Apelação Cível Nº 5065452-05.2019.4.04.7000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ELIANE CELESTINO LUIZ (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de ação pelo procedimento ordinário em que a autora postula a condenação do INSS a pagar-lhe danos morais, em razão de demora injustificada no restabelecimento de seu benefício previdenciário, no valor de R$ 60.000,00 e, sucessivamente, ao pagamento de R$ 10.000,00.
Alega que: a) ajuizou ação destinada ao recebimento de um auxílio-doença; conforme acordado nos autos do referido processo, ... permaneceria recebendo o benefício enquanto não concluísse sua reabilitação profissional, promovida pelo INSS, tendo inclusive iniciado os procedimentos de reabilitação conforme caderneta de frequência que segue em anexo; no entanto, o INSS cessou indevidamente o seu benefício sob o argumento de não comparecimento à reabilitação profissional; sendo assim, ajuizou nova demanda destinada a restabelecer o auxílio doença, julgada, enfim, procedente; durante o curso daquela nova demanda judicial, o INSS verificou a ocorrência do erro administrativo na cessação do benefício de auxílio doença (NB 615.1923.213-0), restabelecendo o benefício, mediante pagamento das prestações vencidas desde a cessação indevida; b) trata-se de falha inadmissível que trouxe prejuízo direto à sobrevivência da segurada no período em que esteve desamparada, que inclusive gerou danos monetários e atraso de contas familiares; c) o ato ilícito praticado foi o erro no sistema do INSS, que ocasionou o cancelamento do benefício da parte autora e, portanto, gerou o dano, lhe deixando sem meios de sustento por seis meses (com necessidade de ajuizamento de nova ação judicial) até que finalmente conseguisse reverter tal situação judicialmente; o nexo de causalidade, por sua vez, surge pelo fato de ser o INSS gestor único e exclusivo de seus sistemas de gerenciamento dos benefícios concedidos, o que lhe torna o único responsável pelas falhas ocorridas e para responder pelos danos causados.
Devidamente processado o feito, sobreveio sentença proferida com o seguinte dispositivo:
Diante do exposto, julgo procedente o pedido formulado pela autora. Condeno o INSS a pagar indenização por danos morais, que fixo em R$ 10.000,00.
Condeno o INSS ao pagamento de eventuais custas adiantadas pela autora e também ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo nos percentuais mínimos previstos no artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC, a incidirem sobre o valor da condenação.
Quanto aos índices de correção monetária e de juros moratórios, vale lembrar que recentemente o plenário do STF reafirmou decisão daquela Corte que definiu o IPCA-E, e não mais a TR, como o índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, mesmo no período da dívida anterior à expedição do precatório. Por maioria, os ministros negaram quatro embargos de declaração no RE 870.847 e decidiram por não modular a decisão do plenário.
Por isso, os valores devidos pelo INSS deverão ser corrigidos segundo a variação do IPCA-E.
Por sua vez, os juros moratórios, de acordo com a Lei nº 12.703/2012 e previsão no Manual de Cálculos da Justiça Federal, devem corresponder ao mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a:
- 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%;
- 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos.
P.R.I.
Opostos embargos de declaração, foram os mesmos acolhidos em parte para reconhecer omissão quanto ao marco inicial da correção monetária e dos juros, sanando-se o vício apontado no seguintes termos: "Uma vez que não a parte autora não se opõe às pretensões do INSS, a correção monetária deverá fluir desde a data em que a sentença foi prolatada, assim como os juros moratórios, nos termos do artigo 407 do Código Civil" (evento 28).
O INSS apelou (ev. 34). Alega que, em que pese a autora fundamentar seu pedido no fato de que foi privada dos valores do benefício quando da cessação do benefício em meados de agosto/2018, note-se que o ajuizamento da demanda somente ocorreu em novembro/2018. Nesse diapasão, não consta que a autora tenha requerido administrativamente, preferindo buscar a via judicial. Portanto, a demora para o restabelecimento do benefício não decorreu da inércia do INSS, que adotou as providências tão-logo tomou conhecimento do caso em referência, mas sim da própria inércia da autora. Salienta que o mero indeferimento de benefício previdenciário não caracteriza conduta ilícita por parte da Autarquia Previdenciária que enseje a reparação de dano moral. Pelo principio da eventualidade, requer seja dado provimento quanto a sucumbência da parte autora na diferença entre o valor pretendido (R$60.000,00) e o valor fixado (R$10.000,00).
