Apelação Cível Nº 5000592-41.2023.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: ELSITA ANTONINA SANOTO DORINI (AUTOR)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum ajuizada por ELSITA ANTONINA SANOTO DORINI em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a declaração judicial do seu direito a receber a Pensão Militar instituída pelo seu falecido pai cumulada com a sua aposentadoria adimplida pelo IPERGS.
Processado o feito, foi exarada sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor, verbis (ev. 38, origin):
Ante o exposto, acolho a preliminar de carência de ação por falta de interesse processual e JULGO EXTINTO o presente feito, sem resolução de mérito, com fulcro no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Por sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte ré, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, caput, e §§ 1º, 2º e 3º, do Código de Processo Civil. Suspendo a exigibilidade da referida verba, porque a autora é beneficiária da gratuidade judiciária.
As partes são isentas de custas, nos termos do artigo 4º, incisos I e II, da Lei nº 9.289/1996. Sem custas a serem ressarcidas.
Interposto recurso da presente sentença, intime-se a parte contrária para contrarrazões e, após, com ou sem estas, remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região.
Transitada em julgado esta decisão, dê-se baixa e arquivem-se os autos.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Rio Grande, data do evento eletrônico.
A parte autora apela, sustentando, em síntese, que houve pedido de desistência do provento recebido junto ao INSS, o qual foi apresentado à organização militar (ev. 52, origin).
Com contrarrazões (ev. 55, origin), vieram estes autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
No caso, o juízo extinguiu o processo sob a seguinte fundamentação:
Preliminar - ausência de interesse processual
O pedido de tutela provisória de urgência foi indeferido nos seguintes termos (
):(...)
Pelo que consta da inicial e dos documentos que a acompanham, o pedido autoral de Habilitação à Pensão Militar da Autora foi indeferido em virtude da percepção de dois benefícios oriundos de cofres públicos, quais sejam, Pensão Rural por Morte de seu esposo (INSS) e Aposentadoria do cargo de professora (IPE - RS), os quais não podem ser acumulados com o pensionamento militar, no entendimento da Administração Castrense, em atenção ao artigo 29 da Lei nº 3.765/60 (
); e, mesmo depois de ter formulado pedido de desistência da percepção do benefício de pensão previdenciária, deferido pela autarquia previdenciária, conforme comunicação datada de 06/01/2023 ( , p. 9), ainda não obteve resposta da Administração Militar.Veja-se que a autora não trouxe aos autos o requerimento administrativo que terá apresentado à Administração Militar após a renúncia ao benefício previdenciário e ela própria afirma na inicial que ainda não recebeu a resposta, não havendo, por ora, a efetiva negativa ao seu pleito na via administrativa, que comprovaria seu interesse de agir. Ademais, não se pode considerar, a priori, que é excessiva a demora da Administração Militar na apresentação de resposta ao novo requerimento.
Por fim, a despeito do caráter alimentar do benefício em cotejo, além da pensão militar e da pensão por morte previdenciária, há informação nos autos de que a autora aufere benefício de aposentadoria, inexistindo risco concreto de dano irreparável em decorrência do processamento da ação a justificar o exame da questão de fundo em sede de cognição sumária.
Assim, impossível que, de antemão, constate-se a ilegalidade apontada, sendo necessário para tanto que antes se oportunize à parte ré o contraditório, com a juntada de documentos de que dispõe, priorizando-se, por ora, a presunção de legalidade e validade de que gozam os atos administrativos.
Ante o exposto, indefiro a tutela de urgência.
Alega a ré que a autora carece de interesse de agir pois a análise do pedido administrativo de concessão do benefício da pensão militar apenas não teve prosseguimento por ausência de documentação, questão essa que poderia ter sido resolvida administrativamente.
Não ficou demonstrada, por outro lado, a negativa do INSS de fornecer à autora o documento exigido pela Administração Militar.
O que se vê da prova produzida nos autos é que a autora ingressou com a ação sem ter apresentado, na via administrativa, os documentos exigidos pela Administração Militar, o que não se alterou com a instrução processual.
Não houve indeferimento propriamente dito de pedido administrativo devidamente formulado, acompanhado dos documentos imprescindíveis para a análise do pleito formulado.
A inafastabilidade da jurisdição não exime a parte de comprovar a presença do binômio necessidade/utilidade do processo, de modo a configurar seu interesse processual. É dizer: se a parte tem meios de obter o reconhecimento de seu direito sem necessidade de recorrer ao Poder Judiciário, deve primeiro socorrer-se de tais meios, pois caso contrário não há demonstração de necessidade de intervenção judicial, pois há não configuração de lesão ou ameaça a direito. Neste sentido:
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO, CARÊNCIA DA AÇÃO. HONORÁRIOS. 1. Para o reconhecimento da existência de interesse processual, é necessária confluência de dois elementos: a utilidade e a necessidade do pronunciamento judicial. 2. Declarando a União, em sua contestação, que não está a exercer qualquer resistência ao intento do contribuinte, uma vez o simples requerimento administrativo solucionaria a questão, não se verifica presente a necessidade de provimento judicial. 3. A inafastabilidade da jurisdição não significa autorizar que o Poder Judiciário seja transformado em balcão da administração pública. 4. A falta de requerimento do contribuinte implica a ausência de interesse de agir, uma das condições da ação e, como consequência processual legal, a extinção do processo sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC. 5. Honorários advocatícios a cargo do autor. (TRF4, AC 5000471-87.2012.4.04.7104, SEGUNDA TURMA, Relator OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, juntado aos autos em 10/04/2013)
No caso concreto, está afastada a necessidade/utilidade de propositura da presente ação, porque, ao que tudo indica (já que sequer houve contestação do mérito da demanda), bastaria a formulação de novo requerimento administrativo, acompanhado da documentação exigida, para que o benefício postulado fosse concedido.
