Apelação Cível Nº 5001573-65.2017.4.04.7203/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
APELADO: DIRLEI CORREA DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: LUÍS FERNANDO SILVA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente a ação, nos seguintes termos:
Ante o exposto, rejeito a preliminar de litisconsórcio passivo necessário, ratifico a tutela provisória de urgência concedida no evento 21 e JULGO PROCEDENTE o pedido, resolvendo o mérito na forma do art. 487, I, do CPC, para o fim de:
a) reconhecer a irrepetibilidade dos valores adimplidos em favor da autora entre maio de 2002 a julho de 2007, concedidos a título de tutela provisória nos autos da Ação de n. 2002.72.00.002565-6;
b) anular o correspondente processo administrativo de comando de descontos em face da parte autora;
c) condenar a União a ressarcir ao autor os valores descontados a título do processo administrativo anulado.
Condeno a União a suportar os honorários de sucumbência, a serem pagos em favor do patrono da parte autora, no percentual de 10% sobre o valor da causa.
A União é isenta de custas.
Sentença não sujeita ao reexame necessário.
Em suas razões, a União defendeu, preliminarmente, a necessidade de integração do Instituto Nacional do Seguro Social no pólo passivo da demanda. No mérito, alegou que é devida a devolução de valores pagos pelo erário, em face de cumprimento de decisão judicial precária ou não definitiva, não havendo que se falar em boa-fé do servidor na percepção de tais valores. Nesses termos, pugnou pelo provimento do recurso.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Ao analisar o pleito deduzido na inicial, o magistrado a quo assim decidiu:
Trata-se de Procedimento Comum proposto por DIRLEI CORREA DE OLIVEIRA em desfavor da UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, objetivando, inclusive em sede de tutela de urgência, que seja determinada a imediata suspensão dos efeitos do ato administrativo "de comando de descontos contra a remuneração da Autora, anunciados na Notificação enviada à Autora em 01/03/2017, até que ulterior decisão judicial venha a dispor em sentido contrário".
Alegou que é servidora pública federal atualmente vinculada à Secretaria da Receita Federal em Santa Catarina e, nesta condição, em 01/03/2017, recebeu da administração "Notificação de início de Desconto em Folha de Pagamento" em razão de decisão final exarada no processo administrativo respectivo, dando-lhe conta do comando de desconto em folha de pagamento para o mês de fevereiro.
Relatou que anteriormente encontrava-se vinculada ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e, nessa condição, foi beneficiada em Ação Trabalhista nº 725/1989 ajuizada pelo SINDPREVS/SC, já transitada em julgado, com "direito à percepção de uma rubrica salarial voltada ao pagamento do percentual de reajuste remuneratório nao aplicado na época própria (URP de fevereiro de 1989), correspondente a 26,05%", verba esta posteriormente reconhecida como indevida pela administração, o que ensejou a instauração de processo administrativo para desconto em folha de pagamento e reposição ao erário.
Sustentou que a União não detém competência para efetuar a cobrança administrativa do débito, que diz respeito a verba remuneratória originariamente paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social; que a providência tomada pela administração atinge verba de natureza alimentar, de modo a merecer proteção jurídica específica, além de afrontar a boa-fé, aspectos a demonstrar sua irrepetibilidade; que a referida pretensão estaria fulminada pela decadência e prescrição, nos termos do art. 54 da Lei 9.784/1999 e art. 1º e 2º, do Decreto nº 20.910/32; que em 11 de dezembro de 2003 foi promulgada a Medida Provisória nº 146, posteriormente convertida na Lei nº 10.855, de 1º abril de 2004, modificando a natureza jurídica das parcelas salariais que vinham até então sendo pagas em razão de decisões administrativas ou judiciais, tornando legais estes pagamentos e conferindo caráter permanente a tais verbas, o que inviabiliza a pretendida reposição ao erário. Posteriormente, apontou equívocos e ilegalidades na planilha de débito apresentada pela ré.
Requereu seja reconhecida a ilegalidade da reposição ao erário dos valores adimplidos em favor da autora entre maio de 2002 e julho de 2007, revogando o ato administrativo que determinou os descontos contra a remuneração da autora, cessando os efeitos da notificação que lhe foi encaminhada, bem como, devolvendo-lhe os valores eventualmente descontados a esse título. Formulou, ainda, diversos pedidos sucessivos.
Valorou a causa, juntou procuração e documentos (evento 1).
A análise do pedido de tutela de urgência foi postergada para após a vinda da contestação (evento 5).
Citada, a União - AGU apresentou contestação no evento 12, onde alegou, em preliminar, a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com o INSS. No mérito, alegou a incompetência da União para buscar verbas pagas pelo INSS e defendeu a inexistência de decadência, pois inaplicáveis o prazo decadencial previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/99 e no Decreto 20910 e que, caso o mesmo fosse aplicável, o termo inicial da decadência seria o trânsito em julgado da Ação Ordinária nº 2002.72.00.002565-6 e não aqueles mencionados na inicial.
