APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001916-68.2011.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
APELANTE | : | RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES |
ADVOGADO | : | Cecília Debiasi de Lima de Almeida |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AGRAVO RETIDO. COMPETÊNCIA. AÇÃO REGRESSIVA. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 120 DA LEI 8.213/91. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. NEGLIGÊNCIA. VALORES PAGOS A TÍTULO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO.
Reconhecida a competência da Justiça Federal, haja vista que a causa não encerra lide acidentária, mas, sim, ação regressiva proposta pela autarquia previdenciária com fundamento do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 - configurando hipótese prevista no artigo 109, I, da Constituição Federal.
A Corte Especial deste Tribunal, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade, declarou constitucional a redação do art. 120 da Lei nº 8.213/91 em face das disposições do art. 7º, XXVIII, art. 154, I, e art. 195, §4º, todos da Constituição Federal.
O fato de a empresa contribuir para a Previdência Social, mediante o pagamento das contribuições sociais de caráter tributário, que custeará as verbas previdenciárias decorrentes de acidente do trabalho, não a isenta de responsabilidade civil pela prática de ato ilícito.
De acordo com o artigo 120 da Lei n.º 8.213/91, a responsabilidade do empregador pressupõe a existência de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para proteção individual ou coletiva (responsabilidade subjetiva). Uma vez comprovado o nexo causal entre a conduta negligente da ré e o dano causado pelo acidente de trabalho ao segurado, procede o pleito regressivo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de julho de 2015.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7661101v4 e, se solicitado, do código CRC B8D64EBB. | |
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| Signatário (a): | Vivian Josete Pantaleão Caminha |
| Data e Hora: | 23/07/2015 08:00 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001916-68.2011.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
APELANTE | : | RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES |
ADVOGADO | : | Cecília Debiasi de Lima de Almeida |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença exarada nos seguintes termos:
"(...) ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedente o pedido para condenar a empresa ré a ressarcir ao INSS os valores pagos em razão da concessão dos benefícios de auxílio-doença (NB 91/529.343.363-2, durante o período de 20-02-2008 a 08-05-2008, e NB nº 91/535.592.011-3, durante o período de 09-05-2009 a 21-06-2012 - data em que foi cessado - conforme consulta ao CNIS do autor). Os valores deverão ser corrigidos monetariamente pelo IPCA-E desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora de 6% ao ano, desde a citação.
Face à sucumbência do INSS em parte mínima do pedido, arcará a requerida inteiramente com os ônus sucumbenciais (CPC, art. 21, par. único), quais sejam, com as custas processuais e com os honorários advocatícios devidos à parte adversa, que fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), atualizáveis até a data do efetivo pagamento pela variação do IPCA-E, o que faço considerando a matéria versada nestes autos, bem como o trabalho então desenvolvido (CPC, art. 20, § 4º).
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Havendo recurso de apelação, recebo-o em ambos os efeitos.
Após, vista à(s) parte(s) apelada(s) para contrarrazões.
Vindas, ou decorrido o prazo legal, e verificadas as condições de admissibilidade, remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região.
Caxias do Sul, 05 de novembro de 2013."
Em suas razões recursais, a empresa apelante postulou, em preliminar, o conhecimento do agravo retido interposto contra a decisão que desacolheu a preliminar de incompetência do Juízo Federal. Argüiu, ainda, as prejudiciais de ilegitimidade ativa do INSS e prescrição trienal. No mérito sustentou a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei n.º 8.213/91, ante a existência do Seguro de Acidentes do Trabalho - SAT, para o qual já contribui com alíquota elevada. Sustentou, no mérito, que o INSS não fez prova da conduta culposa da recorrente, aduzindo que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima. Por fim, asseverou que não pode a apelante responder integralmente pelo ressarcimento dos benefícios pleiteados pelo apelado, postulando que a condenação, se mantida, restrinja-se aos três meses de afastamento referente ao primeiro benefício (20-02-2008 a 08-05-2008), porquanto, entre esse e o segundo benefício, o autor trabalhou mais de um ano normalmente e sem queixas. Nesses termos, requereu a reforma da sentença.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, conheço do agravo retido interposto contra a decisão que rejeitou a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Tenho que tal irresignação não merece guarida.
Apesar da argumentação apresentada pelo apelante, não se pode confundir ações de acidente de trabalho ou ações trabalhistas com ações de regresso por parte do INSS, tendo em vista pagamento de benefício previdenciário oriundo de incapacidade laboral de segurado. Na ação regressiva o que se tutela é o patrimônio da seguridade social. Nesse sentido, o STJ já consolidou o entendimento que a competência para a ação de ressarcimento proposta pelo INSS contra o empregador é da Justiça Federal, verbis:
"CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO PROPOSTA PELO INSS CONTRA O EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
Compete à justiça comum processar e julgar ação proposta pelo INSS objetivando o ressarcimento dos valores despendidos com o pagamento de pecúlio e pensão por morte acidentária, em razão de acidente de trabalho ocorrido nas dependências da empresa ré, por culpa desta. O litígio não tem por objeto a relação de trabalho em si, mas sim o direito regressivo da autarquia previdenciária, que é regido pela legislação civil. Conflito conhecido para declarar competente o Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
(STJ, CC 59970, 2ª Seção, Rel. Min. Castro Filho, DJ 19/10/2006)"
Assim, rejeito o agravo retido e confirmo a competência da Justiça Federal para o julgamento do feito, haja vista que a causa não encerra lide acidentária, mas, sim, ação regressiva proposta pela autarquia previdenciária com fundamento do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 - configurando hipótese prevista no artigo 109, I, da Constituição federal.
Quanto à prescrição, em ação de regresso, movida pelo Instituto Nacional do Seguro Social contra o empregador, para o ressarcimento de valores pagos a título de benefício acidentário, aplica-se a prescrição prevista no art. 1º do Decreto nº 20.910/32.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA RESSARCIMENTO DE DANO. ARTIGO 120 DA LEI Nº 8.213/91. PRESCRIÇÃO. DECRETO 20.910/32. Consoante o artigo 120 da Lei n.º 8.213/91, "nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis". Em ação de regresso, movida pelo Instituto Nacional do Seguro Social contra o empregador, para o ressarcimento de valores pagos a título de benefício acidentário, aplica-se a prescrição prevista no art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Precedentes do STJ e deste Tribunal. O lapso prescricional flui da data da efetiva e concreta ocorrência do dano patrimonial (concessão de benefício previdenciário). (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008587-93.2014.404.7110, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 03/06/2015)
Assim, desacolho a referida preliminar.
Quanto a preliminar de ilegitimidade ativa, adoto integralmente, quanto ao ponto, os fundamentos exarados na sentença monocrática, a qual será oportunamente transcrita.
Da constitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91:
A Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade, declarou constitucional o art. 120 da Lei n.º 8.213/91, em face das disposições do art. 7º, XXVIII, art. 154, I, e art. 195, § 4º, todos da Constituição Federal, consoante ementa que segue:
CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF. Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos. Interpretação conforme a Constituição. Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato. Argüição rejeitada, por maioria.'
