
Apelação Cível Nº 5046508-18.2020.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
APELANTE: ERCILINDA MOREIRA (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Por meio da presente ação, a autora pretende o reconhecimento de fraude na alteração da agência responsável pelo pagamento de seu benefício previdenciário, bem como o imediato retorno dos depósitos na conta em que já os recebia (conta corrente nº 35557-3, da agência nº 3892 do Banco Itaú). Pretende também a condenação do INSS e do Banco Bradesco S/A ao pagamento de indenização pelos danos materiais e morais.
Relata, em síntese, que o benefício previdenciário em questão, de pensão por morte, foi implantado em 02.01.2019, tendo a autora na ocasião escolhido a conta corrente conta corrente nº 35557-3, da agência nº 3892 do Banco Itaú como destinatária dos depósitos.
Entretanto, em 04.2020 não recebeu seu benefício e, ao buscar informações, constatou ter sido vítima de fraude, pois sem seu consentimento, o banco destinatário foi alterado para o Banco Bradesco, em agência situada em São Luís/MA. Em razão disso, formulou requerimento para alteração do banco destinatário, pleiteando o retorno à situação original.
Para receber os benefícios relativos a 04.2020, 05.2020 e 06.2020, foi obrigada a enfrentar filas para sacar pessoalmente os valores no Banco Bradesco. A situação somente foi formalizada em 07.2020.
Ocorre que em 08.2020, a autora foi vítima da mesma fraude, na qual houve nova transferência do Banco destinatário para agência do Bradesco em São Luís/MA. Comunicou o INSS em 09.2020 solicitando o bloqueio de pagamentos e empréstimos e instruindo o pedido com Boletim de Ocorrência.
Entretanto, o bloqueio dos pagamentos não foi efetivado, sob a justificativa de que já existiam mais de duas alterações de localidade dentro do período de 6 meses. Alega que a fraude é grosseira, pois facilmente perceptível a diferença entre os documentos de identidade apresentados. Defende o dever de indenizar, salientando os danos materiais e morais suportados.
Processado o feito, sobreveio sentença (eventos 108 e 132):
Ante o exposto, julgo procedente o pedido da autora para:
a) reconhecer a fraude nos requerimentos administrativos que alteraram a agência destinatária do NB 192.263.563-1 para agências bancárias em São Luís e São José de Ribamar/MA;
b) condenar o INSS a manter a agência destinatária do NB 192.263.563-1 na conta informada pela autora no requerimento administrativo que concedeu o benefício (Agência Centro Cívico do Banco Itaú em Curitiba);
c) condenar o INSS ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 atualizados nos termos da fundamentação;
d) condenar o Banco Bradesco ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 atualizados nos termos da fundamentação;
f) condenar solidariamente os réus ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 16.745,42, atualizados nos termos da fundamentação.
Condeno cada um dos réus ao pagamento de metade das custas, bem como ao pagamento de honorários, os quais fixo em 20% do valor da condenação.
As partes apelam.
BANCO BRADESCO S.A alega em síntese: a) a sua ilegitimidade passiva; b) que não pode ser responsabilizado porque foi mero agente financeiro, servindo apenas como o meio para o recebimento dos valores creditados; c) que deve ser afastada a condenação solidária; d) que inexiste o dano moral ou, alternativamente, que deve ser reduzido o quantum indenizatório; e) que a correção monetária incide apenas a partir da citação válida nesta ação judicial e não do evento danoso.
O INSS alega, em suma, que: a) deve ser afastada a sua responsabilidade, porque não é ente público cujas atribuições se encontre a adoção de medidas de segurança pública; b) não se caracterizou o dano moral.
Ercilinda também apela, requerendo a majoração do quantum indenizatório para R$ 40.000,00 (R$ 20.000,00 em desfavor de cada Apelado).
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
1. A sentença foi assim prolatada (
):(...)
a) Da responsabilidade da instituição financeira
O Banco réu não apresentou nos autos os documentos apresentados para a abertura da conta corrente indicada como destinatária do benefício previdenciário da autora (ag. nº 603163) nos requerimentos formulados perante o INSS em 11.11.2019 e 28.02.2020 (OUT8 e 9 de ev. 01).
Em regra, o ônus de provar a culpa é daquele que alega ter sofrido o dano, por tratar-se de fato constitutivo de seu direito (373, I do CPC). Contudo, em face da incidência da regra do art. 14 do estatuto do Consumidor, a responsabilidade objetiva na prestação de serviços somente será afastada se configuradas as hipóteses previstas no art. 14, §3º do referido diploma, in verbis:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (..)
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Saliento que não há controvérsia quanto à aplicação do CDC às instituições financeiras.
Portanto, a inércia do réu permite supor que os documentos apresentados para a abertura da conta eram os mesmos que instruíram o requerimento administrativo perante o INSS, já que essa operação tinha a finalidade de transferir o benefício da autora essa conta. Desse modo, na p.02 de OUT8/9 de ev. 01 vê-se que há franca divergência entre a Carteira de Identidade apresentada nesse requerimento e aquela exibida pela autora para a concessão do aludido benefício, tanto em relação à foto, como à assinatura, à data de nascimento e aos dados do registro de casamento (p.05/06 de PROCADM7 de ev.01). As carteiras de identidade apresentadas estão colacionadas lado a lado na p. 02 da petição de ev. 62 para melhor visualização.
