APELAÇÃO CÍVEL Nº 5050142-23.2014.4.04.7100/RS
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA CASTRO |
ADVOGADO | : | Tiago Gornicki Schneider |
APELANTE | : | UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO |
: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS | |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. MINISTÉRIO DA SAÚDE. APOSENTADORIA. REVISÃO. PRESCRIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. COMPROVAÇÃO. DIFERENÇAS REMUNERATÓRIAS. ABONO DE PERMANÊNCIA. PERÍODOS DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADAS. CÔMPUTO EM DOBRO. DESAVERBAÇÃO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E IMPOSTO DE RENDA.
- Consoante entendimento que predominou nesta Corte, os atos praticados pela Administração reconhecendo o direito ao cômputo privilegiado de tempo especial por parte dos servidores do Ministério da Saúde implicaram "renúncia tácita ao prazo prescricional relativo ao fundo do direito quanto aos valores atrasados, pois o reconhecimento administrativo é ato incompatível com o instituto da prescrição, conforme dispõe o artigo 191 do Código Civil", de modo que o "marco inicial do pagamento das diferenças; é dizer, os efeitos financeiros da condenação, deve ser assentado na data da jubilação, e não no quinquênio que precedeu a edição da Orientação Normativa ou seus efeitos financeiros, uma vez que naquele momento temporal, as servidoras já possuíam direito à outorga da jubilação com proventos integrais, ou proporcionais com renda mensal superior" (TRF4, 3ª Turma, AC nº 5085540-31.2014.4.04.7100/RS, Rel. Des. Federal Marga Inge Barth Tessler, Rel. p/ acórdão Des. Federal Fernando Quadros da Silva)
- O Supremo Tribunal Federal já reconheceu o direito à contagem especial, no regime estatutário, do tempo de serviço prestado sob condições insalubres pelo servidor público quando ainda tinha vínculo celetista com a Administração Pública, ao entendimento de que este direito incorporou-se ao respectivo patrimônio jurídico (RE n. 258.327-8, Segunda Turma, Rel. Ministra Ellen Gracie, DJ de 06-02-2004). Nessa linha: AgR no RE 724.221, Segunda Turma, Rel. Ministra Cármen Lúcia, julgado em 12-03-2013; ED no AI 728.697, Segunda Turma, Rel. Ministro Celso de Mello, julgado em 05-02-2013; e AgR no RE 463.299-3, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 25-06-2007, dentre inúmeros outros
- Como o fundamento para deferimento da "averbação, no RPPS, do tempo especial dos servidores públicos ex-celetistas, é o de que esse direito se incorporou ao patrimônio jurídico do segurado antes da vigência da Lei 8.112/90, não pode haver distinção entre o segurado que já era "empregado público" e aquele que não era, pois, em ambos os casos, quando da prestação da atividade, eram segurados do RGPS". Nessa linha, " o art. 4º, inc. I, da Lei 6.226/75 e o art. 96, inc. I, da Lei n. 8.213/91 não podem constituir óbice à contagem ponderada do tempo especial prestado sob a égide de legislação em que esta era prevista, sob pena de tratar de forma diferente situações jurídicas idênticas, incorrendo assim em violação aos princípios constitucionais da igualdade e do direito adquirido", razão pela qual também o tempo celetista anterior ao ingresso no serviço público pode ser computado de forma privilegiada (Arguição de inconstitucionalidade 0006040-92.2013.404.0000. Corte Especial do TRF4. Rel. Des. Federal CELSO KIPPER)
- No período de trabalho até 28/04/95, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial (enquadramento por categoria profissional).
- A atividade de médico foi prevista como especial até 28.04.1995, por se enquadrar nos Códigos 2.1.3 do Anexo ao Decreto 53.831/64 e 2.1.3 do Anexo II ao Decreto 83.080/79. Da mesma forma, o artigo 60, inciso I, do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, estabelecia como atividades profissionais perigosas, insalubres ou penosas, para fins de aposentadoria especial, aquelas atividades constantes dos quadros que acompanhavam o regulamento, como Anexos I e II. Do Anexo II constava, sob código 2.1.3, a atividade profissional de "médico (expostos aos agentes nocivos - Código 1.3.0 do Anexo I)".
- Comprovado o exercício de atividades qualificadas como especiais por enquadramento em categoria profissional (Médico), há, em tese, direito ao cômputo privilegiado até 28/04/1995, com a consequente revisão da aposentadoria estatutária, inclusive para fins de reconhecimento do direito ao pagamento retroativo de abono de permanência.
- O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que é possível, no momento da aposentação do agente público, a conversão em pecúnia de licenças-prêmio não gozadas, tendo em vista o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa por parte da Administração (v. AgRg no AREsp 270.708/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2013, DJe 16/09/2013; AgRg no Ag 1404779/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/04/2012, DJe 25/04/2012).
- A opção pela contagem em dobro de período de licença-prêmio para efeito de percepção de abono permanência e aposentadoria somente é irretratável se indispensável para concessão do benefício. Demonstrado que o servidor, com a contagem privilegiada do tempo especial, tinha direito ao benefício sem o cômputo de períodos de licença-prêmio não gozadas, é possível a desaverbação e, consequentemente, a indenização.
- Tendo a ação sido dirigida contra a União, que é a pessoa jurídica legitimada nas discussões acerca de tributos federais, nada obsta que se delibere no processo sobre a incidência do imposto de renda e da contribuição previdenciária, uma vez que se trata de questão assessória. A repartição de matérias entre as Varas, assim como se dá com as Turmas do Tribunal, diz respeito a distribuição de trabalho determinada por ato administrativo. Não se cogita, assim, de incompetência absoluta, a vedar que Vara ou Turma com competência administrativa delibere sobre matéria tributária reflexa, na linha, a propósito, do que estabelece o artigo 10 do Regimento Interno desta Corte.
- "O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade do serviço não está sujeito ao imposto de renda" (Súmula 136 do STJ).
- "É firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que não incide Contribuição Previdenciária sobre abono-assiduidade e licença-prêmio não gozada convertida em pecúnia"(AgRg no AREsp 464.314/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin. 2ª Turma do STJ).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor e de negar provimento às apelações da União, do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de novembro de 2016.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8574894v14 e, se solicitado, do código CRC 6BA8CB5E. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5050142-23.2014.4.04.7100/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA CASTRO em face da UNIÃO, objetivando (evento 1/1):
a) julgar procedente a presente ação, na forma das razões supraexpendidas, para o fim de:
a.1) instar a União a proceder à conversão da integralidade do período laborado no emprego de Médico (de 16-11-1977 a 11-12-1990), sob a vigência do regime celetista e , portanto, do RGPS, observado o fator 1.4 para homens, independentemente da exigência de prova, ponderada a presução legal de exposição aos agentes nocivos reconhecida até 28-04-1995;
a.2) condenar a União ao pagamento do abono de permanência desde a data em que preenchidos os requisitos pertinentes (desde 24-08-2007), em parcelas vencidas, atualizadas pela taxa SELIC;
a.3) declarar o direito da parte autora à conversão em pecúnia do período de licenças-prêmio assiduidade não gozadas nem computadas para a aposentadoria (6 meses), condenando a União ao pagamento das valores estipendiais daí decorrentes, a título indenizatório, devidamente atualizados, na forma da lei, inclusive reconhecendo a não-incidência tributária, ponderado o caráter indenizatório das licenças-prêmio, relativamente aos descontos para a seguridade social e para o imposto de renda;
a.4) em caráter sucessivo, acaso não deferido o pedido a.1 supra, reconhecer o direito do autor ao pagamento de 2 (dois) meses de licença-prêmio não gozada e desnecessárias a quaisquer outros benefícios, acrescido do abono de permanência de junho e de julho de 2009, para o que basta a manutenção do tempo de serviço já averbado pela Administração Federal na via administrativa;
a.5) condenar a demandada nos ônus da sucumbência, com a fixação de honorários advocatícios, na forma do disposto no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, bem como acrescer à condenação o pagamento das diferenças de correção monetária e juros de mora;
(...)
Sobreveio sentença, cujo teor do dispositivo é o seguinte (evento 97):
Ante o exposto:
1) extingo o processo, sem resolução do mérito, quanto ao pedido de isenção da contribuição previdenciária e do imposto de renda sobre os valores postulados a título de indenização de períodos de licença-prêmio não gozados e
2) acolho a preliminar de ausência de interesse de agir arguida pela União, em relação ao período de 01/02/1984 a 11/12/1990.
No restante, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:
1) reconhecer o direito do autor à contagem do tempo de serviço prestado em condições especiais no período de 02/01/1984 a 31/01/1984, com acréscimo de 40%, nos termos da fundamentação;
2) condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a expedir certidão de contagem recíproca de tempo de serviço no período de 02/01/1984 a 31/01/1984, com o acréscimo de tempo de serviço especial de 40%;
3) ordenar à União que promova a averbação do tempo de serviço convertido, para todos os fins, especialmente para a aposentadoria;
4) determinar à União que proceda à revisão dos proventos de aposentadoria do autor após a averbação da contagem ponderada do tempo de serviço prestado em condições especiais;
5) condenar a União ao pagamento do abono de permanência ao autor e também às diferenças havidas em razão da conversão em pecúnia, com base na remuneração percebida pelo requerente na data da aposentadoria, de período de licença-prêmio não gozado pelo servidor, o que deverá ser apurado em fase de liquidação, nos termos da fundamentação.
Os valores deverão ser atualizados monetariamente e acrescidos de juros na forma da fundamentação.
As custas serão rateadas entre as partes, cabendo 50% ao autor, 35% à União e 15% ao INSS, considerando a parcela de sucumbência de cada litigante.
Condeno o autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor da União e INSS, cujo percentual será arbitrado na fase de liquidação, a teor do que dispõe o artigo 85, § 4º, inciso II, do NCPC.
Condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios em favor do autor, cujo percentual será arbitrado na fase de liquidação, a teor do que dispõe o artigo 85, § 4º, inciso II, do NCPC.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do autor, cujo percentual será arbitrado na fase de liquidação, a teor do que dispõe o artigo 85, § 4º, inciso II, do NCPC.
Não é cabível a compensação das verbas honorárias arbitradas de forma recíproca (artigo 85, § 14, do NCPC).
Publique-se e registre-se.
As partes interpuseram apelações.
A União alega que legítimo e juridicamente perfeito o ato administrativo que levou em consideração o cômputo em dobro dos períodos de licença-prêmio não fruídos para fins de concessão de aposentadoria, aduzindo que não é correta a afirmativa da parte autora de que a averbação das licenças-prêmio em nada lhe foi útil, uma vez que a aposentadoria só foi possível em razão do cômputo em dobro das licenças-prêmio, ou seja, o cômputo em dobro gerou sim consequências jurídicas, o que também sob este aspecto denota a improcedência do pedido inicial.
A parte autora apela (evento 105). Alega o direito à contagem diferenciada de tempo de serviço, por presunção legal do caráter insalubre, na integralidade do labor prestado enquanto médico celetista (período 1977 a 1990). São os requerimentos finais do recurso:
a) reconhecer a possibilidade de apreciação do pedido de não incidência tributária, na condição de acessório do principal, bem como acolher o pleito da parte autora nesse aspecto, tal como colocado na exordial;
b) afastar o juízo preliminar de ausência de interesse de agir em relação ao período 02-1984 a 12-1990;
c) no mérito, afastar a prescrição quinquenal decretada, assegurando-se a integral procedência do pedido inicial (inclusive a condenação da União ao pagamento dos valores estipendiais decorrentes, a título indenizatório, devidamente atualizados, na forma da lei, inclusive reconhecendo a não-incidência tributária, ponderado o caráter indenizatório das licenças-prêmio, relativamente aos descontos para a seguridade social e para o imposto de renda), condenando-se as demandadas a arcarem com a integralidade da sucumbência.
O INSS, por fim, postula a extinção do feito, sem julgamento do mérito, sob o argumento de falta de interesse processual, por ausência de prévio requerimento administrativo quanto à expedição de certidão de contagem de tempo de serviço no período de 02/01/1984 a 31/01/1984, com acréscimo de 40%.
Com as contrarrazões da União e do autor, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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VOTO
A sentença (evento 97), da lavra da Juíza Federal Paula Beck Bohn, assim solucionou a controvérsia:
2. FUNDAMENTAÇÃO
Da cumulação indevida de pedidos
A parte autora pede o reconhecimento da natureza indenizatória dos valores decorrentes da condenação oriunda da presente ação, na hipótese de procedência dos pedidos por ela formulados. Este juízo é incompetente para a apreciação de matéria tributária. E para a competência absoluta é inviável a prorrogação pela conexão.
Logo, a parte autora deverá formular tal pedido em ação autônoma, a ser distribuída a uma das Varas Tributárias desta Subseção, eis que ausente a competência deste juízo para conhecer de todos os pedidos, um dos requisitos impostos à cumulação de pedidos pelo CPC.
Ausência de interesse de agir. União
A Administração Pública já efetuou a contagem de tempo de serviço ponderada em relação ao período de 01/02/1984 a 11/12/1990, cf. informações constantes do Evento 39, Cont1, assistindo razão à União nesse ponto.
Contudo, verifica-se pretensão resistida da ré no que tange ao restante do período consignado na petição inicial, ao pagamento de abono de permanência e à desaverbação de licenças-prêmio.
Portanto, acolho em parte a preliminar.
Ausência de interesse de agir. INSS
Sustenta o INSS que o autor carece de interesse de agir, eis que não deduziu pedido na esfera administrativa, o que lhe retiraria o interesse de provocar a manifestação do Poder Judiciário para obter a reforma pretendida.
O acesso ao Poder Judiciário é, em regra, incondicionado, consoante assegura o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, o que torna desnecessário o prévio esgotamento da via administrativa para que se possa ingressar em juízo com uma demanda. Confira-se:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. MILITAR. PENSÃO. ESGOTAMENTO DE VIAS ADMINISTRATIVAS. DESNECESSIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. REFORMATIO IN PEJUS. NÃO-OCORRÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICE. IPC. JUROS DE MORA. AÇÃO AJUIZADA APÓS A EDIÇÃO DA MP 2.180-35/2001. 6% AO ANO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado no sentido de ser desnecessário o exaurimento das vias administrativas para o ingresso em juízo. 2. A fixação, em remessa oficial, de correção monetária, porque constitui simples atualização da moeda, e de juros de mora, porque incluídos no pedido principal, nos termos do art. 293 do CPC, não implicam reformatio in pejus. 3. O índice aplicável na correção monetária de verbas de natureza alimentar pagas em atraso é o IPC. Precedentes. 4. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, no pagamento de parcelas atrasadas de caráter alimentar, inclusive as derivadas de pensão, desde que ajuizada a demanda após a edição da MP 2.180-35/2001, que introduziu o art. 1º-F à Lei 9.494/97, incidem juros moratórios de 6% ao ano. 5. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para fixar juros de mora em 6% ao ano e determinar a utilização do IPC como índice de correção monetária. (REsp 764.560/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 07/03/2006, DJ 01/08/2006 p. 529)
Rejeito, portanto, a preliminar arguida.
Ilegitimidade passiva da União
É inviável acolher a preliminar arguida pela ré, pois há pedido expresso formulado contra a União, no sentido de que ela averbe o tempo de serviço prestado pelo autor, revise sua aposentadoria e efetue o pagamento de abono de permanência e converta em pecúnia as licenças-prêmio desaverbadas.
Prescrição
A prescrição aplicável à hipótese dos autos é a quinquenal, nos termos do que dispõe o enunciado da Súmula nº 85, do Superior Tribunal de Justiça.
Não procede a alegação do autor de renúncia à prescrição, pois o Superior Tribunal de Justiça reiteradamente afasta a renúncia administrativa com base na edição da Orientação Normativa nº 3, de 18/5/2007, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (REsp 1.555.248, Rel. Ministra Regina Helena Costa, publicado em 26/11/2015).
Logo, encontram-se prescritas as parcelas vencidas anteriores a 14/07/2009, considerando o ajuizamento da ação em 14/07/2014.
Exercício de atividade insalubre sob regime celetista
No período em que o autor trabalhou sob o regime celetista, o artigo 38 da CLPS, expedida pelo Decreto nº 77.077, de 24/01/1976, e, em seguida, o artigo 35 da CLPS, expedida pelo Decreto nº 89.312, de 23/01/1984, previam aposentadoria especial conforme serviço para esse efeito considerado perigoso, insalubre ou penoso, em decreto do Poder Executivo.
O Regulamento, aprovado pelo Decreto nº 72.771, de 06/09/1973, no artigo 71, inciso I, estabelecia como atividades profissionais perigosas, insalubres ou penosas, para fins de aposentadoria especial, aquelas atividades constantes dos Quadros I e II. Do Quadro II constava, sob código 2.1.3, a atividade profissional de "médico (expostos aos agentes nocivos - Código 1.3.0 do Anexo I)".
