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ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. ENSINO SUPERIOR EM UNIVERSIDADE PÚBLICA. SISTEMA DE COTAS. DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA. INDEFERIMENTO DE MATRÍC...

Data da publicação: 07/07/2020, 23:46:24

EMENTA: ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. ENSINO SUPERIOR EM UNIVERSIDADE PÚBLICA. SISTEMA DE COTAS. DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA. INDEFERIMENTO DE MATRÍCULA. HIPÓTESE EM QUE DESPROPORCIONAL A PENALIDADE APLICADA. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. O princípio da razoabilidade recomenda que as exigências administrativas sejam aptas a cumprir os fins a que se destinam, sob pena de desproporcionalidade entre a falta cometida e a penalidade aplicada. 2. O atraso ou insuficiência na entrega de documentos pelo aprovado em concurso vestibular não é suficiente, por si só, para indeferimento de matrícula do candidato, na medida em que, além de a perda da vaga obtida em processo seletivo altamente competitivo configurar consequência muito gravosa ao estudante, contraria a própria finalidade do certame que é selecionar os candidatos mais preparados. (TRF4, AC 5046096-49.2018.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 25/04/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5046096-49.2018.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

APELANTE: CARINA MACHADO SOUZA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANAINA FONTANIVE

APELADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS (INTERESSADO)

APELADO: Pró-Reitor - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS - Porto Alegre (IMPETRADO)

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Apelação interposto pela impetrante, CARINA MACHADO SOUZA, contra sentença que denegou a segurança (ev. 27), pleiteada para que fosse determinada à autoridade coatora a realização de matrícula e ingresso imediato da ora recorrente no segundo semestre de 2018 do Curso de Graduação em Ciências Sociais da UFRGS.

Alega a apelante que foi aprovada no exame vestibular de 2018 da referida Universidade, mas que, por formalidades exigidas pela mesma, teve sua matrícula não homologada, em que pese tenha apresentando no prazo estipulado pelo edital toda sua documentação pessoal hábil e compatível com a finalidade a que se destinava: ingresso em curso de ensino superior pela modalidade candidatos egressos do Sistema Público de Ensino Médio com renda familiar bruta mensal igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo nacional per capita.

Aduz que a discussão central que ronda a presente demanda judicial é o seu direito constitucional à educação, em curso superior, de modo que para restringir-lhe tal direito deve ser devidamente justificado pelos pressupostos da razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se verifica na hipótese.

Requer o conhecimento e total provimento do recurso.

Apresentadas contrarrazões (ev. 41).

Distribuído o feito a esta Corte e intimado o MPF, foi lançado parecer opinando pelo provimento do recurso (ev. 4).

É o relato.

VOTO

Inicialmente, imprescindível destacar que já analisei a presente controvérsia, quando da interposição de agravo de instrumento pela ora apelante contra a decisão, em primeira instância, que indeferiu liminarmente a antecipação de tutela para determinar a realização imediata de sua matrícula. Na oportunidade, deferi o pedido de efeito suspensivo ativo, forte nos seguintes fundamentos (Agravo de Instrumento n.º 5034861-45.2018.4.04.0000, evento 2):

[...]

Diante das razões da agravante, entendo que a decisão agravada deve ser reformada.

A questão atinente ao atraso ou insuficiência na entrega de documentos pelo aprovado em concurso vestibular perante a instituição de ensino superior já restou examinada por esta Corte em demandas anteriores, ocasião em que se entendeu desproprocional ter a matrícula inviabilizada por ausência de documento na data estipulada para a sua apresentação. Veja-se:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MATRÍCULA UNIVERSIDADE. ATRASO ENTREGA DOCUMENTOS. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. DIREITO À EDUCAÇÃO. CONCESSÃO DA ORDEM. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Ainda que o Edital já restasse disponibilizado ao estudante muito antes da notícia da aprovação, verifica-se desproporcional inviabilizar sua matrícula tão somente em razão da ausência de fotocópia autenticada do Histórico Escolar na data estipulada para apresentação dos documentos, especialmente em face da comprovação de que o impetrante efetivamente concluiu o Ensino Médio em Instituição de Ensino regular e reconhecida por órgão competente. Ademais, verossímeis as alegações do impetrante no sentido de que houve dificuldade em reunir a documentação necessária à realização da matrícula, uma vez que este cursou o Ensino Médio no Município de Guanambi - Bahia, sendo que atualmente reside em Curitiba - Paraná. (TRF4 5032652-26.2016.4.04.7000, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 14/12/2016)

MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. MATRÍCULA. CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO. COMPROVAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. Embora o impetrante não tenha cumprido rigorosamente a exigência dos editais da universidade no que diz respeito à apresentação da via original e de cópias autenticadas da certidão de conclusão e do histórico escolar do ensino médio, os documentos apresentados demonstram que ele efetivamente concluiu o ensino médio, de modo que apenas formalmente a exigência foi descumprida. Reputa-se irrazoável e desproporcional que o impetrante seja impedido de iniciar imediatamente o curso superior, sendo obrigado, inclusive, a prestar novo processo seletivo, pelo simples fato de não apresentar o certificado de conclusão do ensino médio menos de dez dias antes do início do semestre letivo universitário. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5017066-82.2012.404.7001, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 21/08/2013)

Tenho entendido que, em casos tais, deve ser considerado que o direito à educação é um bem maior em relação a um requisito de organização imposto pela instituição de ensino e as exigências formais da instituição de ensino devem ceder diante de situações que, por suas características, denotam o efetivo esforço do aluno em regularizar sua situação, sob pena de evidente desproporcionalidade entre a falta cometida pela agravante (apresentação incompleta dos documentos) e a penalidade aplicada (perda da vaga conquistada em processo seletivo altamente competitivo).

Ademais, na hipótese, a documentação incompleta se refere à comprovação da renda per capita da família da autora, o que é fator fundamental para o exame da implementação dos requisitos à vaga como quotista.

Da análise dos documentos acostados ao processo de origem, verifica-se nas informações prestadas pela UFRGS (evento 9):

Carina realizou o envio da documentação incompleta no dia 06/02/2018, às 18h56min. Conforme o edital do certame, nesta oportunidade a Impetrante já deveria ter encaminhado a totalidade da documentação exigida para comprovação dos requisitos para a vaga pleiteada.

A documentação encaminhada pela Impetrante teve sua análise socioeconômica realizada no dia 26/02/2018, às 15h09min, sendo não homologada com o seguinte parecer:

Edital do Concurso Vestibular de 2018

A) Documentos obrigatórios, conforme item 8.4 do Edital:

FALTANTES

DA MÃE -

- Declaração da mãe sobre de divórcio não oficializado.

- Documento de identificação atualizado se houver (com menos de 10 anos)

- Extratos do Bradesco ou declaração de inatividade da conta (havia alguns documentos que sairam cortados no arquivo)

Da CANDIDATA -

- CNIS

- Declaração de não percepção de renda.

COMO OBTER o CNIS-Remunerações/pagamento de benefícios e o RegistratoCCS: siga as orientações em http://www.ufrgs.br/prograd/ingresso-cvsisu/ingresso-por-cotas/vestibular-2018

B) Da composição do Grupo Familiar de Origem, conforme item 1.5.7 (incisos I e II) do Edital: ADEQUADAMENTE INFORMADO.

C) Da apuração da Renda Familiar, conforme item 1.5.7 (incisos III, IV e V) do Edital:

NÃO FOI POSSÍVEL APURAR DEVIDO À FALTA DE DOCUMENTOS OBRIGATÓRIOS.

Documentos para RECURSO: leia atentamente o item 11 do Edital

No requerimento de recurso da candidata consta que a documentação solicitada foi anexada (evento 1, OUT 8). Foram juntados, entre outros documentos, cópia da declaração de não percepção de rendimentos pela candidata, declaração quanto ao documento de identidade da mãe, declaração da mãe explicando os motivos pelos quais o divórcio não foi oficializado, dados cadastrais do CNIS da candidata, declaração de que não consta benefícios ativos no Sistema Único de Benefícios em nome da candidata, declaração de isenção de IRPF da candidata e da sua mãe, extrato bancário em nome da mãe da candidata do Banco do Estado do Rio Grande do Sul referente a abril/2017 a setembro/2017, declaração do banco Itaú de que a mãe da candidata não possui conta ativa, extrato previdenciário do CNIS da mãe da candidata que corresponde à anotação em CTPS de vínculo de trabalho encerrado em maio/2013 (empresa Pillaris Consultoria, Gestão e Planejamento Empresarial Ltda. -EPP) e recebimento de benefício de aposentadoria por idade (NB 1756579374, DIB 23/02/2016, valor da remuneração em 01/2018 R$ 960,51).

Sendo assim, tenho que resta comprovada a verossimilhança das alegações a ensejar a concessão da liminar. O risco de prejuízo, acaso concedida a medida somente ao final, resta presente, porquanto já iniciado o semestre letivo.

Sendo assim, estando demonstradas a probabilidade do direito invocado e a existência de perigo de dano, recomendável que seja reformada a decisão agravada.

[...]

