APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005674-88.2016.4.04.7201/SC
RELATORA | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
APELANTE | : | UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO |
: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS | |
APELADO | : | EDENIR SALETE GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) |
: | IVONE CONCEICAO MOREIRA (Curador) | |
ADVOGADO | : | SANDRA FIRMINA SANT´ANA DA SILVA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. PENSIONISTA DE EX-FERROVIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DA PENSÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E DO INSS. ADMISSÃO PELA RFFSA ANTES DE 31/10/1969. EQUIPARAÇÃO AOS PROVENTOS DA APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. LEI Nº 8.186/91. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DIFERIDA.
1. Nas ações relativas à revisão ou complementação de pensão de ex-ferroviário, devem figurar no pólo passivo o INSS e a União, conforme precedentes desta Corte.
2. O STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.211.676/RN, julgado pela sistemática dos recursos repetitivos, consolidou o entendimento de que a complementação da pensão por morte de ex-ferroviário deve observar as disposições do parágrafo único do art. 2º da Lei 8.186/91, que garante a permanente igualdade de valores entre ativos e inativos.
3. A análise do índice de correção monetária incidente sobre o valor da condenação deve ser diferida para a fase de execução da sentença, conforme esta 3ª Turma decidiu na Questão de Ordem nº 0019958-57.2009.404.7000/PR, julgada em 10/12/2014.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da União e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 04 de abril de 2017.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8884194v6 e, se solicitado, do código CRC 3CDE03B4. | |
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| Signatário (a): | Marga Inge Barth Tessler |
| Data e Hora: | 05/04/2017 19:54 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005674-88.2016.4.04.7201/SC
RELATORA | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
APELANTE | : | UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO |
: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS | |
APELADO | : | EDENIR SALETE GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) |
: | IVONE CONCEICAO MOREIRA (Curador) | |
ADVOGADO | : | SANDRA FIRMINA SANT´ANA DA SILVA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que, em ação objetivando o direito à complementação da aposentadoria em igualdade permanente com a remuneração do ferroviário em atividade, no percentual de 60%, nos moldes da Lei nº 8.186/91, assim determinou:
"Ante o exposto, afasto as preliminares suscitadas, pronuncio a prescrição das diferenças postuladas vencidas anteriormente a 29/06/2015 e JULGO PROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito com julgamento de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, para o fim de:
a) condenar a União a complementar o benefício da pensão por morte da parte autora, no valor correspondente à diferença entre o valor dos proventos pagos pelo INSS e o da remuneração do cargo correspondente ao do pessoal em atividade na extinta RFFSA e suas subsidiárias, com a respectiva gratificação adicional por tempo de serviço, nos termos da fundamentação;
b) condenar a União a pagar à parte autora as prestações vencidas decorrentes da complementação devida, respeitada a prescrição quinquenal, acrescidas de juros e corrigidas monetariamente de acordo com os critérios da fundamentação;
c) condenar a União a pagar, mediante complemento positivo, as prestações vincendas a partir da data da prolação desta sentença até a data da efetiva implantação da nova renda mensal benefício, acrescidas de juros e corrigidas monetariamente, nos termos da fundamentação;
d) condenar o INSS a implantar a nova renda mensal do benefício revista, nos termos da fundamentação.
Por ocasião da execução, intime-se o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), inclusive, para que revise o percentual da pensão da demandante, alterando-o de 60% para 100%, a fim de que os repasses a serem realizados pela União possam contemplar a totalidade do vencimento de um ferroviário na ativa, conforme requerimento de ev.9, CONT1, p. 18.
A União e o INSS são isentos de custas (art. 4º, I da Lei 9.289/96).
Condeno as demandadas ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, §2º e §3º, I do NCPC, pro rata."
Nas suas razões recursais, a União alega, preliminarmente, a ausência de legitimidade para figurar no polo passivo da demanda. Aduz, ainda, a ocorrência de decadência e de prescrição de fundo de direito, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Quanto ao mérito propriamente dito, alega que a Lei 8186/1991 assegurou a complementação e não a forma de concessão dos benefícios de pensão, os quais são totalmente regidos pelas normas previdenciárias da época da concessão. Destaca que a legislação aplicável ao caso é a que vigia na do óbito do instituidor, ocorrido em 09/05/1975. Subsidiariamente, quanto à correção monetária, requer a aplicação da nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 pela Lei n. 11.960/09.