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Adotou-se, no Brasil, no que concerne às entidades de direito público, a responsabilidade objetiva com fulcro na teoria do risco administrativo, sem, todavia, adotar a posição extremada dos adeptos da teoria do risco integral, em que o ente público responderia sempre, mesmo presentes as excludentes da obrigação de indenizar, como a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro e o caso fortuito e a força maior.
De acordo com esta teoria, para que haja o dever de indenizar é irrelevante a culpa na conduta do agente, bastando o nexo de causalidade entre fato e dano. Veja-se a redação do referido artigo:
§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelo danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
A configuração da responsabilidade do Estado, portanto, em regra, exige apenas a comprovação do nexo causal entre a conduta praticada pelo agente e o dano sofrido pela vítima, prescindindo de demonstração da culpa da Administração.
O indeferimento do benefício previdenciário na via administrativa por si só não implica direito à indenização, ainda que futuramente venha a ser concedido judicialmente. Isso porque a Administração age no exercício de sua função pública, dentro dos limites da lei de regência e pelo conjunto probatório apresentado pelo segurado. Assim, não se cogita de dano moral se não há procedimento flagrantemente abusivo por parte da Administração, "já que a tomada de decisões é inerente à sua atuação" (APELREEX 2006.71.02.002352-8, Desembargador Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. de 16/11/2009).
No caso presente, a apelada obteve a homologação do pedido de restabelecimento do seu auxílio-doença nos autos nº 5050938-81.2018.4.04.7000/PR, cuja sentença tem o seguinte teor:
1. Relatório
A parte autora, 43 anos, requer o restabelecimento do benefício de auxílio-doença desde a data da cessação do benefício (DCB 31/08/2018, DIB 21/07/2016, NB 31/615.193.213-0), bem como a manutenção do benefício até sua efetiva recuperação laboral.
Requer a condenação do INSS ao pagamento de atrasados, juros e atualização monetária.
No curso da demanda, o INSS reconheceu a ocorrência de inconsistência no sistema e restabeleceu o benefício à parte autora desde 31/08/2018, com o pagamento dos atrasados mediante complemento positivo.
Em contestação, a autarquia requer a improcedência dos pedidos da parte autora, alegando que o benefício já foi restabelecido, os valores atrasados já foram pagos e já convocou a parte autora para o procedimento de reabilitação profissional.
2. Fundamentação
Restabelecimento do benefício por incapacidade
Durante o curso da demanda judicial, após a citação, o INSS verificou a ocorrência do erro administrativo na cessação do benefício de auxílio doença (NB 615.1923.213-0), restabelecendo o benefício, mediante pagamento das prestações vencidas desde a cessação indevida.
Saliento que conforme cálculos anexos a esta sentença, não há diferença de valores de correção monetária e juros de mora.
Os valores devidos foram integralmente adimplidos pelo INSS.
Assim, em relação ao pedido de restabelecimento do benefício, houve o reconhecimento da procedência do pedido da parte autora, nos termos do artigo 487, inciso III, 'a', do Código de Processo Civil.
Da manutenção do benefício
Quanto ao pedido de manutenção do benefício até que a parte autora tenha recuperado sua capacidade laborativa após o procedimento de reabilitação profissional, entendo que a parte autora deverá acompanhar o cronograma de perícias médicas e reabilitação agendadas na esfera administrativa para manutenção do auxílio-doença ou futura conversão em aposentadoria por invalidez (art. 101 da Lei nº 8.213/91).
No entanto, vale consignar que a reabilitação profissional prevista no artigo 89 e seguintes da Lei n.º 8.213/1991, nos arts. 136 a 141 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n.º 3.048/1999,e no Decreto n.º 6.214, de 26 de setembro de 2007, possui a previsão de elegibilidade definida na Resolução n.º 118/INSS/PRES, de 04/11/2010.
E, de acordo com o Manual Técnico de Procedimentos da área de Reabilitação Profissional do INSS (fevereiro de 2018), os critérios de elegibilidade para a realização do programa de reabilitação profissional "são elementos de apoio à decisão médico-pericial e, dessa forma, não devem ser considerados isoladamente sem análise de outros fatores que favoreçam ou desfavoreçam tal encaminhamento. Todos os fatores que influenciem o encaminhamento/elegibilidade devem ser correlacionados" (p. 10).
Vale dizer, a elegibilidade de segurado para encaminhamento à realização de reabilitação profissional ou readaptação profissional é de caráter discricionário do INSS.
Portanto, rejeito o pedido da parte autora de manutenção do benefício até que sua capacidade laborativa seja recuperada.
