Agravo de Instrumento Nº 5011494-89.2018.4.04.0000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
AGRAVANTE: ROGER SOUZA DE BRITO
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença proposto pela União, referente à cobrança de valores recebidos oriundos de antecipação de tutela que determinou a reintegração do executado ao Exército, posteriormente revogada pela sentença de mérito.
O recorrente pleiteia o reconhecimento da inexigibilidade da obrigação, eis que recebeu os valores pagos por força de liminar de boa-fé. Salienta, também, a natureza alimentar dos valores recebidos.
Com contrarrazões vieram os autos.
É o relatório.
VOTO
Não desconheço o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.244.182/PB (Tema 531), julgado sob sistemática dos recursos repetitivos, de que os valores pagos por erro da Administração e recebidos de boa-fé pelo administrado não devem ser restituídos ao erário. Inúmeros julgados sustentam tal posição. Contudo, todos estes precedentes tem como pressuposto fático que o administrado percebia a verba diretamente do ente público, e não por força de decisão judicial, em tutela provisória, onde o caráter precário dos valores alcançados já era de conhecimento da parte tutelada, sob pena de chancela judicial ao enriquecimento ilícito.
Neste sentido, chamo atenção para o entendimento do STJ, também firmado em representativo de controvérsia (Tema 692, REsp 1401560/MT), segundo o qual "A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos.":
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C DO CPC/1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. ARTIGO 115 DA LEI 8.213/1991. CABIMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. Inicialmente é necessário consignar que o presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo n. 2/STJ: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça." 2. Firmou-se em sede de representativo de controvérsia a orientação de que a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. 3. A principal argumentação trazida pela embargante consiste em que a tutela antecipada que lhe reconheceu o direito à aposentadoria por idade rural, posteriormente, revogada pelo Tribunal a quo, foi concedida de ofício pelo Magistrado de primeiro grau, sem que houvesse requerimento da parte nesse sentido. 4. A definitividade da decisão que antecipa liminarmente a tutela, na forma do artigo 273 do CPC/1973, não enseja a presunção, pelo segurado, de que os valores recebidos integram, em definitivo, o seu patrimônio. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada, consoante artigo 273, § 2º, do CPC/1973. 5. Quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Nos dizeres do Ministro Ari Pargendler, que inaugurou a divergência no âmbito do julgamento do representativo da controvérsia, mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo que recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no Juiz, ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. 6. Do texto legal contido no artigo 115 da Lei 8.213/1991, apesar de não expressamente prevista norma de desconto de valores recebidos a título de antecipação da tutela posteriormente revogada, é possível admitir, com base no inciso II e, eventualmente, no inciso VI, o ressarcimento pretendido. 7. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no REsp 1401560/MT, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2016, DJe 02/05/2016)
Corroborando o entendimento, colaciono precedentes desta Corte:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE CASSADA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES AO ERÁRIO. NECESSIDADE. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. 1. É devida a restituição à Administração Pública de valores recebidos em virtude de decisão judicial provisória, posteriormente cassada, sob pena de enriquecimento ilícito dos beneficiados. 2. Inexiste ilegalidade na cobrança, pois a parte autora tinha plena ciência do caráter precário e provisório do provimento antecipatório. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008339-60.2014.404.7100, 3ª TURMA, Juiz Federal NICOLAU KONKEL JUNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 12/03/2015)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ANULAÇÃO DO JULGAMENTO PELO STJ. OMISSÃO. SANADA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA O PODER PÚBLICO. VEDAÇÃO. SATISFATIVIDADE DA MEDIDA. AFASTADAS. 1. Anulado o julgamento dos embargos declaratórios pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça com determinação de nova apreciação pelo Tribunal a quo das razões da parte embargante. 2. As normas infraconstitucionais limitadoras da antecipação de tutela contra o Poder Público devem ser interpretadas em acordo com o texto constitucional e, em especial, com os ditames máximos de proteção à vida, à saúde e à dignidade humana, consoante disposto nos artigos 1º, III; 5º, caput; 6º, caput; e 196, todos da Constituição Federal. 3. Deve ser afastada a satisfatividade da medida antecipatória, porquanto devida a restituição à Administração Pública de valores recebidos em virtude de decisão judicial provisória, caso posteriormente cassada, sob pena de enriquecimento ilícito dos beneficiados. 4. Embargos de declaração parcialmente providos. (TRF4, EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5026629-20.2013.404.0000, 3ª TURMA, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/10/2014)
Nesta toada, os mais recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVOGAÇÃO POSTERIOR. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. NECESSIDADE. VERBA ALIMENTAR. QUESTÃO SUBMETIDA AO REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS. 1. Na hipótese dos autos, conquanto a parte recorrente requeira seja considerada apenas a prova testemunhal para comprovação de sua qualidade de empregada doméstica, o STJ possui firme jurisprudência no sentido de que apenas o trabalho doméstico exercido anteriormente à edição da Lei 5.859/1972 é passível de comprovação exclusivamente testemunhal. Para períodos posteriores a 9.4.1973, data da entrada em vigor do referido diploma legal, exige-se que a prova testemunhal venha acompanhada de início de prova material. 2. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o REsp 1.348.418/SC, consolidou entendimento de que é dever do titular do direito patrimonial - naquele caso, titular de benefício previdenciário - devolver valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial do particular não provido e Recurso Especial do INSS provido. (REsp 1673841/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/08/2017, DJe 12/09/2017)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC/2015. NÃO CONFIGURADA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVOGAÇÃO POSTERIOR. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. NECESSIDADE. VERBA ALIMENTAR. QUESTÃO SUBMETIDA AO REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS. 1. Não se configura a alegada ofensa ao artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015 uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou, de maneira amplamente fundamentada, a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado 2. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o REsp 1.348.418/SC, consolidou entendimento de que é dever do titular do direito patrimonial - naquele caso, titular de benefício previdenciário - devolver valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada.
3. Recurso Especial parcialmente provido. (REsp 1661034/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/05/2017, DJe 16/06/2017)
Assim, caso posteriormente revogada a decisão que concedeu liminarmente os efeitos da antecipação da tutela, será devida a restituição dos valores recebidos em virtude da decisão judicial provisória e precária, a fim de que não se caracterize o enriquecimento ilícito.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.
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Agravo de Instrumento Nº 5011494-89.2018.4.04.0000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
AGRAVANTE: ROGER SOUZA DE BRITO
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROPOSTO PELA UNIÃO. COBRANÇA DE VALORES DECORRENTES DE REINTEGRAÇÃO DE MILITAR POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA, POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES AO ERÁRIO. NECESSIDADE. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.
1. Conforme julgado sob sistemática dos recursos repetitivos pelo STJ, REsp 1401560/MT (Tema 692), "A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos".
2. É devida a restituição à Administração Pública de valores recebidos em virtude de decisão judicial provisória, posteriormente cassada, sob pena de enriquecimento ilícito dos beneficiados. Inexiste ilegalidade na cobrança, pois a parte autora tinha plena ciência do caráter precário e provisório do provimento antecipatório.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de junho de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/06/2018
Agravo de Instrumento Nº 5011494-89.2018.4.04.0000/PR
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PROCURADOR(A): JORGE LUIZ GASPARINI DA SILVA
AGRAVANTE: ROGER SOUZA DE BRITO
ADVOGADO: MATHEUS ZAINEDIN
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento do dia 26/06/2018, na seqüência 1301, disponibilizada no DE de 01/06/2018.
Certifico que a 3ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª Turma , por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
LUIZ FELIPE OLIVEIRA DOS SANTOS
Secretário
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