APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002436-71.2015.4.04.7112/RS
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | LEANDRO VILA NOVA |
ADVOGADO | : | VILMAR LOURENÇO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSS. DANO MORAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE AUXÍLIO-DOENÇA. INDEFERIDO NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSTERIOR CONCESSÃO JUDICIAL. REGULARIDADE DA CONDUTA DA AUTARQUIA.
- A Carta de 1988, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte, pode-se dizer que, de regra os pressupostos dar responsabilidade civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.
- Em se tratando de comportamento omissivo, a situação merece enfoque diferenciado. Decorrendo o dano diretamente de conduta omissiva atribuída a agente público, pode-se falar em responsabilidade objetiva. Decorrendo o dano, todavia, de ato de terceiro ou mesmo de evento natural, a responsabilidade do Estado de regra, assume natureza subjetiva, a depender de comprovação de culpa, ao menos anônima, atribuível ao aparelho estatal. De fato, nessas condições, se o Estado não agiu, e o dano não emerge diretamente deste não agir, de rigor não foi, em princípio, seja natural, seja normativamente, o causador do dano.
- A decisão administrativa indeferindo pedido de concessão de benefício previdenciário constitui exercício regular de direito, e não ilícito ensejador da reparação civil. Ou seja, o indeferimento do benefício na via administrativa, por si só, não implica direito à indenização por dano moral.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo retido e negar provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 02 de agosto de 2016.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8442343v3 e, se solicitado, do código CRC E292FB65. | |
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RELATÓRIO
LEANDRO VILA NOVA ajuizou ação ordinária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando indenização por danos morais, em virtude da não concessão, na esfera administrativa, do benefício de auxílio-doença, que acabou sendo concedido posteriormente na via judicial.
Indeferido o pedido de produção de provas (evento 11, na origem), a decisão foi desafiada pelo recurso de agravo retido (evento 14, na origem).
Processado o feito, sobreveio sentença de improcedência, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da causa. Todavia, tais condenações restaram suspensas em razão da AJG deferida.
Apela a parte autora. Inicialmente, requer a anulação da sentença por cerceamento de defesa, para que seja possibilitada a produção de prova testemunhal. No mérito, requer o reconhecimento da existência de responsabilidade civil do INSS pelos atos praticados pelos seus servidores, condenando-o ao pagamento de indenização por danos morais, renovando todos os pedidos contidos na inicial.
Após as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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VOTO
Inicialmente, em atenção ao disposto no artigo 523, do CPC/1973, não conheço do agravo retido interposto pela parte autora, pois não reiterado em sede de apelação.
Com relação à arguição, na apelação do autor, de ocorrência de cerceamento de defesa em vista da necessidade produção de prova testemunhal, haja vista o indeferimento pelo julgador singular, tenho que não assiste razão à parte. Conforme preceituava o art. 130, do CPC/1973 (atual art. 370, do NCPC), ao juiz compete dizer quais as provas que entende necessárias ao deslinde da questão, bem como indeferir as que julgar desnecessárias ou inúteis à apreciação do caso.
Rejeita-se, pois, o pedido de anulação da sentença.
Quanto ao mérito, no que se refere à pretensão indenizatória, a responsabilidade do Estado está prevista no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal:
"Art. 37.
..
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.".
A Carta de 1988, pois, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte, pode-se dizer que, de regra os pressupostos dar responsabilidade civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.
Em se tratando de comportamento omissivo, a situação merece enfoque diferenciado. Decorrendo o dano diretamente de conduta omissiva atribuída a agente público, pode-se falar em responsabilidade objetiva. Decorrendo o dano, todavia, de ato de terceiro ou mesmo de evento natural, a responsabilidade do Estado de regra, assume natureza subjetiva, a depender de comprovação de culpa, ao menos anônima, atribuível ao aparelho estatal. De fato, nessas condições, se o Estado não agiu, e o dano não emerge diretamente deste não agir, de rigor não foi, em princípio, seja natural, seja normativamente, o causador do dano.
No que tange ao dano moral, a lição de Yussef Said Cahali (in "Dano Moral", Ed. Revista dos Tribunais, 2ª ed., p.20/21) conceitua tratar-se de "tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes a sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral."
O caso dos autos comporta situação na qual o demandante formulou o pedido administrativo do benefício previdenciário de auxílio doença em 24/05/2012, o qual foi indeferido, por entender o INSS inexistente incapacidade, sendo o referido benefício deferido somente após ação judicial (5014028-20.2012.404.7112). No presente processo, defende que o indeferimento do benefício na esfera administrativa e o posterior reconhecimento do direito na via judicial caracterizam danos morais passíveis de indenização pelo INSS.
Ocorre que a decisão administrativa indeferindo pedido de concessão de benefício previdenciário (ou cancelando-o administrativamente) constitui exercício regular de direito, e não ilícito ensejador da reparação civil. Ou seja, o indeferimento do benefício na via administrativa, por si só, não implica direito à indenização por dano moral.