Defendeu não ser aplicável a irrepetibilidade de valores recebidos de boa-fé e o caráter alimentar como impeditivo da ocorrência da reposição. Disse que se o sindicato considerava que a partir de 2004 ou mesmo 2007 os valores pagos a título de URP não eram mais devidos, deveriam ter instruído seus representados a não mais receber as verbas, inexistindo prova, ainda, que o ente associativo tenha comunicado os associados sobre isso, além do que "da falta de boa-fé não se pode extrair a expectativa de segurança jurídica". E ainda que existisse boa-fé, sustenta que não haveria óbice à restituição aos cofres públicos, sob pena de se favorecer o enriquecimento sem justa causa. Citou julgados entendendo pela viabilidade da devolução de valores pagos pelo erário em face de cumprimento de decisão judicial precária ou não definitiva, sem adentrar na boa-fé.
Sustentou que não procede a argumentação de que a MP 146/2003, convertida na Lei n. 10.855/04 teria tornado legais os pagamentos e conferido caráter permanente a tais verbas, "pois uma verba que era paga por força de decisão provisória (antecipação de tutela) obviamente não pode se transformar uma VPNI permanente". Afastou os argumentos de supostos erros e ilegalidade na planilha de débito feita pela administração, afirmando nada ter a recalcular. Afirmou inexistir fundamento jurídico para a pretensão de que o ressarcimento seja feito no mesmo número de parcelas em que se deu o pagamento. Requereu o acolhimento das preliminares e subsidiariamente a improcedência da ação.
No evento 21 foi deferida a tutela provisória de urgência para "determinar que a parte Ré, no prazo de 10 (dez) dias, suspenda os efeitos do ato administrativo que gerou o comando de descontos contra a remuneração do Autor em decorrência da notificação anexa à inicial (evento nº 01/OUT17), até o julgamento definitivo do presente processo, sob pena de multa diária que arbitro em R$ 300,00 (trezentos reais)".
No evento 29 a União comprovou o cumprimento da antecipação de tutela.
Foi interposto Agravo de Instrumento pela ré (evento 28), o qual teve deferido em parte o pedido de antecipação de tutela recursal unicamente para reduzir o valor da multa diária para R$ 100,00 (evento 34).
A parte autora apresentou réplica no evento 35.
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório. Decido.
II - FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente
Integração do INSS à lide - litisconsórcio passivo necessário
A Lei n. 11.457/07 redistribuiu para a Secretaria da Receita Federal do Brasil os cargos dos servidores que, na data da publicação da Lei, se encontravam em efetivo exercício na Secretaria da Receita Previdenciária ou nas unidades técnicas e administrativas a ela vinculadas, assim dispondo no art. 12:
"Art. 12. Sem prejuízo do disposto no art. 49 desta Lei, são redistribuídos, na forma do disposto no art. 37 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, para a Secretaria da Receita Federal do Brasil, os cargos dos servidores que, na data da publicação desta Lei, se encontravam em efetivo exercício na Secretaria de Receita Previdenciária ou nas unidades técnicas e administrativas a ela vinculadas e sejam titulares de cargos integrantes:
I - do Plano de Classificação de Cargos, instituído pela Lei no 5.645, de 10 de dezembro de 1970, ou do Plano Geral de Cargos do Poder Executivo de que trata a Lei no 11.357, de 19 de outubro de 2006;
II - das Carreiras:
a) Previdenciária, instituída pela Lei no 10.355, de 26 de dezembro de 2001;
b) da Seguridade Social e do Trabalho, instituída pela Lei no 10.483, de 3 de julho de 2002;
c) do Seguro Social, instituída pela Lei no 10.855, de 1o de abril de 2004;
d) da Previdência, da Saúde e do Trabalho, instituída pela Lei no 11.355, de 19 de outubro de 2006.
[...]
§ 4o Os servidores referidos neste artigo poderão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contado da data referida no inciso II do caput do art. 51 desta Lei, optar por sua permanência no órgão de origem. (Incluído pela Lei nº 11.501, de 2007) (Regulamento)
§ 5o Os servidores a que se refere este artigo perceberão seus respectivos vencimentos e vantagens como se em exercício estivessem no órgão de origem, até a vigência da Lei que disporá sobre suas carreiras, cargos, remuneração, lotação e exercício".