O INSS, por sua vez, apela alegando que, em relação a ele, houve sucumbência majoritária da autora, na medida em que a autarquia previdenciária não foi condenada solidariamente a arcar com o ônus financeiro da revisão pretendida. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da sucumbência recíproca. Por fim, requer o prequestionamento dos dispositivos aventados no apelo.
Com contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
DAS PRELIMINARES
Da Ilegitimidade das Rés
Considerando-se que o pedido de complementação de pensão envolve ex-ferroviário e passa pela análise da Lei nº 8.186/91, tenho que tanto a União, quanto o INSS devem integrar o polo passivo da demanda. A União pela sua responsabilidade no tocante ao repasse da verba e o INSS pelo efetivo pagamento (art. 2º da Lei nº 8.186/91).
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. PENSIONISTAS DE EX-FERROVIÁRIOS. DIREITO À COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO RECONHECIDO NA FORMA DO ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N.º 8.186/91. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.[...]Em sendo o INSS parte passiva legítima nas ações em que se discute a complementação de aposentadoria de ferroviários, uma vez que lhe cabe o pagamento do benefício, e tendo sucumbido, deve arcar os honorários advocatícios, conforme estabelecido na r. sentença.(TRF4, Quarta Turma, Rel. Vivian Josete Pantaleão Caminha, APELREEX 5000787-65.2010.404.7009/PR, julgado em 21/01/2014, D.E. 28/01/2014). Rejeito a preliminar, portanto. (TRF4, AC 5010384-35.2013.404.7112, Terceira Turma, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 25/08/2014)
PROCESSUAL CIVIL. REITERAÇÃO DAS RAZÕES DE DEFESA. NÃO CONHECIMENTO DO APELO. ADMINISTRATIVO. FERROVIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO. LEGITIMIDADE PASSIVA. PAGAMENTO ADMINISTRATIVO. RECONHECIMENTO DO PEDIDO. LIMITAÇÃO TEMPORAL DO PAGAMENTO. INVIABILIDADE. EXISTÊNCIA DE DIFERENÇAS. SATISFAÇÃO DAS PARCELAS DEVIDAS. DETERMINAÇÃO. (...) A União, na condição de sucessora da RFFSA, e o INSS, órgão responsável pela operacionalização e pagamento da pensão, são partes legítimas para figurarem no polo passivo da demanda que discute a complementação de benefício de ex-ferroviário. (...) (TRF4, AC 5000239-91.2011.404.7207, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, D.E. 16/04/2012)(...) (TRF4, AC 5005460-90.2013.404.7108, Terceira Turma, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 23/05/2014)
Da Decadência e da Prescrição
Da mesma forma, desacolho as prefaciais em epígrafe, visto se tratar de relação de trato sucessivo, devendo ser aplicada a Súmula 85 do STJ. Assim, incide a prescrição quinquenal sobre as parcelas devidas a contar da data do ajuizamento da ação.
