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ADMINISTRATIVO. MILTAR. REFORMA. REINTEGRAÇÃO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO. NÃO CONCESSÃO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. TRF4. 5000433-76.2015.4.04.71...

Data da publicação: 30/06/2020, 21:17:13

EMENTA: ADMINISTRATIVO. MILTAR. REFORMA. REINTEGRAÇÃO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO. NÃO CONCESSÃO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. O diploma legal determina que a incapacidade definitiva em decorrência de acidente sofrido em serviço de acordo com os artigos 106 e 108, III, do Estatuto dos Militares. Todavia, tendo à perícia judicial constatada a inexistência de incapacidade laboral, não é de conceder-se a reintegração. Não restou comprovada a arbitrariedade ou ilegalidade no ato de licenciamento/exclusão do militar, hábil a configurar conduta ilícita ou mesmo falha do serviço público na prática de algum ato administrativo, assim como não restou comprovado que o autor tenha sofrido tratamento degradante ou humilhante na caserna. Inexistente, portanto, a conduta lesiva de parte da administração, imprescindível em caso de condenação por dano moral, a improcedência de pedido nesse sentido é medida que se impõe. (TRF4, AC 5000433-76.2015.4.04.7102, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 15/12/2016)


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000433-76.2015.4.04.7102/RS
RELATOR
:
LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
APELANTE
:
JOAO FELICIO VARGAS DE SOUZA
ADVOGADO
:
RENATO WEBER
:
RENATO JOSÉ WEBER
:
LUCIO ANDRÉ MÜLLER LORENZON
APELADO
:
UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. MILTAR. REFORMA. REINTEGRAÇÃO. AUSÊNCIA DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO. NÃO CONCESSÃO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA.
O diploma legal determina que a incapacidade definitiva em decorrência de acidente sofrido em serviço de acordo com os artigos 106 e 108, III, do Estatuto dos Militares.
Todavia, tendo à perícia judicial constatada a inexistência de incapacidade laboral, não é de conceder-se a reintegração.
Não restou comprovada a arbitrariedade ou ilegalidade no ato de licenciamento/exclusão do militar, hábil a configurar conduta ilícita ou mesmo falha do serviço público na prática de algum ato administrativo, assim como não restou comprovado que o autor tenha sofrido tratamento degradante ou humilhante na caserna. Inexistente, portanto, a conduta lesiva de parte da administração, imprescindível em caso de condenação por dano moral, a improcedência de pedido nesse sentido é medida que se impõe.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de dezembro de 2016.
Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle
Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8703033v3 e, se solicitado, do código CRC 88D276DF.
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Data e Hora: 15/12/2016 15:21




APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000433-76.2015.4.04.7102/RS
RELATOR
:
LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
APELANTE
:
JOAO FELICIO VARGAS DE SOUZA
ADVOGADO
:
RENATO WEBER
:
RENATO JOSÉ WEBER
:
LUCIO ANDRÉ MÜLLER LORENZON
APELADO
:
UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária proposta pela parte autora objetivando a anulação do ato administrativo de licenciamento da Aeronáutica com posterior reforma com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediatamente superior e de indenização a título de danos morais. Sucessivamente, requereu a reintegração na condição de adido para tratamento médico. Afirmou ter ingressado na Aeronáutica em 01.08.2012, aos 19 anos de idade, em perfeitas condições de saúde. Relatou que no dia 27.01.2013, no momento em que deixava o turno de 24 horas de serviço, foi convocado pelo Tenente responsável pelo corpo da guarda para que fosse auxiliar no resgate das vítimas da "Tragédia da Kiss". Afirmou ter realizado o trabalho no local, retirando corpos e demais pertences das vítimas, muitas delas seus amigos e conhecidos, colocando-as nos caminhões da Brigada para encaminhamento ao Farrezão. Que ajudou na identificação das vítimas e no auxílio às famílias que no local estavam. Que toda a operação foi ordenada pelo Major do Hospital da Brigada Militar de Santa Maria. Disse que, passados poucos dias, passou a sofrer de problemas de insônia, e, nas poucas vezes que dormia, tinha pesadelos relacionados ao ocorrido. Mencionou que tal situação foi piorando com o passar dos dias. Afirmou ter sido proibido pela psicóloga de realizar o serviço armado e, tendo solicitado atendimento com o médico psiquiátrico, Capitão Abad, não conseguiu por falta de horários. Disse que passou a ser alvo de chacota entre os militares. Que foi punido injustamente por ter chegado atrasado. Que foi humilhado por seus superiores. Alegou ter sido licenciado em 28.06.2013, sem qualquer auxílio ou continuação de seu tratamento. Referiu que passou a sofrer com diversos sintomas decorrentes do quadro psicológico, tendo chegado a desmaiar na calçada. Que conseguiu atendimento na UFSM, por meio da secretária da esposa do Prefeito municipal. Por ser muito longe de sua residência, procurou atendimento junto ao Acolhe Saúde, estando em tratamento até a presente data. Que foi diagnosticado com moléstia constante na CID 10 F43.1, denominada transtorno de estresse pós-traumático, fazendo uso de diversos medicamentos. Que após o licenciamento conseguiu trabalhar por um tempo, mas não conseguiu manter a atividade laboral porque os sintomas da doença vinham se agravando. Apontou que obteve auxílio-doença previdenciário. Informou que os documentos relativos ao seu estado de saúde foram negados junto à clínica onde se trata por ser vedado pela ética médica a entrega ao interessado.

Angularizada a demanda e estabelecidos os pontos controvertidos da causa, sobreveio o julgamento da lide, oportunidade em que o pedido foi julgado improcedente. Sucumbente a parte autora, restou condenada ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), na forma do art. 20, § 4º, do CPC, observada a assistência judiciária gratuita.

Inconformada, a parte demandante apelou requerendo a nulidade do ato de licenciamento do apelante, com sua reintegração aos quadros das forças armadas na condição de adido, para que permaneça recebendo seu soldo, e, consequente tratamento médico militar, com efeitos financeiros retroativos desde a data do licenciamento indevido, bem como pagamento de indenização a título de danos morais.

Com as contrarrazões, vieram os autos.

É o relatório.
VOTO
A controvérsia a ser solvida cinge-se a (im) possibilidade de outorga da reintegração para tratamento de saúde da parte requerente em razão de sequelas decorrentes da moléstia que eclodira em serviço, com a condenação da União ao pagamento dos proventos daí decorrentes.

Quanto ao tema, dispõe a legislação pertinente (Lei n.º 6.880/80):

Art. 50. São direitos dos militares:
(...)
e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários;

Art. 106. A reforma ex officio será aplicada ao militar que:
(...)
II - for julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas;

(...)
Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de:

I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública;
II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações;
III - acidente em serviço;
IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço;
V - tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias que a lei indicar com base nas conclusões da medicina especializada; e
VI - acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço.
Art. 109. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos itens I, II, III, IV e V do artigo anterior será reformado com qualquer tempo de serviço.

Art. 111. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes do item VI do artigo 108 será reformado:

I - com remuneração proporcional ao tempo de serviço, se oficial ou praça com estabilidade assegurada; e
II - com remuneração calculada com base no soldo integral do posto ou graduação, desde que, com qualquer tempo de serviço, seja considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho.

Como se observa, em se tratando de pedido de reforma decorrente de incapacidade, inicialmente cumpre averiguar a intensidade da moléstia/lesão, ou seja, se o grau de incapacidade detectado prejudica o exercício das atividades militares, ou, além destas, impede também o desempenho de atividades laborativas civis.

Nas hipóteses tratadas nos incisos I a IV do artigo 108 da Lei nº 6.880/80, para os casos em que a enfermidade foi adquirida em decorrência da prestação do serviço castrense, haverá direito à reforma independentemente da existência de incapacidade para o exercício dos atos de natureza civil, sendo suficiente a incapacidade para o serviço militar.