Desse modo, entendo suficientemente comprovada a fraude noticiada pela autora, a qual se deu perante duas agências diferentes do Banco Bradesco (agência Shopping dos Cosméticos e agência COHAB, considerando os dois requerimentos administrativos formulados perante o INSS).
De consequência, aplicável a Súmula 479 do STJ, segundo a qual "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias."
Nos precedentes que deram origem à Súmula, a justificativa para que a obtenção de empréstimos mediante fraude ou a utilização de documentos falsos passassem de excludente de responsabilidade à responsabilização objetiva é que ilícitos dessa natureza fazem parte do risco da atividade financeira desenvolvida pelos bancos (REsp 1197929/PR).
Portanto, tem o Banco réu o dever de ressarcir os danos que decorreram da fraude e de sua conduta.
b) Da responsabilidade do INSS
No caso das pessoas jurídicas de direito público, a responsabilidade civil encontra fundamento no §6º do artigo 37 da Constituição que tem a seguinte redação:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
§ 6.º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Denota-se de tal dispositivo que quando a Administração Pública causar prejuízos a outrem fica obrigada a repará-los. Como se vê, nosso ordenamento jurídico acolhe a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, ou seja, em tema de responsabilidade civil do Estado, prescinde-se da demonstração de culpa, bastando a ocorrência do dano, decorrente de uma ação ou omissão estatal.
Sobre o mencionado dispositivo Hely Lopes Meirelles explica:
O § 6º do art. 37 da CF seguiu a linha traçada nas Constituições anteriores, e, abandonando a privatística teoria subjetiva da culpa, orientou-se pela doutrina do Direito Público e manteve a responsabilidade civil objetiva da Administração, sob a modalidade do risco administrativo. Não chegou, porém, aos extremos do risco integral. É o que se infere do texto constitucional e tem sido admitido reiteradamente pela jurisprudência, com apoio na melhor doutrina.
(Direito Administrativo Brasileiro. 21ª edição. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 564).
Assim, apesar da responsabilidade objetiva, não se vai ao extremo do risco integral. Por outro lado, tem de haver uma ação ou omissão lesiva e injusta por parte da Administração, questão cuja análise muitas vezes é complexa e dissonante da ideia de causalidade pura e simples.
De fato, conquanto a Administração Pública responda objetivamente pelos danos que acarretar, nos termos explicitados acima, a aplicação pura da teoria da causalidade inerente à responsabilidade objetiva acabaria por responsabilizar o Estado em situações em que sua conduta foi legítima, como pondera Marçal Justen Filho, em sua obra Curso de Direito Administrativo, 8ª edição, Belo Horizonte, Fórum, p. 1227. Segundo ele, a teoria objetiva causalista é insuficiente para fundamentar a responsabilidade civil do Estado, o que gera a necessidade de se adotar concepções diferentes para as hipóteses de ação e de omissão.
Para resolver a controvérsia, bem como uniformizar o regime da responsabilidade civil do Estado, o autor diz que o ponto fundamental a ser analisado é a disciplina jurídica da atividade estatal, para efeito de verificação da licitude e ilicitude da conduta, defendendo a ideia de objetivação do elemento subjetivo e não a sua exclusão por completo. Propõe, assim, solução razoável, que pode ser extraída do seguinte excerto:
É mais apropriado aludir a uma objetivação da culpa. Aquele que é investido de competências estatais tem o dever objetivo de adotar as providências necessárias e adequadas a evitar danos às pessoas e ao patrimônio.
Quando o Estado infringir esse dever objetivo e, exercitando suas competências, der oportunidade à ocorrência do dano, estarão presentes os elementos necessários à formulação de um juízo de reprovabilidade quanto à sua conduta. Não é necessário investigar a existência de uma vontade psíquica no sentido da ação ou omissão causadoras do dano. A omissão da conduta necessária e adequada consiste na materialização da vontade defeituosamente desenvolvida. Logo, a responsabilidade continua a envolver um elemento subjetivo, consistente na formulação defeituosa da vontade de agir ou deixar de agir.
(Curso de Direito Administrativo. 8ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 1228).
E mais adiante, conclui:
Mas o reconhecimento de uma concepção objetiva de culpa permite identificar a própria "ilicitude" na conduta estatal. Tradicionalmente, reputa-se que o exercício pelo Estado de suas competências insere-se no campo da licitude, afastando a responsabilização civil. Assim não é, uma vez que haverá ilicitude quando, no exercício de suas competências legítimas, o Estado deixar de adotar as cautelas inerentes ao dever de diligência.
O critério de identificação da ilicitude da atuação estatal reside não apenas na infração objetiva aos limites de suas competências e atribuições, mas também na observância e no respeito às cautelas necessárias indispensáveis para evitar dano aos interesses legítimos de terceiros. (...)