3. Dispositivo
Ante o exposto:
a) Homologo o reconhecimento do pedido de restabelecimento do beneficio de auxílio-doença NB 615.1923.213-0, desde 01/09/2018, com fulcro no artigo 487, inciso III, 'a', do Código de Processo Civil.
b) Julgo improcedentes os demais pedidos, nos termos da fundamentação, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Sem condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios (art. 55 da Lei nº 9.099/95 c/c art. 1º da Lei nº 10.259/01).
Defiro os benefícios da justiça gratuita.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Caso haja recurso de quaisquer das partes dentro do prazo de 10 (dez) dias, intimem-se os recorridos para, querendo, oferecerem resposta escrita no mesmo prazo, nos termos do § 2º do art. 42 da Lei nº 9.099/95, c/c o art. 1º da Lei nº 10.259/01. Após, apresentadas, ou não, as contrarrazões, remetam-se os autos às Turmas Recursais da Seção Judiciária do Estado do Paraná.
(...)
Na sentença consta que o INSS reconheceu que o benefício foi cessado por inconsistência do sistema e, tão logo detectado o erro, os proventos foram restabelecidos e os atrasados pagos. A autarquia informou em sua defesa que não recorreu da sentença, seguindo-se daí o cálculo dos valores devidos, corrigidos e acrescidos dos consectários legais, e o pagamento em favor da apelada. É o que se depreende, aliás, dos movimentos processuais do processo em questão.
É inquestionável, portanto, que a parte autora recebeu o que lhe era de direito em razão do restabelecimento do auxílio-doença.
Entretanto, verifico que a autora, apesar de argumentar que foi privada do benefício em agosto de 2018, ajuizou a ação de restabelecimento em novembro daquele ano, sem antes procurar a via administrativa visando solucionar, amigavelamente, a questão.
Ao optar diretamente pela via judicial, a parte assumiu o ônus de obter o restabelecimento no transcurso da ação, que nem sempre é célere. Veja-se que somente em fins de março de 2019 o juízo ordenou a citação do INSS, momento em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão de restabelecimento. Tão logo compareceu em juízo, a autarquia corrigiu o equívoco, resultando daí uma sentença homologatória do reconhecimento do pedido.
Nessa perspectiva, o argumento de que a autora "necessitou ajuizar demanda destinada a restabelecer o auxílio-doença" perde bastante força. O que se viu é justamente o contrário. A ação judicial aparentemente não era necessária, na medida em que o INSS não opôs resistência à pretensão ao ser demandado em juízo, do que se conclui que a questão poderia muito bem ter sido solucionada na esfera administrativa.
Ademais, também não socorre à parte apelada o argumento de que o fato de se tratar de privação de verbas de natureza alimentar provoca danos extrapatrimoniais in re ipsa. Ora, além de o relato da inicial não deixar transparecer tenha a demandante experimentado danos dessa espécie pelo erro cometido (e solucionado) pela autarquia previdenciária, fosse assim todo e qualquer erro cometido pelo INSS que privasse seus segurados dos seus proventos, por menos que fosse, geraria, necessariamente, danos morais passíveis de indenização, o que inviabilizaria em última análise a atividade da administração.
Assim, muito embora possa ter causado transtornos, tenho que o ato de cessação do benefício, posteriormente corrigido, não se traduziu dano à esfera subjetiva da segurada, que ultrapasse mero aborrecimento. Não há demonstração de que o INSS, por ato de algum de seus prepostos, desbordou dos limites legais de sua atuação.
Ausentes os pressupostos da responsabilidade civil, afasta-se, em consequência, o dever de indenizar. Nesses termos, colaciona-se outros precedentes deste Tribunal Regional Federal que examinaram casos similares:
CANCELAMENTO/INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL. CONDUTA ILÍCITA OU OMISSIVA DO PODER PÚBLICO. NÃO COMPROVAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR. INEXISTÊNCIA. São três os elementos reconhecidamente essenciais na definição da responsabilidade civil - a ilegalidade, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro. O indeferimento de benefício previdenciário, ou mesmo o cancelamento/não prorrogação de benefício por parte do INSS não se prestam para caracterizar dano moral. Somente se cogita da existência de dano quando demonstrada violação a direito subjetivo e efetivo abalo moral, em razão de procedimento flagrantemente abusivo ou ilegal por parte da Administração, o que no caso concreto inocorreu. (TRF4, AC 0020736-12.2013.404.9999, 4ª Turma, rel.ª Des.ª Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. 8-5-2017)
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSS. DANO MORAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE AUXÍLIO-DOENÇA CESSADO NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSTERIOR CONCESSÃO JUDICIAL. REGULARIDADE DA CONDUTA DA AUTARQUIA. IMPROCEDÊNCIA. - Omissis. - Sendo regular o ato administrativo da autarquia que indefere pedido de concessão ou de prorrogação de auxílio-doença com observância de todos os requisitos legais para a sua prática, inclusive manifestação de profissional habilitado, e não havendo prova de abusos, não há direito à reparação por pretensos danos morais, a despeito de posterior análise judicial favorável ao segurado. - Omissis. (TRF4, AC 5021121-41.2015.404.7108, 3ª Turma, Juíza Federal Maria Isabel Pezzi Klein, juntado aos autos em 9-2-2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DESCABIMENTO. 1. Omissis. 2. Ausente a comprovação de ofensa ao patrimônio subjetivo do autor, inexiste direito à indenização por dano moral. O desconforto gerado pelo não-recebimento temporário do benefício resolve-se na esfera patrimonial, através do pagamento de todos os atrasados, com juros e correção monetária. (AC 5002129-08.2010.404.7108, 5ª Turma, rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 13-11-2012)
Considerando a improcedência do pedido, as custas e os honorários ficam a cargo da parte autora, os quais vão arbitrados em 10% do valor atualizado da causa nos termos do artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil.
