
Apelação Cível Nº 5012171-87.2022.4.04.7208/SC
RELATOR: Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO contra sentença proferida nos autos do Procedimento Comum nº 50121718720224047208, a qual julgou procedente o pedido do autor de condenar a União ao ressarcimento dos valores recolhidos a maior a título de taxa de ocupação, nos seguintes termos:
3. Dispositivo
Diante do exposto, julgo procedente o pedido, extinguindo a ação com resolução de mérito (art. 487, inciso I, do CPC), para o fim de condenar a União a restituir à parte autora os valores recolhidos a maior, considerando a anulação do aumento da taxa de ocupação referente ao RIP 8161000072410, nos termos da sentença proferida nos autos nº 2008.72.08.002738-0/SC da 2ª vara federal de Itajaí/SC, que definiu o"recálculo das taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício de 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E", e conforme cálculo apresentado pela parte autora no
, na forma da fundamentação supra, a ser apurado em liquidação de sentença, corrigidos monetariamente pela SELIC, nos termos da fundamentação.Em suas razões, a parte apelante argumenta, em síntese, que deve ser reconhecida a coisa julgada, por se tratar de pedido já analisado em processo anterior. Subsidiariamente, seja acolhida a prescrição quinquenal e, por fim, caso mantida a condenação, sejam acolhidos os cálculos apresentados pela União (
).A parte apelada apresentou contrarrazões (
), tendo sido os autos, na sequência, remetidos a este Tribunal.É o relatório.
VOTO
Cinge-se a controvérsia à caracterização de coisa julgada, à configuração da prescrição do crédito e aos parâmetros utilizados para o cálculo dos valores a serem restituídos pela União.
A sentença ora recorrida foi redigida nas seguintes linhas (
):1. Relatório
Trata-se de ação de ação proposta por J. M. contra a União (AGU) por meio da qual requer a restituição do valor de R$ 193.157,61, corrigido pela SELIC a partir de seu desembolso, com incidência de juros de mora a partir da citação.
Afirmou que obteve sentença favorável em ação transitada em julgado em 09/02/2018, por meio da qual, após recursos, "fora declarada a nulidade do processo de demarcação das áreas de terreno de marinha e nulidade do aumento da taxa de ocupação dos exercícios de 2007 e seguintes". Diante disto, requer a devolução do valor pago indevidamente, em vista da anulação do aumento da taxa de ocupação referente ao RIP 8161000072410.
Citada, a União contestou no
. Suscitou a preliminar de coisa julgada, ao argumento de que o pedido de repetição de indébito da ação 2008.72.08.002738-0/SC da 2ª vara federal de Itajaí/SC com partes e fatos iguais foi julgado improcedente, e que caberia à parte autora ter feito pedido expresso de repetição do excesso ao tempo do ajuizamento da ação 2008.72.08.002738-0/SC da 2ª vara federal de Itajaí/SC. Requereu o reconhecimento da prejudicial de prescrição, pois se passaram mais de 5 anos entre a data em que o ato ou fato se originou e o ajuizamento da presente ação. Contestou os valores requeridos pelo autor.Apresentada réplica pela parte autora no
.Decido.
2. Fundamentação
Pretende a parte autora a restituição de valores supostamente recolhidos a maior a título de taxa de ocupação do RIP 8161000072410, ao argumento de que possui julgamento favorável, transitado em julgado, que declarou a nulidade do processo de demarcação das áreas de terreno de marinha e a nulidade do aumento da taxa de ocupação dos exercícios de 2007 e seguintes.
2.1. Preliminar - Coisa julgada
Defende a parte ré que o pedido de repetição de indébito da ação 2008.72.08.002738-0/SC da 2ª Vara Federal de Itajaí/SC com partes e fatos iguais foi julgado improcedente, e que caberia à parte autora ter feito pedido expresso de repetição do excesso ao tempo do ajuizamento daquela ação.
Não verifico a ocorrência de coisa julgada.