Daí se afirmar que toda a ação ou omissão imputável ao Estado, que configure infração ao dever de diligência no exercício das competências próprias, gerará a responsabilização civil se produzir ou der oportunidade a dano patrimonial ou moral a terceiro. (obra citada, p. 1230)
Em outras palavras, é indispensável que reste caracterizada a infração a um dever de diligência objetivamente considerado, para que se configure o direito à indenização. Marçal Justen Filho, também explicita o que deve ser entendido como dever de diligência:
A natureza da atividade estatal impõe a seus agentes um dever especial de diligência, consistente em prever as consequências de sua conduta ativa e omissiva, adotando todas as providências necessárias para evitar a consumação de danos a terceiros.
Se o agente estatal infringir esse dever de diligência, atuando de modo displicente, descuidado, inábil, estará configurada a conduta ilícita e surgirá, se houver dano a terceiro, a responsabilidade civil.
Observe-se que esse dever de diligência é especial e rigoroso. Não é equivalente àquele que recai sobre todo e qualquer indivíduo que convive em sociedade. A natureza funcional das competências estatais produz o surgimento de um dever de previsão acurada, de cautela redobrada. (obra citada, p. 1231)
Em conclusão, não se considera pura e simplesmente a responsabilidade objetiva do Estado a partir do dano havido, mas se presume a culpabilidade derivada da infração a um dever de diligência para, então, se reconhecer o dever de indenizar.
Podemos dizer, assim, que para o reconhecimento da responsabilidade civil do Estado é imperativa a existência de uma ação ou omissão como infração a um dever de diligência a ser observado pelo agente estatal, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro. Provados tais requisitos, surge a responsabilidade civil, o dever de indenizar, de forma a reparar o dano então sofrido, observado o fato de que nos casos de culpa da vítima, culpa de terceiro, exercício regular do direito e caso fortuito ou força maior há exclusão da responsabilidade estatal.
Por fim, deve ser destacado que o ônus da prova das excludentes de responsabilidade recai sobre a Administração Pública, pois se trata de fato impeditivo ao direito do autor (art.373, II do CPC), qual seja, a inexistência de nexo de causalidade: "a questão relativa à prova leva, primeiramente, em conta a defesa do Estado na ação movida pelo lesado. Diante dos pressupostos da responsabilidade objetiva, ao Estado só cabe defender-se provando a inexistência do fato administrativo, a inexistência de dano ou a ausência do nexo causal entre o fato e o dano." (Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de direito administrativo I - 27. ed. rev., ampl. e atual. até 31-12-2013.- São Paulo :Atlas, 2014, p.615)
Traçadas essas premissas gerais, entendo caracterizada a falha no dever de diligência por parte o INSS, pois a divergência entre a Cédula de Identidade apresentada no requerimento para a concessão do benefício previdenciário (PROCADM7 de ev. 01) e aquela que instruiu o requerimento para alteração da agência bancária destinatária desse benefício (OUT9 de ev. 01) é evidente, como salientado no tópico anterior.
Considerando que se tratava de pedido formulado pela internet, com apresentação de documentos pela via digital, bem como que este visava a alteração da agência destinatária do benefício previdenciário para outro estado da federação, sua análise deveria ter sido realizada ainda com maior rigor. Não foi o que se viu. Ao contrário, mesmo após a ciência de indícios de fraude levantados inicialmente pela autora na via administrativa em relação ao primeiro requerimento formulado pela falsária em 11.11.2019 (OUT8 de ev.01), foi deferido o segundo requerimento fraudulento formulado em 12.03.2020 (OUT9 de ev.01) e mesmo após a exibição de boletim de ocorrência (PADM13 de ev. 01) e a ciência da decisão inicial que concedeu a antecipação de tutela (ev.03), o INSS permitiu nova alteração da agência bancária para outro estado da federação em 11.2020 (ev.29).
Tais fatos revelam a ausência de mecanismos de controle para detecção e prevenção de fraudes em requerimentos formulados via internet e desídia em relação à segurança esperada em relação aos sistemas responsáveis pela guarda de benefício de natureza alimentar.
Em razão desses elementos, reconheço a responsabilidade do INSS.
c) Dos danos materiais
Os danos materiais são aqueles apontados na petição inicial, correspondentes às parcelas de seu benefício previdenciário que foram creditadas a terceiros, em razão da fraude. Está comprovado, a meu ver, o creditamento indevido na competência 08.2020, pois o benefício foi creditado na conta corrente da agência Bradesco COHAB em São Luís/MA, em 03.09.2020 (p.09 de HISCRE15 de ev.01).
Em relação à competência 03.2020, paga em 03.04.2020, consta que o pagamento se deu por cartão magnético, enquanto ainda era indicada a agência do Bradesco Shopping dos Cosméticos, também em São Luís. (p. 06 de HISTCRE15 de ev. 01). Embora os pagamentos subsequentes tenham sido feitos da mesma forma, só que à autora, o INSS não contestou a afirmação de que o benefício relativo à 03.2020 tenha sido pago a terceiros.