Com efeito, eventualmente negado o pedido é que surgiria a necessidade de ingressar em Juízo para requerer judicialmente, seja a expedição do documento pelo INSS, seja a concessão do benefício pela Administração Militar.
Desse modo, deve ser acolhida a preliminar de falta de interesse processual, extinguindo-se o feito sem resolução de mérito.
Tenho que resta preenchido o requisito de apresentação de prévio requerimento administrativo.
Com efeito, a administração militar informou a autora de que deveria haver renúncia a um dos benefícios auferidos por ela. Assim foi procedido.
Todavia, exigiu a apresentação de novo documento, Certidão de desistência do benefício (ev. 14, OUT2, fl. 2, origin), sendo apresentada declaração de que foi cessado o benefício de pensão por morte rural em 07/12/2022.
Entendo que não se faz necessária a elaboração de novo requerimento administrativo, ao passo que houve cumprimento da exigência de renúncia a um dos benefícios recebidos.
Dessa forma, deve ser dado provimento ao recurso de apelação quanto ao ponto.
Mérito
Quanto ao mérito, consta da exordial que a autora requer "a declaração judicial do seu direito a receber a Pensão Militar instituída pelo seu falecido pai cumulada com a sua aposentadoria adimplida pelo IPERGS".
Primeiramente, insta referir que o instituidor, Sr. Balduíno Antônio Sanoto, é ex-combatente da 2ª Guerra. Inicialmante, foi reformado na graduação de 3º Sargento, com remuneração equivalente a de 2º Sargento, com base no Decreto-Lei 8.795/46 (ev. 11, OFIC4, fl. 18, origin).
Em 08/03/1995, passou a auferir remuneração com base no soldo de 2º Tentente, em face da Lei 8.2737/91, sendo ainda considerado provento militar (ev. 11, OFIC4, fl. 42, origin):
Lei 8.237/91
Art. 81. O militar que, na data da publicação desta lei, encontrar-se reformado com fundamento no Decreto-Lei nº 8.795, de 23 de janeiro de 1946, terá o cálculo de seus proventos referidos ao soldo do posto de Segundo-Tenente, ou, se mais benéfico, do posto a que ele faz jus, na inatividade.
No caso, considerando que a remueração inicial do instituidor, equivalente a de 2º Sargento, teve fundamento no Decreto-Lei 8.795/46 e não no art. 30 da Lei 4.242/63, não há renúncia à condição de militar, devendo ser mantidos os mesmo direitos dos que foram reformado pela Lei 3.365/60.
Assim, em vista o preenchimento do requisito de requerimento administrativo para reversão da pensão militar, deve ser concedida a cota-parte da pensão à autora a contar do dia seguinte em que foi cessado o benefício previdenciário de Pensão por Morte do Trabalhador Rural, dia 08/12/2022.
Honorários Advocatícios
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.
Cabe ainda destacar que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária que buscam valorizara advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
Considerando que houve provimento ao recurso de apelação, inverte-se o ônus sucumbencial, ficando a União responsável por pagar 10% do valor da condenação ao procurador da autora, nos termos do art. 85 do CPC.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação provida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5000592-41.2023.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
APELANTE: ELSITA ANTONINA SANOTO DORINI (AUTOR)
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
EMENTA
Administrativo. pensão militar. tríplice cumulação. renúncia comprovada.
1. Sobre a acumulação de pensão militar, a Lei n.º 3.765/1960 não prevê expressamente a tríplice cumulação de benefícios, somente permitindo a dupla cumulação nos termos previstos no art. 29, isto é, ou uma pensão militar cumulada com proventos de disponibilidade, reforma, vencimentos ou aposentadoria, ou uma pensão militar cumulada com pensão de outro regime. Dessa forma, o pensionista pode receber a pensão e proventos próprios ou receber duas pensões, uma delas militar e outra de regime diverso.
2. Havendo renúncia a um benefício, sendo comprovado o término do pagamento, não se pode exigir novo requerimento administrativo, devendo ser paga a cota-parte da pensão a contar do dia seguinte em que foi cessado o pagamento do benefício renunciado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de junho de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2024 A 20/06/2024
Apelação Cível Nº 5000592-41.2023.4.04.7101/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
APELANTE: ELSITA ANTONINA SANOTO DORINI (AUTOR)
ADVOGADO(A): WANDERLEI GALDINO RIBEIRO (OAB RS073549)
ADVOGADO(A): WANDERLEI GALDINO RIBEIRO
APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2024, às 00:00, a 20/06/2024, às 16:00, na sequência 279, disponibilizada no DE de 04/06/2024.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Conferência de autenticidade emitida em 30/06/2024 04:00:59.