Apelação Cível Nº 5001460-15.2020.4.04.7201/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: VALDECIR APARECIDO DE MELO (IMPETRANTE)
ADVOGADO: CELSO ROBERTO EICK JUNIOR (OAB SC014734)
APELADO: GERENTE - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF - JOINVILLE (IMPETRADO)
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que, em mandado de segurança, denegou a ordem em que o impetrante postulava a imediata liberação de seu saldo FGTS, "seja pelo valor que lá se encontra depositado seja para liberação dos depósitos fundiários mensais realizados por sua empregadora".
O dispositivo da sentença foi exarado nos seguintes termos:
(...) DISPOSITIVO:
Ante o exposto, extingo o processo com resolução do mérito (art. 487, I, CPC) e denego a segurança.
Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei n. 12.016/2009).
Custas pelo impetrante.
Sentença não sujeita ao reexame necessário.
Registrada eletronicamente. Dou-a por publicada com a liberação no sistema eletrônico. Intimem-se.
Na hipótese de interposição de recursos, intime-se a parte contrária para apresentação de contrarrazões, no devido prazo. Após a juntada das referidas peças, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 1.010, §§ 1º e 3º, do Código de Processo Civil).
Em suas razões recursais o impetrante sustentou: (1) que a Lei 8.036/90 admite a movimentação da conta fundiária ante a concessão de aposentadoria no RGPS, razão pela qual não poderia o normativo interno da CEF impor qualquer condição; (2) que a proibição invocada pela CEF não merece prosperar e tampouco se coadura com o princípio constitucional da legalidade; (3) que faz jus a liberação do saldo do FGTS da conta vinculada nos termos em que postulada. Nesses termos pediu a reforma da sentença.
Com contrarrazões.
O representante do Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento do feito.
É o relatório.
VOTO
A r. sentença foi exarada nos seguintes termos:
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Valdecir Aparecido de Melo contra ato do Gerente da Caixa Econômica Federal - CEF em Joinville, pleiteando, em sede liminar, provimento jurisdicional que determine a imediata liberação de seu saldo FGTS, "seja pelo valor que lá se encontra depositado seja para liberação dos depósitos fundiários mensais realizados por sua empregadora". Como provimento final, postulou permissão para movimentar a sua conta fundiária.
Sustentou ter a CEF negado o saque do saldo existente nas contas do FGTS vinculadas ao impetrante, porquanto o Manual Normativo da CEF veta a liberação do saldo da conta fundiária por motivo de aposentadoria ao trabalhador que firmou novo contrato de trabalho após o início da aposentadoria.
Defendeu que a Lei 8.036/90 admite a movimentação da conta fundiária ante a concessão de aposentadoria no RGPS, razão pela qual não poderia o normativo interno da CEF impor tal condição.
O pedido liminar foi indeferido (evento 9). Em desfavor de tal decisão, o impetrante opôs embargos declaratórios (evento 17), que foram rejeitados (evento 26).
Notificada, a autoridade impetrada prestou informações (evento 22). Alegou, preliminarmente, a inadequação da via eleita. No mérito aduziu, em suma, que o impetrante firmou novo contrato de trabalho o que o impede de efetuar o saque do FGTS com base na aposentadoria antes do seu desligamento definitivo.
O Ministério Público Federal afirmou não haver interesse público que justifique sua intervenção e apenas pugnou pelo prosseguimento do feito (evento 37).
No evento 46 o impetrante rebateu a preliminar suscitada pela autoridade impetrada nas informações.
Relatados. Decido.
1. Preliminar / Inadequação da via eleita
Sustentou, a impetrada, a inadequação da via eleita, pois não houve ação ou omissão que tenha ameaçado ou violado o direito líquido e certo da impetrante.
Entretanto, existiu ato coator, pois a impetrante teve indeferido o pedido de liberação do saldo da conta fundiária.
Da mesma forma, há adequação da via eleita, tendo em vista que a matéria é passível de comprovação tão somente com base em prova documental. Eventual insuficiência probatória não acarreta falta de interesse de agir, na modalidade interesse-adequação, mas sim denegação da própria segurança.
Com isso, afasto a preliminar.