De consequência, considerando o ônus da impugnação específica, acolho o pedido relativo aos danos materiais, correspondentes aos benefícios previdenciários das competências 03.2020 e 08.2020 (R$ 5.582,00 e R$ 5.581,71).
Entendo que a responsabilidade pelo pagamento de tal montante, que totaliza R$ 11.163,71, é solidária entre os réus.
d) Dos danos morais
A respeito dos danos morais, como afirmou o Ministro Luís Felipe Salomão, "[a] par dos conceitos que se utilizam de critério excludente para definir o dano moral, e que retiram de seu alcance o prejuízo ao patrimônio, a doutrina se divide, ainda, entre os que identificam o dano moral com a própria alteração negativa do ânimo do indivíduo, com o sofrimento, a tristeza experimentada pela vítima, com a vergonha, e também aqueles que reconhecem essa espécie de dano na violação de um bem ou interesse integrante de uma categoria jurídica, sem vinculá-lo, no entanto, à dor, à modificação do estado da alma." (REsp 1245550/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/03/2015, DJe 16/04/2015)
Por conseguinte, o dano moral pode ser concebido, de um lado, como aquele decorrente de dor, angústia e sofrimento e, de outro, como consequência direta de violação a direito da personalidade, aferida objetivamente, isto é, sem perscrutar os sentimentos experimentados pelo lesado. Com a mesma linha de raciocínio, Flávio Tartuce subdivide o dano moral sob esses dois prismas de análise:
"Buscando uma primeira classificação dos danos morais, em sentido próprio, o dano moral causa na pessoa dor, tristeza, amargura, sofrimento, angústia e depressão. Nesse diapasão, constitui aquilo que a pessoa sente, o que se pode denominar dano moral in natura. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença desses sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: “O dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento” (Enunciado n. 445). Cite-se, a título de exemplo, o dano moral da pessoa jurídica que, por óbvio, não passa por tais situações (Súmula 227 do STJ). Em sentido impróprio, o dano moral constitui qualquer lesão aos direitos da personalidade, como, por exemplo, à liberdade, à opção sexual, à opção religiosa, entre outros. Trata-se do dano moral em sentido amplo ou lato sensu, que não necessita da prova do sofrimento em si para a sua caracterização." (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das obrigações e responsabilidade civil. 9.ed. São Paulo: Método, 2014, p. 355)
No caso em apreço, as circunstâncias apontam que os transtornos gerados em razão da conduta dos réus geraram sofrimento que extrapolou a esfera do ordinário, pois a autora teve ameaçado o direito de receber benefício de natureza alimentar ao menos em 3 ocasiões, registradas nos autos.
Quanto ao montante devido, sua definição deve levar em conta tanto o aspecto pedagógico/punitivo, como a reparação proporcional ao dano experimentado, visando evitar o enriquecimento sem causa. Nesse sentido, cito Caio Mário da Silva Pereira:
...na reparação por dano moral estão conjugados dois motivos, ou duas concausas: I - punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II - pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material... esse arbitramento deve ser moderado e eqüitativo, para que não converta o sofrimento em móvel de captação de lucro (lucro capiendo) (PEREIRA, Cáio Mário da Silva. In:CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 98).
Observados esses parâmetros, sigo orientação da 4ª Turma do TRF/4ª Região, que vem fixando o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para indenizar situações semelhantes (TRF4, AC 5000244-28.2017.4.04.7135, QUARTA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS em 16/12/2021).
No que concerne à distribuição desse montante, entendo que o INSS gerou mais danos que o Banco Bradesco, pois deferiu por três vezes a transferência da agência destinatária do benefício da autora, apesar da ciência de indícios de fraude, além de não proceder à imediata regularização dos pagamentos da autora após a comunicação na via administrativa. Por isso, fixo ao INSS o pagamento de R$ 8.000,00, cabendo ao Banco réu o pagamento dos R$ 2.000,00 restantes.
e) Da atualização monetária
Sobre os valores ora reconhecidos deverá incidir atualização monetária pelo IPCA-e e juros de mora à taxa de 1% ao mês para o Banco réu, e à taxa do art. 1º-F da Lei 9.494/97 para o INSS (Tema 810 do STF).
O termo inicial de incidência de juros e correção monetária para os danos materiais é o evento danoso, entendido este como a data em que foram realizados os requerimentos administrativos fraudulentos; para os danos morais é está sentença. Isso porque quanto a esta, o valor estipulado já foi fixado considerando a defasagem havida entre a data do evento danoso e aqueles porque antes de sua quantificação, que só ocorreu por meio da presente sentença, não há se falar em mora do devedor.
2. Legitimidade passiva do Banco Bradesco
A operação fraudulenta somente foi possível em razão da abertura da conta corrente em nome da autora no Banco Bradesco. Como bem registrado na sentença, tal fato é suficiente para justificar a presença do réu nos autos.