Nos dois últimos incisos daquele artigo, hipóteses em que não há nexo de causalidade entre a doença/moléstia e a atividade militar, duas situações devem ser consideradas: a) se a doença é daquelas referidas no inciso V, a incapacidade confere direito à reforma e, se ocasionar invalidez (incapacidade para qualquer trabalho), será com proventos do grau hierárquico imediato ao que o militar possuía na ativa; b) se o caso enquadra-se no inciso VI (incapacidade sem relação de causa e efeito com o serviço), a reforma somente é assegurada para o militar estável. Nesta situação, os militares que ainda não tiverem estabilidade assegurada, apenas serão reformados mediante prova de invalidez, isto é, incapacidade também para o trabalho de natureza civil.

Ademais, sendo o efeito da lesão ou enfermidade sofrida temporária, deve, então, o militar permanecer agregado ou adido às Forças Armadas, sendo-lhe prestado todo auxílio pertinente ao tratamento médico-hospitalar, bem como devendo perceber remuneração equivalente ao posto ou grau hierárquico que ocupava na ativa, enquanto permanecer incapacitado.

Resta analisar se o procedimento de outorga de afastamento fora efetuado de modo escorreito e se devida à reforma.

A questão foi bem resolvida, pelo julgador monocrático, motivo pelo qual adoto sua fundamentação como razão de decidir (evento 79):

No caso em apreço, o Autor foi licenciado em 30.06.2013, seis meses após ter participado do resgate de vítimas em 27.01.2013, data em que ocorreu o acidente na boate Kiss. Afirma que, quando de seu licenciamento, apresentava incapacidade decorrente de "stress pós-traumático".

Primeiramente, destaco que os documentos presentes nos autos indicam que o Autor, ao contrário do que afirma, não foi "convocado" para realizar trabalho de auxílio às vítimas do acidente, mas sim compareceu como voluntário, assim como tantos outros civis e militares que espontaneamente se dirigiram à Boate Kiss e ao Centro Desportivo Municipal (CDM) para prestarem auxílio às vítimas do acidente naquele dia na cidade de Santa Maria.

Segundo as informações trazidas pela União por ocasião de sua contestação (PROCADM2, evento 15), o Autor, logo após o acidente da Kiss, apresentava o seguinte quadro de saúde:

"2. DA SITUAÇÃO MÉDICA

Durante o tempo em que o Autor peramenceu no serviço ativo, foi submetido a inspeções de saúde e atendimento psicológico (algumas consultas) devido ao quadro de ansiedade e agitação ao tirar serviço armado de acordo com o Relatório de Prontuário Médico e Relatório de Atendimento Psicológico, anexados ao presente feito. (...)

Nesse sentido, atenção especial deve ser dada ao Relatório de Atendimento Psicológico emitido pela 2ª TEN QCOA PSL Thais Ferreira de Araújo que refere ter atendido o Autor no dia 25 de fevereiro de 2013 e que o mesmo "tinha um olhar vago, discurso desorganizado e certo abatimento afetivo". Afirma que o Autor teria relatado episódio de nervosismo na hora de preparar seu armamento. que em razão disso, foi dispensado pelo médico de dia do serviço armado por 10 dias (cópia do atestado anexo). Fato que a Tenente psicóloga teve ciência somente na consulta do dia 28 de fevereiro de 2013.

Relata, ainda, que atendeu novamente o Autor em 11 de março de 2013 e a consulta transcorreu sem intercorrências. Entretanto, o Autor relatou dificuldades de marcar consulta com o psiquiatra e que demonstrou preocupação em estar vindo às consultas de psicoterapia, pois temia que essa informação pudesse por em risco o seu reengajamento. No relatório consta que foram agendadas consultas para o dia 21 de março de 2013 e para o dia 18 de abril de 2013, mas que o Autor não compareceu. Registra que após essa data o Autor não mais compareceu para atendimento.