Da mesma forma, o artigo 60, inciso I, do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, estabelecia como atividades profissionais perigosas, insalubres ou penosas, para fins de aposentadoria especial, aquelas atividades constantes dos quadros que acompanhavam o regulamento, como Anexos I e II. Do Anexo II constava, sob código 2.1.3, a atividade profissional de "médico (expostos aos agentes nocivos - Código 1.3.0 do Anexo I)".
Assinale-se que também a Lei nº 5.527, de 08/11/1968, que acolheu as normas do Decreto nº 53.831, de 24/03/1964, classificou a atividade profissional de médico como insalubre, no Quadro anexo ao Decreto, item 2.1.3.
Procede, portanto, a alegação de presunção legal de insalubridade da atividade médica no período trabalhado pelo autor.
Período de 16/11/1977 a 01/01/1984
Em relação à contagem de tempo de serviço com o acréscimo de 40%, quanto ao período acima indicado, não assiste razão ao autor. Com efeito, não é permitida a conversão do tempo de serviço especial em comum, para fins de contagem recíproca, do período laborado em empresa privada.
A possibilidade dessa averbação somente diz respeito ao tempo de serviço prestado sob condições insalubres em vínculo celetista junto à Administração Pública federal, vínculo que posteriormente tenha sido transformado em estatutário (quando implantado o Regime Jurídico Único, cf. Lei nº 8.112/90).
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM RECÍPROCA. INICIATIVA PRIVADA. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Nos termos dos arts. 4º, I, da Lei 6.227/65 e 96, I, da Lei 8.213/91, é vedada a conversão do tempo de serviço especial em comum para fins de contagem recíproca de tempo de serviço, em que se soma o tempo de serviço de atividade privada, seja ela urbana ou rural, ao serviço público. Precedentes do STJ. 2. Recurso especial conhecido e improvido. (STJ, REsp 925359/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009)
EMENTA: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. EX-CELETISTA. ESTATUTÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE INSALUBRE. CONVERSÃO. DECRETOS Nº 53.831/64 E 83.080/79. ARTIGO 164, INCISO IV, DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 99 DO INSS. POSSIBILIDADE. PERÍODO TRABALHADO JUNTO À INICIATIVA PRIVADA. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO PARA FINS DE CONTAGEM RECÍPROCA. 1. Se a parte autora laborou sob condições insalubres durante o período em que era regida pela CLT junto à Administração Pública, faz jus à contagem especial do tempo de serviço. 2. A jurisprudência do STJ firmou posicionamento no sentido de que o servidor público ex-celetista faz jus à contagem do tempo de serviço celetista prestado em condições perigosas e insalubres na forma da legislação vigente à época da prestação de serviço. 3. Tratando-se de atividade profissional elencada como perigosa, insalubre ou penosa (Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79), faz-se a conversão do tempo de serviço na forma da legislação anterior. 4. Reconhecido seu direito à averbação do período trabalhado sob estas condições nos termos do artigo 164, inciso IV, da Instrução Normativa nº 99 do INSS. 5. "Nos termos dos arts. 4º, I, da Lei 6.227/65 e 96, I, da Lei 8.213/91, é vedada a conversão do tempo de serviço especial em comum para fins de contagem recíproca de tempo de serviço, em que se soma o tempo de serviço de atividade privada, seja ela urbana ou rural, ao serviço público. Precedentes do STJ." (TRF4, APELREEX 2007.71.00.040035-9, Quarta Turma, Relator Sérgio Renato Tejada Garcia, D.E. 04/02/2011)
Desse modo, para o reconhecimento do direito postulado pelo autor seria imperativo que na data da instauração do regime jurídico único o requerente mantivesse vínculo com o serviço público federal, além de exercer atividades insalubres, penosas ou perigosas, o que não era o caso.
Período de 02/01/1984 a 31/01/1984
A CF, no artigo 40, § 4º, inciso III, na redação dada pela EC nº 47/2005, veda a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores da União, ressalvados os casos de servidores cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, nos termos definidos em leis complementares. A Lei nº 10.098/94, ao seu turno, estabelece, no § 3º, do artigo 158, que nos casos de exercício de atividades consideradas insalubres ou perigosas, a aposentadoria voluntária por tempo de serviço deverá observar o disposto em lei específica.
Entretanto, a falta de lei complementar e de lei ordinária não impede a contagem, pelo ex-empregado celetista que passou a ser regido pelo Regime Jurídico Único, do tempo de serviço prestado em condições especiais sob a égide do Regime Geral de Previdência Social, em virtude da configuração do direito adquirido a essa contagem, quando do seu exercício, nos termos do artigo 5º, inciso XXXVI, da CF. Com efeito, a lei que rege o cômputo do tempo de serviço é a lei vigente à época de sua prestação, ainda que o direito à aposentadoria não tenha sido implementado sob a égide dessa legislação.
É correto que o artigo 4º, inciso I, da Lei nº 6.226/75, estabelecia que o tempo de serviço ou de atividade será computado de acordo com a Legislação pertinente, não se admitindo a contagem de tempo de serviço em dobro ou em outras condições especiais. E, como essa proibição existe desde 1975, não se poderia falar em direito adquirido no caso presente.
Todavia, a jurisprudência do e. Supremo Tribunal Federal (RE-Agr 220.375/MG, rel. Min. Ellen Gracie, j. 08/6/2004) e do e. Superior Tribunal de Justiça (RESP 517.316/PB, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 03/10/2006), é firme no sentido da afirmação do direito adquirido segundo a legislação vigente à época da prestação do serviço e de que o servidor público empregado que, em virtude da Lei nº 8.112/90 passou compulsoriamente para o regime estatutário, tem direito à contagem do tempo de serviço exercido em condições especiais, restringindo a proibição do artigo 4º, inciso I, da Lei nº 6.226/75 ao tempo de serviço prestado em condições especiais na atividade privada. Essa restrição, entretanto, é inaplicável no caso dos autos, em que a atividade de médico sob regime celetista foi exercida como serviço público federal.
Cabe repisar que o período de 01/02/1984 a 11/12/1990 já foi convertido, restando a conversão do período relativo a 02/01/1984 (data de emissão do requerente) a 31/01/1984 (01/02/1984 em diante já foi convertido).
Abono de permanência
O direito ao abono de permanência está previsto no artigo 40, § 19, da Constituição Federal, segundo o qual "O servidor de que trata este artigo que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no § 1º, III, a, e que opte por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no § 1º, II".
A União afirma que o autor jamais manifestou a opção por permanecer na ativa, o que impediria o recebimento do abono.
Não há como acolher a tese da ré.
O fato de o servidor, mesmo tendo direito, não requerer a aposentadoria já demonstra sua opção por permanecer na ativa.
Além disso, é de se observar que, no caso do autor, ele foi premido a continuar trabalhando devido à posição da Administração Pública, que não aceitava a contagem diferenciada do tempo de serviço prestado em condições insalubres. Seria inócuo que, antes de ver reconhecido o direito à contagem diferenciada, o autor apresentasse opção por permanecer na ativa e pedisse abono de permanência, pois seu pedido seria rejeitado pela Administração.
Sem o deferimento do cômputo do tempo de serviço prestado em condições especiais, era improvável que o autor se aposentasse e, consequentemente, requeresse o abono de permanência por permanecer na ativa.
A questão discutida nestes autos já foi submetida ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que assim se pronunciou:
EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO. ABONO DE PERMANÊNCIA RETROATIVO. DEMORA NO RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM CONDIÇÕES INSALUBRES ENQUANTO CELETISTA. LEI Nº 11.960/2009. APLICABILIDADE PARCIAL. ORIENTAÇÃO E. STJ. O servidor que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no § 1º, III, a, e que opte por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no § 1º, II. Não se pode conceber prejuízo ao servidor que à época estava impossibilitado de requerer o benefício, porquanto pendente o reconhecimento de seu direito à contagem ponderada do tempo de serviço prestado em condições insalubres no regime anterior. Após a edição da Lei n.º 11.960/2009, os juros de mora devem ser calculados, com base nos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, e a correção monetária, pelo IPCA, índice que melhor reflete a inflação acumulada no período, conforme determinado pelo STJ. (TRF4, APELREEX 5031592-48.2012.404.7100, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 11/11/2013)
Portanto, o pedido de recebimento de abono de permanência merece ser acolhido; já a existência efetiva de valores devidos, é questão que será analisada em sede de liquidação de sentença.
Conversão em pecúnia das licenças-prêmio não gozadas
A redação original do artigo 87 da Lei 8.112/90 assim determinava:
Art. 87. Após cada qüinqüênio ininterrupto de exercício, o servidor fará jus a 3 (três) meses de licença, a título de prêmio por assiduidade, com a remuneração do cargo efetivo.
§ 2º. Os períodos de licença-prêmio já adquiridos e não-gozados pelo servidor que vier a falecer serão convertidos em pecúnia, em favor de seus beneficiários da pensão. (Redação originária)
Logo em seguida foi editada a Lei nº 8.162, de 8/1/1991:
Art. 5º. Para efeito de aposentadoria, será contado em dobro o tempo de licença - prêmio a que se refere o art. 87 da Lei nº 8.112/90, que o servidor não houver gozado.
Com a edição da Medida Provisória de nº 1.522/96, convertida na Lei nº 9.527/97, foi alterado o artigo 87 da Lei nº 8.112/1990, sendo a licença-prêmio por assiduidade substituída pela licença para capacitação:
Art. 87. Após cada qüinqüênio de efetivo exercício poderá, no interesse da Administração, afastar-se do exercício do cargo efetivo, com a respectiva remuneração, por até três meses, para participar de curso de capacitação profissional.
Parágrafo único. Os períodos de licença de que trata o caput não são acumuláveis.
O art. 7º da Lei 9.527/97 assegurou o direito à fruição ou o cômputo em dobro para efeitos de aposentadoria, bem como a conversão em pecúnia para o caso de falecimento do servidor, observada a legislação então vigente:
Art. 7º. Os períodos de licença - prêmio, adquiridos na forma da Lei nº 8.112/90 até 15 de outubro de 1996, poderão ser usufruídos ou contados em dobro para efeito de aposentadoria ou convertidos em pecúnia no caso de falecimento do servidor, observada a legislação em vigor até 15 de outubro de 1996.
Parágrafo único. Fica resguardado o direito ao cômputo do tempo de serviço residual para efeitos de concessão da licença capacitação.
Apesar da ausência de previsão legal, a jurisprudência estendeu a aplicação da hipótese prevista no dispositivo aos casos de aposentadoria do servidor público; o Superior Tribunal de Justiça possui orientação no sentido de ser possível, no momento da aposentação do agente público, a conversão em pecúnia de licença-prêmio não gozada e não computada para fins de aposentadoria, tudo com fundamento no princípio da vedação ao enriquecimento sem causa da Administração.
Nessa situação, considerando os reiterados precedentes daquela Corte e também do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e a bem do princípio da segurança jurídica, ressalvo o entendimento deste juízo no sentido de que a conversão em pecúnia de licença-prêmio não gozada pelo servidor sujeita-se à comprovação de que a benesse não foi gozada por necessidade do serviço, a bem do interesse público (porque a lei não defere tal direito ao servidor), e resolvo pela procedência do pleito da parte autora.
Exemplificativamente, dois julgados do STJ sobre o tema:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL APOSENTADO. LICENÇAS-PRÊMIO NÃO GOZADAS E NÃO COMPUTADAS PARA EFEITO DE APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. RESERVA DE PLENÁRIO. INAPLICABILIDADE. PRETENSÃO DE PREQUESTIONAR DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESPECIAL.
1. No tocante ao direito à indenização pelas licenças-prêmio não gozadas e não computadas para efeito de aposentadoria, a jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que o reconhecimento de tal direito não constitui violação à Lei n.º 8.112/90 ou à Lei n.º 9.527/97. (...)
(AgRg no REsp 1158662 / PR Ministra LAURITA VAZ QUINTA TURMA DJe 12/04/2010)
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. APOSENTADORIA. LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE.
1. O Superior Tribunal de Justiça possui orientação no sentido de ser possível, no momento da aposentação do agente público, a conversão em pecúnia de licença-prêmio não gozada, tendo em vista o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, no caso, por parte da Administração.
2. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 540.493 - RS Ministra Maria Thereza de Assis Moura DjE 14/05/2007)
No momento da requisição dos valores devidos, não deverá ser descontado o PSS, dada a natureza indenizatória da verba, como têm decidido a Terceira e a Quarta Turmas do TRF da 4ª Região:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. SERVIDORES. LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. NÃO INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. 1. Os valores recebidos a título de licença-prêmio indenizada não integram o salário de contribuição, sendo impassíveis de contribuição previdenciária (PSS). 2. Agravo de instrumento improvido. (TRF4, AG 0001627-70.2012.404.0000, Quarta Turma, Relator Jorge Antonio Maurique, D.E. 13/06/2012)
EMENTA: AGRAVOS EM APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO INATIVO. LICENÇA-PRÊMIO ADQUIRIDA E NÃO-GOZADA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. VERBAS INDENIZATÓRIAS. IMPOSTO DE RENDA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NÃO INCIDÊNCIA. DECISÃO MANTIDA. Agravos improvidos. (TRF4 5004900-37.2011.404.7200, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 15/09/2011)
Por consequência, eventuais valores recebidos a título de abono de permanência não devem compor o valor da indenização. O abono de permanência tem a finalidade de compensar os valores descontados da remuneração do servidor a título de contribuição previdenciária. Logo, se a indenização pelo não gozo das licenças-prêmio não sofre a incidência de contribuição previdenciária, não deve ser acrescida de abono de permanência, que tem justamente a finalidade de compensar os descontos previdenciários. Caso se afastasse a contribuição previdenciária e se mantivesse o abono de permanência, o valor recebido pelo servidor em decorrência da conversão em pecúnia das licenças-prêmio seria superior ao valor que ele recebia ordinariamente quando estava na ativa. Ter-se-ia, assim, indenização superior ao dano.
O caso do autor conta ainda com uma peculiaridade. Como narrado na inicial, o requerente havia computado em dobro as licenças-prêmio a que tinha direito quando se aposentou. Com a determinação de contagem diferenciada do tempo de serviço prestado em condições insalubres, haverá a revisão do tempo de serviço do servidor. E com a nova averbação de tempo de serviço, a contagem em dobro das licenças-prêmio não gozadas pode vir a se tornar inócua, pois, independente de tal contagem, o tempo de serviço acumulado talvez já fosse suficiente para a aposentadoria com proventos integrais.
A União, por sua vez, sustenta que a contagem em dobro das licenças-prêmio não gozadas se trata de ato jurídico perfeito, o que impede que, agora, o ato seja desfeito a fim de possibilitar a conversão em pecúnia.
Todavia, o fato de a parte autora inicialmente ter requerido a contagem em dobro das licenças-prêmio para fins de aposentadoria não impede que agora ela opte pela conversão das mesmas licenças-prêmio em pecúnia. A parte autora somente requereu a contagem em dobro por causa do entendimento adotado pela própria Administração à época, que não acolhia a contagem diferenciada do tempo de serviço prestado em condições insalubres. Ou seja, o requerente foi forçado a deixar de exercer seu direito à conversão das licenças-prêmio em pecúnia, a fim de poder se aposentar. Reconhecido judicialmente o equívoco da Administração, não se pode negar à parte autora a possibilidade de exercer seu direito à conversão em pecúnia das mesmas licenças-prêmio. Do contrário, estar-se-ia permitindo que a União enriquecesse sem causa às custas do servidor com base em equívoco cometido por ela própria (Administração Pública), vez que, se houvesse a União apurado corretamente o tempo de serviço do servidor já à época do seu pedido de aposentadoria, ele talvez não teria se visto obrigado a requerer a contagem em dobro das licenças-prêmio e poderia, por consequência, ter já àquela época pleiteado a conversão em pecúnia.
Portanto, deve ser reconhecido o direito do requerente a converter tais licenças em pecúnia. Nesse sentido, cito o seguinte precedente:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ATIVIDADE POLICIAL. TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM ESPECIAL. LEI COMPLEMENTAR Nº 51/85. RECONHECIMENTO. LICENÇA-PRÊMIO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. O reconhecimento do direito à contagem especial do tempo de serviço público federal prestado em atividade policial, para fins de aposentadoria, com a desnecessidade do cômputo em dobro das licenças-prêmio não usufruídas, autoriza a conversão destas em pecúnia. (TRF4, Apelação Cível nº 2006.72.00.013632-0, 4ª Turma, Rel. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DJ 08/04/2008)
Liquidação de sentença
A existência de valores efetivamente devidos a título de abono de permanência e licenças-prêmio a serem desaverbadas e convertidas em pecúnia será objeto de liquidação da sentença, considerando o diminuto período que será convertido em fase do julgamento do presente feito.