De fato, a instituição financeira que não emprega segurança suficiente, a fim de evitar que dados do consumidor sejam utilizados por terceiros, pode ensejar a responsabilização por eventual fraude ocasionada mediante uso das referidas informações.
Portanto, compete aos bancos, juntamente com o INSS, verificar a autenticidade dos documentos necessários em caso de requerimento de transferência de contas.
A presente situação se assemelha aos casos de empréstimo consignado fraudulento:
ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FRAUDULENTO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCONTOS INDEVIDOS. RESPONSABILIDADE. DANOS MORAIS. DANOS MATERIAIS. REPETIÇÃO EM DOBRO. 1. Afastada a prefacial de nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, uma vez que o magistrado não está obrigado a rechaçar todos os argumentos trazidos pelas partes, sendo de seu mister, apenas, apreciar as alegações que se caracterizem como relevantes e capazes de infirmar a conclusão adotada no julgamento (art. 489, § 1º, IV, do CPC). 2. Compete às instituições financeiras e ao INSS verificar a veracidade e autenticidade dos contratos de empréstimo. A forma como eles verificam a licitude ou não dos empréstimos não pode acarretar prejuízo ao segurado. A experiência forense revela que essa forma não se mostra segura e eficaz. Assim, os danos decorrentes da falha na conferência de licitude dos empréstimos devem ser suportados pelos bancos e pelo INSS. 3. Especificamente quanto aos casos de descontos realizados indevidamente sobre proventos, decorrentes de empréstimo fraudulento, a jurisprudência predominante aponta que tal situação extrapola o mero aborrecimento, configurando, pois, dano moral indenizável. Em julgamentos recentíssimos desta Corte sobre o mesmo tema, a indenização tem sido fixada em R$10.000,00 (dez mil reais), valor que reputo adequado à reparação do dano, levando-se em consideração as peculiaridades do caso, como também cuidando para que a quantia compensatória não se afigure irrisória ou excessiva. Precedentes. 4. A controvérsia envolvendo as hipóteses de aplicação da repetição em dobro aos contratos bancários (sem natureza pública) consiste em objeto do Tema nº 929 do STJ: "Discussão quanto às hipóteses de aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC", ainda pendente de julgamento. Todavia, o STJ, o apreciar o EAResp 600663/RS, fixou a seguinte tese: "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do cdc, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo". No entanto, modulou os efeitos da decisão para determinar que a devolução em dobro aplica-se somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão, ou seja, a partir de 30/03/2021. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007694-30.2022.4.04.7108, 3ª Turma, Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/04/2024).
3. Responsabilidade civil nas relações bancárias e do INSS
Na Constituição Federal, a responsabilidade objetiva do Estado consagrou-se no art. 37, §6º, a partir da previsão de que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Assim, de regra, para alcançar a indenização, bastará a comprovação do nexo de causalidade entre o dano e o ato ilícito praticado pela Administração. Admite-se, todavia, a comprovação da culpa exclusiva ou recíproca do particular para afastar o dever de reparação ou atenuá-lo, assim como as excludentes do caso fortuito e força maior.
Ademais, pertinente salientar que as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor são plenamente aplicáveis ao caso, pois dizem respeito a operações bancárias, conforme estabelece a Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
Nesse viés, a responsabilidade civil da instituição financeira encontra previsão no art. 14 do CDC, que estabelece o regime de responsabilização civil objetiva, só podendo ser afastado quando o fornecedor comprovar que a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, nos seguintes termos:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro."
Sendo objetiva, a responsabilidade do banco público independe de dolo ou culpa, bastando a existência simultânea dos requisitos para imputação de responsabilidade civil, quais sejam: o ato ou omissão voluntária, que, no caso de aplicação do CDC, seria o defeito do serviço prestado ou informações insuficientes/inadequadas sobre sua fruição e riscos; a existência de dano patrimonial ou moral; e a presença de nexo de causalidade entre o dano e o resultado.
Ainda sobre o tema, o STJ editou o enunciado da Súmula 479 nos seguintes termos:
"As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias."
No presente caso, o Banco Bradesco não juntou aos autos os documentos apresentados para a abertura da conta corrente indicada como destinatária do benefício previdenciário da autora (ag. nº 603163) nos requerimentos formulados perante o INSS em 11.11.2019 e 28.02.2020 (OUT8 e 9 de ev. 01).
Deste modo, a inércia do réu permite supor que os documentos apresentados para a abertura da conta eram os mesmos que instruíram o requerimento administrativo perante o INSS, já que essa operação tinha a finalidade de transferir o benefício da autora para essa conta.
A sentença bem pontuou que na p.02 de OUT8/9 do evento 1 vê-se que há franca divergência entre a Carteira de Identidade apresentada nesse requerimento e aquela exibida pela autora para a concessão do aludido benefício, tanto em relação à foto, como à assinatura, à data de nascimento e aos dados do registro de casamento (p. 05/06 de PROCADM7 do evento 01). As carteiras de identidade apresentadas estão colacionadas lado a lado na p. 02 da petição de evento 62 para melhor visualização.