Em síntese, o pedido inicial da ação 2008.72.08.002738-0/SC, da 2ª Vara Federal de Itajaí/SC, foi, em resumo (
):A sentença foi proferida com o seguinte dispositivo (
):A parte autora opôs embargos de declaração que foram parcialmente acolhidos, no seguinte sentido (
):"Ante o exposto, acolho os embargos de declaração. Os itens 2 e 3 da parte dispositiva da sentença de fls. 178/183 passam a ter a seguinte redação, ficando, no mais, mantida:
2) declarar a nulidade do aumento da Taxa de Ocupação dos exercícios 2007, 2008 e seguintes;
3) condenar a União a recalcular as taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E;"
A União interpôs recurso de apelação que foi parcialmente provido, no seguinte sentido (
):"Dispositivo.
O apelo deve ser parcialmente provido, para reconhecer a regularidade do procedimento de demarcação e ressalvar a possibilidade da União renovar o ato de revisão do valor da taxa de ocupação, mediante prévio processo administrativo, com a notificação pessoal do ocupante, mantido os demais termos da sentença.
Ante a sucumbência recíproca, ficam compensados os honorários advocatícios, nos termos do art. 21 do CPC.
Diante do exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação."
Ambas as partes recorreram.
Inicialmente, o recurso especial da União foi provido, mas, em sequência, foi tornado sem efeito pelo Presidente da Corte, em razão da prevenção do Ag n. 1390726 (
).O Ag 1390726 foi ao final provido, em parte, para declarar nulo o processo de demarcação (disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp?b=ACOR&livre=Ag+1390726&O=JT:
"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SIMPLES REITERAÇÃO DAS ALEGAÇÕES VEICULADAS NO RECURSO ANTERIOR. TERRENOS DE MARINHA. CITAÇÃO PESSOAL DOS INTERESSADOS. NECESSIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 83/STJ.
I - É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual, identificados os interessados no procedimento de demarcação dos terrenos de marinha, deve a Administração Pública intimá-los pessoalmente a fim de oportunizar-lhes o contraditório e a ampla defesa.
II - O recurso especial, interposto pela alínea a e/ou pela alínea c, do inciso III, do art. 105, da Constituição da República, não merece prosperar quando o acórdão recorrido encontra-se em sintonia com a jurisprudência dessa Corte, a teor da Súmula n. 83/STJ.
III - A Agravante não apresenta, no regimental, argumentos suficientes para desconstituir a decisão agravada.
IV - Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp n. 353.140/RS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 18/6/2015, DJe de 30/6/2015.)"
O processo transitou em julgado em 09/02/2018 (
).A União concluiu que "Pelo que depreende, o autor obteve decisão favorável quanto ao pedido de nulidade do processo demarcatório e quanto ao recálculo das taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício de 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E, ressalvada a possibilidade da União renovar o ato de revisão do valor da taxa de ocupação, mediante prévio processo administrativo, com a notificação pessoal do ocupante" (
).Por meio da presente ação, o autor pretende a repetição de indébito em relação ao excesso de pagamento entre 2007 a 2022. Afirma que calculou todas as taxas de ocupação entre 2007 a 2022 pela base de cálculo de 2006, corrigida pelo IPCA-E e, em seguida, descontou dos valores supostamente pagos à SPU/SC, alegando possuir crédito de R$193.157,61 (
).Pelo que se vê, o objeto das ações é diverso. Conforme extraio da réplica, cujos argumentos acolho (
):"Assim, observa-se que, em referidos autos fora declarada a nulidade da majoração no valor da taxa de ocupação, bem como o recálculo dos valores.
Desse modo, em razão do descumprimento do determinado nos autos 2008.72.08.002738-0/SC, busca-se a restituição dos valores cobrados a maior.
A presente repetição de indébito surge em razão do descumprimento dos critérios fixados na sentença dos autos 2008.72.08.002738-0/SC, quais sejam:
“condenar a União a recalcular as taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E”. (vide sentença nos embargos de declaração).
Entretanto, até a presente data, a Requerida não realizou a adequação de valores, conforme os critérios acima, nos termos do extrato a seguir:
[...]