Do exposto, defiro em parte o pedido de tutela de urgência de modo a permitir a matrícula e ingresso imediato no segundo semestre de 2018 do Curso de Graduação em Ciências Sociais da UFRGS, com a participação da agravante nas aulas do curso de graduação em Ciências Sociais, em igualdade de condições aos demais alunos, até que seja prolatada sentença.

Intimem-se, sendo a parte agravada para os fins do disposto no art. 1.019, II, do Código de Processo Civil.

Diante das razões acima expostas, tenho que merece reforma a sentença de primeiro grau.

Com efeito, nos termos do já fundamentado, constata-se que a partir da documentação encaminhada pela candidata para avaliação já era possível verificar a percepção de renda dentro do limite máximo para conquista da vaga na modalidade concorrida, sendo desproporcional a relevância que se deu à suposta falta da CTPS da mãe e de histórico de remunerações e benefícios constantes do CNIS da candidata, ora apelante. Além disso, ressalto que tais faltas, como já observado, restaram supridas na documentação trazida pela impetrante nestes autos, com a inicial, as quais apenas corroboram com os demais documentos encaminhados na via administrativa.

Outrossim, destaco que o princípio da razoabilidade recomenda que as exigências administrativas sejam aptas a cumprir os fins a que se destinam. Na hipótese, o ato da autoridade mostra-se desproporcional à finalidade pretendida, conforme também já consignado nas razões acima transcritas, na medida em que a suposta falta de documentação específica exigida não enseja grave prejuízo à instituição de ensino superior, tampouco prejudicava a análise da renda familiar mensal.

Em contrapartida, a perda da vaga obtida em um processo seletivo deveras competitivo, para acesso à Universidade Pública, pela circunstância de não ter apresentado documento específico requerido, configura consequência muito gravosa à estudante, contrária à própria finalidade do certame que é selecionar os candidatos mais preparados.

Destarte, friso que não se pretende com tal entendimento alargar ou alterar os critérios substanciais de obtenção do benefício, mas tão somente permitir que a comprovação dos requisitos se dê da forma mais ampla, a fim de melhor atender ao objetivo da norma.

Sem honorários, Mandado de Segurança.

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, de modo a permitir a matrícula e ingresso da apelante no Curso de Graduação em Ciências Sociais da UFRGS, com participação nas aulas em igualdade de condições aos demais alunos.



Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000997071v30 e do código CRC 1a2de869.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 25/4/2019, às 10:57:43


5046096-49.2018.4.04.7100
40000997071.V30


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:46:23.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5046096-49.2018.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

APELANTE: CARINA MACHADO SOUZA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANAINA FONTANIVE

APELADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS (INTERESSADO)

APELADO: Pró-Reitor - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS - Porto Alegre (IMPETRADO)

EMENTA

Administrativo. mandado de segurança. apelação. ensino superior em universidade pública. sistema de cotas. DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA. INDEFERIMENTO DE MATRÍCULA. hipótese em que desproporcional a penalidade aplicada. provimento do recurso.

1. O princípio da razoabilidade recomenda que as exigências administrativas sejam aptas a cumprir os fins a que se destinam, sob pena de desproporcionalidade entre a falta cometida e a penalidade aplicada.

2. O atraso ou insuficiência na entrega de documentos pelo aprovado em concurso vestibular não é suficiente, por si só, para indeferimento de matrícula do candidato, na medida em que, além de a perda da vaga obtida em processo seletivo altamente competitivo configurar consequência muito gravosa ao estudante, contraria a própria finalidade do certame que é selecionar os candidatos mais preparados.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, de modo a permitir a matrícula e ingresso da apelante no Curso de Graduação em Ciências Sociais da UFRGS, com participação nas aulas em igualdade de condições aos demais alunos, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de abril de 2019.



Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000997072v8 e do código CRC bf69bb42.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 25/4/2019, às 10:57:43


5046096-49.2018.4.04.7100
40000997072 .V8


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:46:23.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIãO

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/04/2019

Apelação Cível Nº 5046096-49.2018.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

APELANTE: CARINA MACHADO SOUZA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANAINA FONTANIVE

APELADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS (INTERESSADO)

APELADO: Pró-Reitor - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS - Porto Alegre (IMPETRADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/04/2019, na sequência 84, disponibilizada no DE de 29/03/2019.

Certifico que a 3ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, DE MODO A PERMITIR A MATRÍCULA E INGRESSO DA APELANTE NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS DA UFRGS, COM PARTICIPAÇÃO NAS AULAS EM IGUALDADE DE CONDIÇÕES AOS DEMAIS ALUNOS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 20:46:23.

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