Diante disto, resta evidente que após esse período o Autor voluntariamente não procurou por atendimento psicológico. Ainda, o relatório de prontuário médico efetuado pelo 1º TEN MED Leonardo Tadeu Fachini, anexado ao feito, noticia que o Autor apresentou quadro semelhante em fevereiro de 2012 quando do falecimento de sua avó e o retorno dos sintomas após perder um amigo na tragédia da Boate Kiss.

Vale salientar que conforme a cópia da Ata de Junta de Saúde, de 25 de abril de 2013, o Autor foi avaliado como apto ao fim que se destina. Cumprte destacar que a Base Aérea de Santa Maria dispensou todo o atendimento psícológico enquanto houve interesse do Autor. Desde 18 de abril de 2013 até a data de seu efetivo licenciamento, 30 de junho de 2013, o Autor não buscou quanquer tratamento médico psicológico ou psiquiátrico."

Como visto acima, o episódio referente ao acidente da Boate Kiss não foi o primeiro fato na vida do Autor que causou sintomas dessa espécie, não havendo evidência que o fato de ter participado do resgate às vítimas tenha acarretado incapacidade do Autor para o exercício de atividade militar.

Com efeito, as Atas de Inspeção de Saúde realizadas entre o acidente na Kiss e a data em que ocorreu seu licenciamento revelam que ele não registrava qualquer moléstia, além de uma "perda de dentes devido a acidente, extração ou a outras doenças periodontais localizadas' (páginas 28 a 30, PROCADM2, evento 15).

O laudo médico pericial (evento 64), por sua vez, afirma que o Autor, a depender de situações estressantes de seu dia-a-dia, volta a apresentar sintomas de "stress pós-traumático":

O prontuário do "Acolhe Saúde" revela que o autor foi atendido inicialmente em junho de 2014. Na ficha de primeiro atendimento, o entrevistador anotou que o autor atuou como socorrista durante a tragédia da Boate Kiss e que teve entre as vítimas do episódio vizinhos e amigos. Existe ainda anotação em que o autor referiu ter voltado ao trabalho, e, no retorno, ter sofrido desmaio, não dando continuidade ao tratamento. Em julho de 2014, faltou a uma consulta porque estava trabalhando em um frigorífico. Aparentemente, depois disso, abandonou o tratamento, mas foi "reacolhido" em setembro de 2014.
Queixava-se de lapsos de memória ou brancos, associados à irritabilidade quando desrespeitado. Em outubro de 2014, primeiro atendimento psiquiátrico. Nos registros do assistente, problemas de relacionamento dos pais e acompanhamento psicológico aos 12 anos. Mais adiante, há o relato dos sintomas ansiosos e de revivências traumáticas relacionadas aos eventos da boate Kiss, reavivados por situações de estresse do dia-a-dia. Depois de algumas faltas, passou mal no escritório do procurador, que entrou em contato com o serviço. Em novembro de 2014, permanecia sintomático. Em dezembro de 2014, o psiquiatra assistente registrou: "mais calmo". Em fevereiro de 2015, "piora importante". Depois disso, não teve mais consultas regulares.

a) O Autor está acometido de alguma doença?
Sim, F43.1 (transtorno de estresse pós-traumático - TEPT).

b) Essa enfermidade possui relação de causa e efeito com a atividade desenvolvida na prestação do serviço militar?
Não há como estabelecer nexo entre o transtorno e a atividade militar em si.

c) É possível afirmar se a doença referida na petição inicial teve início ou decorreu de algum fato ocorrido durante o período em que o Autor prestou serviço militar, ou fora desse período?
Sim, parece que os sintomas estão relacionados à tragédia da boate Kiss, onde diz ter atuado como socorrista.

e) Considerando a documentação constante nos autos, em especial as "folhas de alterações" e as "atas de inspeção de saúde", bem como o atual exame clínico que o Autor ora se submete, diga o Sr. Perito se na data em que o Autor foi desligado do Exército, ele ainda necessitava de tratamento médico?
É provável que sim.
(...)
g) O Autor é considerado inválido (impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho)?
Não é o caso

2. Quais os fatores determinantes que podem levar a eclodir a doença acometida pelo Autor?
A exposição a um evento traumático associada a uma certa vulnerabilidade psicológica e biológica.
(...)