Portanto, restou suficientemente comprovada a fraude noticiada pela apelada, a qual se deu perante duas agências diferentes do Banco Bradesco (agência Shopping dos Cosméticos e agência COHAB, considerando os dois requerimentos administrativos formulados perante o INSS).
Com relação ao INSS, pessoa jurídica de direito público, a responsabilidade civil encontra fundamento no §6º do artigo 37 da Constituição que tem a seguinte redação:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
§ 6.º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
O ordenamento jurídico acolhe a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, ou seja, em tema de responsabilidade civil do Estado, prescinde-se da demonstração de culpa, bastando a ocorrência do dano, decorrente de uma ação ou omissão estatal.
Mas não se considera pura e simplesmente a responsabilidade objetiva do Estado a partir do dano havido, mas se presume a culpabilidade derivada da infração a um dever de diligência para, então, se reconhecer o dever de indenizar.
Assim, para o reconhecimento da responsabilidade civil do Estado é imperativa a existência de uma ação ou omissão como infração a um dever de diligência a ser observado pelo agente estatal, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro. Provados tais requisitos, surge a responsabilidade civil, o dever de indenizar, de forma a reparar o dano então sofrido, observado o fato de que nos casos de culpa da vítima, culpa de terceiro, exercício regular do direito e caso fortuito ou força maior há exclusão da responsabilidade estatal.
Além disto, o ônus da prova das excludentes de responsabilidade recai sobre a Administração Pública, pois se trata de fato impeditivo ao direito do autor (art.373, II do CPC), qual seja, a inexistência de nexo de causalidade.
No caso, houve culpa por parte do INSS, uma vez que os valores objeto da fraude não foram revertidos em proveito da parte autora. Em outras palavras, o INSS não comprovou que cumpriu com os deveres de cuidado aptos a assegurar a reversão dos valores ao segurado.
3.1. Solidariedade
Como a ofensa à parte demandante possui mais de um autor - INSS e instituição financeira -, devem ambos responder solidariamente pela reparação devida, nos termos do art. 942, CC/02.
Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.
Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRATOS BANCÁRIOS. CRÉDITO CONSIGNADO. CONVÊNIO COM INSS. DESCONTO DIRETAMENTE NO BENEFÍCIO. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS. LEI 8.213/91. LEGITIMIDADE PASSIVA INSS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. 1. O INSS, porquanto responsável pela retenção dos valores autorizados pelo beneficiário e repasse à instituição financeira nas operações de desconto de empréstimos consignados, é parte legítima na demanda que visa à suspensão dos descontos alegadamente indevidos sobre o benefício previdenciário e à consequente indenização pelos danos caudados. 2. A autarquia previdenciária não demonstrou ter agido em cumprimento ao seu dever de cuidado, consistente em verificar a existência e validade do empréstimo consignado, antes de repassar os valores para a instituição financeira, pelo que configurada a responsabilidade solidária das rés pelos danos sofridos pela parte autora. 3. A Lei 8.213/91, nos termos da redação dada pela Lei nº 13.183, de 2015, estabelece que os descontos podem ser realizados até o limite de 35% do valor do benefício. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002066-39.2018.4.04.7031, 12ª Turma, Juíza Federal ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 24/05/2023)
ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FRAUDULENTO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCONTOS INDEVIDOS. INSS. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DANOS MORAIS. RECURSO IMPROVIDO. 1. Responde o INSS por desconto indevido do benefício previdenciário (aposentadoria) de valores referentes a empréstimo em consignação, quando efetuado sem autorização do beneficiário, já que o contrato bancário foi realizado sem a participação deste, por meios fraudulentos empregados por terceiros. 2. Houve culpa por parte do INSS, uma vez que os valores descontados a título de empréstimo não foram revertidos em proveito do autor. Em outras palavras, o INSS não comprovou que cumpriu com os deveres de cuidado aptos a assegurar a reversão dos valores segurado. Assim, não há que se falar em responsabilidade subsidiária, mas sim solidária da autarquia. 3. Descontos indevidos em benefício previdenciário, verba de caráter alimentar, extrapolam o mero aborrecimento e configuram lesão extrapatrimonial passível de indenização. 4. Negado provimento ao recurso. (TRF4, AC 5007432-05.2021.4.04.7112, QUARTA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 05/05/2023
4. Dano moral