Correção monetária e juros
Em relação à aplicabilidade das alterações introduzidas pela Lei nº 11.960/09, a utilização da TR como indexador da correção monetária foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões de mérito das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.357 e 4.425. Já os juros não foram abrangidos pela declaração de inconstitucionalidade (cf. decidido pelo Ministro Teori Zavascki nos autos da Medida Cautelar na Reclamação 16.745, em 18/11/2013, DJE de 20/11/2013).
Em 25 de março de 2015, o Supremo decidiu a questão relativa à modulação dos efeitos das Ações Diretas de Inconstitucionalidade acima referidas, considerando válido o índice básico da caderneta de poupança, a TR, para a atualização monetária dos precatórios expedidos até o dia 25/03/2015; após essa data, determinou a substituição da TR pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
Do que se depreende da leitura da decisão proferida pelo Supremo (disponível no sítio eletrônico do STF), a modulação referiu-se apenas às alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 62/09, não tendo havido a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do artigo 5º, da Lei nº 11.960/09, que alterou a redação do artigo 1º-F, da Lei nº 9.494/97, igualmente considerado parcialmente inconstitucional, por arrastamento, no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.357 e 4.425.
Posteriormente, a Suprema Corte iniciou a análise da repercussão geral, nos autos do RE n. 870.947/SE, da Relatoria do Ministro Luiz Fux, da validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, previstos no artigo 1º-F, da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, assim ementado:
DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. TEMA 810. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
(RE 870947 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 16/04/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-077 DIVULG 24-04-2015 PUBLIC 27-04-2015)
Destaco trecho da manifestação do Ministro relator que explicita a questão a ser dirimida no julgamento do referido recurso:
(...)
Na parte em que rege a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública até a expedição do requisitório (i.e., entre o dano efetivo/ajuizamento da demanda e a condenação), o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 ainda não foi objeto de pronunciamento expresso do Supremo Tribunal Federal quanto à sua constitucionalidade e, portanto, continua em pleno vigor.
Ressalto, por oportuno, que este debate não se colocou nas ADIs nº 4.357 e 4.425, uma vez que, naquelas demandas do controle concentrado, o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 não foi impugnado originariamente e, assim, a decisão por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, §12, da CRFB e o aludido dispositivo infraconstitucional.
(...)
Ainda que haja coerência, sob a perspectiva material, em aplicar o mesmo índice para corrigir precatórios e condenações judiciais da Fazenda Pública, é certo que o julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, sob a perspectiva formal, teve escopo reduzido. Daí a necessidade e urgência em o Supremo Tribunal Federal pronunciar-se especificamente sobre a questão e pacificar, vez por todas, a controvérsia judicial que vem movimentando os tribunais inferiores e avolumando esta própria Corte com grande quantidade de processos.
(...)
Desse modo, tem-se que, segundo a interpretação do Supremo, as decisões proferidas das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.357 e 4.425 não envolveram a discussão relativa aos critérios de atualização dos débitos da Fazenda Pública na fase de condenação, permanecendo, como consequência, em pleno vigor, neste ponto, o disposto no artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação que lhe deu a Lei nº 11.960/09, de modo que resta aplicável a TR como indexador de correção monetária na fase do processo de conhecimento.
No que tange aos juros de mora, por não terem sido atingidos pelos efeitos das decisões das ADIs 4.357 e 4.425, devem ser calculados com base nos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, em uma única incidência (sem capitalização), contemplada a alteração promovida pela Medida Provisória nº 567/2012, convertida na Lei nº 12.703/2012.
Os juros de mora devem ser calculados, desde a citação, com base nos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, em uma única incidência (sem capitalização), contemplada a alteração promovida pela Medida Provisória nº 567/2012, convertida na Lei nº 12.703/2012.
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto:
1) extingo o processo, sem resolução do mérito, quanto ao pedido de isenção da contribuição previdenciária e do imposto de renda sobre os valores postulados a título de indenização de períodos de licença-prêmio não gozados e
2) acolho a preliminar de ausência de interesse de agir arguida pela União, em relação ao período de 01/02/1984 a 11/12/1990.
No restante, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:
1) reconhecer o direito do autor à contagem do tempo de serviço prestado em condições especiais no período de 02/01/1984 a 31/01/1984, com acréscimo de 40%, nos termos da fundamentação;
2) condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a expedir certidão de contagem recíproca de tempo de serviço no período de 02/01/1984 a 31/01/1984, com o acréscimo de tempo de serviço especial de 40%;
3) ordenar à União que promova a averbação do tempo de serviço convertido, para todos os fins, especialmente para a aposentadoria;
4) determinar à União que proceda à revisão dos proventos de aposentadoria do autor após a averbação da contagem ponderada do tempo de serviço prestado em condições especiais;
5) condenar a União ao pagamento do abono de permanência ao autor e também às diferenças havidas em razão da conversão em pecúnia, com base na remuneração percebida pelo requerente na data da aposentadoria, de período de licença-prêmio não gozado pelo servidor, o que deverá ser apurado em fase de liquidação, nos termos da fundamentação.
Os valores deverão ser atualizados monetariamente e acrescidos de juros na forma da fundamentação.
As custas serão rateadas entre as partes, cabendo 50% ao autor, 35% à União e 15% ao INSS, considerando a parcela de sucumbência de cada litigante.
Condeno o autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor da União e INSS, cujo percentual será arbitrado na fase de liquidação, a teor do que dispõe o artigo 85, § 4º, inciso II, do NCPC.
Condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios em favor do autor, cujo percentual será arbitrado na fase de liquidação, a teor do que dispõe o artigo 85, § 4º, inciso II, do NCPC.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do autor, cujo percentual será arbitrado na fase de liquidação, a teor do que dispõe o artigo 85, § 4º, inciso II, do NCPC.
Não é cabível a compensação das verbas honorárias arbitradas de forma recíproca (artigo 85, § 14, do NCPC).
Publique-se e registre-se.
Aprecio as questões controversas.
O INSS em seu recurso insiste na necessidade de requerimento administrativo prévio.
Já a União em sua apelação afirma que inviável juridicamente a pretensão de desaverbação dos períodos de licença-prêmio, pois caracterizado ato jurídico perfeito e acabado.
A parte autora, de seu turno, alega em seu recurso, postula o provimento do recurso de apelação para:
a) reconhecer a possibilidade de apreciação do pedido de não incidência tributária, na condição de acessório do principal, bem como acolher o pleito da parte autora nesse aspecto, tal como colocado na exordial;
b) afastar o juízo preliminar de ausência de interesse de agir em relação ao período 02-1984 a 12-1990;
c) no mérito, afastar a prescrição quinquenal decretada, assegurando-se a integral procedência do pedido inicial, condenando-se as demandadas a arcarem com a integralidade da sucumbência.
Quanto à alegação do INSS de FALTA DE INTERESSE DE AGIR por falta de requerimento administrativo, deve ser mantida a sentença.
Conquanto tenha firmado o Supremo Tribunal Federal (RE 631240 - repercussão geral) entendimento no sentido de que a concessão de benefícios previdenciários depende de prévio indeferimento da pretensão pela Administração, a situação dos autos é peculiar.
O que se pretende é reconhecimento de especialidade de períodos trabalhados junto à Administração, ainda que vinculados ao regime geral, para aproveitamento no regime próprio. A pretensão envolve relação jurídica complexa, pois o tempo cujo especialidade se discute era vinculado ao RGPS, mas para o autor a repercussão econômica efetiva advirá de ato da União, que, em rigor, já apreciou, e indeferiu, o que postulado.
Diante deste quadro não há sentido em se remeter o autor previamente à via administrativa perante o INSS, até porque neste processo ambos os demandados (o INSS e a União) podem exercer com amplitude o direito de defesa.
Rejeito a preliminar.
No que pertine ao reconhecimento da FALTA DE INTERESSE DE AGIR no que toca ao período de 02/1984 a 12/1990, o recurso da parte autora merece provimento.
Pretende o autor o reconhecimento da especialidade do período para fins de revisão de seu ato de aposentadoria e pagamento de diferenças por conta de abono de permanência e também de conversão de períodos de licença-prêmio. Conquanto tenha havia reconhecimento administrativo da especialidade do período, os efeitos financeiros pretendidos não foram de todo reconhecidos. Ademais, não consta que os pagamentos pretendidos tenham sido feitos pela Administração. E o servidor não é obrigado a aguardar indefinidamente o pagamento espontâneo de crédito reconhecido.
Para os fins postulados nesta ação, assim, tenho que presente o interesse processual.
Aprecio agora a alegação de PRESCRIÇÃO.
No que se refere à prejudicial de prescrição, o entendimento que tenho sobre o tema pode ser compreendido a partir de excerto do voto que proferi no processo 5072365-04.2013.4.04.7100:
O reconhecimento por parte da Administração Federal do direito dos servidores públicos civis ao cômputo privilegiado de períodos de trabalho sob condições especiais exercidos quando ainda tinham vínculo celetista com o poder público foi promovido após o advento do Acórdão TCU 2008/2006, proferido em apreciação de Consulta formulada pela Presidência do Senado Federal. Segue o dispositivo da manifestação da Corte de Contas:
Acórdão
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator e com fundamento no art. 1º, inciso XVII, da Lei 8.443/1992, em:
9.1. conhecer da consulta para respondê-la nos seguintes termos:
9.1.1. o servidor público que exerceu, como celetista, no serviço público, atividades insalubres, penosas e perigosas, no período anterior à vigência da Lei 8.112/1990, tem direito à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria; todavia, para o período posterior ao advento da Lei 8.112/1990, é necessária a regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal, que definirá os critérios e requisitos para a respectiva aposentadoria;
9.2. remeter cópia deste Acórdão, acompanhado do relatório e voto que o fundamentam, à Comissão Permanente de Jurisprudência para análise da possibilidade de revogação da Súmula/TCU 245;
9.3. encaminhar cópia deste acórdão, acompanhado do relatório e voto que o fundamentam, à autoridade consulente; ... (grifei)
Considerando o entendimento manifestado pelo Tribunal de Contas da União, a Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão expediu a Orientação Normativa 03, de 18/05/2007, publicada em 21/05/2007, com o seguinte teor:
Art. 1º. A Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, passa a adotar as orientações contidas no Acórdão 2008/2006 - TCU - Plenário, publicado no Diário Oficial da União de 6 de novembro de 2006, que trata de assunto relacionado à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria de servidor público que exerceu atividades insalubres, penosas e perigosas, no serviço público, sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho, de que trata o Decreto-lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943.
Art. 2º. O servidor público que exerceu, como celetista, no serviço público, atividades insalubres, penosas e perigosas, no período anterior à vigência da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, tem direito à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria.
Art. 3º. Para o período posterior ao advento da Lei nº 8.112, de 1990, é necessária a regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal, que definirá os critérios e requisitos para a respectiva aposentadoria.
Art. 4º. Para efeito de aplicação do Acórdão 2008/2006 - TCU - Plenário, há que se observar as tabelas de conversão utilizadas para o cálculo de idênticas aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS, correspondentes aos respectivos períodos de exercício do servidor público nas condições ali previstas.
Art. 5º. Esta Orientação Normativa entra em vigor na data da sua publicação.
Complementando a regulamentação administrativa, a Coordenadora-Geral de Recursos Humanos do Ministério da Saúde expediu o Memorando-Circular 37/2007/CGRH/SAA/SE/MS, de 18/07/2007, que trata exatamente das providências relacionadas à averbação de tempo de serviço especial exercido sob regime celetista, em cumprimento ao acórdão TCU 2008/2006. Na alínea "e" do item 8.1 do citado ato normativo, foram esclarecidos os procedimentos a serem adotados pelas unidades de recursos humanos para a revisão das aposentadorias em manutenção:
e) Conforme o caso, dever-se-á proceder ao apostilamento de aposentadoria, alterando a proporcionalidade dos proventos, ou integralizando-os, desde a data da aposentadoria, mediante publicação de portaria em D.O.U., dando-se os efeitos financeiros a partir de 06.11.2006, data da publicação, em Diário Oficial da União, do Acórdão TCU nº 2008/2006 - Plenário;"(grifei)
Já nas alíneas "c" e "d" do item 8.2 do Memorando-Circular 37/2007/CGRH/SAA/SE/MS foram esclarecidos os procedimentos a serem adotados pelas unidades de recursos humanos relativamente aos servidores em atividade:
c) Registrar, nos assentamentos funcionais do servidor, o cômputo do tempo de serviço fictício obtido mediante a aplicação do respectivo fator de conversão, para, futuramente, ser incluído na elaboração de Mapa de Tempo de Serviço para fins de aposentadoria;
d) Informar o servidor sobre a contagem ponderada, para que, caso haja implementado todos os requisitos para aposentadoria, a requeira; ou, não o querendo, passe a receber o abono de permanência (ressaltando que, também neste caso, os efeitos financeiros contar-se-ão da data de publicação do Acórdão TCU, qual seja, 06.11.2006)".
Cabe salientar, ainda, que a questão foi objeto posteriormente de normatização pela Orientação Normativa 07, de 20/11/2007, da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e pela Orientação Normativa 15, de 23/12/2003, da Secretária de Gestão Pública do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
O reconhecimento pela Administração do direito vindicado nestes autos, como se vê, decorreu, em rigor, da Orientação Normativa 03/2007 (publicada em 21/05/2007), depois complementada pelo Memorando-Circular 37/2007 e pela Orientação Normativa 07/2007.
Segundo precedentes do Superior Tribunal de Justiça o reconhecimento do direito à contagem de tempo de serviço especial pelas orientações normativas 3 e 7, ambas de 2007 do MPOG, não implicou renúncia ao prazo prescricional no que toca a períodos pretéritos ao ato de reconhecimento, pois não foram expressamente incluídos por esses atos os servidores que, à época, já se encontravam aposentados e tiveram suas pretensões submetidas aos efeitos da prescrição. Nesse sentido: AgRg no AgRg no REsp 1405953/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 05/12/2013; AgRg no REsp nº 1.242.708 - RS (2011/0049522-6), Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, julgado em 08/04/2014, DJe 14/04/2014; AgRg no REsp nº 1.218.863 - RS (2010/0199593-8), Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, julgado em 23/10/2014, DJ 03/11/2014.
De fato, a Orientação Normativa 03/2007 limitou-se a reconhecer ao servidor público que exerceu, como celetista, no serviço público, atividades insalubres, penosas e perigosas, no período anterior à vigência da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, o direito à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria, aplicando entendimento firmado pelo Tribunal de Contas da União. O ato do Tribunal de Contas da União, por seu caráter consultivo, e também em razão do papel constitucional do referido órgão como controlador externo da Administração, não configurou, ele próprio, reconhecimento de direito.
O reconhecimento do direito pela Administração decorreu da Orientação Normativa 03/2007. E o reconhecimento procedido pela ON 03/2007deu-se nos estritos limites nele estabelecidos. Houve, portanto, formal reconhecimento (depois esclarecido pelo Memorando-Circular 37/2007), do direito ao pagamento de diferenças desde 06 de novembro de 2006 (data da decisão do TCU).
Quanto aos atos concretos (Portarias) que retificaram posteriormente, de ofício, com base nos atos normativos, as aposentadorias dos servidores, reconhecendo, conforme o caso, o direito à aposentadoria integral ou proporcional em bases mais favoráveis (por conta da consideração de tempo especial), não podem ser qualificados como hipótese de renúncia tácita à prescrição. Ora, a retificação do ato de aposentadoria, neste caso, se dá por for força das orientações normativas 3 e 7, ambas de 2007, do MPOG e do Memorando-Circular 37/2007, e, portanto, nos seus estritos termos (efeitos financeiros a 06/11/2007).
A se entender que o reconhecimento administrativo do direito implicaria renúncia à prescrição, a Administração jamais poderia reconhecer direito algum. Teria que esperar eventual propositura de ação judicial para alegar prescrição.
Ato concreto (Portaria) que retifica, com base no ato normativo, a aposentadoria do servidor, reconhecendo, conforme o caso, o direito à aposentadoria integral ou proporcional em bases mais favoráveis (por conta da consideração de tempo especial), não pode, de fato, ser qualificado como hipótese de renúncia tácita à prescrição. É evidente que a aposentadoria deve ser considerada revisada desde a data da concessão, pois o que se está revisando é o respectivo ato administrativo. A simples revisão, contudo, não implica reconhecimento de efeitos financeiros "ex tunc", com renúncia à prescrição.
A se entender de maneira diversa, a Administração jamais poderia acolher administrativamente pretensões de servidores, pois isso implicaria sempre renúncia tácita à prescrição.