O art. 47, inciso I, da mesma Lei autorizou o Poder Executivo a "transferir, depois de realizado inventário, do INSS, do Ministério da Previdência Social e da Procuradoria-Geral Federalpara a Secretaria da Receita Federal do Brasil e para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional acervos técnicos e patrimoniais, inclusive bens imóveis, obrigações, direitos, contratos, convênios,processos administrativos e demais instrumentos relacionados com as atividades transferidas em decorrência desta Lei;".
Assim, os créditos do INSS referentes às atividades transferidas em razão da Lei n. 11.457/07 que já existiam na data da vigência da Lei foram transferidos à União, que restou legitimada a cobrar os valores relativos ao pretendido ressarcimento, uma vez que houve a transferência também dos direitos relacionados.
De outro vértice, sobre o litisconsórcio passivo necessário assim leciona Daniel Amorim Assumpção Neves:
"A soma dessas duas circunstâncias faz com que o litisconsórcio seja necessário: sabendo-se de antemão que todos os sujeitos que participam da relação jurídica material sofrerão todo e qualquer efeito jurídico gerado sobre a relação, e sabendo-se que o sujeito que não participa do processo poderá sofrer os efeitos jurídicos da decisão, cria-se a obrigatoriedade de todos estarem presentes no processo, única forma po´ssivel de suportarem seus efeitos, que inexoravelmente atingirá a relação de direito material da qual participam" (Novo Código de Processo Civil Comentado, Salvador: Juspodivm, 2016, p. 182).
Nesta ótica, detendo a União a competência para cobrança dos valores entendidos como devidos, bem como por ter a competência, por meio da Delegacia da Receita Federal, para proceder ao desconto em folha, tenho que não há necessidade de integração do INSS à lide na condição de litisconsorte passivo necessário, já que não verificada a hipótese do art. 114 do Código de Processo Civil.
Rejeito, portanto, a preliminar.
Decadência ou prescrição
A discussão preliminar tem origem na eficácia da antecipação de tutela deferida nos autos da ação coletiva de número 2002.72.00.002565-6, que segundo versão da parte autora restou suspensa em 25 de maio de 2004 em razão do deferimento de efeito suspensivo à Apelação interposta contra a Sentença de Primeiro Grau, tendo sido definitivamente revogada em 26 de setembro de 2007, quando o Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região deu integral provimento ao Recurso de Apelação movido pelo INSS.
Em qualquer das hipóteses há a defesa de que já seria possível à Administração Pública intentar administrativamente o ressarcimento discutido nesta ação, tendo transcorrido o lapso quinquenal entre cada um destes marcos e a instauração do correspondente processo administrativo.
No entanto, entendo que somente com o trânsito em julgado da ação coletiva é que poderia se cogitar o início da contagem do prazo decadencial/prescricional, razão pela qual considero não ser essa a razão da procedência do pedido.
Da reposição de valores ao erário pagos por força de decisão judicial precária
Por ocasião da análise do pedido de tutela de urgência foi proferida pela MMa. Juíza Federal Substituta Dra. Marta Weimer, a seguinte decisão, que agrego às razões de decidir da presente sentença:
"Extrai-se da nota técnica lavrada pela Delegacia da Receita Federal do Brasil em Florianópolis, anexado ao evento nº 01/OUT15, que a cobrança decorre do recebimento provisório, com base em tutela antecipada, das rubricas do percentual de 26,05% correspondente a URP de fevereiro de 1989, durante a vigência da decisão judicial proferida nos autos 2002.72.00002565-6, que restou modificada no julgamento do recurso de apelação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Quanto à matéria em discussão (reposição de valores ao erário), este Juízo não desconhece que no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, '(...) a partir do julgamento do REsp 1.401.560/MT, Rel. p/acórdão Min. Ari Pargendler, submetido ao rito do art. 543-C, firmou-se orientação de que o servidor deve devolver os valores recebidos em virtude de decisão judicial precária, que venha a ser posteriormente revogada.' (AgRg no REsp 1.365.066/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 18/08/2015, DJe 26/08/2015).
Não obstante, o Supremo Tribunal Federal, posteriormente ao julgamento do paradigma pelo STJ, definiu que "o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar." (ARE 734242 AgR, Relator(a): Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015).
Ademais, filio-me ao entendimento exarado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região nos autos do agravo de instrumento nº 50128421620164040000, no sentido de que o caso em discussão apresenta particularidades que recomendam sejam obstados os descontos até decisão final do processo.
Desse modo, conveniente citar excerto do voto proferido no julgamento do referido agravo, in verbis:
O(a) autor(a) era vinculado(a) ao INSS e posteriormente restou redistribuído(a) para a Receita Federal do Brasil (Lei 11.457/2007). Antes da redistribuição, contudo, foi contemplado(a) pela ação trabalhista 725/1989, ajuizada pelo SINDPREVS/SC, tendo sido reconhecido na ocasião o direito a reajuste remuneratório específico (URP de fevereiro/1989- 26/06% - Plano Verão. Com a incorporação do reajuste, referida verba passou a se paga em rubrica específica, até que em 2002 a Administração, reanalisando a questão, reputou que o percentual deveria ser deduzido em datas-bases posteriores, o que acarretaria a cessação ainda em dezembro de 1989.