6. Se a referida enfermidade pode levar ao desenvolvimento de outras doenças e sintomas psiquiátricos mais graves? Quais? Algum já apresentado?
O TEPT pode evoluir para uma forma de psicopatologia crônica, em que a ênfase da pessoa se desloca da preocupação com o trauma real para a preocupação com a incapacitação física que resulta deste. Sintomas somáticos, ansiedade crônica e depressão são complicações comuns neste ponto, bem como o abuso de substâncias, perturbação das relações familiares e desemprego. É possível que o autor se enquadre neste caso, mas, sem o tratamento adequado, o que inclui frequência às consultas, tanto psiquiátricas quanto psicológicas, não se pode afirmar.

7. Nos casos de depressão e problemas psiquiátricos como o apresentado pelo Autor, é comum sintomas como: se esconder, tentar fugir da situação, se isolar, sentir vergonha e medo de procurar tratamento?
Comportamento esquivo e isolamento fazem parte do quadro. Medo de procurar tratamento não é descrito na literatura médica como característica da doença.
(...)

19. O Autor apresenta algum sintoma de perda de memória, dificuldade de raciocínio, confusão mental ou outro fator que possa levar a sua incapacidade para os atos da vida cível?
Não há incapacidade civil. Preserva a capacidade de discernimento e autodeterminação.

20. Por quais motivos o Autor não conseguiu mais trabalhar nas empresas em que foi contratado e se estes motivos são consequência da doença apresentada?
Segundo conta, suas dificuldades em manter-se no emprego têm relação com sintomas psíquicos, como as situações que descreve como desmaios ou "brancos", por exemplo. Mesmo assim, devido à irregularidade do tratamento, é difícil estabelecer de forma técnica esse nexo.

21. No estado clínico apresentado pelo Autor, o mesmo possui alguma condição laboral sem que haja prejuízo em sua recuperação? Caso positivo, em qual ambiente pode ser exercida a referida atividade e se o Sr. Perito tem conhecimento de algum ambiente que forneça este tipo de emprego? No momento, incapaz para o trabalho."
Como visto acima, a doença apresentada pelo Autor não tem relação de causa e efeito com o serviço militar. Além disso, o perito não afirmou, de forma inconteste, que o Autor estivesse incapaz quando ocorreu seu desligamento do serviço ativo junto à Base Aérea de Santa Maria.

Portanto, se o Autor recusou-se a procurar atendimento médico e psiquiátrico durante o tempo que prestou serviço militar, e não tendo havido qualquer diagnóstico de incapacidade durante esse período ou outros elementos que indicasse que ele apresentava sintomas de problemas psiquiátricos quando de seu licenciamento, entendo não existir elementos aptos a concluir pela irregularidade do ato que concedeu o licenciamento ao Autor (em 28.06.2013).

Ao que parece do exame da prova, o Autor só voltou a apresentar sintomas dessa doença meses após seu licenciamento, quando submetido a episódios estressantes em seu cotidiano, conforme se percebe pelas informações presentes no seu prontuário do serviço municipal denominado "Acolhe Saúde", no qual foi atendido um ano após seu licenciamento (PRONT2, evento 62):

"Menciona que não deseja atendimento da psiquiatra e psicologia do HUSM.
Atualmente não trabalha, parou dec estudar no 2º ano do EM (Escola Rômulo Z). Não tem muitos amigos, sai pouco, conversa somente com o irmão mais jovem.
Sente muito a perda de um colega/amigo (Bairros) que faleceu na tragédia.
UBS-EACS-Itararé (...) médico pediu exames clínicos (reparou em sua tosse), mas sem saber que o paciente esteve na Kiss. O mesmo ainda não realizou os exames, parecendo boicotar os tratamentos sugeridos.
(...) Realizado contato com João; agendado atendimento para sexta-feira - 13.06 c/ psicóloga Carlise e Assistente Social Cassia.
13.06.2014 - Não compareceu ao atendimento.
30.07.2014 - Feito contato com João, que informou que está trabalhando no Frigorífico Silva e por isso não pode vir ao serviço. (...) Relatou que não tem mais pesadelos que referiu em seu último atendimento, porém disse ter tido dificuldades respiratórias.