Nesse sentido, esta Turma:
ADMINISTRATIVO. COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO. PENSÃO POR MORTE. EX-FERROVIÁRIO. LEI Nº 8.186/91. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E DO INSS. 100% DA APOSENTADORIA DO INSTITUIDOR. EQUIPARAÇÃO AOS SERVIDORES DA ATIVA. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.1. A União, na condição de sucessora da RFFSA, e o INSS, órgão responsável pela operacionalização e pagamento, são partes legítimas para figurarem no polo passivo da demanda.2. No que se refere à decadência, ressalto que não ocorre no caso, pois trata-se de revisão de benefício de natureza previdenciária, não incidindo, portanto, a norma contida na Lei nº 8213/91. Também, não é hipótese de reconhecimento da prescrição de fundo de direito, eis que se está diante de relação jurídica de trato sucessivo, enquadrando-se no teor das disposições da Súmula 85 do e. STJ.3. A orientação do Superior Tribunal de Justiça aponta no sentido de que a Lei nº 8.186/91, nos artigos 2º e 5º, estabelece a equiparação dos proventos do ferroviário inativo com a remuneração correspondente ao cargo do pessoal em atividade na RFFSA e suas subsidiárias, nos moldes da garantia constitucional prevista no art. 40, § 5º da CF, em sua redação original, restando procedente a pretensão de complementação dos valores do amparo percebido pela parte-autora.4. Garantia assegurada em relação aos proventos dos ferroviários aposentados, bem assim às pensões devidas aos seus dependentes com repercussão exclusiva na complementação do benefício a cargo da União, responsável pela dotação necessária a ser colocada à disposição do INSS, incumbido do respectivo pagamento.5. No que diz respeito aos juros moratórios, não houve o reconhecimento da inconstitucionalidade, permanecendo hígida a redação conferida pela Lei nº 11.960/09 ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, razão porque, após a entrada em vigor da referida lei (30/06/2009), os juros de mora são aplicáveis no percentual de 0,5% ao mês.6. Considerando-se a sucumbência dos réus, há de ser provido o recurso do INSS para condenar ambos ao pagamento pro rata da verba honorária fixada em sentença.7. Parcial provimento das apelações e da remessa oficial. (TRF4, AC 5002454-48.2013.404.7214, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 16/07/2015)
Mérito
Inicialmente cumpre destacar que a parte autora não pleiteia equiparação com os funcionários da Valec, da Transurbe entre outras sucessoras, em atividade naquelas empresas. Ao contrário, a autora pleiteia tão somente receber a pensão com base na integralidade do que o seu instituidor receberia se estivesse na ativa, considerando a sua carreira de origem.
Portanto, a controvérsia cinge-se ao reconhecimento do direito à complementação da pensão paga a dependente de ex-ferroviário, mantendo-se a equivalência com a remuneração do ferroviário em atividade, nos moldes dos artigos 1º, 2º e 5º da Lei 8.186/91 que assim dispõem:
"Art. 1°: É garantida a complementação da aposentadoria paga na forma da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) aos ferroviários admitidos até 31 de outubro de 1969, na Rede ferroviária Federal S.A. (RFFSA), constituída ex-vi da Lei n° 3.115, de 16 de março de 1957, suas estradas de ferro, unidades operacionais e subsidiárias.
Art. 2°: Observadas as normas de concessão de benefícios da Lei Previdenciária, a complementação da aposentadoria devida pela União é constituída pela diferença entre o valor da aposentadoria paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o da remuneração do cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA e suas subsidiárias, com a respectiva gratificação adicional por tempo de serviço.
Parágrafo único: O reajustamento do valor da aposentadoria complementada obedecerá aos mesmos prazos e condições em que for reajustada a remuneração do ferroviário em atividade, de forma a assegurar a permanente igualdade entre eles".
(...)
Art. 5°: A complementação da pensão de beneficiário do ferroviário abrangido por esta lei é igualmente devida pela União e continuará a ser paga pelo INSS, observadas as normas de concessão de benefícios da Lei Previdenciária e as disposições do parágrafo único do art. 2° desta lei.
Parágrafo único. Em nenhuma hipótese, a pensão previdenciária complementada poderá ser paga cumulativamente com as pensões especiais previstas nas Leis n°s 3.738, de 3 de abril de 1960, e 6.782, de 20 de maio de 1980, ou quaisquer outros benefícios pagos pelo Tesouro Nacional".
Assim, a complementação de aposentadoria e a respectiva paridade previstas no art. 2º da Lei 8.186/91 abrangem os ferroviários da extinta Rede Ferroviária Federal - (RFFSA) admitidos até 31/10/69. Em outras palavras, a pensionista de instituidor admitido até 31/10/69 possui direito a receber a integralidade do que aquele receberia se estivesse na ativa, considerando a sua carreira de origem.