Determinada a cessação, o sindicato ajuizou nova ação, agora perante a Justiça Federal (pois os servidores já haviam passado ao regime jurídico único), que tomou o número 2002.72.00.002565-6, com o intuito de combater a referida supressão do pagamento da URP. Citada ação, após longa tramitação, foi julgada improcedente.
Com isso, pretende agora a União cobrar do(a) servidor(a) tudo o que foi pago a título de URP desde a data em que obstado o desconto por força do deferimento da decisão provisória no processo 2002.72.00.002565-6.
O longo tempo decorrido e a natureza alimentar da verba afastam a alegação de urgência por parte da União e, de outro lado, evidenciam o receio de dano por parte do(a) servidor(a).
Por outro lado, trata-se o percentual referente à URP de parcela remuneratória que foi incorporada à folha de pagamentos entre as décadas de 1980 e 1990, incorporação que decorreu, tenha ou não havido interpretação equivocada do título, em tese, de decisão judicial (ação trabalhista). Os servidores, saliente-se, figuraram como substituídos, pelo que a iniciativa, de rigor, sequer foi pessoal.
Não soa desarrazoada a afirmação de que, em tese, os valores, até que afirmado em definitivo que deveria ocorrer a cessação, estavam sendo recebidos (e a própria Administração, como já afirmado, entendia assim) por força de decisão judicial (ação trabalhista). Sendo este o quadro, defensável, em princípio, a aplicação da mesma ratio que inspirou os precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que descabida a restituição de valores recebidos por conta de decisão judicial transitada em julgado:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. VALORES RECEBIDOS POR SERVIDOR PÚBLICO EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA POR MEIO DE AÇÃO RESCISÓRIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Nº 1.401.560/MT. INAPLICABILIDADE. 1. 'A jurisprudência do STJ firmou o entendimento no sentido de que, em virtude da natureza alimentar, não é devida a restituição dos valores que, por força de decisão transitada em julgado, foram recebidos de boa-fé, ainda que posteriormente tal decisão tenha sido desconstituída em ação rescisória'. (AgRg no AREsp 2.447/RJ, Rel.Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/04/2012, DJe 04/05/2012) 2. O entendimento consolidado pela Primeira Seção do STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.410.560/MT, segundo o qual é legítimo o desconto de valores pagos em razão do cumprimento de decisão judicial precária, posteriormente revogada, não tem aplicação no caso dos autos, pois na hipótese o pagamento decorreu de sentença judicial definitiva, desconstituída em ação rescisória. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 463.279/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 08/09/2014)
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. VALORES RECEBIDOS POR SERVIDOR PÚBLICO EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA POR MEIO DE AÇÃO RESCISÓRIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Nº 1.401.560/MT. INAPLICABILIDADE. 1. 'A jurisprudência do STJ firmou o entendimento no sentido de que, em virtude da natureza alimentar, não é devida a restituição dos valores que, por força de decisão transitada em julgado, foram recebidos de boa-fé, ainda que posteriormente tal decisão tenha sido desconstituída em ação rescisória.' (AgRg no AREsp 2.447/RJ, Rel.Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/04/2012, DJe 04/05/2012) 2. O entendimento consolidado pela Primeira Seção do STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.410.560/MT, segundo o qual é legítimo o desconto de valores pagos em razão do cumprimento de decisão judicial precária, posteriormente revogada, não tem aplicação no caso dos autos, pois na hipótese o pagamento decorreu de sentença judicial definitiva, desconstituída em ação rescisória. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 463.279/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 08/09/2014)
Em sentido similar o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal:
SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE 1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010) 2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua restituição. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.(MS 25921 AgR-segundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/09/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193 DIVULG 25-09-2015 PUBLIC 28-09-2015)
Deve ser registrado, ainda, que na ação 2002.72.00.002565-6 já referida, a sentença, publicada no dia 27/11/2003, foi de procedência. Não obstante, no dia 29/08/2007 foi dado provimento ao apelo do INSS, tendo sido o acórdão publicado no Diário Eletrônico do dia 17/09/2007, e a autarquia intimada oficialmente no dia 26/09/2007, conforme consulta processual na internet. Entrementes, somente no dia 04/10/2013 a Receita Federal (onde atualmente lotada a servidora) deu início ao processo de reposição ao erário (EVENTO 1 - OUT4).
