Agravo de Instrumento Nº 5048281-83.2019.4.04.0000/SC
RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
AGRAVANTE: JUREMA MARIA DOS SANTOS
AGRAVADO: HELENICE THEREZINHA ESCORCIO
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
RELATÓRIO
Cuida-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela, na qual objetiva o reconhecimento de sua condição de pensionista do Militar da Marinha do Brasil 3º Sgt BENEDITO CARLOS ESCORCIO, falecido em 11/03/2019, ao argumento de que há mais de quarenta anos convivia maritalmente com o militar falecido, com quem teve duas filhas.
Alega ser uma pessoa idosa (72 anos), tendo convivido com o falecido em regime de união estável por mais de 42 anos, até a data do óbito, mesmo este mantendo o estado civil como casado, porquanto comprovada a seperação de fato, desde 1976, com a segunda requerida, Sra. Helenice Therezinha Escórcio, que percebia pensão alimentícia descontada dos proventos do militar. Sustenta que, além da dependência econômica presumida, tem necessidade de recebimento de 50% do valor do benefício para manter as despesas para sua sobrevivência e as que eram comuns do casal. Aduz estar fartamente comprovado nos autos sua condição de dependente para todos os fins de direito, principalmente, para recebimento do valor de 50% do benefício Pensão por Morte, EM RATEIO COM a Segunda Agravada, Sra. Helenice Therezinha Escórcio, esta última em razão da pensão alimentícia por esta recebida. Ressalta que a união estável perdurou de 01/05/1976 até o óbito do instituidor da pensão, em 11/03/2019, o que se demonstra com a declaração firmada na Escritura Pública de Declaração de União Estável, datada de 12/05/2017. Da união estável, o casal teve duas filhas: Ana Claudia Escorcio de 38 anos e Carolina Rúbia Escorcio Duarte de 33 anos de idade. Esclarece que os gastos básicos assumidos pelo casal, e que seriam saldados no mês de óbito e nos meses seguintes, encontrando-se agravante em débito, ultrapassam e muito os parcos recursos de Aposentadoria que recebe em valor bruto de cerca de R$ 1.200,00, e que, deduzidas as rubricas de praxe, sequer consegue arcar com despesas de condomínio e alimentação. Sustenta a presença do periculum in mora e o fumus boni iuris, busca o deferimento da antecipação tutelar.
Deferida a antecipação de tutela, regularmente intimada, a União apresentou contraminuta.
Esta a suma.
VOTO
As tutelas provisórias podem ser de urgência ou da evidência (art. 294 do CPC), encontrando-se assim definidas no novo diploma processual:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
Da leitura do artigo referido, denota-se que dois são os requisitos que sempre devem estar presentes para a concessão da tutela de urgência: a) a probabilidade do direito pleiteado, isto é, uma plausibilidade lógica que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, do que decorre um provável reconhecimento do direito, obviamente baseada em uma cognição sumária; e b) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo caso não concedida, ou seja, quando houver uma situação de urgência em que se não se justifique aguardar o desenvolvimento natural do processo sob pena de ineficácia ou inutilidade do provimento final.
A tutela de evidência, por sua vez, dispensa a prova do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo, mas seu cabimento está restrito ao rol taxativo do art. 311, I ao IV, do CPC/2015.
No caso dos autos, tratando-se de pleito antecipatório fundado na urgência, passo ao exame do pedido à luz do art. 300 do NCPC.
Tenho, como bem destacado pelo Magistrado a quo, que as alegações na peça inicial, muito bem elaboradas, foram acompanhadas de "impressionante conjunto probatório" - especialmente aqueles juntados ao evento 1 e relacionados nos itens 3 e 4 da inicial -, demonstrando a existência de união estável entre a autora e o falecido 3º Sgt BENEDITO CARLOS ESCORCIO, por mais de 40 anos.