(TRF 4ª Região, Corte Especial, INAC 1998.04.01.023654-8, Rel. p/ Acórdão Manoel Lauro Volkmer de Castilho, DJU 13/11/2002)
Transcrevo trecho do voto proferido pelo eminente Relator:
Salvo engano, não há incompatibilidade entre o art. 7º, inciso 28, da Constituição, e o art. 120 da Lei 8.213/91. Assim porque estou lendo o inc. 28 de modo diverso ao que faz a eminente Relatora. Penso que, quando a Constituição garante aos trabalhadores esse direito de seguro contra acidente de trabalho a cargo do empregador, é o custeio que ele faz perante a Previdência. Diz a Constituição em seguida: ... 'sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa'. A Constituição não diz que essa indenização é ao empregado. A Constituição diz que o empregador fica responsável por uma indenização se ele der causa ao acidente por culpa ou dolo. O direito dos trabalhadores urbanos e rurais é o seguro contra acidente de trabalho; foi isso que se garantiu na Constituição. Se essa leitura é compatível do jeito que estou a propor, não há divergência entre o art. 120 da Lei nº 8.213 e este inciso, porque, quando o art. 120 diz que a Previdência vai propor ação de regresso, é justamente para se ressarcir daquilo que pagou por responsabilidade objetiva ao empregado, tendo o empregador tido culpa ou dolo. (...)
De modo que, se isso é verdadeiro, o ressarcimento ou a indenização, conforme o termo da Constituição, se é devido, é devido à Previdência Social, que atendeu o direito, garantido pela Constituição, ao empregado. Não estou vendo a incompatibilidade que se quer extrair, e mais, a inconstitucionalidade que se quer ler no dispositivo mencionado. De qualquer modo, se a regra tivesse a leitura afirmada pela Relatora, também não seria incompatível com a da Constituição, pois que, tendo títulos diversos, tanto o empregador tem de contribuir, quanto, sendo culpado, haverá de indenizar quem pagou o seguro, isto é, o INSS e a quem causar dano, e nessa perspectiva, não acontece inconstitucionalidade.
Já o SAT (Seguro de Acidente do Trabalho) destina-se ao custeio geral dos benefícios de aposentadoria especial e decorrentes de acidente de trabalho relativos aos riscos ordinários do empreendimento ou, nos termos do inciso II do artigo 22, dos "riscos ambientais do trabalho". O artigo 120 da Lei 8.213/91, por sua vez, refere-se expressamente a hipóteses de "negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho".
Não se trata assim de onerar duas vezes uma mesma empresa, mas somente obter o ressarcimento dos valores pagos pelo INSS em relação a prestações decorrentes de acidente de trabalho e que não podem ser associadas pela fonte de custeio do SAT.
Neste sentido vem decidindo este Tribunal:
PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. MOLÉSTIA DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. DEVER DO EMPREGADOR DE RESSARCIR OS VALORES DESPENDIDOS PELO INSS EM VIRTUDE DA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ALEGAÇÕES DE ILEGITIMIDADE ATIVA DO INSS E DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR AFASTADAS. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CULPA CONCORRENTE DO SEGURADO NÃO DEMONSTRADA. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA QUANTO À ADOÇÃO E OBSERVÂNCIA DAS MEDIDAS DE PROTEÇÃO À SEGURANÇA DO TRABALHADOR. PEDIDO DE ABATIMENTO DOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE SEGURO - SAT. IMPROCEDÊNCIA. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELOS DESPROVIDOS. 1. Não há falar em imprescritibilidade da ação regressiva acidentária, sendo-lhe inaplicável o artigo 37, § 5º, da Constituição Federal, uma vez que 'considerando que a pretensão do INSS é de regresso na condição de segurador, a lide é de natureza civil, pelo que seria inaplicável o art. 37, § 5º, da CF/88, já que a autarquia atua para se ressarcir de indenização/benefício que pagou' (AC nº 0004226-49.2008.404.7201/SC, Rel. Des. Federal Marga Barth Tessler, 4ª T., j. 09-02-2011, un., DJ 17-02-2011). 2. Não prospera a preliminar de falta de interesse de agir da autarquia aventada pela parte ré no caso. É inquestionável a existência de interesse processual do INSS na propositura da presente demanda, visando a ressarcir-se dos valores despendidos com o pagamento do benefício previdenciário (auxílio-doença por acidente de trabalho) no caso. 3. A preliminar de ilegitimidade ativa do INSS, aventada pelo réu, não merece guarida. A presente ação encontra previsão legal expressa nos arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213/91, sendo o meio legal cabível para a autarquia reaver os valores despendidos com a concessão de benefício previdenciário a segurado vítima de acidente de trabalho, bastando, para tanto, a prova do pagamento do benefício e da culpa da ré pelo infortúnio que gerou a concessão do amparo. 4. Demonstrada a negligência do réu quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito à ação regressiva prevista nos arts. 120, 121 e 19, caput e § 1º, da Lei nº 8.213/91. 5. Hipótese em que o laudo pericial elaborado no caso e a prova testemunhal produzida demonstraram o descumprimento, pelo demandado, de normas de segurança no trabalho, detectando o referido laudo os seguintes problemas na execução do labor pelos seus empregados: quadro de pessoal insuficiente; imobiliário inadequado (configuração ergonômica inadequada); condições ambientais inadequadas; falta de programa de ginástica compensatória e ausências de pausas para recuperação. 6. Afastada a alegação quanto à culpa concorrente da vítima para a eclosão da moléstia, restando demonstrado na espécie que, caso existisse um ambiente de trabalho mais adequado, o mal não teria ocorrido 7. Constatada a existência de algumas irregularidades relativas ao ambiente de trabalho do segurado, causadoras do pagamento do amparo em tela, resta inafastável o dever de indenização por parte do empregador ao INSS. 8. Improcede o pedido do apelante/réu de que as parcelas pagas a título de seguro de acidente do trabalho - SAT sejam abatidas do montante a que foi condenado, uma vez que é pacífico em nossos Tribunais o entendimento no sentido de que o fato das empresas contribuírem para o custeio da Previdência Social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui sua responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. 9. Não se acolhe o pedido do INSS de constituição de capital para o pagamento das parcelas vincendas. Segundo o art. 475-Q do CPC, a constituição de capital somente ocorre quando a dívida for de natureza alimentar. A hipótese em tela trata de ressarcimento, isto é, restituição, afastando o caráter alimentar das parcelas. Além disso, o segurado não corre o risco de ficar sem a verba alimentar, cujo pagamento é de responsabilidade da autarquia. 10. Verba honorária mantida em 10% (dez por cento) do valor da condenação (parcelas vencidas até a prolação da sentença) - valor sedimentado por esta Turma para ações em que há condenação de cunho pecuniário. 11. Apelos desprovidos. (TRF4, AC 5005583-26.2010.404.7001, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 08/07/2011)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA DE INDENIZAÇÃO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. ACIDENTE DO TRABALHO. NORMAS DE SEGURANÇA. COMPETÊNCIA. NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA. COMPROVAÇÃO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO- SAT. NÃO EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE EM CASO DE ACIDENTE DECORRENTE DE CULPA DA EMPREGADORA. 1. Trata-se aqui de ação regressiva que busca a responsabilidade civil pelos danos causados, e não demanda relacionada ao contrato ou relação de trabalho. Aplicável as disposições do art. 109, I, da Constituição Federal, sendo competente a Justiça Federal para processar e julgar a causa. 2. Demonstrada a negligência da empregadora quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito à ação regressiva prevista no art. 120 da Lei nº 8.213/91. 3. O fato de a empresa contribuir para o Seguro de Acidente do Trabalho - SAT não exclui sua responsabilidade em caso de acidente decorrente por sua culpa. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000882-10.2010.404.7102, 3a. Turma, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/05/2013)
Dessa forma, reconhecida a constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, resta verificar os parâmetros em que uma conduta do empregador pode ser considerada negligente a ensejar o ressarcimento do INSS.