Não se cogita, pois, de renúncia à prescrição no que toca a períodos pretéritos a 06/11/2006, seja pelos atos administrativos genéricos editados para reconhecer o direito, seja pelos atos concretos praticados para revisar as aposentadorias.
Temos, assim, como efeitos do reconhecimento promovido pela Administração por força da Orientação Normativa 03/2007, duas consequências:
(i) reconhecimento dos créditos dos servidores no que toca aos valores devidos a partir de 06/11/2006;
(ii) interrupção em 21/05/2007 (publicação da Orientação Normativa 03, de 18/05/2007) do prazo prescricional no que toca às parcelas anteriores a 06/11/2006, por força do disposto no inciso VI do artigo 202 do Código Civil (interrompe-se a prescrição "por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor").
Quanto aos créditos reconhecidos, estes estão pendentes de pagamento, pois a Administração até hoje está tomando as providências para providenciar o adimplemento. São devidos, pois foram reconhecidos, e em relação a eles não se cogita de prescrição, pois os processos administrativos para pagamento dos valores ainda estão em trâmite, incidindo o que dispõe o "caput" artigo 4º do Decreto 20/910/1932:
Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
...
Quanto às parcelas anteriores a 06/11/2006, reconhecido o efeito interruptivo operado pela Orientação Normativa 03, de 18/05/2007 (publicada em 21/05/2007), deve ser observado o que dispõe o Decreto nº 20.910/32 (ato normativo que, ressalte-se, foi recepcionado pela vigente Constituição com força de lei):
Art. 1º. As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
(...)
Art. 9º. A prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo.
Por outro lado, o Decreto-Lei nº 4.597/42 assim estabelece:
Art. 3º. A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para a interromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempre que a partir do último ato ou termo da mesma, inclusive da sentença nela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio.
Como se percebe, a prescrição quinquenal das dívidas da Fazenda Pública só pode ser interrompida uma vez (nesse sentido também dispõe genericamente o artigo 202 do Código Civil), e, uma vez interrompida, volta a correr pela metade do seu prazo.
Calha registrar ainda, que deve ser observada a Súmula nº 383 do STF:
Súmula 383
"A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo".
Assim, como na situação em análise a prescrição das parcelas anteriores a 06/11/2006 foi interrompida em 21/05/2007 (data da publicação da Orientação Normativa 03), e como o prazo prescricional voltou a correr pela metade, a prescrição em princípio consumou-se em 21/11/2009 (dois anos e meio depois da publicação da ON 03/2007), impondo-se, contudo, a observância da Súmula 383 do STF. A prescrição, convém salientar, em se tratando de relação continuativa, atinge gradativamente as prestações que vão se vencendo mês a mês.
Desta forma, considerando a interrupção da prescrição ocorrida em 21/05/2007, pode-se concluir que:
- As parcelas anteriores a 21/05/2002 estão fulminadas pela prescrição, pois a interrupção não tem o efeito de afastar os efeitos da causa extintiva já consumada;
- Quanto às parcelas posteriores a 21/05/2002 e anteriores a 06/11/2006 (a partir desta data os créditos estão reconhecidos), somente o exercício oportuno do direito na via administrativa se mostra apto viabilizar a cobrança, ainda que parcial, do pretenso crédito.
Com maior detalhamento pode-se afirmar, tendo em vista o que dispõem o Código Civil, o Decreto 20.910/32, Decreto-Lei 4.597/42 e a Súmula 383 do Supremo Tribunal Federal, que:
- As parcelas vencidas até 21/05/2002 já estavam prescritas quando da interrupção da prescrição em 21/05/2007;
- Não se cogita de prescrição no que toca às diferenças posteriores a 06/11/2006, pois no particular houve reconhecimento do próprio crédito pela União, e estão em andamento as providências para o pagamento.
- As parcelas vencidas entre 21/05/2002 e 21/11/2004 (dois anos e meio antes da interrupção) tiveram a retomada do curso do prazo prescricional em 21/05/2007, e, em tese, tendo em vista o disposto na primeira parte da Súmula 383 do STF, no caso de não ter sido exercido o direito, foram atingidas pela prescrição em 21/11/2009 (dois anos e meio após 21/05/2007);
- As parcelas vencidas entre 21/10/2004 (dois anos e meio antes da interrupção) e 06/11/2006 tiveram a prescrição interrompida em 21/05/2007, e, em tese, tendo em vista o disposto na segunda parte da Súmula 383 do STF, passaram a ser atingidas mensalmente pela prescrição cinco anos após as datas dos respectivos vencimentos, de modo que, no caso de não ter sido exercido o direito até 06/11/2011, restou consumada a prescrição da última competência passível de cobrança, afastando qualquer possibilidade de exigibilidade de valores pretéritos a 06/11/2006.
Nesse sentido, ação judicial ou requerimento específico de revisão apresentado pelo servidor (ou mesmo medida coletiva promovida em regime de substituição processual por entidade sindical) depois de 21/10/2011 não tem qualquer efeito em relação aos períodos anteriores a 06/11/2006, pois já consumada a prescrição em relação a todas as parcelas. Não obstante, ainda que indevidamente formulado após 10/2011, o requerimento de revisão não prejudica o pagamento das parcelas vencidas após 06/11/2011, pois, no particular, como já esclarecido, houve reconhecimento do crédito, e as providências administrativas para pagamento estão em andamento.
Ocorre, porém, que na sessão datada de 08 de setembro de 2016, esta Terceira Turma, em sua composição ampliada (art. 942 do CPC), consagrou o entendimento de que em casos como tais o reconhecimento administrativo do direito após o transcurso do prazo de cinco anos representa a renúncia da administração à prescrição, voltando a correr novo prazo prescricional desde então, relativamente a todas as parcelas vencidas desde a concessão do benefício até a data do reconhecimento administrativo.
Referida decisão restou ementada nos seguintes termos:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. REVISÃO DE APOSENTADORIA. DIFERENÇAS DE PROVENTOS. RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. MARCO INICIAL. DATA DA JUBILAÇÃO.
1. Sendo o INSS o ente ao qual as partes autoras estão vinculadas, e tendo ela autonomia jurídica, administrativa e financeira, fica caracterizado o seu interesse na demanda em razão da repercussão direta do benefício discutido sobre a sua esfera jurídico-patrimonial. O réu, portanto, detém legitimidade passiva ad causam. Pelo mesmo motivo, merece ser afastado o litisconsórcio necessário com a União.
2. Existe, in casu, interesse processual quanto aos valores pleiteados, pois, em que pese o reconhecimento administrativo do direito ao pagamento dos referidos valores, a Administração estaria atrasada na satisfação das quantias devidas, permanecendo sem qualquer perspectiva a integralização do saldo que é cobrado na presente ação. Estão presentes, portanto, os requisitos de necessidade e utilidade da prestação jurisdicional.
3. A Administração praticou ato de renúncia tácita ao prazo prescricional relativo ao fundo do direito quanto aos valores atrasados, pois o reconhecimento administrativo é ato incompatível com o instituto da prescrição, conforme dispõe o artigo 191 do Código Civil.
4. O marco inicial do pagamento das diferenças; é dizer, os efeitos financeiros da condenação, deve ser assentado na data da jubilação, e não no quinquênio que precedeu a edição da Orientação Normativa ou seus efeitos financeiros, uma vez que naquele momento temporal, as servidoras já possuíam direito à outorga da jubilação com proventos integrais, ou proporcionais com renda mensal superior.
5. O direito mostrava-se existente desde o requerimento da aposentadoria, uma vez que, nesta data, os servidores já haviam cumprido os requisitos necessários à sua inativação em modalidade mais vantajosa do que a outorgada. A comprovação ou o reconhecimento posteriores não comprometem a existência do direito adquirido, uma vez que não confere ao titular qualquer vantagem que já não integrasse seu patrimônio jurídico.
6. Provimento da apelação da parte autora e improvimento da apelação do INSS e da remessa oficial.
(TRF4, 3ª Turma, AC nº 5085540-31.2014.4.04.7100/RS, Rel. Des. Federal Marga Inge Barth Tessler, Rel. p/ acórdão Des. Federal Fernando Quadros da Silva)
No mesmo sentido segue precedente da 4ª Turma deste Tribunal Regional Federal:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA. REVISÃO. PRESCRIÇÃO. FUNDO DO DIREITO. RENÚNCIA. ARTIGO 1º DO DECRETO Nº 20.910/1932. DIFERENÇAS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
Ao reconhecer expressamente o direito do autor ao cômputo de tempo de serviço especial, recalculando administrativamente os seus proventos de aposentadoria, a Administração Pública renunciou, de forma tácita, à prescrição, retroagindo os efeitos financeiros da revisão à data de concessão do benefício.
(TRF4, APELREEX 5064589-84.2012.404.7100, QUARTA TURMA, Relatora para Acórdão VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 26/09/2015)
Assim, ainda que com ressalva da compreensão que tenho acerca do tema (e que foi manifestada em várias oportunidades, como no voto vista proferido no processo 5072365-04.2013.4.04.7100), deve, em princípio, ser reconhecida a renúncia à prescrição.
Passo à MATÉRIA DE FUNDO.
Pende desde agosto de 2010 análise de RE sob regime de repercussão geral (RE n. 612.358) no que toca à contagem especial de tempo de serviço sob condições insalubres anterior à instituição do Regime Jurídico Único.
Não obstante, o Supremo Tribunal Federal há muito vem reconhecendo o direito à contagem especial, no regime estatutário, do tempo de serviço prestado sob condições insalubres pelo servidor público quando ainda tinha vínculo celetista com a Administração Pública, ao entendimento de que este direito incorporou-se ao respectivo patrimônio jurídico (RE n. 258.327-8, Segunda Turma, Rel. Ministra Ellen Gracie, DJ de 06-02-2004), como se verifica pelos seguintes julgados: AgR no RE 724.221, Segunda Turma, Rel. Ministra Cármen Lúcia, julgado em 12-03-2013; ED no AI 728.697, Segunda Turma, Rel. Ministro Celso de Mello, julgado em 05-02-2013; e AgR no RE 463.299-3, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 25-06-2007, dentre inúmeros outros.
Segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal, é possível a averbação, no Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos Federais, do acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum prestado no RGPS, se o segurado, à época, já era servidor público.
O argumento utilizado pelo Supremo Tribunal Federal para considerar viável a averbação, no Regime Próprio de Previdência dos Servidores Públicos Federais, do acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum prestado no RGPS, se o segurado, à época, já era servidor público, é o de que, prestado o serviço sob condições nocivas quando vinculado ao Regime Geral de Previdência Social, o direito ao cômputo diferenciado do tempo de serviço incorpora-se ao patrimônio jurídico do segurado.
Seguem precedentes que expressam esse entendimento:
EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Direito Constitucional e Administrativo. Tempo de serviço prestado em condições especiais sob regime celetista. Conversão em tempo de atividade comum. Transformação do vínculo em estatutário. Averbação. Aposentadoria. Contagem recíproca. Possibilidade. Precedentes.
1. A jurisprudência da Corte é no sentido de que o servidor que laborou em condições insalubres, quando regido pelo regime celetista, pode somar esse período, ainda que convertido em tempo de atividade comum, com a incidência dos acréscimos legais, ao tempo trabalhado posteriormente sob o regime estatutário, inclusive para fins de aposentadoria e contagem recíproca entre regimes previdenciários distintos.
2. Agravo regimental não provido.
(RE 603581 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 18/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-238 DIVULG 03-12-2014 PUBLIC 04-12-2014)
AGRAVO DE INSTRUMENTO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO - SERVIDOR PÚBLICO - POSSIBILIDADE DE CONTAGEM ESPECIAL DE TEMPO DE SERVIÇO - PRETENDIDA AVERBAÇÃO - ATIVIDADE INSALUBRE EXERCIDA ANTES DA CONVERSÃO DO REGIME CELETISTA EM REGIME ESTATUTÁRIO - SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 8.112/90, QUE INSTITUIU O REGIME JURÍDICO ÚNICO - DIREITO ADQUIRIDO - PRECEDENTES (...) RECURSO IMPROVIDO.
(ED no AI 728697, Segunda Turma, Rel. Min. Celso De Mello, DJe de 08-03-2013)
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL EX-CELETISTA. CONTAGEM ESPECIAL DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES INSALUBRES EM PERÍODO ANTERIOR À INSTITUIÇÃO DO REGIME JURÍDICO ÚNICO. DIREITO ADQUIRIDO. AGRAVO IMPROVIDO.
I - A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o servidor público, ex-celetista, possui direito adquirido à contagem especial do tempo de serviço prestado sob condições insalubres, penosas ou perigosas no período anterior à instituição do regime jurídico único. Precedentes.
II - Agravo regimental improvido.
(AgR no RE 695749, Segunda Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 15-03-2013)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. NOVEL REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 12.322/2010 AO ART. 544 DO CPC. SERVIDOR PÚBLICO CELETISTA QUE EXERCEU ATIVIDADE INSALUBRE ANTERIORMENTE AO ADVENTO DA LEI Nº 8.112/90. CONTAGEM DE TEMPO PARA APOSENTADORIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 287 DO STF. DECISÃO QUE SE MANTÉM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. O princípio da dialeticidade recursal impõe ao recorrente o ônus de evidenciar os motivos de fato e de direito suficientes à reforma da decisão objurgada, trazendo à baila novas argumentações capazes de infirmar todos os fundamentos do decisum que se pretende modificar, sob pena de vê-lo mantido por seus próprios fundamentos.
2. O agravo de instrumento é inadmissível quando a sua fundamentação não impugna especificamente a decisão agravada. Nega-se provimento ao agravo, quando a deficiência na sua fundamentação, ou na do recurso extraordinário, não permitir a exata compreensão da controvérsia. (súmula 287/STF).
3. Precedentes desta Corte: AI 841690 AgR, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, DJe- 01/08/2011; RE 550505 AgR, Relator: Min. Gilmar Mendes, DJe- 24/02/2011; AI 786044 AgR, Relator: Min. Ellen Gracie, DJe- 25/06/2010.
4. In casu, o acórdão recorrido assentou: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL - EXPOSIÇÃO A AGENTES INSALUBRES ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA FUNASA RECONHECIMENTO DE OFÍCIO CONVERSÃO DO PERÍODO POSTERIOR AO ADVENTO DA LEI Nº 8.112/90 IMPOSSIBILIDADE. 1. "A contagem e a certificação de tempo de serviço prestado sob o regime celetista é atribuição do INSS, que detém, por isso, a legitimidade exclusiva para figurar no pólo passivo da ação." (AC 1998.38.00.037819-0/MG,Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ GONZAGA BARBOSA MOREIRA, PRIMEIRA TURMA, DJ 07/03/2005). 2. O servidor público celetiário anteriormente ao advento da Lei nº 8.112/90, que exerceu atividade insalubre tem direito à contagem desse tempo como especial, porquanto à época a legislação então vigente permitia essa conversão, entretanto para o período posterior à referida Lei faz-se necessário seja regulamentado o art. 40, § 4º da Carta Magna. (RE 382352/ SC, Relator (a): Min. ELLEN GRACIE, DJ 06-02-2004) 3. Reconhecimento da ilegitimidade passiva ad causam da FUNASA, quanto ao período anterior à Lei n. 8.112/90, com a extinção do feito sem exame de mérito, com fundamento no art. 267, VI e § 3º, do CPC. 4. Apelação conhecida em parte e desprovida. (fl. 378).
5. Agravo Regimental desprovido.
(AgR no ARE 686697, Primeira Turma, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe de 13-08-2012)
Agravo regimental no agravo de instrumento. Servidor público. Atividade insalubre. Contagem especial de tempo. Período anterior à edição da Lei nº 8.112/90. Possibilidade. Precedentes.
1. A decisão ora atacada reflete a pacífica jurisprudência desta Corte a respeito do tema, a qual reconhece a possibilidade da contagem especial do tempo de serviço em atividade insalubre prestado antes da edição da Lei nº 8.112/90.
2. Agravo regimental não provido.
(AgR no RE 457106, Primeira Turma, Rel. Ministro Dias Toffoli, DJe de 27-03-2012)
DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO SERVIDOR PÚBLICO DIREITO ADQUIRIDO À CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES INSALUBRES EM PERÍODO ANTERIOR À INSTITUIÇÃO do REGIME JURÍDICO ÚNICO PRECEDENTES.