Muito embora o Sr. Benedito mantivesse o estado civil como casado com a Sra. Helenice Therezinha Escórcio, há elementos demonstrando a separação de fato de sua esposa - ação de alimentos moviada em 1980. Por outro lado, há também forte elemento indiciário da convivência em comum entre o militar falecido e a autora, ora agravante, com destaque para a Escritura Pública de Declaração de União Estável, a Certidão de Óbito, as filhas em comum, o mesmo endereço residencial, etc.
Assim, havendo em perfunctória análise, própria da presente fase processual, fortes indícios da existência de que o falecido há muitos anos estava separado de fato, e que mantinha união estável com a demandante, presente está o fumus boni juris, inclusive em relação à dependência, que é presumida. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE DEPENDENTE. CASAMENTO. SEPARAÇÃO DE FATO. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. BENEFÍCIO DEVIDO. SENTENÇA REFORMADA.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. É presumida a dependência econômica do companheiro que vivia em união estável com a de cujus.
3. A união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação more uxório. A Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço.
4. Houve demonstração através de certidão de óbito, em que consta expressamente o autor e a falecida viviam maritalmente desde 2005 até a data do óbito e instrumento particular de acordo de união estável. Tais documentos indicam a relação sólida, pública e duradoura.
5. Ademais, a união estável foi corroborada pelas as testemunhas ouvidas em juízo, que confirmaram a união estável entre a autora e o de cujus há 06 anos.
6. O casamento entre o autor e Maria Judite Souto (1964), da qual era separado de fato, não é empecilho para o reconhecimento da união estável com a autora. Precedente do STJ.
7. Comprovadas a união estável e, por conseguinte, a dependência econômica da autora em relação ao de cujus, além dos demais requisitos, deve ser reformada a sentença de improcedência.
8. As prestações em atraso serão corrigidas pelos índices oficiais, desde o vencimento de cada parcela, ressalvada a prescrição quinquenal, e, segundo sinalizam as mais recentes decisões do STF, a partir de 30/06/2009, deve-se aplicar o critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009.
9. Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral (RE 870.947), bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
10. Os juros de mora são devidos a contar da citação, à razão de 1% ao mês (Súmula nº 204 do STJ e Súmula 75 desta Corte) e, desde 01/07/2009 (Lei nº 11.960/2009), passam a ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança (RESP 1.270.439), sem capitalização.
(TRF4, AC 0024153-70.2013.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 29/10/2015)
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PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. COMPROVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. COMPANHEIRA CASADA, MAS SEPARADA DE FATO. POSSIBILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. In casu, a autora faz jus à pensão por morte do companheiro.
2. Inexiste óbice ao reconhecimento da união estável quando um dos conviventes, embora casado, encontra-se separado de fato.
3. A atualização monetária, a partir de maio de 1996, deve-se dar pelo IGP-DI, de acordo com o art. 10 da Lei nº 9.711/98, combinado com o art. 20, §§ 5º e 6º, da Lei nº 8.880/94.
4. O termo inicial da fluência de juros, consoante a Súmula 3 deste Tribunal, deve remontar à data da citação.
5. Tendo o feito tramitado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, deve a Autarquia responder pela metade das custas devidas, conforme dispõe a Súmula 2 do extinto Tribunal de Alçada do Estado.
(TRF4, AC 2001.04.01.083459-3, QUINTA TURMA, Relator CELSO KIPPER, DJ 21/12/2005)
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ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE. RATEIO PROPORCIONAL ENTRE A ESPOSA LEGÍTIMA E A COMPANHEIRA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DA CORTE. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.
1. Não se tem como óbice ao reconhecimento de união estável e ao deferimento de pedido de percepção de pensão, a manutenção por quaisquer dos companheiros de vínculo matrimonial formal, embora separado de fato há vários anos. A Constituição da República, bem como a legislação que rege a matéria, têm como objetivo precípuo a proteção dos frutos provenientes de tal convivência pública e duradoura formada entre homem e mulher reconhecida como entidade familiar ?,de forma que não tem qualquer relevância o estado civil dos companheiros. Precedentes do STJ.