A respeito da caracterização de dano moral em casos análogos, envolvendo fraude da qual resultou descontos sobre os proventos previdenciários da vítima, o entendimento deste Tribunal é no sentido de que o dano moral se configura in re ipsa, de sorte que não se exige prova do prejuízo sofrido:
ADMINISTRATIVO. ANULATÓRIA DE CONTRATO CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. FALSIDADE DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. DANO MORAL. 1. Comprovado que o contrato de empréstimo com desconto de benefício previdenciário firmado com instituição financeira é objeto de fraude, qual seja falsidade da assinatura aferida em perícia grafotécnica, decorrência lógica imediata é sua anulação. 2. Havendo descontos em provento beneficiário decorrente de fraude, o dano moral trata-se de dano in re ipsa. (TRF4, AC 5018685-69.2020.4.04.7000, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relator LUIZ ANTONIO BONAT, juntado aos autos em 15/06/2023)
DIREITO ADMINISTRATIVO E CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÍVIDA CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. DANO MATERIAL E MORAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO FIRMADO COM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. FRAUDE. FALSIDADE DA ASSINATURA. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. COMPROVAÇÃO DE QUE A FIRMA NÃO PARTIU DO PUNHO DA AUTORA. NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS DESCONTADAS SOBRE O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL IN RE IPSA. 1. Em se tratando de ação em que a parte autora alega não reconhecer contrato de empréstimo firmado em seu nome junto à instituição financeira, a perícia grafotécnica é o meio de prova mais seguro para se aferir se houve ou não falsificação da assinatura aposta na avença. 2. Comprovado por meio de perícia grafotécnica que quem assinou o contrato de empréstimo não foi a autora, a avença deve ser anulada, fazendo ela jus à restituição dos valores descontados de seu benefício previdenciário para pagamento do empréstimo. 3. O dano moral, em caso de fraude da qual resulta descontos sobre os proventos previdenciários da vítima, tem origem na situação angustiante que lhe é imposta, sendo dispensável que comprove a existência do dano. Trata-se de dano in re ipsa. (TRF4 5002738-02.2016.4.04.7101, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 12/12/2018)
No presente situação, observa-se que os transtornos gerados em razão da conduta dos réus geraram sofrimento que extrapolou a esfera do ordinário, pois a parte demandante teve ameaçado o direito de receber benefício de natureza alimentar ao menos em 3 momentos registrados nos autos, ao passo que não concorreu de nenhuma forma para o evento.
Portanto, o dano moral é devido.
5. Valor da indenização por danos morais
Na sentença, a condenação dos réus em dano moral ficou nos seguintes patamares:
c) condenar o INSS ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 atualizados nos termos da fundamentação;
d) condenar o Banco Bradesco ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 atualizados nos termos da fundamentação;
Conforme entendimento desta Turma, em casos semelhantes ao presente, em que o segurado foi vítima de fraude, o pagamento de indenização por danos morais tem sido arbitrado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor este que considero razoável e proporcional, e que assegura o caráter pedagógico da medida:
DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. DESCONTOS INDEVIDOS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANOS MATERIAIS. RETITUIÇÃO EM DOBRO. DANOS MORAIS. FIXAÇÃO DO QUANTUM. 1. Compete às instituições financeiras verificar a veracidade e autenticidade dos contratos de empréstimo. A forma como eles verificam a licitude ou não dos empréstimos não pode acarretar prejuízo ao segurado. Danos decorrentes da falha na conferência de licitude dos empréstimos devem ser suportados pelos bancos. 2. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável (art. 42, CDC). 3. Verifica-se a ocorrência de dano in re ipsa diante de descontos indevidos em verba de caráter alimentar, benefício previdenciário. Dano moral presumido. 4. Sobre a quantificação dos danos morais, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) afigura-se razoável para o caso concreto, não caracterizando enriquecimento sem causa por parte da aposentada e assegurando o caráter pedagógico da medida. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002123-75.2022.4.04.7012, 12ª Turma, Juíza Federal ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/10/2023)
Portanto, mantenho a condenação tal como arbitrada na sentença.
6. Correção monetária
A sentença bem registrou que o termo inicial de incidência de juros e correção monetária para os danos materiais é o evento danoso, entendido este como a data em que foram realizados os requerimentos administrativos fraudulentos; para os danos morais é a data da sentença, entendimentos que corroboro.