A jurisprudência do Supremo firmou-se no sentido de que o servidor público federal ou estadual ex-celetista possui direito adquirido à contagem de tempo de serviço prestado sob condições insalubres ou perigosas no período anterior à instituição do Regime Jurídico Único. (AgR no RE 333.246, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 07-12-2011)
(...) anoto que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o direito à contagem do tempo de serviço público prestado por servidor celetista, antes da passagem para o regime estatutário, incorpora-se ao seu patrimônio jurídico, para todos os efeitos. (...) (Grifei)
(Ag no RE 363.064, Segunda Turma, Rel. Ministro Ayres Britto, julgado em 28-09-2010)
1. Agravo regimental em recurso extraordinário.
2. Servidor público estadual. Contagem especial do tempo de serviço prestado sob condições insalubres, no período anterior à instituição de regime jurídico único. Regime da Previdência Social. Contagem recíproca. Direito reconhecido. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento." (Grifei)
(AgR no RE 408.338, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 28-11-2008)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM CELETISTA. PRECEDENTES.
A decisão agravada não diverge da pacífica jurisprudência desta Casa de Justiça, de que "o direito à contagem do tempo de serviço público federal prestado por celetista, antes de sua transformação em estatutário, se incorpora ao seu patrimônio jurídico para todos os efeitos: comprovado o exercício de atividade considerada insalubre, perigosa ou pena, pela legislação à época aplicável, possui o servidor o direito à contagem especial deste tempo de serviço" (RE 440.648, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence). Nesse mesmo sentido, foram proferidas as seguintes decisões: RE 446.462, Relator o ministro Cezar Peluso; e RE 461.977, Relator o Ministro Celso de Mello. (...)
(AgR no RE 474.450, Primeira Turma, Rel. Ministro Carlos Britto, DJe de 29-09-2006)
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM CONDIÇÕES INSALUBRES EM PERÍODO ANTERIOR À SUPERVENIÊNCIA DO ESTATUTO DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS DO ESTADO. CONTAGEM RECÍPROCA. POSSIBILIDADE.
1. A contagem recíproca é um direito assegurado pela Constituição do Brasil. O acerto de contas que deve haver entre os diversos sistemas de previdência social não interfere na existência desse direito, sobretudo para fins de aposentadoria.
2. Tendo exercido suas atividades em condições insalubres à época em que submetido aos regimes celetista e previdenciário, o servidor público possui direito adquirido à contagem desse tempo de serviço de forma diferenciada e para fins de aposentadoria.
3. Não seria razoável negar esse direito à recorrida pelo simples fato de ela ser servidora pública estadual e não federal. E isso mesmo porque condição de trabalho, insalubridade e periculosidade, é matéria afeta à competência da União (CB, artigo 22, I [direito do trabalho]). Recurso a que se nega provimento. (Grifei)
(RE 255827, Primeira Turma, Rel. Ministro Eros Grau, DJ de 02-12-2005)
1. Servidor público federal: contagem especial de tempo de serviço prestado enquanto celetista, antes, portanto, de sua transformação em estatutário: direito adquirido, para todos os efeitos, desde que comprovado o efetivo exercício de atividade insalubre, perigosa ou penosa. (...) (Grifei)
(Ag no RE 367.314-9, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 20-04-2004)
Não há, por outro lado, obstáculo ao aproveitamento como especial de tempo de serviço prestado por servidor público antes do ingresso no serviço público. No particular, valho-me dos fundamentos expostos no voto do Des. Federal Celso Kipper quando do julgamento da 0006040-92.2013.404.0000 pela Corte Especial deste Tribunal:
D) Conversão de tempo especial em comum prestado no RGPS, antes do ingresso do servidor no serviço público:
Esta é a situação do caso concreto. Trata-se de servidor público federal que pretende a averbação, em seus assentos funcionais, do acréscimo resultante da conversão, para comum, de tempo de serviço especial em que se encontrava vinculado ao RGPS; entretanto, na época da prestação da atividade, o impetrante não era servidor público. Não se trata, pois, de hipótese de servidor público celetista que foi transposto para Regime Próprio de Previdência. Cuida-se, em verdade, de segurado vinculado ao RGPS que, após a prestação da atividade, prestou concurso público e passou, na condição de servidor público federal, a ser regido pela Lei n. 8.112/90.
Quanto à situação específica do impetrante, o Supremo Tribunal Federal, aparentemente, ainda não se manifestou. A questão, contudo, vem sendo apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, que firmou posição no sentido de ser inviável a contagem recíproca, no Regime Próprio dos Servidores Públicos Federais, de tempo de serviço ficto prestado no âmbito do RGPS, a teor do disposto no art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75, e no art. 96, I, da Lei n. 8.213/91. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO E ADMINISTRATIVO - TEMPO DE SERVIÇO - CONTAGEM RECÍPROCA - ATIVIDADE INSALUBRE PRESTADA NA INICIATIVA PRIVADA - CONTAGEM ESPECIAL PARA FINS DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA NO SERVIÇO PÚBLICO - IMPOSSIBILIDADE - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS.
1. O REsp n. 534.638/PR, relatado pelo Excelentíssimo Ministro Félix Fischer, indicado como paradigma pela Autarquia Previdenciária, espelha a jurisprudência sedimentada desta Corte no sentido de que, objetivando a contagem recíproca de tempo de serviço, vale dizer, a soma do tempo de serviço de atividade privada (urbana ou rural) ao serviço público, não se admite a conversão do tempo de serviço especial em comum, ante a expressa proibição legal (artigo 4º, I, da Lei n. 6.226/75 e o artigo 96, I, da Lei n. 8.213/91). Precedentes.
2. Embargos de divergência acolhidos para dar-se provimento ao recurso especial do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, reformando-se o acórdão recorrido para denegar-se a segurança.
(EREsp 524267/PB, Terceira Seção, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe de 24-03-2014)
Nesse sentido, ainda, os seguintes precedentes: REsp 925.359, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 17-03-2009; ED no REsp 640.322, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJ de 12-09-2005; e REsp 534.638, Quinta Turma, Rel. Ministro Felix Fischer, julgado em 03-02-2004. As seguintes decisões monocráticas também são na mesma linha: REsp 1151024, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe de 18-02-2014; REsp 1088568, Rel. Ministro Og Fernandes, DJe de 02-05-2012; REsp 1295443, Rel. Ministro Francisco Falcão, DJe de 12-03-2012; Ag 1143623, Rel. Ministra Thereza de Assis Moura, DJe de 24-10-2011; e Ag 1215059, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 04-08-2011.
Acerca da questão, assim estabelece o art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75, que dispõe sobre a contagem recíproca de tempo de serviço público federal e de atividade privada, para efeito de aposentadoria, e o art. 96, I, da Lei n. 8.213/91:
Art. 4º - Para os efeitos desta Lei, o tempo de serviço ou de atividade, conforme o caso, será computado de acordo com a legislação pertinente, observadas as seguintes normas:
I - não será admitida a contagem de tempo de serviço em dobro ou em outras condições especiais;
(...)
Art. 96 - O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
(...)
Como referido acima, o STJ consolidou o entendimento de que, se o tempo especial foi prestado no RGPS quando o segurado ainda não era servidor público, porém veio a sê-lo posteriormente, não é possível o cômputo do tempo como especial, em face do óbice existente no art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75, e no art. 96, I, da Lei n. 8.213/91.
Entretanto, não vislumbro como diferenciar a hipótese acima daquela situação em que o tempo especial foi prestado no RGPS pelo servidor público que deixou de ser celetista e teve o emprego público transformado em cargo público por força da Lei 8.112/90. Em ambos os casos, o tempo especial foi prestado no RGPS, e em ambos os casos o tempo ficto será averbado no Regime Próprio dos Servidores.
O mesmo fundamento utilizado pelo Supremo Tribunal Federal para autorizar o cômputo do acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum, qual seja, o direito adquirido (prestado o serviço sob condições nocivas quando vinculado ao Regime Geral de Previdência Social, o direito ao cômputo diferenciado do tempo de serviço incorpora-se ao patrimônio jurídico do segurado), é válido para o presente caso. Veja-se a lição de Gabba sobre direito adquirido:
É adquirido todo direito que: a) seja consequência de um fato idôneo a produzi-lo, em virtude da lei do tempo no qual o fato se viu realizado, embora a ocasião de fazê-lo valer não se tenha apresentado antes da atuação de uma lei nova a respeito do mesmo; e que b) nos termos da lei sob o império da qual se verificou o fato de onde se origina, entrou imediatamente a fazer parte do patrimônio de quem o adquiriu. (Grifei)
(Gabba, Francesco: Teoria della Retroattività delle Leggi, Roma, 1891, 3ª Edição, volume I, p. 191)
Como se verifica, quando da prestação da atividade pelo impetrante, a legislação a que estava vinculado autorizava o reconhecimento do tempo como especial e o cômputo do tempo de serviço ficto. Dessa forma, o exercício de atividade especial incorporou-se ao seu patrimônio jurídico e não mais pode ser retirado.
Acerca do direito adquirido, veja-se, também, a lição de Luis Roberto Barroso ao tratar do tema in Reforma da Previdência: Análise e Crítica da Emenda Constitucional nº 41/2003 - doutrina, pareceres e obras selecionadas (Belo Horizonte: Editora Fórum, 2004, pp. 124-129):
Como visto, a constituição estabelece que a lei - e, para esse fim, também a emenda constitucional - não pode retroagir para prejudicar o direito adquirido. Cabe, portanto, qualificar o que seja o efeito retroativo vedado. O tema é envolto em polêmica, mas há um ponto inicial de consenso: se a lei pretender modificar eventos que já ocorreram e se consumaram ou desfazer os efeitos já produzidos de atos praticados no passado, ela estará em confronto com a Constituição e será inválida nesse particular.
A controvérsia na matéria surge a propósito de uma outra situação: a do tratamento jurídico a ser dado aos efeitos de um ato praticado sob a vigência da lei anterior, que só venham a se produzir após a edição da lei nova. Foi precisamente em torno dessa questão que se dividiu a doutrina, contrapondo dois dos principais autores que se dedicaram ao tema: o italiano Gabba e o francês Paul Roubier. Para Roubier, a lei nova aplicava-se desde logo a esses efeitos, circunstância que denominou de eficácia imediata da lei, e não retroatividade. Gabba, por sua vez, defendia tese oposta: a de que os efeitos futuros deveriam continuar a ser regidos pela lei que disciplinou sua causa, isto é, a lei velha. Esta foi a linha de entendimento que prevaleceu no direito brasileiro e que tem chancela da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
(...)
Como já se assinalou, é a posição de Gabba que, de longa data, baliza o tema no direito brasileiro, apontando como características do direito adquirido: 1) ter sido consequência de um fato idôneo para a sua produção; 2) ter-se incorporado definitivamente ao patrimônio do titular. O conhecimento corrente é o de que havendo o fato necessário à aquisição de um direito ocorrido integralmente sob a vigência de uma determinada lei, mesmo que seus efeitos somente se devam produzir em um momento futuro, terão de ser respeitados na hipótese de sobrevir uma lei nova.
O direito adquirido pode ser mais bem compreendido se extremado de duas outras categorias que lhe são vizinhas, a saber: a expectativa de direito e o direito consumado. Com base na sucessão de normas no tempo e na posição jurídica a ser desfrutada pelo indivíduo em face da lei nova, é possível ordenar estes conceitos em sequência cronológica: em primeiro lugar, tem-se expectativa de direito, depois o direito adquirido e, por fim, o direito consumado.
A expectativa de direito identifica a situação em que o fato aquisitivo do direito ainda não se completou quando sobrevém uma nova norma alterando o tratamento jurídico da matéria. Neste caso, não se produz o efeito previsto na norma, pois seu fato gerador não se aperfeiçoou. Entende-se, sem maior discrepância, que a proteção constitucional não alcança esta hipótese, embora outros princípios, no desenvolvimento doutrinário mais recente (como o da boa-fé e o da confiança), venham oferecendo algum tipo de proteção também ao titular da expectativa de direito. É possível cogitar, nessa ordem de idéias, de direito a uma transição razoável.
Na sequência de eventos, direito adquirido traduz situação em que o fato aquisitivo aconteceu por inteiro, mas por qualquer razão ainda não se operaram os efeitos dele resultantes. Nesta hipótese, a Constituição assegura a regular produção de seus efeitos, tal como previsto na norma que regeu sua formação, nada obstante a existência da lei nova. Por fim, o direito adquirido consumado descreve a última das situações possíveis - quando não se vislumbra mais qualquer conflito de leis no tempo - que é aquela na qual tanto o fato aquisitivo quanto os efeitos já se produziram normalmente. Nesta hipótese, não é possível cogitar de retroação alguma.
De modo esquemático, é possível retratar a exposição desenvolvida na síntese abaixo:
a) Expectativa de direito: o fato aquisitivo teve início, mas não se completou;
b) Direito adquirido: o fato aquisitivo já se completou, mas o efeito previsto na norma ainda não se produziu;
c) Direito consumado: o fato aquisitivo já se completou e o efeito previsto na norma já se produziu integralmente.
Um exemplo singelo ilustrará os conceitos. A Emenda Constitucional nº 20/98 instituiu a idade mínima de 60 anos para a aposentadoria dos servidores públicos do sexo masculino. Anteriormente, bastava o tempo de serviço de 35 anos. Ignorando-se as sutilezas do regime de transição, para simplificar o exemplo, confira-se a aplicação dos conceitos. O servidor público de 55 anos que já tivesse se aposentado pelas regras anteriores desfrutava de um direito consumado, isto é, não poderia ser "desaposentado". O servidor público que tivesse 55 anos de idade e 35 de serviço quando da promulgação da emenda, mas ainda não tivesse se aposentado, tinha direito adquirido à aposentar-se, pois já se haviam implementado as condições de acordo com as regras anteriormente vigentes. Porém, o servidor que tivesse 45 anos de idade e 25 de serviço, e que contava se aposentar daí a 10 anos, tinha mera expectativa de direito, não desfrutando de proteção constitucional plena. (Grifei)
Com efeito, a título de exemplo, se um segurado do Regime Geral de Previdência Social passou 10 anos prestando atividade sujeita a condições nocivas, que lhe garantem a contagem do tempo como especial pela legislação a que estava vinculado, o tempo que integrou seu patrimônio jurídico não são apenas os 10 anos que passou trabalhando, mas sim 14 anos, ou seja, o tempo comum (10 anos) e o acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum (04 anos). O tempo que se incorpora ao patrimônio jurídico do segurado corresponde a 14 anos, independentemente de, posteriormente, deixar de exercer atividade vinculada ao RGPS.
Ainda no tocante ao segurado vinculado ao RGPS, a jurisprudência do STF é pacífica, desde longa data, no sentido de que o reconhecimento da especialidade da atividade exercida é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, de modo que, prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida (AgReg no RE n. 463.299-3, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, D.J. de 17-08-2007; AgReg no RE n. 438.316-4, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, Segunda Turma, D.J. de 30-03-2007; AgReg no RE 450.035-3, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, Segunda Turma, D.J. de 22-09-2006; AgReg no RE 456.480-7, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, D.J. de 24-02-2006; e RE n. 258.327-8, Rel. Ministra Ellen Gracie, Segunda Turma, D.J. de 06-02-2004). Com efeito, em recente julgado, o STF deixou assentado que a contagem, como especial, de tempo de serviço rege-se pela lei vigente à época da prestação do serviço (ARE n. 665.307, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 09-05-2014).
Confira-se, a título de exemplo, outro caso em que o Plenário do STF assegurou o direito adquirido: no julgamento do Recurso Extraordinário n. 630.501, submetido ao regime da repercussão geral, o Plenário entendeu, por maioria de votos, em sessão realizada em 21-02-2013, que, em reconhecimento do direito adquirido ao melhor benefício, ainda que sob a vigência de uma mesma lei, teria o segurado direito a eleger o benefício mais vantajoso, consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde quando preenchidos os requisitos mínimos para a aposentação, consoante se vê do Informativo n. 695 daquela Corte, assim posto:
Aposentadoria: preenchimento de requisitos e direito adquirido ao melhor benefício - 7
O segurado do regime geral de previdência social tem direito adquirido a benefício calculado de modo mais vantajoso, sob a vigência da mesma lei, consideradas todas as datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde quando preenchidos os requisitos para a jubilação. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, proveu, em parte, recurso extraordinário para garantir a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial (RMI) possível no cotejo entre aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria proporcional, com efeitos financeiros a contar do desligamento do emprego ou da data de entrada do requerimento, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vencidas. Prevaleceu o voto da Min. Ellen Gracie - v. Informativo 617. Observou, inicialmente, não se estar, no caso, diante de questão de direito intertemporal, mas da preservação do direito adquirido em face de novas circunstâncias de fato, devendo-se, com base no Enunciado 359 da Súmula do STF, distinguir a aquisição do direito do seu exercício. Asseverou que, cumpridos os requisitos mínimos (tempo de serviço e carência ou tempo de contribuição e idade, conforme o regime jurídico vigente à época), o segurado adquiriria o direito ao benefício. Explicitou, no ponto, que a modificação posterior nas circunstâncias de fato não suprimiria o direito já incorporado ao patrimônio do seu titular. Dessa forma, o segurado poderia exercer o seu direito assim que preenchidos os requisitos para tanto ou fazê-lo mais adiante, normalmente por optar em prosseguir na ativa, inclusive com vistas a obter aposentadoria integral ou, ainda, para melhorar o fator previdenciário aplicável.