Pode-se afirmar, assim, sob outra ótica, que plausível a alegação de que após setembro de 2007, quando reformada a decisão de primeiro grau no processo 2002.72.00.002565-6, os pagamentos não se deram por força de decisão provisória, mas, sim, por erro da administração, que continuou a pagar a URP, a despeito da inexistência, a partir de então, de manifestação judicial definitiva afirmando que a cessação da rubrica em 2002 estava correta.
Ainda, como estão em discussão parcelas com vencimento entre maio/2002 e julho/2007 - (evento nº 01/OUT10), e como decorridos mais de cinco anos até a data da deflagração do procedimento administrativo visando à reposição dos valores, não se pode descartar, em primeira análise, própria deste momento processual, a alegação de que consumada a prescrição.
Logo, diante do caráter alimentar, aliado à boa-fé no recebimento das verbas, decorrente de decisão judicial provisória, encontram-se presentes a probabilidade do direito e o risco de dano, o que autoriza o deferimento da tutela de urgência.
Ante o exposto, nos termos do art. 300 do CPC, defiro o pedido de tutela de urgência para determinar que a parte Ré, no prazo de 10 (dez) dias, suspenda os efeitos do ato administrativo que gerou o comando de descontos contra a remuneração do Autor em decorrência da notificação anexa à inicial (evento nº 01/OUT17), até o julgamento definitivo do presente processo, sob pena de multa diária que arbitro em R$ 300,00 (trezentos reais)".
No decorrer da ação, a parte ré não trouxe qualquer elemento capaz de alterar este contexto inicial identificado, devendo prevalecer, de modo definitivo, a conclusão inicialmente exarada.
A decisão, aliás, foi mantida pelo TRF da 4ª Região ao apreciar o Agravo de Instrumento de n. 5044420-60.2017.4.04.0000, interposto pela União em face da decisão proferida, tendo-a alterado unicamente em relação ao valor da multa diária, que restou minorado para R$ 100,00 (cem reais).
Outrossim, em outros julgados recentes do TRF da 4ª Região prevaleceu a interpretação de que "não há falar em devolução de parcela remuneratória percebida de boa-fé. O Superior Tribunal de Justiça vem decidindo, de forma reiterada, que verbas de caráter alimentar pagas a maior em face de conduta errônea da Administração ou da má-interpretação legal não devem ser devolvidas quando recebidas de boa-fé pelo beneficiário, inclusive em sede de recurso repetitivo", a exemplo, no Agravo de Instrumento n. 5016427-42.2017.404.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 24/08/2017.
Por tais razões, a procedência do pedido é medida que se impõe.
(...)
Por primeiro, afasto a necessidade de integração do Instituto Nacional do Seguro Social no pólo passivo da ação, com base nas razões já declinadas pelo juízo a quo, na esteira da jurisprudência:
A Lei n. 11.457/07 redistribuiu para a Secretaria da Receita Federal do Brasil os cargos dos servidores que, na data da publicação da Lei, se encontravam em efetivo exercício na Secretaria da Receita Previdenciária ou nas unidades técnicas e administrativas a ela vinculadas, assim dispondo no art. 12:
"Art. 12. Sem prejuízo do disposto no art. 49 desta Lei, são redistribuídos, na forma do disposto no art. 37 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, para a Secretaria da Receita Federal do Brasil, os cargos dos servidores que, na data da publicação desta Lei, se encontravam em efetivo exercício na Secretaria de Receita Previdenciária ou nas unidades técnicas e administrativas a ela vinculadas e sejam titulares de cargos integrantes:
I - do Plano de Classificação de Cargos, instituído pela Lei no 5.645, de 10 de dezembro de 1970, ou do Plano Geral de Cargos do Poder Executivo de que trata a Lei no 11.357, de 19 de outubro de 2006;
II - das Carreiras:
a) Previdenciária, instituída pela Lei no 10.355, de 26 de dezembro de 2001;
b) da Seguridade Social e do Trabalho, instituída pela Lei no 10.483, de 3 de julho de 2002;
c) do Seguro Social, instituída pela Lei no 10.855, de 1o de abril de 2004;
d) da Previdência, da Saúde e do Trabalho, instituída pela Lei no 11.355, de 19 de outubro de 2006.
[...]
§ 4º Os servidores referidos neste artigo poderão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contado da data referida no inciso II do caput do art. 51 desta Lei, optar por sua permanência no órgão de origem. (Incluído pela Lei nº 11.501, de 2007) (Regulamento)
§ 5º Os servidores a que se refere este artigo perceberão seus respectivos vencimentos e vantagens como se em exercício estivessem no órgão de origem, até a vigência da Lei que disporá sobre suas carreiras, cargos, remuneração, lotação e exercício".
