabalhou na Farina 17 anos.
Testemunha José Paese - informante (evento 74, video3): afirmou que não presenciou o acidente; que em seguida foi ao local do acidente; que desligou a energia do local para facilitar o socorro; que a vítima tinha sido designada para consertar a iluminação externa do pavilhão; que a vítima tinha sido ordenada para parar de trabalhar naquele local e auxiliar outro colega (Sr. João Alves), em uma função mais necessária (conserto de um compressor de ar); que ordenou que a vítima parasse os trabalhos porque era horário de verão, em torno de 20h, e já estava escuro; que entre 19h e 20h, a vítima disse que não tinha resolvido o problema; que mandou encerrar as atividades naquele setor; que Leandro tinha lhe falado que sim, que iria encerrar as atividades, que só iria buscar umas ferramentas no local; que não sabe por que a vítima resolveu continuar o serviço; que Leandro era uma pessoa disciplinada; que a vítima usava os equipamentos de proteção necessários: capacete, luvas, óculos, botina; que não sabia se Leandro estava usando cinto de segurança no momento do acidente; que não sabe exatamente de onde veio o choque; que não tem muitos fios emaranhados no local; que a empresa tem escadas de fibra para a manutenção; que lhe disseram que a vítima utilizou um "eito de cabo", parecido com uma escada; que a empresa faz reciclagem e cursos de segurança do trabalho; que havia um representante da manutenção na CIPA; que a empresa exigia a NR10; que havia reuniões quase que diárias sobre medidas de segurança; que foi feito uma reforma geral no local do acidente, pelo fato de não ter sido descoberto exatamente o que causou a fatalidade; que a perícia não soube dizer exatamente qual teria sido a causa do acidente; que considerava o local seguro; que as instalações elétricas estavam em boas condições; que os fios ainda estão no mesmo lugar.
Testemunha Leandro Secco (evento 74 - video3): disse que era colega de trabalho de Leandro; que a vítima era eletricista e ele era mecânico; que socorreu a vítima; que Leandro estava debruçado sobre uma escada de ferro contra a caixa d'água da empresa; que tinha um fio que estava contra o corpo da vítima e que ele o arrancou, para poder tirar Leandro de cima da escada; não sabe se o fio encostou na vítima quando esta escorregou da escada; que tirou o fio para não levarem choque; que correu risco para puxar o fio; que estava usando os EPIs normais de serviço: botina, macacão, luva, capacete; que não lembra se a vítima estava usando equipamento de proteção; que normalmente a vítima usava EPIs; que os funcionários da empresa eram obrigados a usar equipamentos de proteção; que existiam placas de advertência com os EPIs obrigatórios para cada setor; que quem não utilizasse os EPIs eram advertidos pelo supervisor da área ou pelos Técnicos de Segurança; que recebiam treinamento de segurança do trabalho quando eram admitidos, bem como que no decorrer do contrato eram ministrados treinamentos; que encontrava a ré Gisélia de dia no trabalho, na parte da manhã; que enxergava o réu Ayrton muito pouco; que após o acidente foi feita a parte elétrica nova no local do acidente;
Testemunha Delmar Tesser - informante (evento 74 - video5): afirmou que esteve na empresa no dia posterior ao acidente com a perícia; que na época era gerente industrial; que a perícia não conseguiu identificar as causas do acidente; que a empresa realizava cursos de aperfeiçoamento para os funcionários; que após o acidente foi realizada reunião extraordinária da CIPA; que o pavilhão em que ocorreu o acidente estava em boas condições; que a empresa possuía ISO na época; que para obter a ISO a empresa precisa ter treinamentos, inclusive na área de segurança do trabalho; que são fornecedores de peças para montadoras (Scania e Volvo) e que a ISO é requisito básico para isso.
Em sede policial, José Antônio Paese disse que ordenou para Leandro suspender aquela manutenção e continuá-la somente na data seguinte (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 24). Em seu depoimento, aduz ter dito a Leandro que não haveria problema algum se deixasse a manutenção para a data seguinte, mandando-o ajudar João Alves, eletrotécnico da Farina, na manutenção de compressores de ar em outro pavilhão.
Em seu interrogatório na polícia (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 26), Ivonir Antoninho Bochi, coordenador de manutenção, referiu que, segundo apurou após o fato, José Paese teria dito a Leandro para deixar a manutenção para a data seguinte porque estava escurecendo e ordenou que fosse ajudar João Carlos Alves na manutenção de compressores. Relatou que é norma da Farina que seus eletricistas usem sapatos de segurança, luvas, óculos de segurança, capacetes, máscara, um avental e, em caso de alta tensão, roupa especial para alta tensão. Referiu que o acidente foi uma fatalidade, pois Leandro normalmente usava todos os EPIs em suas atividades diárias e era um funcionário exemplar.