RE 630501/RS, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 21.2.2013. (RE-630501)
Aposentadoria: preenchimento de requisitos e direito adquirido ao melhor benefício - 8
Reputou que, uma vez incorporado o direito à aposentação ao patrimônio do segurado, sua permanência na ativa não poderia prejudicá-lo. Esclareceu que, ao não exercer seu direito assim que cumpridos os requisitos mínimos para tanto, o segurado deixaria de perceber o benefício mensal desde já e ainda prosseguiria contribuindo para o sistema. Não faria sentido que, ao requerer o mesmo benefício posteriormente (aposentadoria), o valor da sua RMI fosse inferior àquele que já poderia ter obtido. Aduziu que admitir que circunstâncias posteriores pudessem ensejar renda mensal inferior à garantida no momento do cumprimento dos requisitos mínimos seria permitir que o direito adquirido não pudesse ser exercido tal como adquirido. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que consideravam o requerimento de aposentadoria ato jurídico perfeito, por não se tratar, na hipótese, de inovação legislativa. (Grifei)
RE 630501/RS, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 21.2.2013. (RE-630501)
O acórdão do aludido Recurso Extraordinário, publicado em 26-08-2013, restou assim ementado:
APOSENTADORIA - PROVENTOS - CÁLCULO. Cumpre observar o quadro mais favorável ao beneficiário, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em data posterior ao implemento das condições legais. Considerações sobre o instituto do direito adquirido, na voz abalizada da relatora - ministra Ellen Gracie -, subscritas pela maioria.
A propósito, transcrevo excerto do voto proferido pela Ministra Ellen Gracie, na Repercussão Geral no RE 630.501, acima referida:
A garantia constitucional do direito adquirido está estampada no artigo 5o, XXXVI, da Constituição Federal:
"Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada ".
O instituto do direito adquirido insere-se, normalmente, nas questões de direito intertemporal. Não temos, no nosso direito, uma garantia ampla e genérica de irretroatividade das leis, mas a garantia de que determinadas situações Jurídicas consolidadas não serão alcançadas por lei nova. Assegura-se, com isso, a ultratividade da lei revogada em determinados casos, de modo que o direito surgido sob sua vigência continue a ser reconhecido e assegurado.
Pontes de Miranda, comentando a Constituição anterior - cujo art.153, § 3 o , trazia a mesma fórmula -, já destacava que a lei nova não pode prejudicar os direitos emanados de fatos pretéritos, considerados adquiridos, "isto é, os direitos já irradiados e os que terão de irradiar-se". (Comentários à Constituição de 1967; com a Emenda n. I, de 1969. 3a ed. Tomo V. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 67).
Celso Ribeiro Bastos dá destaque a outra perspectiva, esclarecendo que, ao se assegurar o direito adquirido, o que se protege "não é o passado, mas sim o futuro". Continua: "o direito adquirido consiste na faculdade de continuar a extraírem-se efeitos de um ato contrários aos previstos pela lei atualmente em vigor, ou, se preferirmos, continuar-se a gozar dos efeitos de uma lei 'pretérita mesmo depois de ter ela sido revogada. [...] "o direito adquirido envolve muito mais uma questão de permanência da lei no tempo, projetando-se, destarte, para além da sua cessação de vigência, do que um problema de retroatividade." (Comentários à Constituição do Brasil, 2o vol. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 192).
Em matéria previdenciária, já está consolidado o entendimento de que é assegurado o direito adquirido sempre que, preenchidos os requisitos para o gozo de determinado benefício, lei posterior revogue o dito benefício, estabeleça requisitos mais rigorosos para a sua concessão ou, ainda, imponha critérios de cálculo menos favoráveis.
É que, nessas situações, coloca-se a questão da supressão, de um direito já incorporado ao patrimônio do segurado e constitucionalmente protegido contra lei posterior, que, no dizer do art. 5o, inciso XXXVI, da Constituição, não pode prejudicá-lo.
Também as modificações instituídas pela Emenda Constitucional n. 20, de 1998, e pela Lei n. 9.876, de 1999, na concessão e na forma de cálculo da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, foram tema de repercussão geral pelo STF, que entendeu que: ou o segurado se aposenta com base no direito adquirido, computando o tempo e os salários de contribuição vertidos até 16-12-1998 ou até 28-11-1999, véspera da data em que passou a viger a Lei n. 9.876/99, cujo salário de benefício será apurado nos termos da legislação vigente à época; ou soma o tempo posterior à Lei n. 9.876/99 e se sujeita às regras de concessão do benefício e de apuração do salário de benefício vigentes nessa ocasião, com incidência do fator previdenciário, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no RE n. 575089, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, cujo mérito foi julgado em 10-09-2008 pelo Tribunal Pleno, como segue:
INSS. APOSENTADORIA. CONTAGEM DE TEMPO. DIREITO ADQUIRIDO. ART. 3º DA EC 20/98. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO POSTERIOR A 16.12.1998. POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO CALCULADO EM CONFORMIDADE COM NORMAS VIGENTES ANTES DO ADVENTO DA REFERIDA EMENDA. INADMISSIBILIDADE. RE IMPROVIDO. I - Embora tenha o recorrente direito adquirido à aposentadoria, nos termos do art. 3º da EC 20/98, não pode computar tempo de serviço posterior a ela, valendo-se das regras vigentes antes de sua edição. II - Inexiste direito adquirido a determinado regime jurídico, razão pela qual não é lícito ao segurado conjugar as vantagens do novo sistema com aquelas aplicáveis ao anterior. III - A superposição de vantagens caracteriza sistema híbrido, incompatível com a sistemática de cálculo dos benefícios previdenciários. IV - Recurso extraordinário improvido.
O STJ também vem decidindo no sentido de que o direito ao cômputo diferenciado do tempo de serviço prestado em condições especiais, por força das normas vigentes à época da referida atividade, incorpora-se ao patrimônio jurídico do segurado (REsp 1387670, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 28-05-2014); como se verifica nos seguintes precedentes: AgRg nos EDcl no REsp 1425750, segunda Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe de 02-05-2014; AR n. 3320/PR, Terceira Seção. Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 24-09-2008; EREsp n. 345554/PB, Terceira Seção, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 08-03-2004; AGREsp n. 493.458/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23-06-2003; e REsp n. 491.338/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23-06-2003, dentre outros.
Outro exemplo: a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp n. 1110565, pelo rito da Lei dos Recursos Repetitivos (Lei n. 11.672/2008), definiu que os dependentes têm direito ao benefício previdenciário de pensão por morte se o segurado, quando do seu falecimento, já preenchia os requisitos necessários para obter qualquer das aposentadorias do Regime Geral de Previdência Social, ou seja, o segurado falecido tinha direito adquirido ao benefício previdenciário por ocasião do óbito, gerando assim direito à pensão aos seus dependentes. Em face disso, o STJ editou a Súmula 416, que dispõe: "É devida a pensão por morte aos dependentes do segurado que, apesar de ter perdido essa qualidade, preencheu os requisitos legais para a obtenção de aposentadoria até a data do seu óbito".
Nessa linha de raciocínio, conclui-se que, tanto o art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75, quanto o inc. I do art. 96 da Lei n. 8.213/91, se interpretados no sentido de que constituem óbice à contagem ponderada do tempo especial prestado sob a égide de legislação em que esta era prevista, acabam por ferir a garantia constitucional do direito adquirido e o princípio da isonomia.
No tocante ao princípio da isonomia ou igualdade, disposto no art. 5º, caput, da Constituição Federal de 1988, veja-se a lição de Celso Antonio Bandeira de Mello in "O conteúdo jurídico do princípio da igualdade" (São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2012, p. 25-39):
20. É inadmissível, perante a isonomia, discriminar pessoas ou situações ou coisas (o que resulta, em última instância, na discriminação de pessoas) mediante traço diferencial que não seja nelas mesmas residentes. Por isso, são incabíveis regimes diferentes determinados em vista de fator alheio a elas; quer-se dizer: que não seja extraído delas mesmas.
Em outras palavras: um fator neutro em relação às situações, coisas ou pessoas diferenciadas é inidôneo para distingui-las. Então, não pode ser deferido aos magistrados ou aos advogados ou aos médicos que habitem em determinada região do país - só por isto - um tratamento mais favorável ou mais desfavorável juridicamente. Em suma, discriminação alguma pode ser feita entre eles, simplesmente em razão da área especial em que estejam sediados.
Poderão, isto sim - o que é coisa bastante diversa - existir nestes vários locais, situações ou circunstâncias, as quais sejam, elas mesmas, distintas entre si, gerando, então, por condições próprias suas, elementos diferenciais pertinentes. Em tal caso, não será a demarcação especial, mas o que nelas exista, a razão eventualmente substante para justificar discrímen entre os que se assujeitam - por sua presença contínua ali - àquelas condições e as demais pessoas que não enfrentam idênticas circunstâncias.
21. O asserto ora feito - que pode parecer senão óbvio, quando menos, despiciendo - tem sua razão de ser. Ocorre que o fator "tempo", assaz de vezes, é tomado como critério de discrímen sem fomento jurídico satisfatório, por desrespeitar a limitação ora indicada.
Esta consideração postremeira é indispensável para aplainar de lés a lés possíveis dúvidas.
O fator "tempo" não é jamais um critério diferencial, ainda que em primeiro relanço aparente possuir este caráter.
22. Quando a lei validamente colhe os indivíduos e situações a partir de tal data ou refere os que hajam exercido tal ou qual atividade ao largo de um certo lapso temporal, não está, em rigor de verdade, erigindo o "tempo", per se, como critério qualificador, como elemento diferencial.
Sucede, isto sim, que o tempo é um condicionante lógico dos seres humanos. A dizer, as coisas decorrem numa sucessão que demarcamos por força de uma referência cronológica irrefragável. Por isso, quando a lei faz referência ao tempo, aparentemente tomando-o como elemento para discriminar situações ou indivíduos abrangidos pelo período demarcado, o que na verdade está prestigiando como fator de desequiparação é a própria sucessão de fatos ou de "estados" transcorridos ou a transcorrer.
(...)
24. Igualmente, quando a lei diz: a partir de tal data, tais situações passam a ser regidas pela norma superveniente, não está, com isso, elevando o tempo à conta de razão de discrímen, porém, tomando os fatos subjacentes e dividindo-os em fatos já existentes e fatos não existentes. Os que já existem recebem um dado tratamento, os que não existem e virão a existir receberão outro tratamento. É a diferença entre existir e não existir (ter ocorrido ou não ter ocorrido) que o Direito empresta força de fator distintivo entre as situações para lhes atribuir disciplinas diversas. E, mesmo nesta hipótese, não é ilimitada a possibilidade de discriminar. Assim, os fatos já existentes foram e continuam sendo, todos eles tratados do mesmo modo, salvo se, por outro fator logicamente correlacionado com alguma distinção estabelecida, venham a ser desequiparados.
(...)
25. Em conclusão: tempo, por si só, é elemento neutro, condição do pensamento humano e por sua neutralidade absoluta, a dizer, porque em nada diferencia os seres ou situações, jamais pode ser tomado como o fator em que se assenta algum tratamento jurídico desuniforme, sob pena de violência à regra da isonomia. Já os fatos ou situações que nele transcorreram e por ele se demarcam, estes sim, é que são e podem ser erigidos em fatores de discriminação, desde que, sobre diferirem entre si, haja correlação lógica entre o acontecimento, cronologicamente demarcado, e a disparidade de tratamento em função disto se adota.
Sintetizando: aquilo que é, em absoluto rigor lógico, necessária e irrefragavelmente igual para todos não pode ser tomado como fator de diferenciação, pena de hostilizar o princípio isonômico.
(...)
Isto posto, procede concluir: a lei não pode tomar tempo ou data como fator de discriminação entre pessoas a fim de lhes dar tratamentos díspares, sem com isto pelejar à arca partida com o princípio da igualdade. O que pode tomar como elemento discriminador é o fato, é o acontecimento, transcorrido em certo tempo por ele delimitado.
(...)
Ora, o princípio da isonomia preceitua que sejam tratadas igualmente as situações iguais e desigualmente as desiguais. Donde não há como desequiparar pessoas e situações quando nelas não se encontram fatores desiguais. (Grifei)
No caso dos autos, o impetrante trabalhou, sob condições especiais (prejudiciais a sua saúde), no período de 15-10-1987 a 30-05-1995, junto à EMBRATEL, à época sociedade de economia mista, pessoa jurídica de direito privado, sujeito ao RGPS.
Tem direito à contagem diferenciada do seu tempo de serviço, mediante a conversão de tempo especial em comum, com base no art. 57, § 5º, da Lei n. 8.213/91, o que, aliás, já lhe foi garantido por decisão judicial transitada em julgado. Tal contagem diferenciada de tempo de serviço incorporou-se ao seu patrimônio jurídico desde então, à medida mesma em que ia exercendo seu trabalho sob condições especiais. Na verdade, segundo as regras então vigentes, ele tem direito não apenas ao cômputo do tempo de serviço equivalente a 07 anos, 07 meses e 16 dias, mas também ao tempo acrescido em virtude do exercício do trabalho sob condições adversas a sua saúde (03 anos e 18 dias), totalizando 10 anos, 08 meses e 04 dias.
É esse o tempo que ele leva para o futuro. Nenhuma norma, sob qualquer fundamento, pode subtrair de seu patrimônio jurídico o referido tempo de serviço, sob pena de afronta direta ao direito adquirido.
Outro fundamento que impede a qualquer norma de subtrair o tempo de serviço especial (em razão de exercido em condições nocivas a sua saúde) é o princípio da igualdade. Isso porque a situação do impetrante é idêntica à dos servidores públicos que exerceram atividade especial quando celetistas. Ambos estavam submetidos ao mesmo regime previdenciário. Ambos têm direito adquirido ao cômputo diferenciado do tempo de serviço, o qual já integrou o seu patrimônio jurídico. Conceder-lhes tratamento díspar fere o princípio da igualdade e o direito adquirido.
Poder-se-ia argumentar que a diferença entre as duas situações é a de que, na primeira, houve a transformação do emprego público em cargo público para os servidores públicos, enquanto que, na segunda hipótese - caso dos autos -, o segurado optou pelo ingresso no Regime Próprio de Previdência ao se tornar servidor público em face de concurso, submetendo-se assim às regras existentes nesse regime. Ocorre que essa "transformação" (do emprego em cargo público) não seria um discrímen razoável para diferenciar as duas hipóteses, justamente porque no Regime Próprio de Previdência Social não é possível a contagem diferenciada do tempo de serviço.
A incorporação do tempo especial ao patrimônio jurídico do segurado ocorre independentemente de a vinculação ao RGPS dar-se na condição de servidor público celetista ou na condição de segurado obrigatório do RGPS. Em ambos os casos o trabalhador exerceu suas atividades no Regime Geral da Previdência Social, e em ambos os casos tem direito adquirido à contagem diferenciada do tempo de serviço.
Como diferenciar a situação do impetrante daquela em que o segurado trabalhou em condições especiais em um emprego público, depois transformado em cargo público, como, por exemplo, os casos de professores de universidades federais ou médicos e enfermeiros vinculados a hospitais públicos, casos em que o STF, como já visto, assegura o direito à averbação do tempo convertido?
No caso do impetrante, à época em que trabalhou sob condições especiais, estava sujeito ao RGPS; no caso dos empregados públicos citados, o regime previdenciário era absolutamente o mesmo (RGPS). O impetrante, hoje, está vinculado ao Regime Próprio dos Servidores Públicos Federais (RPPS); os demais, também. Se a estes é assegurada a contagem diferenciada de tempo de serviço exercido sob condições especiais, ao primeiro (impetrante) não se pode deixar de considerar também. Não se pode dar tratamento diferenciado a situações essencialmente iguais.
Podem ser incluídas nessa análise, além das duas acima mencionadas, outras hipóteses: a terceira, em que um segurado também trabalhou na EMBRATEL (como o impetrante) em condições nocivas (como o impetrante), na mesma época em que o impetrante, e depois passa a exercer outras atividades no setor privado, não prejudiciais a sua saúde; e a quarta, em que o segurado, enfermeiro de hospital público que desempenhou, como empregado público, atividades sujeitas a condições especiais, na mesma época, sob o RGPS, e que depois também passa a desenvolver atividades na esfera privada, sem agentes agressivos a sua saúde. Também nesses casos o segurado teria, hoje, garantido o direito à conversão de seu tempo de serviço, então exercido sob condições especiais. Por que unicamente a hipótese do impetrante não estaria contemplada com a garantia desse direito?