Tendo em conta a inversão da sucumbência, inaplicável a majoração recursal prevista no § 11 do artigo 85 do mesmo código, pois tal acréscimo só é permitido sobre verba anteriormente fixada, consoante decidiu o Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AResp nº 829.107).
Fica suspensa a exigibilidade dos valores enquanto mantida a situação de insuficiência de recursos que ensejou a concessão da gratuidade da justiça, conforme o § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil.
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5065452-05.2019.4.04.7000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ELIANE CELESTINO LUIZ (AUTOR)
ADVOGADO: Leandro Gustavo Carneiro Rocha (OAB PR057188)
VOTO DIVERGENTE
A indenização por dano moral, prevista no art. 5º, V, da Constituição Federal de 1988, objetiva reparar, mediante pagamento de um valor estimado em pecúnia, a lesão ou estrago causado à imagem, à honra ou estética de quem sofreu o dano.
Este Tribunal já firmou entendimento no sentido de que a suspensão do pagamento do benefício ou o seu indeferimento não constitui ato ilegal por parte da Autarquia hábil à concessão de dano moral. Ao contrário, se há suspeita de que o segurado não preenche os requisitos para a concessão do benefício, é seu dever apurar se estes estão ou não configurados. Este ato, que constitui verdadeiro dever do ente autárquico, não é capaz de gerar constrangimento ou abalo tais que caracterizem a ocorrência de dano moral.
Para que isto ocorra, é necessário que o INSS extrapole os limites deste seu poder-dever.
O caso, porém, contém a peculiaridade de que, devido a "inconsistências nos seus sistemas de dados", o benefício da autora foi cancelado e somente foi restabelecido após o ajuizamento da ação judicial, o que lhe causou danos morais, pois ficou privada do benefício, de natureza alimentar.
A circunstância de que, detectado o erro, os proventos foram restabelecidos e os atrasados pagos, apenas amenizou as dificuldades enfrentadas, mas não afasta a lesão sofrida.
Diante desse quadro, a sentença deve ser confirmada quanto ao mérito. Transcrevo e adoto seus fundamentos como razões de decidir:
"Os fatos narrados pela parte autora, porém, não dizem respeito a um mero indeferimento de um benefício por parte do INSS, ou a um mero cancelamento prontamente restabelecido.
O INSS, na realidade, prestou mal seus serviços, demorando-se seis meses para restabelecer o pagamento do benefício previdenciário.
Vale destacar que há precedentes dando conta de que é cabível dano moral nos casos de atraso na concessão de uma aposentadoria após dois anos e meio (AgRg nos EDcl no REsp 1540866/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/02/2016, DJe 12/02/2016), ou após três anos de atraso (AgRg no AREsp 478.713/RN, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/09/2014, DJe 16/09/2014).
(...)
Além disso, o benefício só foi restabelecido após o ajuizamento de uma ação judicial, o que reforça a impressão de que o INSS prestou mal os seus serviços. Cabia ao INSS verificar, por conta própria, que cometera um equívoco decorrente de "inconsistências nos seus sistemas de dados".