O art. 47, inciso I, da mesma Lei autorizou o Poder Executivo a "transferir, depois de realizado inventário, do INSS, do Ministério da Previdência Social e da Procuradoria-Geral Federalpara a Secretaria da Receita Federal do Brasil e para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional acervos técnicos e patrimoniais, inclusive bens imóveis, obrigações, direitos, contratos, convênios,processos administrativos e demais instrumentos relacionados com as atividades transferidas em decorrência desta Lei;".
Assim, os créditos do INSS referentes às atividades transferidas em razão da Lei n. 11.457/07 que já existiam na data da vigência da Lei foram transferidos à União, que restou legitimada a cobrar os valores relativos ao pretendido ressarcimento, uma vez que houve a transferência também dos direitos relacionados.
De outro vértice, sobre o litisconsórcio passivo necessário assim leciona Daniel Amorim Assumpção Neves:
"A soma dessas duas circunstâncias faz com que o litisconsórcio seja necessário: sabendo-se de antemão que todos os sujeitos que participam da relação jurídica material sofrerão todo e qualquer efeito jurídico gerado sobre a relação, e sabendo-se que o sujeito que não participa do processo poderá sofrer os efeitos jurídicos da decisão, cria-se a obrigatoriedade de todos estarem presentes no processo, única forma po´ssivel de suportarem seus efeitos, que inexoravelmente atingirá a relação de direito material da qual participam" (Novo Código de Processo Civil Comentado, Salvador: Juspodivm, 2016, p. 182).
Nesta ótica, detendo a União a competência para cobrança dos valores entendidos como devidos, bem como por ter a competência, por meio da Delegacia da Receita Federal, para proceder ao desconto em folha, tenho que não há necessidade de integração do INSS à lide na condição de litisconsorte passivo necessário, já que não verificada a hipótese do art. 114 do Código de Processo Civil.
Rejeito, portanto, a preliminar.
Quanto ao mérito da lide propriamente dito, é cediço que as verbas remuneratórias recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração, não são passíveis de devolução:
ADMINISTRATIVO. PAGAMENTO A MAIOR. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ OBJETIVA. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E DEFINITIVIDADE DO PAGAMENTO. RESTITUIÇÃO DE VALORES. DESCABIMENTO. 1. No julgamento do REsp 1.244.182/PB, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, ficou estabelecido o entendimento de que, nos casos em que o pagamento indevido foi efetivado em favor de servidor público, em decorrência de interpretação equivocada ou de má aplicação da lei por parte da Administração, a verba não está sujeita à devolução, presumindo-se a boa-fé do servidor. 2. Na linha do julgado precitado, o elemento configurador da boa-fé objetiva é a inequívoca compreensão, pelo beneficiado, do caráter legal e definitivo do pagamento. 3. No caso dos autos, o pagamento originado de decisão administrativa, devidamente motivada, gera presunção de legitimidade. 3. Recurso Especial não provido. (STJ, 2ª Turma, REsp 1590238/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, julgado em 03/05/2016, DJe 25/05/2016)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. URP DE FEVEREIRO DE 1989. REESTRUTURAÇÃO DE CARREIRA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES. BOA-FÉ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Inexigível a devolução de verbas remuneratórias recebidas de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei ou, ainda, erro operacional cometido pela Administração. Nos termos do art. 86, caput, do CPC/2015, se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA nº 5004755-42.2015.404.7102, Rel. Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/07/2016)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. URP DE FEVEREIRO DE 1989. REESTRUTURAÇÃO DE CARREIRA. ABSORÇÃO. DECADÊNCIA. COISA JULGADA. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO. INVIÁVEL. A regra prevista no art. 54 da Lei n.º 9.784/99 não se aplica às hipóteses em que a outorga da vantagem, posteriormente suprimida, decorre de decisão judicial. A decisão judicial proferida no Juízo trabalhista tem seus efeitos limitados à vigência do contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas, mesmo que sobre ela tenha se operado a coisa julgada. Com o advento da Lei n.º 8.112/1990, as relações de trabalho, estabelecidas com a Administração Pública, embora de trato sucessivo, foram extintas, remanescendo apenas a garantia da irredutibilidade nominal e global da remuneração dos servidores enquadrados no regime jurídico único. A eficácia do título judicial perdura enquanto estiver em vigor a lei que o fundamentou, não podendo surtir efeitos após a revogação do regime jurídico existente à época (art. 471, inciso I, do CPC), pois 'não há direito adquirido a regime jurídico-funcional pertinente à composição dos vencimentos ou à permanência do regime legal de reajuste de vantagem, desde que eventual modificação introduzida por ato legislativo superveniente preserve o montante global da remuneração' (STF, 2ª Turma, RE-AgR 433621, Relator Ministro Eros Grau, DJE 14.03.2008). Não há amparo legal para que os servidores das instituições federais de ensino, que foram contemplados com a reestruturação de suas carreiras pelas Leis n.ºs 11.087/2005, 11.091/2005 e 11.784/2008, permaneçam recebendo a parcela referente a URP de fevereiro de 1989, que foi absorvida pelo novo padrão remuneratório. A jurisprudência desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de ser inviável a exigência de devolução de valores pagos a maior quando recebidos de boa-fé pelo servidor/pensionista. (TRF4, 4ª Turma, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA nº 5006307-50.2012.404.7101, Rel. Juiz Federal EDUARDO VANDRÉ O L GARCIA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 26/07/2016)