2. Mérito.
A questão jurídica gira em torno da verificação das hipóteses de levantamento de valores depositados em conta vinculada ao FGTS, de acordo com o art. 20 da Lei n. 8.036/90.
O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS é regido pela Lei n. 8.036/1990, cujo art. 20 dispõe acerca das hipóteses de levantamento dos valores depositados na conta vinculada ao trabalhador. Quanto à possibilidade de saque, dispõe:
"Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações: [...]
III - aposentadoria concedida pela Previdência Social; [...]"
Assim, a conta vinculada ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS poderá ser movimentada pelo trabalhador quando lhe for concedida aposentadoria pela Previdência Social.
Analisando os autos, verifico que o demandante comprovou que lhe foi concedida aposentadoria por tempo de contribuição (NB 1837962844), a partir de 03/11/2017 (evento 1, ANEXOSPET6, p. 8).
Contudo, conforme Extrato de Consulta (evento 22, EXTR4), a conta vinculada ao FGTS, cujo saldo o demandante pretende levantar, restou aberta em virtude de vínculo empregatício iniciado com a empresa Tupy S.A., em 12/11/2018, estando, inclusive, atualmente ativa.
Registro, ainda, que os valores constantes na referida conta foram depositados a partir de 07/12/2018, fato que demonstra referirem-se ao vínculo empregatício firmado pelo autor em 12/11/2018, sem relação alguma com o vínculo empregatício anterior a 03/11/2017.
Assim, resta demonstrado que, na hipótese dos autos, o demandante postula o levantamento dos valores depositados após a sua aposentadoria, em decorrência de novo vínculo empregatício, o qual configura um novo contrato de trabalho.
Desse modo, considerando que o saldo atualmente existente em nome do autor, em conta vinculada ao FGTS, refere-se a contrato de trabalho iniciado, segundo os registros formais, posteriormente à data de obtenção de aposentadoria, não é possível autorizar a disponibilização pretendida.
A aposentadoria do trabalhador somente autoriza o saque dos valores depositados nas contas vinculadas existentes até seu advento. Logo, eventuais depósitos realizados em contas abertas, em momento posterior, relativas a novos vínculos laborais, permanecem sujeitos ao regramento da Lei n. 8.036/90; sendo, consequentemente, necessária a superveniência de alguma das outras hipóteses permissivas previstas no art. 20 da referida Lei, para que seja possível o levantamento do respectivo saldo.
Na realidade, o fato de o trabalhador estar aposentado não permite que efetue sucessivos saques dos valores depositados em relação a vínculo iniciado posteriormente à aposentadoria, sob pena de indevida ampliação das hipóteses legalmente previstas.
Consequentemente, tratando-se de novo vínculo empregatício, o demandante deverá preencher uma das demais hipóteses elencadas no art. 20 da Lei 8.036/90, que rege a matéria atinente ao FGTS.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. FGTS. SAQUE DE VALORES. VÍNCULO DE EMPREGO POSTERIOR À APOSENTADORIA. REQUISITOS AUTORIZADORES. 1. O art. 20, III, da Lei nº 8.036/1990, prevê entre as hipóteses autorizadoras de saque do saldo disponível em conta vinculada ao FGTS a superveniência da aposentadoria do trabalhador. 2. Referido dispositivo, todavia, não trata da hipótese de saque de valores depositados em conta fundiária após a ocorrência da aposentadoria do trabalhador em razão de vínculo de emprego iniciado posteriormente à concessão do benefício previdenciário, caso em que a autorização para o saque depende da rescisão do novo vínculo de emprego (art. 20, I, da Lei nº 8.036/1990), ou da comprovação de ocorrência das demais hipóteses permissivas previstas na legislação de regência. ( 5001879-57.2019.4.04.7011, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR, Relatora MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA, julgado em 02/07/2020)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. SAQUE DE VALORES DEPOSITADOS EM CONTA DE FGTS. APOSENTADORIA. PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO. 1. A parte agravante aposentou-se em 23/04/1994 enquanto laborava na empresa Mulhouse Malhas e Confecções Ltda, sendo readmitida em 01/03/1995, desligada da empresa em 05/06/2001 e novamente readmitida em 02/07/2001, onde, ao que tudo indica, exerce suas atividades até os dias de hoje. 2. Nos termos do artigo 20, da Lei 8.036/90, dentre as hipóteses de levantamento do saldo da conta vinculada do trabalhador no FGTS, encontra-se a aposentadoria concedida pela Previdência Social (inciso III). 3. Não merece prosperar o pleito da autora, tendo em vista que se trata de novo vínculo empregatício, devendo a fundista preencher uma das demais hipóteses elencadas no art. 20, da Lei nº 8.036/90. 4. Recurso improvido. (TRF4, AG 5071902-80.2017.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 16/05/2018)
Por tais razões, a denegação da segurança é medida que se impõe.