Para caracterização da responsabilidade do empregador em face do INSS são necessários os seguintes elementos: a) culpa, na forma de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho; b) dano; c) nexo causal entre a conduta culposa e o dano.
Feitas tais considerações, passo à análise do caso concreto.
Do mérito
Impõe-se o reconhecimento de que são irretocáveis as razões que alicerçaram a r. sentença monocrática, a qual me permito transcrever integralmente, verbis:
"Sentença nº 1107/2013
O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL ajuizou a presente ação ordinária contra RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES objetivando a condenação da empresa ao ressarcimento de valores despendidos no pagamento de benefícios previdenciários decorrentes de acidente de trabalho. Referiu que em 20-02-2008, nas dependências da ré, o funcionário Samuel Borges sofreu acidente ao realizar suas tarefas laborais, resultando em lesão na perna, tendo que ser submetido à cirurgia no joelho. Disse que a empresa requerida assumiu a culpa pelo acidente de trabalho, disponibilizando-se a pagar indenização ao funcionário no valor de R$ 15.000,00 a título de danos morais. Salientou que a culpa deve-se à falta de 'orientação e preparo dos funcionários para manusear equipamentos pesados (carretas), o que nesse caso ficou caracterizado principalmente pela ausência do sinal da sirene de alerta, necessário para chamar a atenção dos demais trabalhadores de que uma atividade perigosa está sendo realizada' (p. 3). Mencionou que em razão do acidente foi concedido ao empregado o benefício de auxílio-doença (NB 91/529.343.363-2, no período de 29-02-2008 a 08-05-2008, e NB nº 91/535.592.011-6, com início em 09-05-2009 e ainda em vigor), defendendo caber à demandada o ressarcimento dos valores despendidos pela Previdência Social a esse título. Discorreu sobre a obrigação de o causador do acidente de trabalho responder pelos prejuízos dele decorrentes, invocando dispositivos da Lei nº 8.213/91, da CLT e da CF/88 acerca da ação regressiva. Argumentou estarem presentes os requisitos previstos na legislação para a reparação do dano, enfatizando a configuração de conduta negligente por parte da empregadora. Postulou, ao final, a procedência da ação, com a condenação da demandada a: a) ressarcir todos os valores pagos pelo INSS a título de benefício previdenciário, desde sua implantação até a data da cessação, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária, e b) a constituir capital cuja renda assegure o cumprimento de suas obrigações, nos termos do art. 475-Q do CPC, sem prejuízo das condenações relativas à sucumbência. Juntou documentos (eventos 1 e 3).
Citada, a ré contestou (evento 10), arguindo preliminares de incompetência absoluta, por se tratar de ações que versam sobre acidente de trabalho, de inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91, de ilegitimidade ativa e de prescrição. No mérito, discorreu sobre o fato, afirmando que o segundo benefício de auxílio-doença não tem relação com o acidente de trabalho sofrido pelo autor, mas se refere à artrose que o mesmo possui nos dois joelhos. Salientou que não pode o INSS utilizar-se das ações regressivas como nova fonte de custeio para a Previdência Social. Referiu que a indenização paga ao funcionário diz respeito ao objeto de demanda trabalhista. Aduziu que 'não reconhece que tenha agido com culpa na ocorrência do acidente e nem que tenha de qualquer forma contribuído para o resultado (...). Somente com a realização de uma perícia técnica especialmente designada para essa finalidade, poderiam ser apuradas as reais causas do acidente' (p. 11). Impugnou o pedido da autora de inversão do ônus da prova. Salientou que fornece aos seus funcionários todos os equipamentos de proteção individual, sendo que o infortúnio ocorreu em face de caso fortuito ou força maior. Insurgiu-se contra o pedido de constituição de capital. Requereu a improcedência da ação, com a condenação da parte autora a arcar com os ônus sucumbenciais. Postulou, em caso de procedência, fosse reconhecida a culpa concorrente do acidentado, aplicados o IPCA e IBGE como índices de correção monetária, e que fosse reconhecido o direito a amortizar os valores pagos do que é devido a título de SAT e FAP e demais contribuições previdenciárias. Juntou documentos.
Em manifestação sobre a contestação (evento 16), o INSS impugnou as preliminares arguidas pela requerida, rebateu os demais argumentos por ela expendidos e informou não ter outras provas a produzir.
A demandada, intimada para especificar as provas que pretendia produzir, requereu a produção de prova pericial e testemunhal (evento 18).
O pedido de produção de prova pericial e testemunhal foi deferido (evento 20). Na ocasião, foi rejeitada a alegação de incompetência absoluta do Juízo.
O INSS apresentou quesitos no evento 26; a ré apresentou rol de testemunhas no evento 32.
A demandada, intimada, interpôs agravo retido (evento 30), que recebeu contrarrazões do INSS (evento 56).
No evento 33 o perito apresentou proposta de honorários, a qual foi impugnada pela requerida (evento 37), os quais foram arbitrados no evento 51.
A requerida apresentou comprovante de depósito do valor dos honorários periciais (evento 58), tendo sido expedido alvará em favor do perito (eventos 59 e 107).
No evento 80 a ré acostou laudo de seu assistente técnico.
O perito, por sua vez, acostou laudo pericial e documentos nos eventos 82 a 85, sobre os quais as partes manifestaram-se a respeito (evento 89, ré, e evento 90, INSS).
Intimado (evento 93), o perito apresentou laudo complementar (evento 97), sobre o qual o INSS manifestou-se no evento 101, e a ré impugnou-o no evento 104.
As partes foram intimadas sobre o interesse na produção de outras provas, cuja resposta foi negativa por parte do INSS (evento 112); a requerida reiterou o pedido de produção de prova testemunhal (evento 115), o que foi deferido (evento 121).
Realizada audiência, foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas pela ré (eventos 146 e 161). Na ocasião, foi determinada expedição de carta precatória para oitiva da testemunha Renato Busato, e determinada designação de nova data para oitiva da testemunha Gilmar de Paula Carpes.
Designada nova data para oitiva da testemunhal Gilmar de Paula Carpes, este não compareceu (evento 162).
A ré, por sua vez, desistiu da oitiva da testemunha Renato Busato, requerendo a devolução da carta precatória (evento 172).
Diante da ausência de interesse das partes na produção de outras provas, foi encerrada a instrução e aberto prazo para memoriais (evento 175), os quais foram apresentados pelas partes nos eventos 180 (INSS) e 182 (ré).
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
* PRELIMINARES
I - ILEGITIMIDADE ATIVA E INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 120 e 121 DA LEI Nº 8.213/91
A empresa demandada alega que o INSS não detém legitimidade ativa para propor a presente ação, por haver reconhecido o direito do segurado ao benefício previdenciário e efetuado o respectivo pagamento.
A preliminar em apreço não merece acolhida, uma vez que a legitimidade e a pretensão do INSS têm como fundamento os seguintes dispositivos:
Lei nº 8.213/91
'Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 121. O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.'