Todavia, se o recebimento de tais valores decorre de decisão judicial precária, posteriormente revogada, a divergência jurisprudencial impera. De um lado, há o posicionamento do e. Superior Tribunal de Justiça, inclusive em sede de recurso repetitivo, no sentido de que são passíveis de devolução; de outro, existem precedentes do e. Supremo Tribunal Federal, reconhecendo o caráter irrepetível das parcelas de natureza alimentar percebidas de boa-fé:
Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR SERVIDORES PÚBLICOS. VALORES REFERENTES À PARCELA DE 10,87% (IPCR) E AO PAGAMENTO PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES GRATIFICADAS E CARGOS EM COMISSÃO. A NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM O DEVER DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DESPROVIDOS. 1. O acórdão recorrido foi publicado em período anterior à vigência do Novo Código de Processo Civil, razão pela qual os presentes embargos seguirão a disciplina jurídica da Lei nº 5.869/1973, por força do princípio tempus regit actum. 2. A omissão, contradição ou obscuridade, quando inocorrentes, tornam inviável a revisão da decisão em sede de embargos de declaração, em face dos estreitos limites do artigo 535 do CPC/1973. 3. A revisão do julgado, com manifesto caráter infringente, revela-se inadmissível, em sede de embargos (Precedentes: AI 799.509-AgR-ED, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJe 8/9/2011, e RE 591.260-AgR-ED, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, DJe 9/9/2011). 4. In casu, o acórdão embargado restou assim ementado: "AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATOS DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR SERVIDORES PÚBLICOS. VALORES REFERENTES À PARCELA DE 10,87% (IPCR) E RELATIVOS A PAGAMENTO PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES COMISSIONADAS E CARGOS EM COMISSÃO. A NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO". 5. Embargos de declaração DESPROVIDOS. (STF, MS 31259 AgR-ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 16/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-184 DIVULG 30/08/2016 PUBLIC 31/08/2016)
Ementa: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVOS REGIMENTAIS EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APOSENTADORIA. EXAME. DECADÊNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DIREITO AO PAGAMENTO DA UNIDADE DE REFERÊNCIA E PADRÃO - URP DE 26,05%, INCLUSIVE PARA O FUTURO, RECONHECIDO POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. PERDA DA EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO JUDICIAL, EM RAZÃO DA SUPERVENIENTE ALTERAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS FÁTICOS E JURÍDICOS QUE LHE DERAM SUPORTE. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À GARANTIA DA COISA JULGADA, DA SEGURANÇA JURÍDICA, DA BOA-FÉ E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. DEVOLUÇÃO DAS VERBAS PERCEBIDAS. IMPOSSIBILIDADE. 1. Nos termos da jurisprudência do STF, o ato de concessão de aposentadoria é complexo, aperfeiçoando-se somente após a sua apreciação pelo Tribunal de Contas da União, sendo, desta forma, inaplicável o art. 54, da Lei nº 9.784/1999, para os casos em que o TCU examina a legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. 2. Inexiste afronta ao princípio da separação de poderes quando o TCU não desconstitui decisão advinda do Poder Judiciário, mas apenas emite interpretação quanto à modificação das condições fáticas que justificaram a prolação da sentença, exercendo o seu poder-dever de fiscalizar a legalidade das concessões. 3. A eficácia temporal da sentença, cuidando-se de relação jurídica de trato continuado, circunscreve-se aos pressupostos fáticos e jurídicos que lhe serviram de fundamento, não se verificando ofensa ao princípio da coisa julgada quando o TCU verifica mudanças no conjunto fático que deu suporte à decisão. 4. Não se constata ofensa aos princípios da segurança jurídica e da boa-fé quando a alteração do contexto fático implica alteração dos fundamentos pelos quais o próprio direito se constituiu. 5. Esta Corte decidiu, quando do julgamento do MS 25.430, que as verbas recebidas a título de URP, que havia sido incorporado à remuneração dos servidores e teve sua ilegalidade declarada pelo Tribunal de Contas da União, até o momento do julgamento, não terão que ser devolvidas, em função dos princípios da boa-fé e da segurança jurídica, tendo em conta expressiva mudança de jurisprudência relativamente à eventual ofensa à coisa julgada de parcela vencimental incorporada à remuneração por força de decisão judicial. 6. Agravos regimentais a que se nega provimento. (STF, MS 27965 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 15/03/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-066 DIVULG 08/04/2016 PUBLIC 11/04/2016)