A questão não comporta maiores digressões, haja vista que o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp nº 1211676, havido como representativo da controvérsia, com base no artigo 543-C do Código de Processo Civil, consolidou o assunto ora tratado nestes termos:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. PENSIONISTAS DE EX-FERROVIÁRIOS. DIREITO À COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO RECONHECIDO NA FORMA DO ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.186/91. DEMANDA QUE NÃO CORRESPONDE AO TEMA DE MAJORAÇÃO DE PENSÃO NA FORMA DA LEI 9.032/95, APRECIADOS PELO STF NOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 415.454/SC E 416.827/SC. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Controvérsia que se cinge ao reconhecimento, ou não, do direito à complementação da pensão paga aos dependentes do ex-ferroviário, mantendo-se a equivalência com a remuneração do ferroviário em atividade. 2. Defende a recorrente que as pensões sejam pagas na forma dos benefícios previdenciários concedidos na vigência do art. 41 do Decreto 83.080/79, ou seja, na proporção de 50% do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, se na data do seu falecimento fosse aposentado, acrescida de tantas parcelas de 10% (dez por cento) para cada dependente segurado. 3. A jurisprudência desta Casa tem reiteradamente adotado o entendimento de que o art. 5º da Lei 8.186/91 assegura o direito à complementação à pensão, na medida em que determina a observância das disposições do parágrafo único do art. 2º da citada norma, o qual, de sua parte, garante a permanente igualdade de valores entre ativos e inativos. 4. Entendimento da Corte que se coaduna com o direito dos dependentes do servidor falecido assegurado pelo art. 40, § 5º, da CF/88, em sua redação original, em vigor à época da edição da Lei 8.186/91, segundo o qual "O benefício da pensão por morte corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, até o limite estabelecido em lei, observado o disposto no parágrafo anterior". 5. A Lei 8.186/91, destinada a disciplinar a complementação dos proventos dos ferroviários aposentados e das pensões devidas aos seus dependentes, por ser norma específica, em nada interfere na regra de concessão da renda mensal devida a cargo do INSS, a qual permanece sendo regida pela legislação previdenciária. 6. Ressalva de que o caso concreto não corresponde àqueles apreciados pelo Supremo Tribunal Federal nos RE 415.454/SC e RE 416.827/SC, ou ainda, no julgado proferido, com repercussão geral, na Questão de Ordem no RE 597.389/SP. Em tais assentadas, o STF decidiu ser indevida a majoração das pensões concedidas antes da edição da Lei 9.032/95, contudo, a inicial não veiculou pleito relativo a sua aplicação. 7. A Suprema Corte não tem conhecido dos recursos interpostos em ações análogas aos autos, acerca da complementação da pensão aos beneficiários de ex-ferroviários da extinta RFFSA, por considerar que a ofensa à Constituição, se existente, seria reflexa. 8. Recurso especial conhecido e não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(REsp 1211676/RN, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 17/08/2012)
Logo, a Lei nº 8.186/91 em nada interfere nas normas de concessão de pensão da Lei Previdenciária. O artigo 5º prevê a complementação de pensão devida aos dependentes do ex-ferroviário falecido, cuja dotação é colocada à disposição do INSS, que efetua os pagamentos conforme o artigo 6º da mesma lei. Assim, o entendimento de que o benefício previdenciário deve ser regido pela lei vigente na data do óbito do segurado não se aplica na complementação da aposentadoria ou pensão a ser paga pela União, mas tão-somente quanto à pensão paga pelo INSS, nos termos do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Neste sentido a r. sentença, cujos fundamentos adoto integralmente como razões de decidir:
"Do mérito
O presente feito tem como questão nodal a amplitude do direito da autora à complementação de benefício de pensão por morte, de forma a perceber valor igual à remuneração do pessoal em atividade da RFFSA, nos termos da Lei nº 8.186/1991.
A aludida lei prescreveu:
Art. 1.º É garantida a complementação da aposentadoria paga na forma da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) aos ferroviários admitidos até 31 de outubro de 1969, na Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), constituída ex-vi da Lei n.º 3.115, de 16 de março de 1957, suas estradas de ferro, unidades operacionais e subsidiárias.