Decreto nº 3.048/99
'Art. 341. Nos casos de negligência quanto às normas de segurança e saúde do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a previdência social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 342. O pagamento pela previdência social das prestações decorrentes do acidente a que se refere o art. 336 não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de terceiros.'
Por seu turno, a alegada inconstitucionalidade dos artigos 120 e 121 da Lei nº 8.213/91 é matéria que diz respeito ao mérito da demanda e, portanto, com ele será analisada.
II - PRESCRIÇÃO
A preliminar de prescrição invocada pela ré com base no art. 206, § 3º, V, do Código Civil, que prevê o lapso temporal de três anos para 'a pretensão de reparação civil', igualmente não merece acolhida.
Isso porque a adoção de tal prazo representaria tratamento desigual entre o Erário e o administrado diante de uma mesma situação jurídica, considerando que a pretensão deste último em face da Administração sucumbiria em cinco anos, nos termos do Decreto nº 20.910/32, ao passo que a pretensão inversa - ou seja, do Estado contra o particular - prescreveria em prazo menor, de três anos.
Nesse sentido, traz-se à colação o seguinte acórdão do Superior Tribunal de Justiça, proferido em ação de responsabilidade civil por dano à Fazenda Pública, em que foi aplicado o prazo previsto no Decreto nº 20.910/32 para as pretensões por esta formuladas em face do particular:
'PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO A IMÓVEL PÚBLICO. ACIDENTE OCASIONADO POR VEÍCULO PARTICULAR. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO DO DECRETO Nº 20.910/32. 1. O art. 1º do Decreto nº 20.910/32 dispõe acerca da prescrição qüinqüenal de qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja qual for a sua natureza, a partir do ato ou fato do qual se originou. 2. A aplicação principiológica da isonomia, por si só, impõe a incidência recíproca do prazo do Decreto 20.910/32 nas pretensões deduzidas em face da Fazenda e desta em face do administrado. Precedentes do STJ: REsp 946.232/RS, DJ 18.09.2007; REsp 444.646/RJ, DJ 02.08.2006; REsp 429.868/SC, DJ 03.04.2006 e REsp 751.832/SC, DJ 20.03.2006. 3. In casu, a pretensão deduzida na inicial resultou atingida pelo decurso do prazo prescricional, uma vez que, inobstante o dano tenha ocorrido em 21.09.1987, a ação somente foi ajuizada em 09.02.1994, consoante se infere do excerto do voto condutor do acórdão recorrido. 4. Deveras, a lei especial convive com a lei geral, por isso que os prazos do Decreto 20.910/32 coexistem com aqueles fixados na lei civil. 5. Agravo regimental desprovido.' (AgRg no REsp 1015571/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 17-12-2008)
Assim sendo, impõe-se a adoção da prescrição quinquenal da ação regressiva do INSS contra o responsável pelo acidente de trabalho.
Nesse passo, considerando que o termo inicial do prazo prescricional é a data do dano sofrido pela autarquia previdenciária, ou seja, o início do pagamento do benefício decorrente do acidente de trabalho (20-02-2008, conforme p. 3 do PROCADM2, evento 1), afasta-se a alegação de prescrição, uma vez que a presente ação foi ajuizada em 28-04-2011.
Por fim, importa afastar a alegação do INSS de inocorrência da prescrição, nos termos do art. 37, § 5º, da CF, uma vez que inaplicável ao caso em questão, por não se tratar de ilícito praticado por agente público (servidor ou não), e tampouco por ocasião de prestação de serviço ao Poder Público.
Esclarecidos esses aspectos, passa-se ao exame do mérito.
* MÉRITO
Na presente ação, o INSS pretende obter o ressarcimento de valores devidos a título de auxílio-doença concedidos ao segurado Samuel Borges, ferido durante o exercício de suas atividades laborais. Sustenta que o fato decorreu de conduta negligente da ré, que não observou as normas padrão de segurança do trabalho, o que colocou em risco a integridade física de seus funcionários. Defende que, caso tivessem sido cumpridas as orientações de segurança, o acidente teria sido evitado, e não estaria sendo necessário o pagamento dos benefícios.
A pretensão veiculada tem como fundamento os seguintes dispositivos:
Lei nº 8.213/91
'Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 121. O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.'
Decreto nº 3.048/99
'Art. 341. Nos casos de negligência quanto às normas de segurança e saúde do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a previdência social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 342. O pagamento pela previdência social das prestações decorrentes do acidente a que se refere o art. 336 não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de terceiros.'
Ampara ainda o INSS seu pleito no fato de que, nos termos do art. 19, §1º, da Lei de Benefícios, a 'empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador'. Assim, caso não adote as precauções necessárias e o empregado venha a se acidentar, em razão disso, no exercício de suas funções, a empresa pode ser compelida a indenizar a Previdência Social, em ação regressiva, pelas despesas que tiver com o segurado acidentado ou com seus dependentes.
A parte ré, por sua vez, assevera que é atribuição exclusiva do INSS a cobertura dos eventos resultantes de acidentes de trabalho, argumentando que as contribuições previdenciárias representam sua parcela quanto aos ônus financeiros de eventuais infortúnios laborais.
Contudo, tal raciocínio não encontra amparo nas disposições constitucionais e legais que versam sobre a matéria. A Emenda Constitucional nº 41/2003, que acrescentou o §10 ao art. 201 da CF, milita contra o argumento da defesa: '§10º. Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado.'
Tal dispositivo evidencia, portanto, que o setor privado também deve arcar com os riscos atinentes aos acidentes de trabalho, especialmente quando o sinistro decorrer de culpa do empregador. Neste sentido trilhou o seguinte julgado:
'ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. CABIMENTO. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA. RESPONSABILIDADE. PROVA DO PAGAMENTO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. 1. É constitucional o art. 120 da Lei 8.213/91. O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. 2. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança do trabalho. Nesse prisma, a não-adoção de precauções recomendáveis, se não constitui a causa em si do acidente, evidencia negligência da empresa que, com sua conduta omissiva, deixou de evitar o acidente, sendo responsável, pois, pela reparação do dano, inclusive em ação regressiva ajuizada pelo INSS. 3. A efetiva execução da sentença condenatória proferida na ação regressiva (processo de conhecimento) se fará mediante comprovação dos pagamentos efetuados pelo INSS, vencidos e vincendos. (TRF 4ª Região, AC nº 2000.72.02.000687-7, Rel. Juiz Federal Francisco Donizete Gomes, DJU-II de 13-11-2002)
Desta forma, o ressarcimento perseguido nesta demanda não excede à responsabilidade das empresas, considerando que a ação regressiva em questão tem como fundamento a responsabilidade civil do empregador por ato culposo, gerador de dano à seguridade social. Com efeito, o pagamento de contribuição previdenciária em face dos riscos decorrentes das atividades laborais não pode ser considerado como salvo-conduto a isentar do empregador sua responsabilidade pelos riscos criados ou não reduzidos dentro de seu estabelecimento.