EMENTA AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. JUIZ CLASSISTA. FÉRIAS ANUAIS DE SESSENTA DIAS. CONCESSÃO PREVISTA NO REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO VIGENTE À ÉPOCA. NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA E BOA-FÉ DO IMPETRANTE A CONJURAR A NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO. 1. Na ausência, à época dos pagamentos glosados pela autoridade impetrada, de decisão prévia e específica desta Suprema Corte, a respeito do tema das férias anuais de juízes classistas, resulta evidenciada dúvida plausível quanto à legalidade dos atos autorizadores dos mencionados pagamentos, praticados em conformidade com o então disciplinado no Regimento Interno do TRT da 15ª Região, aspecto que, aliado à boa-fé do impetrante e à natureza alimentar dos valores recebidos, afasta, na espécie, o dever de devolução de valores ao erário. 2. Decisão agravada proferida em sintonia com os seguintes precedentes: MS 27467 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 28.9.2015; AI 490551 AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe de 03.9.2010; e MS 26085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 13.6.2008. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF, MS 28165 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-077 DIVULG 20/04/2016 PUBLIC 22/04/2016)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. OMISSÃO EM RELAÇÃO À DISPENSA DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS DE BOA-FÉ. A NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM O DEVER DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. EMBARGOS ACOLHIDOS. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010) 2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua restituição. 3. Embargos acolhidos a fim de impedir qualquer determinação de devolução das quantias recebidas até a revogação da liminar, a título da parcela de 26,05%, pelos substituídos da associação da impetrante. (STF, MS 25678 AgR-ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 08/09/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-217 DIVULG 28/10/2015 PUBLIC 29/10/2015)
PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO. O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrario sensu, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária (declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675) dispensava. Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. Recurso especial conhecido e provido. (STJ, 1ª Seção, REsp 1401560/MT, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, Rel. p/ Acórdão Ministro ARI PARGENDLER, julgado em 12/02/2014, DJe 13/10/2015)
Nesse contexto, considerando que a tese sustentada pela apelante não vem sendo acolhida pelo e. Supremo Tribunal Federal em casos análogos, há de prevalecer a orientação consubstanciada na sentença, em observância ao decidido pela Suprema Corte, última instância do Judiciário nacional.
Nesta Corte, ilustram tal entendimento:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR. IRREPETÍVEL. Os valores recebidos de boa-fé por servidor público, em decorrência de antecipação de tutela posteriormente revogada, não estão sujeitos à devolução em razão de seu caráter alimentar. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006324-81.2015.404.7101, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 24/04/2017 - grifei)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR RECEBIDA EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVOGAÇÃO DA MEDIDA LIMINAR. DEVOLUÇÃO. DESNECESSIDADE. É inexigível a restituição de verbas de caráter alimentar, recebidas de boa-fé, por força de decisão judicial liminar posteriormente revogada. Precedentes do STF. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5019522-37.2014.404.7000, 2ª SEÇÃO, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 25/12/2016 - grifei)
Destarte, irretocável a sentença.
Em observância ao contido no art. 85, § 11º, do CPC/2015, majoro os honorários advocatícios parar 11% (onze por cento).
Por fim, em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contrariou nem negou vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5001573-65.2017.4.04.7203/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
APELADO: DIRLEI CORREA DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: LUÍS FERNANDO SILVA
EMENTA
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR RECEBIDA EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVOGAÇÃO DA MEDIDA LIMINAR. DEVOLUÇÃO. DESNECESSIDADE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO.
1. Se a União tem competência para cobrança dos valores entendidos como devidos, inclusive para proceder ao respectivo desconto em folha de pagamento, não há necessidade de integração do Instituto Nacional do Seguro Social à lide na condição de litisconsorte passivo necessário.
2. É inexigível a restituição de verbas de caráter alimentar, recebidas de boa-fé pelo servidor público, por força de decisão judicial liminar posteriormente revogada. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de fevereiro de 2018.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000347491v6 e do código CRC f4097d8c.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/02/2018
Apelação Cível Nº 5001573-65.2017.4.04.7203/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
SUSTENTAÇÃO ORAL: LUÍS FERNANDO SILVA por DIRLEI CORREA DE OLIVEIRA
APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
APELADO: DIRLEI CORREA DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: LUÍS FERNANDO SILVA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/02/2018, na seqüência 47, disponibilizada no DE de 05/02/2018.
Certifico que a 4ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação. DETERMINADA A JUNTADA DO VÍDEO DO JULGAMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
Votante: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA
LUIZ FELIPE OLIVEIRA DOS SANTOS
Secretário
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