Art. 2.º Observadas as normas de concessão de benefícios da Lei Previdenciária, a complementação da aposentadoria devida pela União é constituída pela diferença entre o valor da aposentadoria paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o da remuneração do cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA e suas subsidiárias, com a respectiva gratificação adicional por tempo de serviço.
Parágrafo único. O reajustamento do valor da aposentadoria complementada obedecerá aos mesmos prazos e condições em que for reajustada a remuneração do ferroviário em atividade, de forma a assegurar a permanente igualdade entre eles. (...)
Art. 5.º A complementação da pensão de beneficiário do ferroviário abrangido por esta lei é igualmente devida pela União e continuará a ser paga pelo INSS, observadas as normas de concessão de benefícios da Lei Previdenciária e as disposições do parágrafo único do art. 2.º desta lei.
Parágrafo único. Em nenhuma hipótese, a pensão previdenciária complementada poderá ser paga cumulativamente com as pensões especiais previstas nas Leis n.ºs 3.738, de 3 de abril de 1960, e 6.782, de 20 de maio de 1980, ou quaisquer outros benefícios pagos pelo Tesouro Nacional. (grifei)
Poder-se-ia alegar que, por força da parte final do caput do art. 5.º, a pensão e a complementação da pensão seriam vinculadas à forma de apuração da pensão quando de sua instituição, como fez a parte ré.
Ocorre que essa não é a melhor exegese do dispositivo. Como é sabido, a interpretação do Direito Positivo, na busca das normas jurídicas dele emanadas, deve, sempre, não se ater apenas a aspectos textuais isolados, mas buscar a composição da norma tanto a partir do diploma por meio do qual ela é inserida no sistema quanto do amoldamento dessa norma no resto do sistema jurídico já vigente e válido. Partindo-se dessas premissas, é fácil perceber que a Lei n.º 8.186/1991 teve por objetivo corrigir discrepância existente entre os empregados da RFFSA e diversos empregados públicos, atribuindo àqueles benefícios de prestação continuada valores integrais e paritários com o pessoal da ativa, sem prejuízo de, eventualmente, serem beneficiados por melhor atualização do benefício suportado pelo INSS.
Se pretendesse o legislador limitar os benefícios previdenciários que não a aposentadoria, teria feito expressa menção a que o valor paradigma da complementação deixaria de ser o salário do empregado ativo para ser a parcela desse salário proporcional à pensão devida. Isso, no entanto, não foi feito. Daí porque é fácil perceber que a Lei n.º 8.186/1991 assegurou a complementação até o valor do empregado ativo, qualquer que fosse a forma de concessão do benefício de aposentadoria.
Também não se pode, como fizeram as rés, deturpar o texto legal para ler, em lugar da expressão "entre o valor da aposentadoria paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o da remuneração do cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA", a expressão "entre o valor da aposentadoria paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o do salário de benefício calculado no percentual previdenciário sobre a remuneração do cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA". Tal interpretação extrapola o que seria ordinário e, como tal, se fosse esse o objetivo na norma, o legislador teria deixado essa intenção expressa no texto. Não o tendo feito, interpretar como querem as rés levaria o juízo a inserir na lei previsão que nela não se contém.
Observe-se que o presente caso não se trata de retroação da lei, mas incidência das normas instituídas pela Lei n.º 8.186/1991 para o futuro, alcançando todos os fatos subsumidos na hipótese posta nos artigos 1.º e 5.º da lei: aposentadorias de ou pensões instituídas por empregados da RFFSA admitidos até 31.10.1969, tenham as aposentadorias ou as pensões sido deflagradas antes ou depois da edição da aludida lei, mas sempre com efeitos apenas posteriores à sua vigência. A lei não alcança fatos pretéritos - a instituição da aposentadoria ou pensão -, mas fatos atuais - ser a aposentadoria ou pensão vinculada a empregado da RFFSA que reúna as condições postas na lei -, em nada havendo ofensa à irretroatividade das leis, que, diga-se, não pode ser invocada, quando existente, pelo ente que a editou.