Neste sentido:
ADMINISTRATIVO E CIVIL. APELAÇÃO. BLOQUEIO INDEVIDO DE VALORES EM CONTA BANCÁRIA. RESPONSABILIDADE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DEFERIDA. DANO MATERIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. 1. Responde objetivamente o banco pelos danos causados por simples falha do serviço em razão do risco inerente à atividade que exerce (artigo 14 do CDC e arts. 186 e 927 do CPC), independentemente de culpa. Basta a existência de um defeito do serviço bancário (decorrente de ação ou omissão do agente) aliada à ocorrência de um dano, interligados por um nexo de causalidade. 2. Caso em que foi indevidamente bloqueado valor da conta bancária da parte autora, ficando a Caixa responsável pelo desbloqueio e restituição da quantia. 3. Aplicação da Taxa Selic, abrangendo a correção monetária e os juros de mora, a contar do evento danoso. 4. Não é qualquer transtorno ou aborrecimento que caracteriza o dano moral, mas apenas aquele que transcenda a naturalidade dos fatos da vida. A indenização tem por objetivo ofertar uma compensação de um dano de ordem não patrimonial, já que não é possível mensurar monetariamente o abalo psicológico sofrido pelo lesado. 5. Caso em que não houve comprovação de situação vexatória ou que atingisse a esfera íntima da parte autora, além do evidente aborrecimento, de forma que não há que falar em indenização por danos morais. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002488-33.2020.4.04.7002, 12ª Turma, Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 13/03/2024)
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS. CORREÇÃO MONETÁRIA INCIDENTE DA DATA DO ARBITRAMENTO. SELIC. 1. O entendimento desta 12ª Turma quanto aos juros de mora e correção monetária incidentes sobre o valor estabelecido a título de indenização por dano moral é de que serão devidos da data do arbitramento (Súmula nº 362 do STJ), assim considerada a data da sentença ou acórdão que contenha essa condenação e em que seu quantum seja estabelecido pela primeira vez, ou majorado, ou minorado. 3. Os juros moratórios e a correção monetária pretéritos, decorridos entre o evento danoso ou a citação e a data do julgamento definitivo, encontram-se incluídos no valor arbitrado na sentença ou acórdão em que se definiu, majorou ou minorou a obrigação pecuniária de reparar os danos morais. Sobre essa condenação, aplica-se exclusivamente a taxa Selic, composta por juros moratórios e correção monetária. 3. Hipótese em que a data do arbitramento da indenização por dano moral em face da União ocorreu em setembro de 2018, data do julgamento da apelação cível, sendo este, portanto o termo inicial à incidência da correção monetária. 4. Agravo de instrumento improvido. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5043339-66.2023.4.04.0000, 12ª Turma, Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 18/04/2024)
7. Honorários Advocatícios
Nos termos do art. 85, §11, CPC e conforme decisão do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.72/DF5, é devida a majoração dos honorários advocatícios já fixados pelo juízo de origem no caso de desprovimento da apelação, razão pela qual os majoro em 20% sobre a quantia anteriormente fixado para o Banco Bradesco e para o INSS.
Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações do BANCO BRADESCO S.A, do INSS e da autora ERCILINDA MOREIRA.
Documento eletrônico assinado por JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004547766v38 e do código CRC d8a7a14a.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5046508-18.2020.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
APELANTE: ERCILINDA MOREIRA (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. responsabilidade civil da instituição financeira e do INSS. fraude na alteração da agência responsável pelo pagamento de benefício previdenciário. Legitimidade passivA do banco. INSS. Solidariedade. Dano moral. quantum. correção monetária. termo inicial.
1. A legitimidade passiva da instituição financeira se verifica quando o banco não emprega segurança suficiente, que seja capaz de evitar que dados do consumidor sejam utilizados por terceiros estelionatários.
2. A responsabilidade civil da instituição financeira encontra previsão no art. 14 do CDC, que estabelece o regime de responsabilização civil objetiva, só podendo ser afastado quando o fornecedor comprovar que a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
3. Para o reconhecimento da responsabilidade civil do Estado é imperativa a existência de uma ação ou omissão como infração a um dever de diligência a ser observado pelo agente estatal, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro. Provados tais requisitos, surge a responsabilidade civil, o dever de indenizar, de forma a reparar o dano então sofrido, observado o fato de que nos casos de culpa da vítima, culpa de terceiro, exercício regular do direito e caso fortuito ou força maior há exclusão da responsabilidade estatal.
4. Como a ofensa à parte demandante possui mais de um autor - INSS e instituição financeira -, devem ambos responder solidariamente pela reparação devida, nos termos do art. 942, CC/02.
5. A respeito da caracterização de dano moral em casos análogos, envolvendo fraude da qual resultou descontos sobre os proventos previdenciários da vítima, o entendimento deste Tribunal é no sentido de que o dano moral se configura in re ipsa, de sorte que não se exige prova do prejuízo sofrido.
6. Mantida o valor fixado na sentença a título de danos morais, porque dentro dos parâmetros fixados por precedentes da Corte em casos semelhantes.
7. O entendimento desta 12ª Turma, quanto aos juros de mora e correção monetária incidentes sobre o valor estabelecido a título de indenização por dano moral, é de que serão devidos da data do arbitramento (Súmula nº 362 do STJ), assim considerada a data da sentença ou acórdão que contenha essa condenação e em que seu quantum seja estabelecido pela primeira vez, ou majorado, ou minorado.
8. Apelos desprovidos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações do BANCO BRADESCO S.A, do INSS e da autora ERCILINDA MOREIRA, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 31 de julho de 2024.
Documento eletrônico assinado por JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004547767v7 e do código CRC 8bfb71fe.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 24/07/2024 A 31/07/2024
Apelação Cível Nº 5046508-18.2020.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON
APELANTE: ERCILINDA MOREIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A): MARCELO OSTERNACK AMARAL (OAB PR035828)
ADVOGADO(A): REALINA PEREIRA CHAVES BATISTEL (OAB PR009628)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A): VIDAL RIBEIRO PONCANO (OAB PR071710)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 24/07/2024, às 00:00, a 31/07/2024, às 16:00, na sequência 34, disponibilizada no DE de 15/07/2024.
Certifico que a 12ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 12ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DO BANCO BRADESCO S.A, DO INSS E DA AUTORA ERCILINDA MOREIRA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
Votante: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
Votante: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT
Votante: Desembargadora Federal GISELE LEMKE
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/08/2024 04:02:00.