2. Reconhecida a união estável com base no contexto probatório carreado aos autos, é vedada, em sede de recurso especial, a reforma do julgado, sob pena de afronta ao verbete sumular n.º 07.
3. Comprovada a vida em comum por outros meios, a designação da companheira como dependente para fins de pensão por morte é prescindível. Confira-se: REsp 477.590/PE, rel. Ministro VICENTE LEAL, DJ de 07/04/2003 e REsp 228.379/RS, rel. Ministro FELIX FISCHER, DJ de 28/02/2000.
4. Corretas às instâncias ordinárias quando consideram como termo inicial a data do ajuizamento da ação, pois, na hipótese, afirmou a beneficiária que protocolou requerimento na esfera administrativa, todavia, em face da extinção da SUNAB (órgão que o servidor falecido era vinculado), ficou impossibilitada de comprovar em que data.
5. Recurso especial não conhecido.
(REsp 590.971/PE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 25/05/2004, DJ 02/08/2004, p. 528)
De fato, os elementos trazidos aos autos até o presente momento são suficientes à concessão da medida antecipatória, pois comprovado o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte de militar, sobretudo a dependência econômica.
Ademais, a todo tempo a tutela pode ser revogada.
Diante do exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento para conceder à autora/agravante o benefício da pensão por morte, com pagamento de 50% (cinquenta por cento) do valor mensal devido da pensão em rateio com a litisconsorte passiva.
Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001618373v4 e do código CRC ada14cfc.Informações adicionais da assinatura:
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Agravo de Instrumento Nº 5048281-83.2019.4.04.0000/SC
RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
AGRAVANTE: JUREMA MARIA DOS SANTOS
AGRAVADO: HELENICE THEREZINHA ESCORCIO
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. MILITAR. PENSÃO POR MORTE. união estável. concessão.
- Do artigo 300 do Código de Processo Civil, denota-se que dois são os requisitos que sempre devem estar presentes para a concessão da tutela de urgência: a) a probabilidade do direito pleiteado, isto é, uma plausibilidade lógica que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, do que decorre um provável reconhecimento do direito, obviamente baseada em uma cognição sumária; e b) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo caso não concedida, ou seja, quando houver uma situação de urgência em que se não se justifique aguardar o desenvolvimento natural do processo sob pena de ineficácia ou inutilidade do provimento final.
- A tutela de evidência, por sua vez, dispensa a prova do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo, mas seu cabimento está restrito ao rol taxativo do art. 311, I ao IV, do CPC/2015.
- Os elementos trazidos aos autos até o presente momento são suficientes à concessão da medida antecipatória, pois comprovado o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte de militar, sobretudo a dependência econômica.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento para conceder à autora/agravante o benefício da pensão por morte, com pagamento de 50% (cinquenta por cento) do valor mensal devido da pensão em rateio com a litisconsorte passiva, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de março de 2020.
Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001618374v4 e do código CRC 9aa5fd4d.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 11/03/2020
Agravo de Instrumento Nº 5048281-83.2019.4.04.0000/SC
RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON
AGRAVANTE: JUREMA MARIA DOS SANTOS
ADVOGADO: ELIDIA TRIDAPALLI (OAB SC009666)
ADVOGADO: KATIA DA CUNHA (OAB SC025710)
AGRAVADO: HELENICE THEREZINHA ESCORCIO
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 11/03/2020, na sequência 38, disponibilizada no DE de 20/02/2020.
Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO PARA CONCEDER À AUTORA/AGRAVANTE O BENEFÍCIO DA PENSÃO POR MORTE, COM PAGAMENTO DE 50% (CINQUENTA POR CENTO) DO VALOR MENSAL DEVIDO DA PENSÃO EM RATEIO COM A LITISCONSORTE PASSIVA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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