Por tudo isso, o INSS merece ser condenado ao pagamento de indenização por danos morais, mas não no elevado valor proposto. Arbitro o valor da indenização em R$ 10.000,00, montante que reputo adequado pelas seguintes razões, a saber:
a) a autora teve que esperar por seis meses até ver restabelecido o seu benefício, demora que presumivelmente trouxe-lhe grandes inquietações;
b) a autora, porém, demorou-se dois meses até mover uma ação judicial, sugerindo, assim, que os danos morais, ainda que presumíveis (in re ipsa), não foram tão grandes assim; e
c) já concedi indenizações por dano moral equivalentes a R$ 20.000,00 em ações semelhantes, mas nas quais o atraso na concessão do benefício chegou a expressivos dois anos e meio, de modo que não seria justo, neste caso (em que o atraso não superou seis meses), fixar valor idêntico."
Sucumbência recíproca e honorários advocatícios recursais
Em ação de indenização por danos morais, a fixação do quantum em valor inferior ao requerido não configura sucumbência recíproca ou mínima de alguma das partes, pois o montante deduzido na petição inicial é meramente estimativo. Nesse sentido, a Súmula 326 do Superior Tribunal de Justiça.
No tocante aos honorários advocatícios devidos, o percentual incidente sobre a condenação deverá ser elevado em 2%, nos termos do § 11 do art. 85 do CPC.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5065452-05.2019.4.04.7000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ELIANE CELESTINO LUIZ (AUTOR)
EMENTA
ADMINISTRATIVO. apelação cível. alegação de DEMORA NA ANÁLISE DE PEDIDO ADMINISTRATIVO. danos morais. afastado o dever de indenizar do inss.
1. O indeferimento do benefício previdenciário na via administrativa por si só não implica direito à indenização, ainda que futuramente venha a ser concedido judicialmente. Isso porque a Administração age no exercício de sua função pública, dentro dos limites da lei de regência e pelo conjunto probatório apresentado pelo segurado. Assim, não se cogita de dano moral se não há procedimento flagrantemente abusivo por parte da Administração, "já que a tomada de decisões é inerente à sua atuação" (APELREEX 2006.71.02.002352-8, Desembargador Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. de 16/11/2009).
2. No caso dos autos, a autora, apesar de argumentar que foi privada do benefício em agosto de 2018, ajuizou a ação de restabelecimento em novembro daquele ano, sem antes procurar a via administrativa visando solucionar, amigavelamente, a questão. Ao optar diretamente pela via judicial, a parte assumiu o ônus de obter o restabelecimento no transcurso da ação, que nem sempre é célere. Veja-se que somente em fins de março de 2019 o juízo ordenou a citação do INSS, momento em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão de restabelecimento. Tão logo compareceu em juízo, a autarquia corrigiu o equívoco, resultando daí uma sentença homologatória do reconhecimento do pedido. Nessa perspectiva, o argumento de que a autora "necessitou ajuizar demanda destinada a restabelecer o auxílio-doença" perde bastante força.
3. Assim, muito embora possa ter causado transtornos, tenho que o ato de cessação do benefício, posteriormente corrigido, não se traduziu dano à esfera subjetiva da segurada, que ultrapasse mero aborrecimento. Não há demonstração de que o INSS, por ato de algum de seus prepostos, desbordou dos limites legais de sua atuação.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencido o Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de outubro de 2021.
Documento eletrônico assinado por MARGA INGE BARTH TESSLER, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002635322v4 e do código CRC 9642e176.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 13/07/2021
Apelação Cível Nº 5065452-05.2019.4.04.7000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ELIANE CELESTINO LUIZ (AUTOR)
ADVOGADO: Leandro Gustavo Carneiro Rocha (OAB PR057188)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 13/07/2021, na sequência 5, disponibilizada no DE de 01/07/2021.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL MARGA INGE BARTH TESSLER NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, DA DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL ROGERIO FAVRETO, NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, E DO VOTO APRESENTADO PELA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA ACOMPANHANDO A RELATORA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Divergência - GAB. 31 (Des. Federal ROGERIO FAVRETO) - Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO.
Conferência de autenticidade emitida em 16/10/2021 12:02:10.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 07/10/2021
Apelação Cível Nº 5065452-05.2019.4.04.7000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: JOAO ERNESTO ARAGONES VIANNA por INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: EMERSON SALVADOR DE LIMA por ELIANE CELESTINO LUIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ELIANE CELESTINO LUIZ (AUTOR)
ADVOGADO: EMERSON SALVADOR DE LIMA (OAB PR090222)
ADVOGADO: Leandro Gustavo Carneiro Rocha (OAB PR057188)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/10/2021, na sequência 11, disponibilizada no DE de 21/09/2021.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DO DESEMBARGADOR FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS E DO JUIZ FEDERAL SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA ACOMPANHANDO A RELATORA, A 3ª TURMA AMPLIADA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO O DESEMBARGADOR FEDERAL ROGERIO FAVRETO, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 16/10/2021 12:02:10.