Diante disto, surge o direito de se requerer a devolução dos valores cobrados a maior, o que se requer nestes autos, sob pena de enriquecimento ilícito da União."
Diante disto, rejeito a preliminar.
2.2. Prejudicial de mérito - Prescrição
Defende a União que a pretensão de repetição dos valores entre 2007 a 2017 encontra-se prescrita, pois passaram-se mais de 5 anos entre a data do ato ou fato que se originou e o ajuizamento da presente ação, em respeito ao art. 1º do Decreto. 20.910/1932:
"Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem."
Todavia, o prazo da prescrição de crédito não tributário é de cinco anos, contado do momento em que o crédito se torna exigível, no caso, com o trânsito em julgado da sentença, que ocorreu em 09/02/2018.
A respeito, em casos semelhantes:
EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO NÃO-TRIBUTÁRIO. IBAMA. PRAZO PRESCRICIONAL. DECRETO N. 20.910, DE 1932. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. DESPACHO QUE ORDENA A CITAÇÃO. PRESCRIÇÃO NÃO VERIFICADA. 1. Nos casos da cobrança de créditos de natureza administrativa, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal são pacíficas no sentido de que aplica-se, por analogia o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910, de 1932, de modo que o prazo prescricional é de cinco anos a contar do momento em que se torna exigível a dívida do devedor 2. Nas execuções fiscais de créditos não-tributários, o despacho que ordena a citação interrompe o fluxo do prazo prescricional, conforme a regra específica art. 8º, §2º, da Lei nº 6.830, de 1980. (TRF4, AC 5019835-75.2021.4.04.9999, TERCEIRA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 13/06/2023)
EXECUÇÃO FISCAL. MULTA ADMINISTRATIVA. CRÉDITO NÃO-TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. O prazo de prescrição para a Fazenda Pública cobrar por execução fiscal crédito de natureza não-tributária inscrito em dívida ativa é de cinco anos. Precedente cogente do Superior Tribunal de Justiça. 2. O termo inicial da prescrição deve ser contado da constituição definitiva do crédito, que se dá após o decurso do prazo para apresentação de defesa à autuação ou para pagar a multa. Transcorrido prazo superior a cinco anos entre a constituição definitiva do crédito e a inscrição em dívida ativa, a prescrição deve ser mantida. 3. Apelação desprovida. (TRF4, AC 5004833-36.2015.4.04.7005, PRIMEIRA TURMA, Relator EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, juntado aos autos em 07/03/2022)
EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO NÃO TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. Para fins de execução fiscal de crédito decorrente de multa de caráter não-tributário, o prazo prescricional é de cinco anos, mediante isonômica aplicação do disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, tanto para a cobrança de créditos em favor ou contra a Administração Pública. (TRF4, AC 5010605-44.2019.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 21/09/2022)
A presente ação foi proposta em 13/10/2022, não tendo decorrido cinco anos entre essa data e o trânsito em julgado (09/02/2018). Não houve prescrição.
2.3. Mérito
A respeito do cálculo apresentado, a ré, na contestação, faz remissão à nota técnica da SPU, na qual consta (
):"Quanto ao cálculo das taxas de ocupação entre 2007 a 2022 tomando por base o valor de 2006, corrigido pelo IPCA-E, apresentada pela parte autora, entendemos que houve equívoco no estabelecimento dos períodos para obtenção dos valores percentuais correspondentes, uma vez que a parte autora forneceu sua atualização multiplicando o valor a ser corrigido pelo fator acumulado do índice de referência relativo a períodos contínuos a partir do ano base de cálculo e não anualmente (ano a ano) com correção percentual por índice econômico do ano calendário anterior, como de fato procedemos.
A Lei 14.474, de 06 de dezembro de 2022, a qual fez diversas inserções e cortes na Lei nº 9.636, de 15 de maio de 1998, especificamente no art. 11-B, o qual rege a atualização dos valores dominiais da União para fins de cobrança de receitas patrimoniais, em seu § 8º, inciso II, estabelece o seguinte:
Art. 11-B . O valor do domínio pleno do terreno da União será ob7do com base na planta de valores da Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União.