(...) Após iniciar trabalho no Frigorífico Silva, presenciou cena de morte de morte e teve flash backs. No momento desempregado e reside com os pais.

04.11.2014 (...) Refere última crise na quinta-feira passada após ouvir briga dos pais, sendo necessário encaminhamento para a UPA. Diz sentir-se esquecido, tendo 'brancos' em atividade durante o dia.
12.11.2014 Paciente refere que pais se reconciliaram e decidiram arrendar chácara em Itaara. (...)
10.12.2014 (...) Teve perícia e conseguiu benefício 4 meses. Diz que menino atropelado residia na frente, mas tinham se mudado há 1 mês por incêndio, mais calmo.
10.12.2014 Realizado atendimento após consulta psiquiátrica, João relata que está em Itaara e pouco vem para a cidade; trouxe questões sobre o conflito dos pais (...) ao mesmo tempo diz sentir-se melhor pois os pais brgam menos e a vizinhança é mais tranquila."

Além disso, destaco que o Autor está em gozo de auxílio-doença desde 01.10.2014 (página 01, COMP7, evento 01), benefício que não é concedido em razão de moléstia preexistente, a não ser que tenha existido o agravamento de moléstia após ter dado início ao exercício de atividade laborativa, conforme preconiza o artigo 59, parágrafo único da Lei nº 8.213/91:

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quandofor o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seutrabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Parágrafo único. Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesãoinvocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.

De tal modo, não comprovada que a incapacidade do Autor efetivamente existia quando de seu licenciamento, ou de que já sofresse de moléstia psíquica naquela época, resta caracterizada a impossibilidade de se realizar a reincorporação do Demandante às fileiras da Aeronáutica, caso em que merece ser desacolhido o pedido de antecipação de tutela que foi formulado pelo Autor no evento 68.

E, em conseqüência dos mesmos fundamentos, e tendo em vista o disposto nos artigos 108, VI c/c artigo 110, § 1º da Lei nº 6.880/80, descabe a concessão de reforma ao Autor por moléstia sem relação de causa e efeito com o serviço militar, ante a existência de prova técnica de que o Autor não pode ser considerado inválido, isto é, impossibilitado total ou permanentemente para qualquer trabalho.

No mesmo sentido o entendimento do TRF da 4º Região:

ADMINISTRATIVO. MILITAR FALECIDO. LICENCIAMENTO - ALTERAÇÃO PARA REFORMA. PENSÃO E REPARAÇÃO CIVIL CONTRA FAZENDA PÚBLICA. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO PARA COMPANHEIRA. FILHO MENOR - POSSIBILIDADE. ACIDENTE EM SERVIÇO - INCAPACIDADE INEXISTENTE - LICENCIAMENTO LEGAL.1. A pretensão de revisão de ato administrativo de licenciamento de militar e pedido de reparação civil contra a Fazenda Pública observa o prazo prescricional quinquenal do art. 1º do Decreto nº 20.910/32.2. No presente caso, a prescrição atinge o próprio fundo de direito para a companheira, pois decorridos mais de cinco anos entre os fatos e o ajuizamento da ação, não correndo contra o filho menor do ex-militar.3. O militar que sofreu acidente em serviço somente possui direito à reforma se comprovada sua incapacidade definitiva para o serviço militar. 4. Não comprovado nexo de causalidade nem contemporaneidade entre o serviço militar e a doença que acometeu o ex-militar posteriormente a seu licenciamento, descabe sua reintegração e reforma. (TRF4, AC 5009486-23.2011.404.7102, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Lúcia Luz Leiria, juntado aos autos em 03/08/2012)

ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIO. ACIDENTE SEM RELAÇÃO COM O SERVIÇO MILITAR - INCAPACIDADE INEXISTENTE - REFORMA - IMPOSSIBILIDADE.São requisitos essenciais para a reforma de militar temporário que sofreu acidente sem relação com o serviço militar que a lesão seja contemporânea à caserna e tenha lhe deixado inválido. (TRF4, AC 5006485-30.2011.404.7102, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Sebastião Ogê Muniz, juntado aos autos em 01/06/2012)

Por tais razões, a improcedência do pedido é medida que se impõe!