Nessa senda, cabe destacar que a Corte Especial do TRF 4ª Região, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade, declarou constitucional a redação do art. 120 da Lei nº 8.213/91 em face das disposições do art. 7º, XXVIII, art. 154, I, e art. 195, §4º, todos da Constituição Federal, consoante ementa que segue:
'CONSTITUCIONAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE OS ARTS. 120 DA LEI Nº 8.213/91 E 7º, XXVIII, DA CF. Inocorre a inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 (Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.) em face da disposição constitucional do art. 7º, XXVIII, da CF (Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;), pois que, cuidando-se de prestações de natureza diversa e a título próprio, inexiste incompatibilidade entre os ditos preceitos. Interpretação conforme a Constituição. Votos vencidos que acolhiam ante a verificação da dupla responsabilidade pelo mesmo fato. Argüição rejeitada, por maioria.' (TRF 4ª Região, INAC 1998.04.01.023654-8, Corte Especial, rel. p/ Acórdão Manoel Lauro Volkmer de Castilho, DJU de 13-11-2002)
Cabe ainda citar o seguinte trecho do voto do relator do acórdão:
'Salvo engano, não há incompatibilidade entre o art. 7º, inciso 28, da Constituição, e o art. 120 da Lei 8.213/91. Assim porque estou lendo o inc. 28 de modo diverso ao que faz a eminente Relatora. Penso que, quando a Constituição garante aos trabalhadores esse direito de seguro contra acidente de trabalho a cargo do empregador, é o custeio que ele faz perante a Previdência. Diz a Constituição em seguida: ... 'sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa'. A Constituição não diz que essa indenização é ao empregado. A Constituição diz que o empregador fica responsável por uma indenização se ele der causa ao acidente por culpa ou dolo. O direito dos trabalhadores urbanos e rurais é o seguro contra acidente de trabalho; foi isso que se garantiu na Constituição. Se essa leitura é compatível do jeito que estou a propor, não há divergência entre o art. 120 da Lei nº 8.213 e este inciso, porque, quando o art. 120 diz que a Previdência vai propor ação de regresso, é justamente para se ressarcir daquilo que pagou por responsabilidade objetiva ao empregado, tendo o empregador tido culpa ou dolo. (...)
De modo que, se isso é verdadeiro, o ressarcimento ou a indenização, conforme o termo da Constituição, se é devido, é devido à Previdência Social, que atendeu o direito, garantido pela Constituição, ao empregado. Não estou vendo a incompatibilidade que se quer extrair, e mais, a inconstitucionalidade que se quer ler no dispositivo mencionado. De qualquer modo, se a regra tivesse a leitura afirmada pela Relatora, também não seria incompatível com a da Constituição, pois que, tendo títulos diversos, tanto o empregador tem de contribuir, quanto, sendo culpado, haverá de indenizar quem pagou o seguro, isto é, o INSS e a quem causar dano, e nessa perspectiva, não acontece inconstitucionalidade.'
Enfrentadas essas questões, passa-se à análise da matéria de fato envolvida na demanda.
De acordo com os dispositivos legais anteriormente citados, a responsabilidade da empresa pressupõe a existência de negligência, tratando-se, portanto, de responsabilidade subjetiva. Deste modo, para que se configure é necessária a existência de nexo de causalidade entre a conduta omissiva ou comissiva do empregador e o evento que deu causa à prestação previdenciária.
De acordo com a perícia médica realizada no âmbito do processo nº 0001160-33.2010.5.04.0403, os fatos ocorreram da seguinte forma (págs. 2-3 do LAU17, evento 10):
'HISTÓRIA CLÍNICA OCUPACIONAL:
Relata o reclamante que em 20-02-2008, quando estava trabalhando na lateral da carreta, um colega movimentou o produto sem colocar o mesmo em gabarito, colocou uma corrente, e movimentou o produto com a ponte rolante. A peça girou e prensou a perna direita do reclamante tocando a parte posterior do joelho e inferior da coxa, e empurrando o mesmo de encontro ao cubo da roda. A pancada foi de traz para a frente, no sentido horizontal, prensando a perna do reclamante. Aconteceu o traumatismo, foi caminhando para a enfermaria da empresa e de lá foi encaminhado ao hospital do Círculo. Após aconteceu um pequeno edema.
No Hospital realizaram RX que não mostrou alteração e lhe foi prescrito medicação. Foi atendido e tratado pelo Traumatologista Dr. Leonardo do Nascimento, que realizou tratamento medicamentoso, não havendo qualquer intervenção cirúrgica, nem punção para drenagem de edema. Foi emitida CAT pela empresa e encaminhado ao Benefício Previdenciário, permanecendo afastado por aproximadamente três meses, sendo que após teve alta previdenciária, realizou exame de retorno ao trabalho e retornou, realizando a operação de solda.
Seu retorno ao trabalho foi em maio de 2008, trabalhando por 1 ano, eventualmente consultava médico na empresa, era medicado, e não houve necessidade de novo afastamento devido a este motivo.
Em abril de 2009, foi consultar com outro Traumatologista, Dr. Clademir Ortigara, que solicitou Ressonância Magnética, onde apareceu alteração em joelho que era 'extensa ruptura de menisco e desgaste patelar' (SIC). Em maio de 2009, realizou cirurgia e foi encaminhado ao Benefício Previdenciário, permanecendo até a presente data.
Atualmente realiza fisioterapia, toma medicação Doxelene, Profenid, Flotac.
Relata que tem, também, dor em joelho Esquerdo e dor em coluna lombar, com desgaste em joelho esquerdo e em coluna lombar.
Nega internações hospitalares, nega cirurgias outras, nega uso de fumo, nega uso de bebida alcoólica. Não era praticante de exercícios físicos, realizando eventuais caminhadas, nega doenças graves. É alérgico a picada de abelha.'
Por ocasião da 'Comunicação de Acidente de Trabalho - CAT', a empresa ré descreveu o acidente de forma sucinta, apenas informando que 'no giro de um Dolly teve a perna direita prensada contra outro produto' (OUT18, evento 10).
Realizada a perícia judicial no âmbito deste processo, o perito fez as seguintes afirmações (LAU1, evento 84 - grifos acrescidos):
' (...) 8.4 OS RECURSOS DE SAÚDE
O autor refere que realizou os exames admissional e periódicos.
Refere que havia Serviço Especializado de Segurança e Medicina do Trabalho interno.
Refere que havia Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA).
Relata que recebeu o Plano de Saúde SSI.
Relata que recebeu os equipamentos de proteção individual (EPI) adequadamente.
Informa que recebeu uniforme, avental, luva, bota, óculos, protetor auricular, toca, máscara de solda, creme e mangote.
Refere que havia ginástica laboral em outros setores.
Tem convênio com academia de ginástica.
09. RELATO DO QUADRO DE SAÚDE
9.1 ACIDENTE E SOCORRO
Refere que sofreu um acidente típico no dia 20/02/08 na cidade de Caxias do Sul às 14h30min.
Relatou que estava trabalhando em uma carreta na parte lateral, de costas para outra linha de produção.
Um colega desta outra linha fez o giro da carreta sem colocar o gabarito e havia somente uma corrente.
Este funcionário (Hélio) teria de ter acionado uma sirene e avisado os colegas da manobra.
A carreta virou e girou com a corrente no meio, deu um tranco e ficou pendente.
Esta desestabilizou devido ao peso do Dolly na ponta da carreta, e havia um cambão de ferro na frente, este cambão atingiu diretamente as duas pernas prensando as pernas contra o cubo da roda da carreta em que trabalhava.
Refere que houve esmagamento e que machucou somente o joelho direito.
Refere que foi socorrido pela Brigada de Incêndio e atendido na Emergência do Hospital Medianeira pelo Dr. Leonardo.
Nega ter realizado artrocentese na época do acidente.
Nega perda de consciência. Nega fratura de ossos. Nega ferimento corto-contuso.