(...) § 8º O lançamento de débitos relacionados ao foro, à taxa de ocupação e a outras receitas extraordinárias:
I - utilizará como parâmetro o valor do domínio pleno do terreno estabelecido de acordo com o disposto nocaput deste artigo; e
II - observará o percentual máximo de atualização estabelecido em regulamento, aplicado sobre os valores cobrados no ano anterior, ressalvada a correção de inconsistências cadastrais. (Redação dada pela Lei nº 14.474, de 2022)
Esclarecemos que nossa base de dados (planta de valores genéricos) é atualizada todo início de exercício (início de cada ano), com uso de valores provenientes de pesquisa mercadológica ou pela aplicação de índice econômico acumulado do ano calendário anterior (período entre 1º de janeiro e 31 de dezembro) para a correção monetária. Portanto, a par7r da atualização de nossa PVG, se dá a correção dos débitos relacionados à taxa de ocupação, que são lançados no primeiro semestre de cada ano.
Todavia, levando-se em conta a tabela de valores apresentada pela parte autora e sua relação com as datas de vencimento dos débitos constantes no Anexo SIAPA -Débitos 06/08/2019 (36726589), apresentamos na tabela 1 novo cálculo das taxas de ocupação entre 2007 a 2023, corrigido pelo IPCA-E acumulado no período de doze meses contados entre os vencimentos dos débitos anteriores e atuais, os quais entendemos que devem ser levados em conta."
Conclui que o somatório da taxa de ocupação de 2007 a 2023 é de R$ 86.105,53.
Aparentemente, o valor de R$ 86.105,53 é incontroverso, embora não tenha ficado claro na manifestação da SPU nem na contestação.
A parte autora, na réplica, sustenta (
):"A parte Ré discorre que houve equívoco no estabelecimento dos períodos para obtenção dos valores percentuais correspondentes, uma vez que a parte autora forneceu sua atualização multiplicando o valor a ser corrigido pelo fator acumulado do índice de referência relativo a períodos contínuos a partir do ano base de cálculo e não anualmente com correção percentual por índice econômico do ano calendário anterior.
Contudo, Vossa Excelência, tal argumentação não deve prosperar.
Para cálculo do valor recolhido indevidamente, foi utilizado como base o valor pago em 2006 atualizado pelo índice IPCA-E ano a ano e, como resultado, a diferença entre este e o valor pago a SPU, todas informações retiradas do próprio site da SPU, conforme CALC24 e CALC25 constantes no ev. 1.
Veja-se que o cálculo apresentado pela parte Ré consta tão somente a atualização com índice IPCA-E, sem considerar o que efetivamente foi pago pelo Autor, que a diferença é o que se deve restituir.
Portanto, requer-se seja afastado o cálculo apresentado pela parte ré, com a manutenção dos cálculos apresentados com a exordial."
A União conclui na contestação que "Pelo que depreende, o autor obteve decisão favorável quanto ao pedido de nulidade do processo demarcatório e quanto ao recálculo das taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício de 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E, ressalvada a possibilidade da União renovar o ato de revisão do valor da taxa de ocupação, mediante prévio processo administrativo, com a notificação pessoal do ocupante" (
).Afirma a parte autora que calculou todas as taxas de ocupação entre 2007 a 2022 pela base de cálculo de 2006, corrigida pelo IPCA-E e, em seguida, descontou dos valores supostamente pagos à SPU/SC, alegando possuir crédito de R$193.157,61, conforme consta no cálculo de
.A autora comprova que recolheu as taxas de ocupação de 11/06/2007 a 27/06/2022 (
).Verifico, assim, que o cálculo apresentado pela parte autora foi elaborado de acordo com os termos definidos na sentença proferida na ação nº 2008.72.08.002738-0/SC, da 2ª Vara Federal de Itajaí/SC, com as alterações promovidas pelos Tribunais Superiores, e descontados os valores que já pagou a título de taxa de ocupação.