Como bem referido no julgamento, nesta Corte, da Apelação Cível/Reexame Necessário 0011597-02.2014.404.9999 (Quinta Turma, Relatora Taís Schilling Ferraz, D.E. 21/10/2014), se há suspeita de que o segurado não preenche os requisitos para a concessão do benefício, é dever do INSS apurar se tais pressupostos estão ou não configurados, ato que constitui verdadeiro dever do ente autárquico.
Tendo isso em mente, andou bem o juízo singular ao fixar (evento 16, na origem):
(...)
No caso dos autos, o ato de indeferimento/cancelamento do benefício auferido pela Parte Autora, efetuado pela Autarquia Previdenciária, não se mostra gerador do constrangimento e/ou abalo tal(is) que caracterize a ocorrência de dano moral.
Há que se ressaltar que a ação de decidir é inerente ao Poder Público, especialmente ao INSS, não podendo este ser responsabilizado sempre que sua decisão for contrária aos interesses do particular, sob pena de todo ato administrativo, quando revisado ou anulado, gerar a obrigação de indenizar.
Colaciono jurisprudência a respeito:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CANCELAMENTO. DESCONTO DOS VALORES PAGOS A MAIOR. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. 1. Tratando-se de benefício previdenciário, deve-se ter em conta o inegável caráter alimentar dos valores percebidos, bem como a boa-fé do segurado ou dependente, sendo inviável a devolução das verbas recebidas a título de benefício assistencial. 2. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores determinada pela Autarquia Federal. 3. Incabível a condenação do INSS em danos morais, como pretende a parte autora, uma vez que não há prova nos autos de que tenha ocorrido o alegado prejuízo de ordem moral, bem como o nexo causal. O cancelamento de benefício indevido na via administrativa, por si só, não implica direito à indenização por dano moral. (sublinhei) (TRF/4ª Região; Quinta Turma; APELREEX 5000334-94.2010.404.7001/pr; de 07/10/2011; Relator Ezio Teixeira).
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ATO ILÍCITO. INEXISTÊNCIA. DANO GRAVE INDENIZÁVEL. NÃO COMPROVAÇÃO. A produção de provas visa à formação do juízo de convicção do juiz, a quem caberá nos termos do artigo 130 do CPC, 'de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.' A responsabilidade por indenização de danos morais, seja ela subjetiva ou objetiva, pressupõe a comprovação de efetivo dano moral, ou seja, a efetiva comprovação de abalo moral relevante sofrido pela vítima. Cabe ao magistrado, guiando-se pelo princípio da razoabilidade, analisar se houve dano grave e relevante que justifique a indenização buscada. Não comprovada conduta ilícita por parte da ré, assim como abalo moral relevante sofrido pela parte autora, descabe acolher o pedido de indenização por danos morais. (TRF/4ª Região. AC nº 5019178-11.2014.404.7112. Rel. Vivian Josete Pantaleão Caminha. DJ: 25/08/2015).
Salvo situações em que evidenciado extremo abuso de autoridade por parte da Autarquia Previdenciária, o que não é o caso dos autos, a condenação à indenização por danos morais é medida que acaba por inibir o exercício do direito, quiçá dever da Administração Pública rever seus atos, quando verificada alguma irregularidade.
Em outras palavras, o ato de indeferimento/cancelamento é formalmente legal, baseado em interpretação administrativa por parte do ente público e inerente à sua função de conceder ou negar benefícios de natureza previdenciária e, em alguns casos, assistencial.
Ressalto que não estou aqui a afastar de modo abstrato o direito à reparação de danos morais. No entanto, esse direito só pode ser reconhecido em situações específicas, em que verificado um agir ilícito por parte do ente público, o que não é o caso. Na situação dos autos, tem-se um agir lícito, externado na emissão de um ato administrativo contrário aos interesses da Parte Autora, que foi revisado por via de ação judicial, sendo determinado o pagamento de valores retroativos à data em que houve a negativa do benefício.
(...)
Assim, na situação presente, não foi comprovada prática de ilegalidade ou abuso no agir da Administração Pública, sendo impossível de reconhecer, como bem salientou o juízo singular, dano moral indenizável.
Inexistente o dever de o Estado indenizar, nenhum reparo há para ser feito à sentença de improcedência.
Custas e honorários na forma da decisão de origem.
Ante o exposto, voto por não conhecer do agravo retido e negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 02/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002436-71.2015.4.04.7112/RS
ORIGEM: RS 50024367120154047112
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Dr Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | LEANDRO VILA NOVA |
ADVOGADO | : | VILMAR LOURENÇO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 02/08/2016, na seqüência 106, disponibilizada no DE de 19/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DO AGRAVO RETIDO E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
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