Valmor Zuge, mecânico, disse, em sede policial (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 29), que Leandro usava botas de segurança e macacão no momento em que prestou socorro ao mesmo. Não reparou se ele utilizava outros equipamentos de proteção individual. Afirmou que Leandro costumava utilizar os EPIs, uma vez que é norma da Farina o uso dos mesmos. Disse que não sabe informar como o fato ocorreu, mas pelo que pode observar no local enquanto prestava socorro ao mesmo, acredita que a calha elétrica pode ter escorregado fazendo com que Leandro, ao tentar se agarrar em um cano de ferro da caixa de água, esbarrasse no fio elétrico. Referiu, ainda, que a vítima costumava utilizar todos os EPIs.
Dos elementos que se colhem dos autos, tudo leva a crer que Leandro agir por conta própria ao desobedecer a ordem dada pelo seu superior, o qual havia lhe ordenado que deixasse a atividade para o dia seguinte.
Ratificam o contexto favorável em prol dos réus os documentos coligidos nos eventos 24 e 25, que demonstram sua diligência quanto às normas de segurança do trabalho: ata de reunião da CIPA, Mapa de Risco, Lista de Presença PSSGT, PPRA, Plano 2008, Plano 2009, Plano de Gestão e Saúde e Segurança do Trabalho, Reconhecimento de Riscos Ambientais, Entrega da CAT e EPIs.
Saliente-se, ainda, que, conforme referiu Delmar Tesser em audiência, a empresa possuía certificação ISO na época; e que para obter a ISO a empresa precisa ter treinamentos, inclusive na área de segurança do trabalho, já que são fornecedores de peças para montadoras (Scania e Volvo).
Por outro lado, o setor de criminalística da polícia informou que foram encontradas no local da ocorrência várias fiações que apresentavam descontinuidades as quais, em tese, poderiam ter provocado choque elétrico, se energizadas. (evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 45). Tal descrição, contudo, além de genérica, não foi corroborada pela prova testemunhal, bem como é fragilizada pela tese defensiva de que foram cortados/arrancados fios para desprender a vítima. De se sublinhar, neste particular, o testemunho de João Alves, indicativo de que não era comum a presença de fios elétricos soltos na empresa ré, tendo o fio elétrico encontrado no local do acidente sido arrancado pela escada.
Diante do conjunto probatório dos autos não é possível afirmar, de modo claro, a negligência por parte dos réus quanto às normas padrão de segurança, situação que inviabiliza a sua responsabilização.
No ponto, importante salientar que ações como a presente encontram guarida quando há comprovação da negligência empresarial em atender às normas de segurança, o que não ocorreu no caso.
Dessa forma, não se extraem dos autos todos os elementos suficientes para caracterizar o nexo causal entre a culpa da parte ré e o dano causado à Previdência Social. Tudo indica para a culpa preponderante do falecido, que descumpriu ordem de seu superior para encerrar o trabalho, assumindo o risco do resultado nefasto. Provavelmente, a vítima escorregou da escada devido ao seu peso (120 kg - evento 1 - anexos_pet_ini3, p. 33) e por utilizar uma escada inadequada em um local escuro, tendo, por consequência, esbarrado na fiação elétrica e levado um choque elétrico acidental. Saliente-se que havia escadas de fibra para usar, conforme se extrai da prova testemunhal, oferecendo a empresa orientações e treinamentos adequados. Por outro lado, as testemunhas não relataram que a instalação elétrica do local do acidente não estivesse em boas condições.
Conquanto se possa identificar alguma omissão culposa da empresa - na medida em que não pode ficar sob o arbítrio de funcionário o reparo elétrico em local perigoso e de baixa iluminação - não se tratou de causa direta e eficiente do evento danoso. É importante observar que, em matéria cível, não se aplica a teoria da equivalência dos antecedentes, própria da esfera criminal (e que mesmo nela recebe flexibilizações, próprias da dogmática construída), mas a teoria da causalidade adequada.
Como se vê, o acidente se deu em razão de desobediência do segurado às determinações para encerrar as atividades naquele dia, assumindo os riscos de exercer seu trabalho sem o uso de escada de fibra a ele disponível e sem o recurso da luz natural, que poderiam oferecer maior tranquilidade para efetuar o reparo que buscava fazer. Outrossim, a empresa contratante mantinha em constante treinamento e sob orientações técnicas os seus empregados, além do que cumpriu as normas de saúde e segurança do trabalho que lhe foram impostas.
Nesse contexto, caracterizada a culpa exclusiva da vítima, deve ser mantida a solução de improcedência emprestada à causa.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à remessa oficial e à apelação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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| Data e Hora: | 28/08/2015 14:11 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/08/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002582-80.2013.4.04.7113/RS
ORIGEM: RS 50025828020134047113
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Dr(a) Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | FARINA S/A COMPONENTES AUTOMOTIVOS |
ADVOGADO | : | CESAR LOEFFLER |
APELADO | : | GISELIA LUCIA RACHELE |
ADVOGADO | : | Guilherme Rachelle Accordi |
APELADO | : | AYRTON LUIZ GIOVANNINI |
ADVOGADO | : | CESAR LOEFFLER |
: | ANA MERI PAGOT |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26/08/2015, na seqüência 175, disponibilizada no DE de 13/08/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Juiz Federal NICOLAU KONKEL JUNIOR | |
: | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
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