Sendo assim, acolho os cálculos apresentados pela parte autora, ressalvada a possibilidade de revisão dos valores exatos, ou seja, valores efetivamente recolhidos à SPU e a existência de eventuais equívocos no cálculo (quanto a correção dos valores, percentuais, soma, etc) a serem apurados em liquidação de sentença.
Desse modo, o pedido inicial é procedente.
Correção monetária e juros de mora
Os valores deverão ser atualizados apenas pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, até a data da efetiva restituição (artigo 406 do Novo Código Civil). O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 192.015/SP, de que foi relator o Ministro José Delgado (publicado em 16.08.1999), decidiu pela impossibilidade da cumulação de correção monetária e da taxa SELIC.
3. Dispositivo
Diante do exposto, julgo procedente o pedido, extinguindo a ação com resolução de mérito (art. 487, inciso I, do CPC), para o fim de condenar a União a restituir à parte autora os valores recolhidos a maior, considerando a anulação do aumento da taxa de ocupação referente ao RIP 8161000072410, nos termos da sentença proferida nos autos nº 2008.72.08.002738-0/SC da 2ª vara federal de Itajaí/SC, que definiu o"recálculo das taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício de 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E", e conforme cálculo apresentado pela parte autora no
, na forma da fundamentação supra, a ser apurado em liquidação de sentença, corrigidos monetariamente pela SELIC, nos termos da fundamentação.Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, nos termos do art. 85, §§2º e 3º do CPC.
Parte ré isenta de custas devendo, no entanto, reeembolsar aquelas adiantadas pela parte autora.
Sem reexame necessário (CPC, art. 496, § 3º, I).
Interposto recurso voluntário, intime-se a parte apelada para contrarrazões e, oportunamente, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade, nos termos do art. 1.010, §§1º e 3º do CPC/2015.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso interposto e passo à análise do apelo.
I - Preliminar - Coisa Julgada
Inicialmente, requer a apelante seja reconhecida a coisa julgada. Aduz que o pedido da presente ação foi objeto do processo nº 2008.72.08.002738-0/SC, tendo sido julgado improcedente, bem como que a parte autora deveria ter feito pedido expresso de repetição do excesso ao tempo do ajuizamento daquela ação.
Contudo, razão não lhe assiste.
No processo mencionado, o autor havia pleiteado a declaração de nulidade do processo administrativo que ensejou a majoração da taxa de ocupação, bem como o recálculo dos valores pela União, a partir do ano de 2007, utilizando-se por base o valor referente ao ano de 2006, pedidos julgados procedentes, ao final. Requereu, ainda, a devolução dos valores pagos a título de taxa de ocupação, que entendia indevidos, pedido que restou indeferido, por entender o julgador que as taxas eram devidas, ainda que tenha havido ilegalidade na majoração (
).De outra banda, na presente ação, busca a parte autora a restituição da diferença dos valores pagos a maior, entre 2007 e 2022, em relação aos valores que deveriam ter sido pagos, levando-se em consideração os parâmetros de cálculo definidos em sentença, transitada em julgado em 2018 (
).Não se verifica, portanto, a ocorrência de coisa julgada, uma vez que se trata de pedidos distintos entre si.
II - Prejudicial de Mérito - Prescrição
O Decreto nº 20.910 de 1932, que regula a prescrição no âmbito da Fazenda Pública, estabelece o prazo de 05 (cinco) anos para o ajuizamento de ação que vise a cobrança de dívida passiva da União, a contar da data do ato ou fato do qual se originarem:
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
Nos casos de créditos de natureza administrativa, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal são pacíficas no sentido de que se aplica, por analogia, o disposto no artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932, de modo que o prazo prescricional é de cinco anos a contar do momento em que se torna exigível a dívida do devedor (cf. STJ, AGRESP 201001417909, Segunda Turma, DJE 14-02-2011; REsp 1105442/RJ, Primeira Seção, julgado em 09-12-2009, DJe 22-02-2011; TRF4, AC 5000337-09.2016.404.7205, Terceira Turma, juntado aos autos em 17-5-2017).