Refere ter sido submetido a tratamento cirúrgico ortopédico somente 01 ano depois do trauma, realizado duas artroscopias em joelho direito e uma no esquerdo, com Dr. Ortigara, no Hospital Pompéia.
Nega imobilização com aparelho gessado, mas refere que ficou 01 mês e meio sem poder caminhar.
Refere que realizou 80 sessões de fisioterapia.
Refere o uso atual das seguintes medicações: Diacereína, Etna, Dolamin Flex, Codaten e Toragesic.
O autor informa como queixa atual muita dor e a necessidade de se manter em tratamento fisioterápico, relata que, segundo o seu médico assistente, não tem volta o problema.
Refere que depois do trauma também começou a sentir dor no joelho contralateral.
(...)
14. CONCLUSÃO
Houve um acidente típico.
O nexo é do tipo concausa (tipo III da classificação de Schilling).
A concausa é superveniente.
Há incapacidade laborativa do ponto de vista ortopédico.
A incapacidade é parcial e temporária para a atividade habitual de soldador.
(...)
16. RESPOSTAS AOS QUESITOS DAS PARTES
16.1 JUÍZO
(...)
3) qual a origem da patologia e se poderia ter sido evitada pelo uso de equipamentos de proteção individual ou melhor adequação do local de trabalho?
O aviso prévio à movimentação por meio de sirene poderia ter evitado o trauma.
(...)
14) O art. 21, inciso I, da Lei nº 8.213/91, dispõe que se equipara ao acidente do trabalho, para efeitos dessa Lei, o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação. A incapacidade do trabalhador que originou a concessão do benefício de auxílio-doença em maio de 2009 enquadra-se nessa situação? Fundamente.
Há enquadramento, há concausa.
(...)
16.3 RÉU
(...)
12-) O acidentado tinha treinamento e experiência na função no momento do acidente? Se positivo, quanto tempo ele trabalhava no setor e na função quando ocorreu o infortúnio?
Sim.
(...)
15-) Eventuais seqüelas decorrentes exclusivamente do acidente de trabalho, estão consolidadas ou podem ser passiveis de melhoras mediante tratamento?
Há indicação de cirurgia. (...)'
O médico do trabalho, Sr. Renato Guerino Pezzi, que realizou a perícia no âmbito da ação trabalhista movida pelo segurado contra a ora requerida, foi ouvido nestes autos como testemunha, tendo feito as seguintes afirmações (grifos acrescidos, evento 161):
* TESTEMUNHA: RENATO GUERINO PEZZI
'(...) JUÍZA: E o senhor recorda alguma coisa do caso concreto?
TESTEMUNHA: Sim, recordo.
JUÍZA: O que houve, ao que o senhor se recorde?
TESTEMUNHA: O Senhor Samuel teve um acidente de trabalho, em que ele era soldador e montador dentro da RANDON. Ele estava soldando a lateral de um produto e esse produto normalmente é soldado sobre um gabarito, ou seja, fixo. Um colega dele resolveu movimentar uma peça desse produto com uma ponte rolante; a ponte rolante soltou na corrente, a peça se movimentou, pegou na face posterior do joelho direito do Samuel e imprensou, então, o joelho 'incompreensível' roda do produto. Esse é o acidente relatado. Ele foi atendido na enfermaria da Randon, foi levado ao hospital, lá foi radiografado, no raio X não apareceu nada, nenhuma alteração aguda, um derrame sanguinolento, ou qualquer coisa assim. Esse raio X é informação dele, eu não vi o raio X, a informação dele é que não deu nada. Chamaram um traumatologista e ortopedista renomado, Doutor Leonardo Nascimento, que o atendeu e ficou com ele durante um período de afastamento por três meses. A partir daí, ele teve alta, foi encaminhado para a perícia previdenciária, teve alta novamente e retornou ao trabalho.
JUÍZA: O senhor recorda quanto tempo depois ele ajuizou essa reclamatória trabalhista, ou não?
TESTEMUNHA: A reclamatória trabalhista, exatamente, eu não sei. Eu sei sobre a evolução, que ele continua trabalhando, trabalhou normalmente na empresa por um ano. Mais uma coisa, nesse meio tempo, naqueles três meses, ele fez uma ressonância, não fez somente um raio X simples, ele fez uma ressonância magnética que mostrou pequenas áreas de hematoma dentro da articulação, não mostrou lesão meniscal, não mostrou nada alterado nesse sentido. Um ano depois, ele voltou a consultar com outro traumatologista e esse traumatologista fez uma solicitação de ressonância magnética em que apareceu uma lesão de menisco, e essa lesão o levou a uma cirurgia. Depois dessa cirurgia, acredito que ele não retornou mais, porque ele esteve afastado, e, concomitante a isso, ele fez uma cirurgia no outro joelho, no joelho esquerdo, que não foi atingido nesse acidente. A partir daí, o que eu sei até hoje é que ele não tinha retornado ao trabalho.
JUÍZA: Na época da reclamatória trabalhista, quando o senhor teve acesso a essas considerações, ele já tinha feito a cirurgia ou não?
TESTEMUNHA: A segunda cirurgia já tinha sido feita. (...)
JUÍZA: E o senhor chegou a ir lá na empresa?
TESTEMUNHA: Sim, eu faço algumas assistências técnicas para a empresa do Grupo Randon, não só para o grupo Randon, mas para Marcopolo e algumas outras empresas. Basicamente, a atividade exige, além do meu conhecimento de Medicina do Trabalho, que vem desde 1976, exige o conhecimento das empresas, do chão de fábrica. (...)
JUÍZA: E a questão da sirene de alerta, de movimentação, por que não funcionou na época? Consta aqui que ele não teria utilizado o gabarito que se coloca a peça.
TESTEMUNHA: Sim, essa outra pessoa não utilizou o gabarito, não acionou, não avisou e em função disso é que houve essa batida. (...)
PROCURADORA DA PARTE RÉ: Sim, o que era a patologia denominada Geno Valgo?
TESTEMUNHA: Geno Valgo é uma alteração congênita, isto é, é uma alteração de nascimento.
JUÍZA: Joelho torto, não é?
TESTEMUNHA: Exatamente, o joelho sofre uma inclinação. É uma patologia que deve ser corrigida até os oito anos de idade no máximo, caso contrário, há uma sobrecarga mecânica no joelho, o que favorece o desgaste, as lesões meniscais. O menisco é um amortecedor, é uma estrutura que amortece choques, e o Geno Valgo faz com que os meniscos se sobrecarreguem. Então, independente de trauma, ...
JUÍZA: Pode haver a lesão?
TESTEMUNHA: Independente de trauma, o menisco rompe. Com o tempo, o menisco sempre vai romper se não houver correção até essa idade. Até essa idade é uma correção incruenta, não há necessidade de intervenção cirúrgica, posteriormente tem que haver cirurgia.
JUÍZA: Mas é bem comum?
TESTEMUNHA: Bem comum.
PROCURADORA DA PARTE RÉ: É uma lesão congênita?
TESTEMUNHA: É congênita, vem com o nascimento da pessoa.
PROCURADORA DA PARTE RÉ: E o senhor Samuel é portador dessa patologia?
TESTEMUNHA: É portador dessa patologia, em ambos os joelhos.
PROCURADORA DA PARTE RÉ: Depois de passado essa fase da infância, da adolescência, qual é o tratamento e se tem correção essa patologia?