Veja-se que não se está discutindo, aqui, direito adquirido a regime jurídico, o que se sabe inexistente. Gilmar Mendes, in Curso de Direito Constitucional (São Paulo: Editora Saraiva, 2009, pp. 511-515), analisando entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, referiu que se assentou, desde longa data, naquela Corte, que a proteção ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito não obstava à modificação ou à supressão de determinado instituto jurídico. Afirmou, ainda, que:
Em acórdão mais recente, proferido no RE 94.020, de 4-11-1981, deixou assente a excelsa Corte, pela voz do Ministro Moreira Alves:
"(...) em matéria de direito adquirido vigora o princípio - que este Tribunal tem assentado inúmeras vezes - de que não há direito adquirido a regime jurídico de um instituto de direito. Quer isso dizer que, se a lei nova modificar o regime jurídico de determinado instituto de direito (como é o direito de propriedade, seja ela de coisa móvel ou imóvel, ou de marca), essa modificação se aplica de imediato".
Esse entendimento foi reiterado pelo Supremo Tribunal Federal em tempos mais recentes.
Em decisão proferida no RE 226.855, o Supremo Tribunal Federal afirmou a natureza institucional do FGTS, como se lê na ementa do acórdão, igualmente da relatoria do Ministro Moreira Alves:
"Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. Natureza jurídica e direito adquirido. Correções monetárias decorrentes dos planos econômicos conhecidos pela denominação Bresser, Verão, Collor I (no concernentes aos meses de abril e de maio de 1990) e Collor II.
- O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), ao contrário do que sucede com as cadernetas de poupança, não tem natureza contratual, mas, sim, estatutária, por decorrer da Lei e por ela ser disciplinado.
- Assim, é de aplicar-se a ele a firme jurisprudência desta Corte no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico.
(...)
- No tocante, porém, aos Planos Bresser, Collor I (quanto ao mês de maio de 1990) e Collor II, em que a decisão recorrida se fundou na existência de direito adquirido aos índices de correção que mandou observar, é de aplicar-se o princípio de que não há direito adquirido a regime jurídico. Recurso extraordinário conhecido em parte, e nela provido, (...)
(...)
Vê-se, assim que o princípio constitucional do direito adquirido não se mostra apto a proteger as posições jurídicas contra eventuais mudanças dos institutos jurídicos ou dos próprios estatutos jurídicos previamente fixados.
Questão relevante foi trazida à apreciação da Corte na ADI 3.105, na qual se discutiu a incidência da Emenda Constitucional n. 41/2003, art. 4º, caput, que instituiu contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e pensões dos servidores públicos da união, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações. A requerente - Associação nacional dos Membros do Ministério público/CONAMP - alegava que a tributação dos inativos violava o art. 5º, XXXVI, da Constituição, uma vez que "os servidores públicos aposentados e os que reuniam condições de se aposentar até 19 de dezembro de 2003, têm assegurado o direito subjetivo, já incorporado aos seus patrimônios jurídicos, de não pagarem contribuição previdenciária, forçosa a conclusão de que o art. 4º da Emenda Constitucional n. 41, de 2003, não poderia, como fez, impor a eles a obrigação de pagar dito tributo, de modo a prejudicar aquele direito adquirido e impor a eles aos seus titulares situação jurídica mais gravosa".
O Tribunal, contudo, entendeu constitucional a incidência da contribuição social em acórdão assim ementado:
"1. Inconstitucionalidade. Seguridade Social. Servidor Público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Ofensa a direito adquirido no ato de aposentadoria. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Emenda Constitucional n. 41/2003 (art. 4º, caput). Regra não retroativa. Incidência sobre fatos geradores ocorridos depois do início de sua vigência. Precedentes da Corte. Inteligência dos arts. 5º, XXXVI, 146, III, 149, 150, I e III, 194, 195, caput, II, e § 6º, da CF, e art. 4º, caput, da EC n. 41/2003. No ordenamento jurídico vigente, não há norma, expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito subjetivo como poder de subtrair ad eternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que, anterior ou ulterior, os submeta à incidência de contribuição previdenciária. Noutras palavras, não há, em nosso ordenamento, nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a respeito, direito adquirido com o aposentamento.
2. Inconstitucionalidade. Ação direta. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária, por força de Emenda Constitucional. Ofensa a outros direitos e garantias individuais. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Regra não retroativa. Instrumento de atuação do Estado na área da previdência social. Obediência aos princípios da solidariedade e do equilíbrio financeiro e atuarial, bem como aos objetivos constitucionais de universalidade, equidade na forma de participação no custeio e diversidade da base de financiamento. Ação julgada improcedente em relação ao art. 4º, caput, da EC n. 41/2003. Votos vencidos. Aplicação dos arts. 149, caput, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, e 201, caput, da CF. Não é inconstitucional o art. 4º, caput, da Emenda Constitucional n. 41, de 19 de dezembro de 2003, que instituiu contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e as pensões dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações.
(...)"
Também aqui considerou-se a não-configuração de direito adquirido a um dado estatuto jurídico. A não-incidência inicial da contribuição sobre os proventos dos inativos não assegurava aos aposentados imunidade em relação à tributação, e o fato de não se ter estabelecido a tributação até então não legitima, do ponto de vista do direito adquirido, a preservação indefinida desse status.
Assinale-se que o tema pode ser objeto, porém, de discussão sob uma perspectiva estrita de segurança jurídica.
É a não existência de um direito adquirido a um estatuto jurídico que explica que a lei nova, que altere o regime das relações pessoais dos cônjuges ou a administração dos bens do casal, se aplique de imediato às situações constituídas anteriormente.
É também o perfil institucional que vai determinar a aplicação da lei nova no caso de alteração das regras sobre impedimentos matrimoniais, se ainda não se verificou o casamento, ou de alteração das causas de indignidade sucessória, dos fundamentos da deserdação, das regras sobre vocação sucessória, antes da abertura da sucessão.
É verdade, todavia, que a validade formal de um testamento, dos pactos sucessórios e da capacidade para sua elaboração será aferida em face da lei do tempo de sua celebração. Da mesma forma, a validade formal dos contratos, em geral, há de ser aferida com base na lei vigente ao tempo em que foram elaborados.
No que concerne ao direito dos servidores públicos, é pacífica a orientação doutrinária e jurisprudencial no sentido de que não se pode invocar direito adquirido para reivindicar a continuidade de um modelo jurídico referente ao sistema de remuneração, férias, licenças ou enquadramento ou outro qualquer benefício, exatamente por não se poder invocar direito adquirido a um dado estatuto jurídico. (Os grifos são do original)
Os seguintes julgados do STF refletem o entendimento acima (quanto à inexistência de direito adquirido a regime jurídico): AgR no MS 28433, Segunda Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 14-08-2014); AgR no AI 803861, Primeira Turma, Rel. Ministra Rosa Weber, DJe de 25-11-2013; AgR no ARE 744672, Primeira Turma, Rel. Ministro Dias Toffoli, DJe de 28-10-2013; AgR no AI 632930, Primeira Turma, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe de 19-02-2013; AgR no AI 654807, Segunda Turma, Rel. Ministra Ellen Gracie, DJe de 06-08-2009; e ADI 3104, Tribunal Pleno, Rel. Ministra Cármen Lúcia, DJe de 08-11-2007. Confira-se:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DEFERIDO ANTES DA LEI 9.876/99. IMPOSSIBILIDADE DE RETROAÇÃO. CONJUGAÇÃO DE VANTAGENS DO NOVO SISTEMA COM O ANTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I - Em matéria previdenciária, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a lei de regência é a vigente no tempo de concessão do benefício (tempus regit actum). II - Inexiste direito adquirido a determinado regime jurídico, razão pela qual não é lícito ao segurado conjugar as vantagens do novo sistema com aquelas aplicáveis ao anterior. III - Agravo regimental improvido.
(AgR no AI 816921, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 03-03-2011)
Feitas tais considerações, verifica-se que a discussão posta nos presentes autos não se refere a direito adquirido a um determinado regime jurídico, mas sim direito adquirido ao cômputo do tempo especial prestado quando o impetrante estava vinculado a regime que o admitia. E, se o fundamento para o STF deferir a averbação, no RPPS, do tempo especial dos servidores públicos ex-celetistas, é o de que esse direito se incorporou ao patrimônio jurídico do segurado antes da vigência da Lei 8.112/90, não pode haver distinção entre o segurado que já era "empregado público" e aquele que não era, pois, em ambos os casos, quando da prestação da atividade, eram segurados do RGPS. Entender-se que o primeiro possui direito à contagem diferenciada do tempo de serviço e o segundo não, consubstancia afronta direta ao princípio da igualdade e ao direito adquirido constitucionalmente assegurados.
Finalmente, o § 10 do art. 40 da Constituição Federal de 1988 não pode ser empecilho para a averbação do acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum. Se assim fosse, a mesma disposição constitucional teria obrigatoriamente de funcionar como óbice também para a averbação do tempo ficto do servidor público ex-celetista, haja vista que este, também, terá averbado acréscimo decorrente de conversão de tempo especial em comum para futura concessão de benefício pelo RPPS.
Em conclusão, o art. 4º, inc. I, da Lei 6.226/75, e o art. 96, inc. I, da Lei n. 8.213/91, não podem constituir óbice à contagem ponderada do tempo especial prestado sob a égide de legislação em que esta era prevista, sob pena de tratar de forma diferente situações jurídicas idênticas, incorrendo assim em violação aos princípios constitucionais da igualdade e do direito adquirido.
Importante salientar que este Tribunal, por suas duas Turmas que apreciam matéria afeta ao servidor público (Terceira e Quarta Turmas), vem julgando no sentido de admitir o cômputo do tempo de serviço especial prestado no RGPS para a concessão de aposentadoria no RPPS, não obstante o segurado, à época, não fosse servidor público: AC n. 0000930-85.2009.404.7200, Quarta Turma, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DE de 16-12-2013; MS n. 0025636-67.2010.404.0000, Quarta Turma, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DE de 13-03-2012; AC n. 2004.71.07.006545-5/RS, Terceira Turma, Rel. Des. Federal Marga Inge Barth Tessler, DE de 14-04-2011; AC n. 5003853-35.2010.404.7112, Terceira Turma, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, julgado em 21-08-2013; AC n. 0007694-08.2009.404.7000, Terceira Turma, Rel. Des. Federal. Fernando Quadros da Silva, DE de 05-04-2011; AC n. 2003.71.00.053964-2, Terceira Turma, Rel. Des. Federal. Fernando Quadros da Silva, DE de 01-06-2011; AC n. 5005811-09.2012.404.7105, Terceira Turma, Rel. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, julgado em 26-03-2014; e Agravo em AC n. 0020008-11.2008.404.7100, Terceira Turma, Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DE de 17-08-2010.
Considerando, no entanto, a posição consolidada do STJ em sentido contrário, como acima visto, outra solução não há senão arguir a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 96, inc. I, da LBPS, e do art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75."
O parecer do Ministério Público Federal, da lavra da douta Procuradora Regional da República Andrea Falcão de Moraes, também foi nesse mesmo sentido:
Efetivamente, se o servidor público exerceu, no passado, atividade laborativa penosa ou insalubre, por isso mesmo sujeita a contagem favorecida sob o Regime Geral de Previdência Social, é mister que lhe seja assegurado transpor tal tempo de serviço especial, convertido em comum, para o Regime Próprio de Previdência Social, no qual veio a ingressar em momento posterior, sob pena de se tornar letra morta, em casos tais, a especial proteção que a ordem jurídica pretendeu conferir ao trabalhador que laborou sujeito a agentes nocivos.
Como bem destacou o insigne Des. Federal Aurvalle nos debates orais ocorridos em sessão, além de "o ex-trabalhador e atual servidor incorporar ao seu patrimônio jurídico esse direito adquirido, eu acho que ele incorpora também ao seu patrimônio físico, porque não será o fato de ser aprovado em um concurso que o agravo que foi feito em sua saúde durante a prestação de serviço particular irá ser restaurada" (fl. 84 e v.).
Com efeito, assim como o ingresso do trabalhador em um novo regime jurídico não retira a nocividade das atividades laborais exercidas sob o regime anterior, do mesmo modo, a mudança de sistema previdenciário não pode fulminar o direito do trabalhador à contagem diferenciada do serviço prestado sob condições prejudiciais, direito esse que se incorporou em definitivo ao seu patrimônio jurídico, pro labore facto, nas palavras do voto do douto Des. Federal Lugon, em conformidade com a legislação que estava vinculado quando da prestação do trabalho.
Em suma, o tempo de serviço que o segurado carrega consigo para o novo regime previdenciário é o tempo de serviço nos termos em que foi reconhecido pela legislação sob a qual o trabalho foi prestado. Se essa legislação contemplou a conversão do tempo especial em comum, a contagem assim feita é direito adquirido do trabalhador, que se mantém sob o novo regime previdenciário.
Em relação ao art. 4º, inc. I, da Lei 6226/75, no entanto, dado que consubstancia norma pré-constitucional incompatível com a Constituição superveniente, impõe-se um juízo negativo de recepção, na linha da jurisprudência consolidada do egrégio STF (Ag.Reg. na ADI 4.222/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, DJe de 02-09-2014; Ag.Reg. no RE 766.616/RS, Rel. Min. Rosa Weber, 1ª Turma, DJe de 12-12-2014; Ag.Reg. no RE 353.508-1/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, D.J. de 29-06-2007; HC 113.857/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, Plenário, DJe de 30-10-2014; Ag.Reg. no RE 278.710/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe de 28-05-2010; Ag.Reg. na Reclamação 17.206/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe de 15-08-2014).
Ante o exposto, com base nos fundamentos acima delineados, voto por declarar a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do inciso I do artigo 96 da Lei n. 8.213/91, no tocante à sua aplicação às hipóteses de contagem diferenciada (ponderada), no Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Públicos Federais, do acréscimo decorrente da conversão, em comum, de tempo de serviço em atividades exercidas sob condições especiais, em período em que vinculado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), por afronta aos princípios da igualdade e do direito adquirido, insculpidos no art. 5º, caput, e inc. XXXVI, da Constituição Federal de 1988, bem como, nas mesmas hipóteses acima mencionadas, a não recepção, pela Constituição atual, do art. 4º, inc. I, da Lei 6226/75.
Segue a ementa do acórdão referente à arguição de inconstitucionalidade 0006040-92.2013.404.0000, na qual, a propósito, também trata, ainda que de maneira reflexa, da questão relacionada à conversão de tempo de serviço público anterior à passagem para o regime estatutário, a qual é igualmente objeto de discussão neste processo, como já esclarecido:
ADMINISTRATIVO. TEMPO ESPECIAL PRESTADO NA INICIATIVA PRIVADA, ANTES DO INGRESSO DO SERVIDOR NO SERVIÇO PÚBLICO. AVERBAÇÃO NO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS. VEDAÇÃO EXISTENTE NO INC. I DO ART. 96 DA LEI N. 8.213/91, E NO INC. I DO ART. 4º DA LEI N. 6.226/75, CONFORME INTERPRETAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INCONSTITUCIONALIDADE POR AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DO DIREITO ADQUIRIDO.
1. A Lei n. 8.213/91 assegura aos beneficiários do RGPS duas possibilidades: (a) aposentadoria especial (art. 57, caput); e (b) aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição, com o cômputo de tempo fictício, decorrente da conversão do tempo especial em comum (§ 5º do art. 57).
2. Aos servidores públicos, é possível vislumbrar a existência de quatro possibilidades distintas: (a) aposentadoria especial; (b) conversão de tempo especial em comum exercido pelo servidor público no serviço público; (c) conversão de tempo especial em comum prestado no RGPS quando o servidor público, embora já ostentasse essa condição, era celetista; e (d) conversão de tempo especial em comum prestado no RGPS, antes do ingresso do servidor no serviço público.
3. Embora ausente lei específica, o Supremo Tribunal Federal vem assegurando a possibilidade de concessão de aposentadoria especial aos servidores públicos, cabendo ao órgão a que se encontram vinculados analisar o implemento dos requisitos legais, considerando, para tanto, o disposto no art. 57 da LBPS. Sobre o tema, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente decisão, datada de 09-04-2014, aprovou a Proposta de Súmula Vinculante n. 45, com o seguinte teor: "Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do Regime Geral de Previdência Social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição Federal, até edição de lei complementar específica.".
4. Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal tem entendido como inviável o cômputo de tempo ficto prestado no serviço público, seja porque há vedação expressa no § 10 do art. 40 da Constituição Federal, seja porque o art. 40, § 4º, da Carta Magna, prevê apenas a possibilidade de concessão de aposentadoria especial.