No caso concreto, por se tratar de direito oriundo de ilegalidade reconhecida em decisão judicial, tornou-se o crédito exigível somente a partir do trânsito em julgado da decisão que o constituiu, ou seja, a partir do dia 09-02-2018.
Nesse panorama, tendo o autor ingressado com a presente ação em 13-10-2022, não houve o decurso do prazo quinquenal. Desse modo, não há falar em prescrição da pretensão autoral, nos termos do artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932.
Nesse sentido (grifos acrescidos):
EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO NÃO-TRIBUTÁRIO. IBAMA. PRAZO PRESCRICIONAL. DECRETO N. 20.910, DE 1932. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. DESPACHO QUE ORDENA A CITAÇÃO. PRESCRIÇÃO NÃO VERIFICADA. 1. Nos casos da cobrança de créditos de natureza administrativa, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal são pacíficas no sentido de que aplica-se, por analogia o disposto no art. 1º do Decreto nº 20.910, de 1932, de modo que o prazo prescricional é de cinco anos a contar do momento em que se torna exigível a dívida do devedor 2. Nas execuções fiscais de créditos não-tributários, o despacho que ordena a citação interrompe o fluxo do prazo prescricional, conforme a regra específica art. 8º, §2º, da Lei nº 6.830, de 1980. (TRF4, Apelação Cível nº 5019835-75.2021.4.04.9999, Terceira Turma, Relator Desembargador Federal Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 13-6-2023)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ARTIGO 1.022 DO CPC. VÍCIOS. PRESCRIÇÃO. HONORÁRIOS. ESCLARECIMENTO. REDISCUSSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. 1.São cabíveis embargos de declaração quando houver na decisão judicial a necessidade de se esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão e corrigir erro material de ponto ou questão sobre o qual deveria se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento (art. 1.022 CPC/15). Além dessas hipóteses, cabem para fins de prequestionamento, por construção jurisprudencial, como indicam as Súmulas 356 do STF e 98 do STJ 2. No que diz respeito ao termo inicial da contagem do prazo prescricional, este, de regra, deve recair no momento da constituição definitiva do crédito, ou seja, na data da notificação do encerramento do processo administrativo, a partir de quando o crédito passou a ser exigível. 3. Considerando que ambos os apelos foram desprovidos, não incide o art. 85, § 11, do CPC, diante da impossibilidade de majoração da verba sucumbencial, com a fixação dos honorários recursais, quando os recursos de ambas as partes são improvidos. 4. Acolhidos os aclaratórios da parte executada. 5. Quanto ao pedido de prequestionamento, ressalta-se que, a teor do artigo 1025 do CPC/2015, é suficiente a mera suscitação da matéria para se obter tal desiderato e não a expressa referência aos dispositivos legais. (TRF4, Apelação Cível nº 5056397-60.2015.4.04.7100, Quarta Turma, Relator Desembargador Federal Marcos Roberto Araujo dos Santos, juntado aos autos em 31-7-2024)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE TEVE INÍCIO ANTES DA VIGÊNCIA DA MP 780/17, CONVERTIDA NA LEI 13.494/2017. DISCUSSÃO NA VIA DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NÃO CABIMENTO. 1. É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. Precedente do STF. Repercussão Geral, Tema 666. 2. Caso em que houve recebimento indevido de benefício previdenciário. Aplica-se o art. 1º do Decreto nº 20.910/32, que estabelece prazo prescricional de 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou do fato do qual se originaram, para a cobrança de créditos contra a fazenda federal, estadual ou municipal. 3. Termo inicial da contagem do prazo prescricional, via de regra, começa no momento da constituição definitiva do crédito, ou seja, quando encerrado o processo administrativo, a partir de quando o crédito passa a ser exigível. 4. O manejo do incidente da exceção de pré-executividade, no caso concreto, extrapola a sua finalidade, tendo em vista que o conhecimento das questões suscitadas implica análise meritória, que somente tem cabimento pela via adequada dos embargos à execução fiscal ou ação anulatória/declaratória. 5. Agravo improvido. (TRF4, Décima Segunda Turma, Agravo de Instrumento nº 5001191-11.2021.4.04.0000, Relatora Juíza Federal Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo, juntado aos autos em 06-10-2023)
III - Mérito
No mérito, insurge-se a apelante quanto aos parâmetros utilizados para o cálculo dos valores devidos pela União, apresentado pela parte autora e acolhido pela r. sentença.