A questão foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça que, na forma preconizada pelo art. 543-C do Código de Processo Civil, nos seguintes termos:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. PENSIONISTAS DE EX-FERROVIÁRIOS. DIREITO À COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO RECONHECIDO NA FORMA DO ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.186/91. DEMANDA QUE NÃO CORRESPONDE AO TEMA DE MAJORAÇÃO DE PENSÃO NA FORMA DA LEI 9.032/95, APRECIADOS PELO STF NOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 415.454/SC E 416.827/SC. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Controvérsia que se cinge ao reconhecimento, ou não, do direito à complementação da pensão paga aos dependentes do ex-ferroviário, mantendo-se a equivalência com a remuneração do ferroviário em atividade. 2. Defende a recorrente que as pensões sejam pagas na forma dos benefícios previdenciários concedidos na vigência do art. 41 do Decreto 83.080/79, ou seja, na proporção de 50% do valor da aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, se na data do seu falecimento fosse aposentado, acrescida de tantas parcelas de 10% (dez por cento) para cada dependente segurado. 3. A jurisprudência desta Casa tem reiteradamente adotado o entendimento de que o art. 5º da Lei 8.186/91 assegura o direito à complementação à pensão, na medida em que determina a observância das disposições do parágrafo único do art. 2º da citada norma, o qual, de sua parte, garante a permanente igualdade de valores entre ativos e inativos. 4. Entendimento da Corte que se coaduna com o direito dos dependentes do servidor falecido assegurado pelo art. 40, § 5º, da CF/88, em sua redação original, em vigor à época da edição da Lei 8.186/91, segundo o qual "O benefício da pensão por morte corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, até o limite estabelecido em lei, observado o disposto no parágrafo anterior". 5. A Lei 8.186/91, destinada a disciplinar a complementação dos proventos dos ferroviários aposentados e das pensões devidas aos seus dependentes, por ser norma específica, em nada interfere na regra de concessão da renda mensal devida a cargo do INSS, a qual permanece sendo regida pela legislação previdenciária. 6. Ressalva de que o caso concreto não corresponde àqueles apreciados pelo Supremo Tribunal Federal nos RE 415.454/SC e RE 416.827/SC, ou ainda, no julgado proferido, com repercussão geral, na Questão de Ordem no RE 597.389/SP. Em tais assentadas, o STF decidiu ser indevida a majoração das pensões concedidas antes da edição da Lei 9.032/95, contudo, a inicial não veiculou pleito relativo a sua aplicação. 7. A Suprema Corte não tem conhecido dos recursos interpostos em ações análogas aos autos, acerca da complementação da pensão aos beneficiários de ex-ferroviários da extinta RFFSA, por considerar que a ofensa à Constituição, se existente, seria reflexa. 8. Recurso especial conhecido e não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 1211676/RN, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 17/08/2012)
No mesmo sentido a orientação recente do TRF da 4ª Região:
PENSIONISTA DE EX-FERROVIÁRIO. DIREITO À COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO RECONHECIDO NA FORMA DOS ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, E 5º DA LEI N.º 8.186/91. ENTENDIMENTO FIRMADO NO STJ. 1 A Lei 8.186/91, nos artigos 2º e 5º, assegura o direito à complementação da pensão de dependentes de ex-ferroviários, garantindo a igualdade da remuneração entre ativos, inativos e pensionistas. 2. Garantia assegurada em relação aos proventos dos ferroviários aposentados, bem como às pensões devidas aos seus dependentes com repercussão exclusiva na complementação do benefício a cargo da União, responsável pela dotação necessária a ser colocada à disposição do INSS, incumbido do respectivo pagamento. 3. Orientação alinhada ao entendimento do julgamento de recurso representativo da controvérsia (REsp 1.211.676/RN) que reconheceu o direito à complementação de pensão na forma do artigo 2º da Lei 8.186/91. (TRF4, APELREEX 5008117-57.2012.404.7102, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, juntado aos autos em 20/06/2014)
Por tudo isso, assiste à parte autora o direito de ver corrigido o valor da complementação, para que ela, somada à parcela devida pelo INSS, alcance o salário do servidor da ativa ocupante do cargo equivalente ao do instituidor da pensão, na forma da Lei n.º 8.186/1991, com as modificações decorrentes da Lei n.º 10.233/2001, art. 118, § 1.º.