TESTEMUNHA: Sim, tem correção cirúrgica, existe correção, ainda mesmo na idade adulta, só que a correção é cirúrgica; enquanto, na infância, são colocadas umas hastes metálicas. Para a correção depois dessa fase dos oito, dez anos de idade, é cirúrgica. (...)
PROCURADORA DA PARTE RÉ: Então, é possível dizer que essa lesão que ocorreu um ano depois do acidente seja decorrente da compleição física da vítima e não do acidente?
TESTEMUNHA: Eu diria que sim. Como o acidente ocorreu, não é um acidente em que envolveu torção, não é um acidente que acontece com atleta profissional que faz uma torção devido à queda, torce e rompe o menisco; o acidente dele foi um traumatismo de trás do joelho, de trás para frente, prensou, foi um acidente na horizontal, não houve torção. Tanto não houve, que na ressonância magnética de dois meses depois do acidente, não havia meniscos rompidos. Essa lesão meniscal que apareceu um ano depois decorreu, certamente, pelo Geno Valgo e pela obesidade de que ele é portador, então, o peso dele também faz com que o joelho force, porque é um peso que está em cima de uma articulação que está torta, forçando. (...)
PROCURADORA DO INSS: Antes do acidente o Seu Samuel trabalhava plenamente na empresa. O acidente agravou a patologia do joelho do Seu Samuel, que o senhor afirmou que ele já tinha um desgaste?
TESTEMUNHA: Eu diria que não.
PROCURADORA DO INSS: Não agravou?
TESTEMUNHA: Não agravou. Temos que ver, ergonomicamente, como aconteceu, como é que se relata, como é que ele relata e como é que aconteceu o acidente. O acidente foi um trauma de trás para frente, fazendo com que o joelho tenha sido prensado na horizontal, não houve torções. Meniscos rompem por trauma, por congênito, ou por degeneração. Uma lesão meniscal por trauma sempre envolve um mecanismo violento de torção, que é muito chamativo. Ele faz uma hemartrose, que é um derrame articular com sangue, isso envolve um atendimento médico, uma pulsão, uma artrocentese, para retirar esse sangue, para depois fazer a cirurgia. Nada disso houve na história dele. A história dele é esse trauma que foi radiografado, e não apareceu nada; feita a ressonância dois meses depois, não apareceu; o exame meniscal, não apareceu nada. Então, eu diria que não agravou a lesão dele, eu diria que a lesão dele apareceria de qualquer maneira independentemente de ter havido essa batida ou não. (...)'
Considerando as afirmações da referida testemunha, cumpre citar trechos do laudo pericial complementar apresentado pelo perito designado nestes autos e, portanto, profissional neutro, que não possui relação alguma com quaisquer das partes (LAU1, evento 97):
'PREÂMBULO
Houve acidente típico.
O exame de ecografia do joelho e perna direita datado de 10/04/08 descreveu lesões com aspecto de hematomas organizados, devendo também considerar celulite subcutânea.
O exame é taxativo.
Há nexo técnico.
Haveria hematoma organizado num exame realizado em 10/04/08 se não houvesse um trauma de alta energia em 20/02/08, cinqüenta dias antes?
Este argumento é insofismável, pois sem o agente (trauma severo) não haveria o dano (hematoma).
Ratifico o laudo pericial. Que impacto é necessário para que um hematoma persista por 50 dias e gere um afastamento laboral de 90 dias?
QUESITOS COMPLEMENTARES (...)
6-) Considerando que o acidente de trabalho ocorreu em 20.02.2008, e de que o autor retornou do afastamento em maio de 2008, trabalhou normalmente por 1 ano e depois afastou-se novamente em maio de 2009, não seria possível considerar que esse novo afastamento estivesse relacionado a outro trauma, inclusive doméstico, e não necessariamente ao acidente de mais de um ano atrás? Ou seja o perito do Juízo pode descartar com certeza que esse afastamento em maio de 2009 não teve outros fatores como concausa que não o acidente de fev de 2008? Se positiva a resposta, favor esclarecer.
Não, porque a ecografia da época do trauma revelou lesão extensa no joelho direito e perna direita.'
Verifica-se, portanto, o nexo causal entre o acidente e os benefícios previdenciários.
Desse modo, a questão está centrada em aferir se houve negligência do empregador quanto às normas padrão de segurança do trabalho e, em caso positivo, se tal negligência concorreu de alguma forma para o evento danoso.
Nesse passo, as provas carreadas aos autos comprovam que o acidente ocorreu em virtude de negligência da ré, no que respeita à observância das normas necessárias à segurança dos empregados. Saliente-se que se o serviço estivesse sendo executado de forma devida, ou seja, com a peça fixa ao gabarito e com a sua movimentação mediante sinalização prévia, o acidente não teria ocorrido.
Desta forma, não há como afastar a culpa da empregadora, considerando que a empresa é responsável tanto pelo treinamento e conscientização de seus funcionários, como pelo controle das atividades e adoção de medidas eficazes na prevenção de acidentes. Nesse passo, é preciso recordar que a Consolidação das Leis do trabalho define a relação de trabalho como sendo de subordinação do empregado, cumprindo ao empregador dirigir e fiscalizar a execução dos serviços prestados: 'Artigo 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário'.