O pedido de reintegração da parte demandante está alicerçado basicamente de que durante a prestação do serviço militar teria adquirido doença psiquiátrica específica, consistente em um Transtorno de Estresse Pós Traumático (CID 10 OMS F431), tendo como fato desencadeador da patologia à prestação de auxílio às vítimas do incêndio da Boate Kiss, em Santa Maria, o que ocorreu no dia 27/01/2013.

Todavia, analisando o histórico clínico do demandante denota-se que no relatório do prontuário médico castrense aponta que os transtornos verificados após o episódio do incêndio da Boate Kiss não são novos, mas, sim, uma recorrência do que aconteceu em fevereiro/2012, quando o demandante perdeu sua avó (evento 15 - processo adm. 2 - fl. 24).

Oferecido tratamento psicológico na unidade militar não houve interesse do requerente, bem como demonstrou preocupação com as consultas médicas e seu possível reengajamento (evento 15 - processo adm. 2 - fl. 25).

Ao iniciar novo vínculo trabalhista no Frigorífico Silva Ind. Com. Ltda presenciou cena de morte e teve ressurgimento do quadro clínico, tal crise repetiu-se com a discussão dos pais, tendo reiniciado tratamento psicológico, mas não houve continuidade do tratamento, consoante relatório médico da Secretária Municipal de Saúde. (evento 62 - prontuário 02)

Desse modo, como bem apontado pelo perito judicial, o demandante apresenta certa vulnerabilidade psicológica e biológica ao ser exposto a um evento traumático (óbito da avó, incêndio da Boate Kiss, brigas familiares, óbito na empresa Frigorífico Silva Ltda), agravada a situação pelo desinteresse em manter um tratamento contínuo.

Portanto, não há que se falar em uma patologia desenvolvida durante o serviço militar.

Ademais, o autor tem o dever de cumprir com os protocolos de tratamento, não ficando ao seu livre arbítrio, pois a ninguém é dado se valer da própria torpeza para extrair vantagens indevidas.

Ao final, quanto a eventual prequestionamento relativamente à discussão de matéria constitucional e/ou negativa de vigência de lei federal, os próprios fundamentos desta decisão e a análise da legislação pertinente à espécie, são suficientes para aventar a questão. Saliento que o prequestionamento se dá nesta fase processual com intuito de evitar embargos declaratórios, que, advirto, interpostos com tal fim, serão considerados procrastinatórios e sujeitarão o embargante à multa, na forma do previsto no art. 538 do CPC.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle
Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8703032v3 e, se solicitado, do código CRC 2865453B.
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Signatário (a): Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle
Data e Hora: 15/12/2016 15:21




EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/12/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000433-76.2015.4.04.7102/RS
ORIGEM: RS 50004337620154047102
RELATOR
:
Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PRESIDENTE
:
VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PROCURADOR
:
Dr. Cláudio Dutra Fontella
APELANTE
:
JOAO FELICIO VARGAS DE SOUZA
ADVOGADO
:
RENATO WEBER
:
RENATO JOSÉ WEBER
:
LUCIO ANDRÉ MÜLLER LORENZON
APELADO
:
UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 14/12/2016, na seqüência 1658, disponibilizada no DE de 29/11/2016, da qual foi intimado(a) UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
VOTANTE(S)
:
Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
:
Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR
:
Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Luiz Felipe Oliveira dos Santos, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8773723v1 e, se solicitado, do código CRC 1A64BF13.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Data e Hora: 15/12/2016 12:12




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