DISPOSITIVO:
Ante o exposto, extingo o processo com resolução do mérito (art. 487, I, CPC) e denego a segurança.
Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei n. 12.016/2009).
Custas pelo impetrante.
Sentença não sujeita ao reexame necessário.
Registrada eletronicamente. Dou-a por publicada com a liberação no sistema eletrônico. Intimem-se.
Na hipótese de interposição de recursos, intime-se a parte contrária para apresentação de contrarrazões, no devido prazo. Após a juntada das referidas peças, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 1.010, §§ 1º e 3º, do Código de Processo Civil).
A tais fundamentos não foram opostos argumentos idôneos a infirmar a conclusão do magistrado singular, devendo a r. sentença ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Como bem salientou o Juízo a quo, o fato de o trabalhador estar aposentado não permite que efetue sucessivos saques dos valores depositados em relação a vínculo iniciado posteriormente à aposentadoria, sob pena de indevida ampliação das hipóteses legalmente previstas. Consequentemente, tratando-se de novo vínculo empregatício, o demandante deverá preencher uma das demais hipóteses elencadas no art. 20 da Lei 8.036/90, que rege a matéria atinente ao FGTS.
Assim, a condição de aposentado do requerente não é suficiente para permitir o levantamento dos valores depositados, que se referem a vínculo empregatício que surgiu após a aposentadoria, porquanto tal realidade não se enquadra no inciso III do art. 20 da Lei 8.036/90, nem em quaisquer dos demais incisos do referido dispositivo legal, inexistindo, como sustenta o apelante, violação ao princípio da legalidade, pois a Lei 8.036/90 não permite o saque pleiteado.
Nesse sentido já se manifestou a 4ª Turma deste Tribunal:
APELAÇÃO. FGTS. CONTA VINCULADA. MOVIMENTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1- Somente é possível a movimentação do saldo da conta vinculada do FGTS nas hipóteses previstas em lei ou em situações realmente graves e urgentes. 2- Descabimento de alargamento das hipóteses legais na espécie. 3- Sentença de improcedência mantida. (TRF4, AC 5004007-61.2016.4.04.7106, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 28/04/2017)
Logo, irretocável a r. sentença
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002198857v4 e do código CRC 4e18823f.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5001460-15.2020.4.04.7201/SC
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APELANTE: VALDECIR APARECIDO DE MELO (IMPETRANTE)
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APELADO: GERENTE - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF - JOINVILLE (IMPETRADO)
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
EMENTA
administrativo. fgts. saque de valores. vínculo empregatício posterior à aposentadoria. requisitos autorizadores. inocorrência.
A condição de aposentado do requerente não é suficiente para permitir o levantamento dos valores depositados, que se referem a vínculo empregatício que surgiu após a aposentadoria, porquanto tal realidade não se enquadra no inciso III do art. 20 da Lei 8.036/90, nem em quaisquer dos demais incisos do referido dispositivo legal.
Consequentemente, tratando-se de novo vínculo empregatício, o demandante deverá preencher uma das demais hipóteses elencadas no art. 20 da Lei 8.036/90, que rege a matéria atinente ao FGTS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de novembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002198858v4 e do código CRC 420d5ead.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 25/11/2020
Apelação Cível Nº 5001460-15.2020.4.04.7201/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
APELANTE: VALDECIR APARECIDO DE MELO (IMPETRANTE)
ADVOGADO: CELSO ROBERTO EICK JUNIOR (OAB SC014734)
APELADO: GERENTE - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF - JOINVILLE (IMPETRADO)
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 25/11/2020, na sequência 762, disponibilizada no DE de 13/11/2020.
Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Juiz Federal MARCOS JOSEGREI DA SILVA
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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