Portanto, não basta a existência de normas de conduta, ou que os avisos e os equipamentos de proteção estejam à disposição dos trabalhadores. As normas de segurança são de caráter obrigatório, assumindo o empregador o risco pela sua negligência em cobrar de modo efetivo sua observância pelos empregados. Nesse sentido:
'ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA EMPREGADOR. DOCUMENTOS. AUTENTICAÇÃO. OMISSÃO. - Afastada a irregularidade no que diz respeito aos documentos juntados pela autarquia requerente por ausência de autenticação. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e desta Corte entendem que os documentos públicos gozam de presunção de veracidade, mesmo quando apresentados em cópias não autenticadas, sendo invalidáveis por incidente de falsidade. - Correta a decisão, que presente a omissão da requerida no seu dever de prevenir acidentes do trabalho, descumpriu as normas legais que disciplinam a matéria. - Quanto as alegações de violação ao direito de propriedade e ao princípio da universalidade de jurisdição, não examinadas em face da ausente fundamentação.' (TRF 4ª Região, AC 2000.72.02.000688-9/SC, rel. Vânia Hack de Almeida, DJU-II de 27-07-2005, p. 686)
'PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA CONTRA EMPREGADOR. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. CULPA EXCLUSIVA. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. ART. 602 DO CPC. 1. Pretensão regressiva exercitada pelo INSS face à empresa, com amparo na Lei nº 8.213/91, art. 120. 2. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas conseqüências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada, afirmando de modo simplista que cumpriu com seu dever apenas estabelecendo referidas normas. 3. Os testemunhos confirmam que medidas de segurança recomendadas não foram adotadas. 4. A pessoa jurídica responde pela atuação desidiosa dos que conduzem suas atividades, em especial daqueles que têm o dever de zelar pelo bom andamento dos trabalhos. 5. Para avaliarmos, diante de um acidente de trabalho, se a eventual conduta imprudente de um empregado foi causa do evento, basta um raciocínio simples: se essa conduta imprudente fosse realizada em local seguro, seria, ela, causadora do sinistro? No caso, a forma como eram transportadas as pilhas de chapas de madeira (sem cintamento e uma distância razoável entre elas) denota a falta de prevenção da empresa. 6. Em se tratando de ressarcimento dos valores dispendidos pelo INSS em virtude da concessão de benefício previdenciário, é infundada a pretensão da apelante de limitar sua responsabilidade pelos prejuízos causados, visto que o pagamento daquele não se sujeita à limitação etária preconizada no apelo. 7. Pela mesma razão, não tendo sido a empresa condenada a prestar alimentos à dependente do de cujus, e sim ao ressarcimento do INSS, não cabe a aplicação da norma contida no art. 602 do CPC, que constitui garantia de subsistência do alimentando, para que o pensionamento não sofra solução de continuidade. 8. Parcialmente provido o recurso para excluir da condenação a constituição de capital. (TRF 4ª Região, AC 1998.04.01.023654-8/RS, Rel. Marga Inge Barth Tessler, DJU-II de 02-07-2003, p. 599)
'ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. CABIMENTO. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA. RESPONSABILIDADE. PROVA DO PAGAMENTO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. 1. É constitucional o art. 120 da Lei 8.213/91. O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. 2. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança do trabalho. Nesse prisma, a não-adoção de precauções recomendáveis, se não constitui a causa em si do acidente, evidencia negligência da empresa que, com sua conduta omissiva, deixou de evitar o acidente, sendo responsável, pois, pela reparação do dano, inclusive em ação regressiva ajuizada pelo INSS. 3. A efetiva execução da sentença condenatória proferida na ação regressiva (processo de conhecimento) se fará mediante comprovação dos pagamentos efetuados pelo INSS, vencidos e vincendos.' (TRF 4ª Região, AC 2000.72.02.000687-7, Rel. Francisco Donizete Gomes, DJU-II de 13-11-2002, p. 973)
Deste último acórdão, convém colacionar o seguinte excerto, extraído do voto proferido pelo relator:
'É fato incontroverso nos autos, por exemplo, a inexistência de ordens de serviço por escrito dando instruções ao operador sobre os riscos da atividades e como evitá-los, não se prestando a suprir tal exigência, que consta da Norma Regulamentadora nº 1, do Ministério do Trabalho, o fato dos trabalhadores terem recebido treinamento quanto à operação da máquina e procedimentos de segurança. (...)
Não há dúvida que o trabalhador foi imprudente ao não utilizar o pilão para pressionar a carne, isto sobre um piso escorregadio. Todavia, se houvesse uma fiscalização mais rigorosa para forçar o uso do pilão pelos empregados ou se houvesse um mecanismo de proteção que impedisse a mão de escorregar para dentro do moedor ou, ainda, se a plataforma estivesse fixada ao piso (escorregadio) certamente o acidente teria sido evitado. Ou seja, embora não constituam a causa única do acidente, se as medidas preventivas citadas tivessem sido adotadas, o acidente teria sido evitado. É aí que reside a culpa da ré pelo acidente, impondo-lhe o dever de ressarcir o INSS pelas despesas efetuadas.'
Em suma, não há como afastar a responsabilização da empresa ré pelo acidente que provocou as lesões no joelho direito e o afastamento do funcionário Samuel Borges, já que, caso tivessem sido adotadas medidas de segurança eficientes, a lesão não teria ocorrido.
Assim, uma vez comprovada a culpa da ré no evento danoso, impõe-se a condenação da empresa demandada a ressarcir ao INSS os valores despendidos com o pagamento dos benefícios de auxílio-doença - NB 91/529.343.363-2, durante o período de 20-02-2008 a 08-05-2008, e NB nº 91/535.592.011-3, durante o período de 09-05-2009 a 21-06-2012 - data em que foi cessado, conforme informação obtida junto ao CNIS do autor.
Os valores já desembolsados pela autarquia serão corrigidos monetariamente pelo IPCA-E desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora de 6% ao ano, desde a citação.
De outra parte, por se tratar de ressarcimento, via regressiva, dos valores despendidos pelo INSS em virtude da concessão de benefício previdenciário, não cabe a aplicação da norma contida no art. 475-Q do CPC. Isso porque a constituição de capital visa a garantir o cumprimento de prestação de alimentos, tratando-se, portanto, de garantia à subsistência do alimentando, para que o pensionamento não sofra solução de continuidade. Assim, como o pedido veiculado na presente demanda não é de condenação ao pagamento de prestação alimentícia, mas sim ao ressarcimento de valores pagos pelo INSS ao segurado, não há subsunção da norma invocada ao caso presente.
ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedente o pedido para condenar a empresa ré a ressarcir ao INSS os valores pagos em razão da concessão dos benefícios de auxílio-doença (NB 91/529.343.363-2, durante o período de 20-02-2008 a 08-05-2008, e NB nº 91/535.592.011-3, durante o período de 09-05-2009 a 21-06-2012 - data em que foi cessado - conforme consulta ao CNIS do autor). Os valores deverão ser corrigidos monetariamente pelo IPCA-E desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora de 6% ao ano, desde a citação."
Logo, tendo restada comprovada a culpa da ré no evento danoso, impõe-se sua condenação a ressarcir o INSS pelos valores despendidos com o pagamento dos benefícios de auxílio-doença - NB 91/529.343.363-2, durante o período de 20-02-2008 a 08-05-2008, e NB nº 91/535.592.011-3, durante o período de 09-05-2009 a 21-06-2012 - data em que foi cessado, conforme informação obtida junto ao CNIS do autor.
Igualmente descabida o pleito sucessivo do apelante no sentido de determinar o ressarcimento somente do benefício concedido entre 20-02-08 a 08-05-2008. Isso porque a perícia judicial respondeu de forma clara e objetiva quanto a impossibilidade de considerar o novo afastamento como relacionado a outro trauma, vinculando o segundo afastamento do segurado ao acidente ocorrido há mais de um ano atrás. Vejamos o conteúdo do laudo judicial:
"(...) QUESITOS COMPLEMENTARES (...)
6-) Considerando que o acidente de trabalho ocorreu em 20.02.2008, e de que o autor retornou do afastamento em maio de 2008, trabalhou normalmente por 1 ano e depois afastou-se novamente em maio de 2009, não seria possível considerar que esse novo afastamento estivesse relacionado a outro trauma, inclusive doméstico, e não necessariamente ao acidente de mais de um ano atrás? Ou seja o perito do Juízo pode descartar com certeza que esse afastamento em maio de 2009 não teve outros fatores como concausa que não o acidente de fev de 2008? Se positiva a resposta, favor esclarecer.
Não, porque a ecografia da época do trauma revelou lesão extensa no joelho direito e perna direita.'
Assim, em que pesem as alegações do recorrente, na há, nos presentes autos, fundamentos que autorizem a reforma da sentença, motivo pelo qual a mantenho por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Com efeito, o Juízo de origem está próximo das partes, realizou ampla dilação probatória, devendo ser prestigiada sua apreciação dos fatos, não existindo nos autos situação que justifique a alteração do que restou decidido.
Do prequestionamento
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo retido e à apelação.
É o voto.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/07/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001916-68.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50019166820114047107
RELATOR | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PRESIDENTE | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PROCURADOR | : | Dr. Fabio Bento Alves |
APELANTE | : | RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES |
ADVOGADO | : | Cecília Debiasi de Lima de Almeida |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/07/2015, na seqüência 158, disponibilizada no DE de 08/07/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
: | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE | |
: | Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
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