No presente caso, a partir dos documentos juntados pela própria União (18:2, pág.1) observo que o aposentado do qual a autora é filha, ingressou nos quadros da RFFSA em 01/03/1943; sua aposentadoria era regida pelo RGPS e detinha condição de ferroviário na data imediatamente anterior ao início do início do benefício. Logo, ao ver deste juízo, estão presentes os requisitos legais para concessão do pedido."
No tocante aos acréscimos legais, cumpre destacar que o Supremo Tribunal Federal, nas ADIs n.ºs 4357, 4372, 4400 e 4425, reconheceu a inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção monetária, modulando os efeitos da decisão para mantê-la em relação aos precatórios expedidos ou pagos até 25/03/2015.
Todavia, a questão relativa à aplicação do art. 1º-F da Lei n.º 9.494/97, na redação dada pela Lei n.º 11.960/2009, no período anterior à inscrição da requisição de pagamento, ainda não foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a existência de repercussão geral da matéria (RE 870947).
Por essa razão, esta 3ª Turma decidiu na Questão de Ordem nº 0019958-57.2009.404.7000/PR, julgada em 10/12/2014, que a análise dos critérios de correção monetária deve ser diferida para a fase da execução, de modo a racionalizar o andamento do processo. A ação de conhecimento deve centrar-se no reconhecimento do direito postulado, e qualquer controvérsia acerca dos encargos legais incidentes sobre o débito ora imputado à ré, dado o caráter instrumental e acessório, não pode impedir seu regular trâmite até o desfecho final, com o esgotamento de todos os recursos atinentes à matéria de fundo.
Reconhece-se, assim, por ora, que é devida a incidência de correção monetária sobre o débito, nos termos da legislação vigente no período a que se refere, postergando-se a especificação dos índices e taxas aplicáveis para a fase de execução.
Outrossim, incabível o pleito do INSS consistente em não considerá-lo sucumbente na ação. Isso porque, embora a União seja a responsável por efetivamente arcar com os valores, quem efetua o ato de pagar é a autarquia previdenciária. Tal ponto é, inclusive, muito bem esclarecido na inicial do autor, conforme transcrevo:
6. No caso em tela, a parcela paga pela União Federal não vem observando os princípios da integralidade e da paridade/isonomia, sendo este o objeto da demanda. Vale dizer, a pensão paga à Autora deverá ser equivalente ao valor do cargo no qual o seu esposo se aposentou ou à importância que o falecido esposo estaria recebendo se vivo estivesse.
Na ocasião do dispositivo da sentença, o juízo a quo condenou o INSS a implementar e a manter a complementação da pensão da autora, correspondente à diferença entre o valor da pensão paga pelo INSS e o valor da remuneração do cargo correspondente ao funcionário da ativa, cujo ônus financeiro deverá ser suportado pela União.
Acaso adotado o entendimento pretendido pela autarquia, a própria União não seria sucumbente, na medida em que ela não foi condenada a operacionalizar o pagamento da pensão, obrigação a cargo tão somente da autarquia previdenciária.
Assim, rejeito a alegação do INSS no tópico.
Em arremate, a r. sentença merece reforma apenas para se diferir a atualização monetária da condenação.
Verificada a sucumbência recursal das apelantes, destacando que a União decaiu em quase a totalidade do apelo, nos termos do art. 85, §11, CPC/2015, majoro os honorários advocatícios em 20% do que foi fixado na sentença, totalizando a quantia de R$ 8.304,00, a qual deve ser dividida por ambos os réus de forma paritária, nos termos do art. 87, §1º do CPC.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da União e negar provimento à apelação do INSS.
É o voto.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/04/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005674-88.2016.4.04.7201/SC
ORIGEM: SC 50056748820164047201
RELATOR | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Dr Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO |
: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS | |
APELADO | : | EDENIR SALETE GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) |
: | IVONE CONCEICAO MOREIRA (Curador) | |
ADVOGADO | : | SANDRA FIRMINA SANT´ANA DA SILVA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 04/04/2017, na seqüência 1301, disponibilizada no DE de 17/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
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