A sentença que constituiu o crédito do autor impôs, após a oposição de embargos de declaração, o seguinte parâmetro de cálculo (
):3) condenar a União a recalcular as taxas de ocupação de 2007, 2008 e seguintes, utilizando a base de cálculo cobrada no exercício 2006, devidamente atualizada pelo IPCA-E;
Pois bem, ao que parece, o cálculo apresentado pela parte autora seguiu o critério determinado em sentença, à medida que utilizou como base o valor pago a título de taxa de ocupação em 2006, atualizado pelo IPCA-E para cada ano, descontando o valor encontrado do montante efetivamente pago em cada exercício, chegando à diferença paga indevidamente.
Outrossim, conforme bem pontuou a sentença guerreada, não se descarta a possibilidade de revisão dos valores exatos em fase de liquidação de sentença, momento em que poderão ser corrigidos eventuais equívocos, por exemplo, quanto à correção, percentuais, somas e descontos.
Assim, não havendo flagrante inconformidade dos cálculos apresentados com os critérios definidos no título constitutivo, não há motivos para reforma da sentença.
IV - Honorários Advocatícios
Desprovida a apelação, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do Código de Processo Civil, bem como eventual gratuidade de justiça, a verba honorária fica majorada em 10% (dez por cento) sobre o percentual que já havia sido estipulado em primeiro grau, ou seja, resultando em 11% (onze por cento), mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573). Esclareço que, nos termos da jurisprudência daquela Corte, "não é exigível a comprovação de trabalho adicional do advogado do recorrido no grau recursal, tratando-se apenas de critério de quantificação da verba" (STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.357.561/MG, Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe 19-4-2017).
V - Conclusões
1. Tratando-se de pedidos distintos, ainda que haja a identidade das partes, não há que se falar em coisa julgada.
2. A prescrição dos créditos de natureza administrativa começa a contar a partir da data em que o crédito se tornou exigível. Não configurada a prescrição no caso concreto.
3. Os valores apresentados foram calculados segundo os parâmetros definidos na sentença que constituiu o crédito, não havendo motivos para reforma da sentença. Eventuais correções nos cálculos poderão ser feitas em fase de liquidação de sentença.
VI - Prequestionamento
Em face do disposto nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 do Superior Tribunal de Justiça, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a presente decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
VII - Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso, nos termos da fundamentação.
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Apelação Cível Nº 5012171-87.2022.4.04.7208/SC
RELATOR: Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
EMENTA
administrativo. repetição de indébito. união. taxa de ocupação. terreno de marinha. ilegalidade de majoração. diferenças pagas a maior. coisa julgada. inocorrência. prescrição quinquenal. termo inicial. parâmetros de cálculo. sentença mantida.
1. Tratando-se de pedidos distintos, ainda que haja a identidade das partes, não há que se falar em coisa julgada.
2. A prescrição dos créditos de natureza administrativa começa a contar a partir da data em que o crédito se tornou exigível.
3. Os valores foram calculados segundo os parâmetros definidos na sentença que constituiu o crédito, não havendo motivos para reforma da decisão recorrida.
4. Apelo desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de dezembro de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 04/12/2024 A 11/12/2024
Apelação Cível Nº 5012171-87.2022.4.04.7208/SC
RELATOR: Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/12/2024, às 00:00, a 11/12/2024, às 16:00, na sequência 188, disponibilizada no DE de 25/11/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
Votante: Juiz Federal MARCELO ROBERTO DE OLIVEIRA
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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