5. No entanto, o STF vem reconhecendo o direito de o servidor público ex-celetista averbar, no RPPS, o acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum prestado no RGPS, se o segurado, à época, já era servidor público.
6. Quanto à conversão de tempo especial em comum prestado no RGPS, antes do ingresso do servidor no serviço público, o Supremo Tribunal Federal, aparentemente, ainda não se manifestou. A questão, contudo, vem sendo apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, que firmou posição no sentido de ser inviável a contagem recíproca, no Regime Próprio dos Servidores Públicos Federais, de tempo de serviço ficto prestado no âmbito do RGPS, a teor do disposto no art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75, e no art. 96, I, da Lei n. 8.213/91.
7. Quanto ao segurado vinculado ao RGPS, tanto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto a do Superior Tribunal de Justiça são pacíficas, desde longa data, no sentido de que o reconhecimento da especialidade da atividade exercida é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, de modo que, prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida.
8. Dentro dessa perspectiva, o mesmo fundamento utilizado pelo Supremo Tribunal Federal para autorizar o cômputo do acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum, qual seja, o direito adquirido (prestado o serviço sob condições nocivas quando vinculado ao Regime Geral de Previdência Social, o direito ao cômputo diferenciado do tempo de serviço incorpora-se ao patrimônio jurídico do segurado), é válido para o caso de conversão de tempo especial em comum prestado no RGPS, antes do ingresso do servidor no serviço público.
9. A incorporação do tempo especial ao patrimônio jurídico do segurado ocorre independentemente de a vinculação ao RGPS dar-se na condição de servidor público celetista ou na condição de segurado obrigatório do RGPS. Em ambos os casos o trabalhador exerceu suas atividades no Regime Geral da Previdência Social, e em ambos os casos tem direito adquirido à contagem diferenciada do tempo de serviço.
10. Se o fundamento para o STF deferir a averbação, no RPPS, do tempo especial dos servidores públicos ex-celetistas, é o de que esse direito se incorporou ao patrimônio jurídico do segurado antes da vigência da Lei 8.112/90, não pode haver distinção entre o segurado que já era "empregado público" e aquele que não era, pois, em ambos os casos, quando da prestação da atividade, eram segurados do RGPS. Entender-se que o primeiro possui direito à contagem diferenciada do tempo de serviço e o segundo não, consubstancia afronta direta ao princípio da igualdade e ao direito adquirido constitucionalmente assegurados.
11. Nessa linha de raciocínio, tanto o art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75, quanto o inc. I do art. 96 da Lei n. 8.213/91, se interpretados no sentido de que constituem óbice à contagem ponderada do tempo especial prestado sob a égide de legislação em que esta era prevista, acabam por ferir a garantia constitucional do direito adquirido e o princípio da isonomia.
12. O § 10 do art. 40 da Constituição Federal de 1988 não pode ser empecilho para a averbação do acréscimo decorrente da conversão do tempo especial em comum. Se assim fosse, a mesma disposição constitucional teria obrigatoriamente de funcionar como óbice também para a averbação do tempo ficto do servidor público ex-celetista, haja vista que este, também, terá averbado acréscimo decorrente de conversão de tempo especial em comum para futura concessão de benefício pelo RPPS.
13. Em conclusão, o art. 4º, inc. I, da Lei 6.226/75 e o art. 96, inc. I, da Lei n. 8.213/91 não podem constituir óbice à contagem ponderada do tempo especial prestado sob a égide de legislação em que esta era prevista, sob pena de tratar de forma diferente situações jurídicas idênticas, incorrendo assim em violação aos princípios constitucionais da igualdade e do direito adquirido.
14. Em relação ao art. 4º, inc. I, da Lei 6226/75, dado que consubstancia norma pré-constitucional incompatível com a Constituição superveniente, impõe-se um juízo negativo de recepção, na linha da jurisprudência consolidada do egrégio STF.
15. Declarada a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do art. 96, inc. I, da LBPS, e do art. 4º, inc. I, da Lei n. 6.226/75. (TRF4, ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 0006040-92.2013.404.0000, CORTE ESPECIAL, Des. Federal CELSO KIPPER, POR MAIORIA, D.E. 15/06/2015, PUBLICAÇÃO EM 16/06/2015) (grifei)
Assentada a possibilidade de aproveitamento tanto dos períodos anteriores ao ingresso no serviço público, como daqueles celetistas já prestados à Administração Pública, necessárias a análise do direito ao aproveitamento privilegiado.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial, é de ressaltar-se que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AGREsp nº 493.458/RS, Relator Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJU de 23/06/2003, p. 429, e REsp nº 491.338/RS, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 23/06/2003, p. 457), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto nº 4.827/2003, que alterou a redação do art. 70, §1º, do Decreto nº 3.048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/95, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desse agente;
b) a partir de 29/04/95, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05-03-97, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) a partir de 06/03/97, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial , a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Para fins de enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nºs 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte) e 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/95, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nºs 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte) e 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/97 e o Decreto nº 2.172/97 (Anexo IV) a partir de 06/03/97. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP nº 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/06/2003, p. 320).
A atividade de médico foi prevista como especial até 28.04.1995, por se enquadrar nos Códigos 2.1.3 do Anexo ao Decreto 53.831/64 e 2.1.3 do Anexo II ao Decreto 83.080/79. A partir dessa data, para que o trabalho do médico possa ser considerado tempo especial, deverá haver comprovação da exposição, habitual e permanente, aos agentes considerados nocivos pela legislação previdenciária. Já a partir de 05/03/1997 para a caracterização da atividade especial nessa atividade é necessário o trabalho em estabelecimento de saúde em contato permanente com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados. (Decreto nº 2.172/97, código 3.0.1, a).
No presente caso, a sentença rechaçou a pretensão no que toca ao período de 16/11/1977 a 01/01/1984.
Quanto ao período de 02/01/1984 a 31/01/1984, a sentença acolheu o pedido, observando que o período de 01/02/1984 a 11/12/1990 já foi convertido.
Afastada, como já foi, para os fins colimados neste feito, a falta de interesse de agir quanto ao período de 01/02/1984 a 11/12/1990, deve ser reconhecido, pois, como devidamente comprovado o enquadramento por categoria profissional, em todo o período de 16/11/1977 a 11/12/1990.
Acrescido o tempo insalubre e desconsideradas as licenças-prêmio em dobro, o demandante preencheria os requisitos para perceber abono de permanência ainda em data anterior, de modo que as diferenças devem ser pagas .
Assim, como devem ser pagos os valores referentes às licenças-prêmio não gozadas a desnecessariamente utilizadas pelo servidor.
Não procede a alegação da União de que inviável juridicamente a pretensão de desaverbação dos períodos de licença-prêmio (pois caracterizado ato jurídico perfeito e acabado).
A desaverbação pode ser considerada irretratável quando tenha sido indispensável para concessão do benefício.
Demonstrado que o servidor já tinha direito à aposentadoria sem o cômputo em dobro de períodos de licença-prêmio não gozadas, a desaverbação é perfeitamente possível, até em respeito ao direito adquirido. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. LICENÇA-PRÊMIO CONTADA EM DOBRO PARA FINS DE CONCESSÃO DE ABONO DE PERMANÊNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ÓRGÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. DESAVERBAÇÃO. POSSIBILIDADE EM SITUAÇÕES ESPECIAIS. PARCELAS VENCIDAS. INTERESSE DE AGIR. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se firmou no sentido de que as universidades têm legitimidade para figurar no polo passivo das demandas propostas por seus servidores por serem autarquias federais dotadas de personalidade jurídica própria e patrimônio próprio, distintos da União.
2. Conforme a Emenda Constitucional nº 41/2003, o servidor que opte por permanecer em atividade tendo completado as exigências para aposentadoria voluntária fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória ou optar pela aposentadoria.
3. A opção pela contagem em dobro de período de licença-prêmio para efeito de percepção de abono permanência é irretratável, desde que indispensável para concessão do benefício.
4. No caso concreto, a averbação da licença-prêmio do autor não foi necessária para implementação do tempo de serviço para fins de concessão do abono de permanência, sendo devida sua desaverbação.
5. (...). (TRF4, APELREEX 5024830-79.2013.404.7100, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Sérgio Renato Tejada Garcia, juntado aos autos em 08/05/2014)
Note-se que inquestionável o direito ao pagamento em pecúnia de períodos de licença-prêmio não gozadas.
Com efeito, em sua redação original o art. 87 da Lei 8.112/90 assim estatuia:
Art. 87. Após cada qüinqüênio ininterrupto de exercício, o servidor fará jus a 3 (três) meses de licença, a título de prêmio por assiduidade, com a remuneração do cargo efetivo.
§ 1º. (VETADO)
§ 2º. Os períodos de licença - prêmio já adquiridos e não-gozados pelo servidor que vier a falecer serão convertidos em pecúnia, em favor de seus beneficiários da pensão. (Redação originária)
Com o advento da Lei nº 8.162, de 8/1/1991 a disciplina passou a ser a seguinte:
Art. 5º. Para efeito de aposentadoria, será contado em dobro o tempo de licença - prêmio a que se refere o art. 87 da Lei nº 8.112/90, que o servidor não houver gozado.
Posteriormente, por força da Medida Provisória de nº 1.522/96 (convertida na Lei nº 9.527, de 10/12/1997), foi alterado o art. 87 da Lei nº 8.112, de 11/12/1990, com a substituição da licença-prêmio por assiduidade pela licença para capacitação:
Art. 87. Após cada qüinqüênio de efetivo exercício poderá, no interesse da Administração, afastar-se do exercício do cargo efetivo, com a respectiva remuneração, por até três meses, para participar de curso de capacitação profissional.
Parágrafo único. Os períodos de licença de que trata o caput não são acumuláveis.
A Lei 9.527/97 em seu artigo 7º garantiu o direito à fruição ou o cômputo em dobro para efeitos de aposentadoria, bem como a conversão em pecúnia, em determinadas circunstâncias:
Art. 7º. Os períodos de licença - prêmio, adquiridos na forma da Lei nº 8.112/90 até 15 de outubro de 1996, poderão ser usufruídos ou contados em dobro para efeito de aposentadoria ou convertidos em pecúnia no caso de falecimento do servidor, observada a legislação em vigor até 15 de outubro de 1996.
Parágrafo único. Fica resguardado o direito ao cômputo do tempo de serviço residual para efeitos de concessão da licença capacitação.
E é nessa linha que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que é possível, no momento da aposentação do agente público, a conversão em pecúnia de licença-prêmio não gozada, tendo em vista o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa por parte da Administração (v. AgRg no AREsp 270.708/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2013, DJe 16/09/2013; AgRg no Ag 1404779/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/04/2012, DJe 25/04/2012).
Admitida a desaverbação, o pagamento das licenças não gozadas é medida que se impõe.
Quanto à questão relativa à alegação de NÃO INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA, igualmente merece provimento o apelo da parte autora.
Trata-se de questão acessória em relação à discussão principal. E tendo sido a ação dirigida contra a União, que é a pessoa jurídica legitimada para discussão acerca de tributos federais, nada obsta que neste processo se delibere sobre a incidência do imposto de renda e da contribuição previdenciária. A distribuição de matérias entre as Varas, assim como se dá com as Turmas do Tribunal, diz respeito a distribuição de trabalho determinada por ato administrativo. Não se cogita, assim, de incompetência absoluta, a vedar que Vara ou Turma com competência administrativa delibere sobre matéria tributária reflexa, na linha, a propósito, do que estabelece o artigo 10 do Regimento Interno desta Corte:
Art. 10. A competência das Seções e das respectivas Turmas é fixada em função da natureza da relação jurídica litigiosa.
§ 1º À Primeira Seção cabe processar e julgar os feitos de natureza trabalhista e tributária, nesta compreendidos os que disserem respeito a obrigações tributárias acessórias (CTN, art. 113, § 2º) e contribuições sociais, inclusive ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e ao Programa de Integração Social, bem como as matérias compreendidas no Regulamento Aduaneiro.
§ 2º À Segunda Seção cabe processar e julgar os feitos de natureza administrativa, civil e comercial, bem como os demais feitos não incluídos na competência das Primeira, Terceira e Quarta Seções.
§ 3º À Terceira Seção cabe processar e julgar os feitos relativos à previdência e assistência social, mesmo quando versem sobre benefício submetido a regime ou condições especiais ou, ainda, complementado.
§ 4º À Quarta Seção cabe processar e julgar os feitos de natureza penal.
§ 5º Para fins de definição de competência, deverá ser levado em consideração, prioritariamente, o pedido. Havendo cumulação de pedidos, prevalecerá o principal. (grifei)
A questão, pois, pode ser apreciada neste feito.
E o acolhimento do pedido se impõe, pois inquestionável a natureza indenizatória da verba.
Em se tratando de verba indenizatória, não incide imposto de renda.
Em apoio ao entendimento exposto:
SÚMULA N. 136 do Superior Tribunal de Justiça
"O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade do serviço não está sujeito ao imposto de renda".
DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA FEDERAL APOSENTADA. LICENÇA-PRÊMIO NÃO USUFRUÍDA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. DESAVERBAÇÃO. NÃO-INCIDÊNCIA DE IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. SÚMULA 136 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
- Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a servidora pública federal aposentada tem direito à conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada e não contada em dobro, sob pena de enriquecimento sem causa da administração.
- No caso concreto, a averbação das licenças-prêmio não foi necessária para a implementação do tempo necessário para a aposentadoria integral, sendo de rigor a sua desaverbação.
- O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade do serviço não está sujeito ao imposto de renda (súmula 136 do Superior Tribunal de Justiça). - As licenças-prêmio que não foram usufruídas e que são convertidas em pecúnia (indenizadas) não representam acréscimo patrimonial, apenas o recompõem pela impossibilidade de exercício de um direito. Não havendo acréscimo patrimonial e tendo em vista que esses valores não têm natureza salarial, não há incidência tanto do imposto de renda quanto da contribuição previdenciária.
(TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5003321-58.2014.404.7100, 3ª TURMA, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/06/2016)
Não se cogita igualmente de incidência de contribuição previdenciária.
Nesse sentido seguem julgados do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ABONO ASSIDUIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ.
"É firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que não incide Contribuição Previdenciária sobre abono-assiduidade e licença-prêmio não gozada convertida em pecúnia." (AgRg no AREsp 464.314/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 6/5/2014, DJe 18/6/2014.) Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1560219/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 10/02/2016)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INEXISTÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ABONO-ASSIDUIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO.
1. Não se configura a ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal a quo julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.
2. É firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que não incide Contribuição Previdenciária sobre abono-assiduidade e licença-prêmio não gozada convertida em pecúnia.
3. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no AREsp 464.314/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2014, DJe 18/06/2014)
Reformada a sentença, pois, para afastar a preliminar de falta de interesse de agir quanto ao período de 02/1984 a 12/1990, para afastar a prescrição, e para reconhecer a possibilidade de apreciação do pedido de não incidência de imposto de renda, com o acolhimento do pedido. E admitdos, nos termos da fundamentação, os reflexos no que toca ao abono de permanência e à indenização de licença prêmio por conta do reconhecimento da especilidade do período de 11/1977 a 12/1990, com direito a conversão pelo fator 1,4 (40%), tudo a ser apurado em liquidação de sentença, consoante já havia sido determinado na sentença.
Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento à apelação do autor e de negar provimento às apelações da União, do INSS e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5050142-23.2014.4.04.7100/RS
ORIGEM: RS 50501422320144047100
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
PROCURADOR | : | Dr Cláudio Dutra Fontella |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | do Adv. Glênio Ohlweiler Ferreira pelo apelante Antonio Carlos de Oliveira Castro. |
APELANTE | : | ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA CASTRO |
ADVOGADO | : | Tiago Gornicki Schneider |
APELANTE | : | UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO |
: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS | |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/11/2016, na seqüência 455, disponibilizada no DE de 04/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O RELATÓRIO E SUSTENTAÇÃO ORAL DO ADV. GLÊNIO OHLWEILER FERREIRA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO, POR INDICAÇÃO DO RELATOR.
AUSENTE(S) | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
| Documento eletrônico assinado por José Oli Ferraz Oliveira, Secretário de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8727117v1 e, se solicitado, do código CRC 628A7390. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5050142-23.2014.4.04.7100/RS
ORIGEM: RS 50501422320144047100
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
PROCURADOR | : | Dra. Márcia Neves Pinto |
APELANTE | : | ANTONIO CARLOS DE OLIVEIRA CASTRO |
ADVOGADO | : | Tiago Gornicki Schneider |
APELANTE | : | UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO |
: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS | |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR E DE NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DA UNIÃO, DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
José Oli Ferraz Oliveira
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