APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007140-23.2016.4.04.7200/SC
RELATOR | : | LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE |
APELANTE | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC |
APELADO | : | RENATO ANTONIO MACIEL |
ADVOGADO | : | Maíra Wollinger Maciel |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA ESPECIAL. MANDADO DE INJUNÇÃO. COMPROVAÇÃO A SUJEIÇÃO AOS AGENTES AGRESSIVOS. POSSIBILIDADE.
Nos Mandados de Injunção, julgados pelo STF, foi reconhecida a falta de norma regulamentadora do direito à aposentadoria especial dos servidores públicos, removido o obstáculo criado por essa omissão e, supletivamente, tornou viável o exercício do direito consagrado no artigo 40, § 4º, da Constituição do Brasil, nos termos do artigo 57 da Lei 8.213/91.
Comprovado nos autos que o autor esteve sujeito a agentes agressivos de forma habitual e permanente, é de se conceder aposentadoria especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da UFSC, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de abril de 2017.
Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8891949v3 e, se solicitado, do código CRC DA982B4C. | |
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| Signatário (a): | Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle |
| Data e Hora: | 20/04/2017 16:42 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007140-23.2016.4.04.7200/SC
RELATOR | : | LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE |
APELANTE | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC |
APELADO | : | RENATO ANTONIO MACIEL |
ADVOGADO | : | Maíra Wollinger Maciel |
RELATÓRIO
Renato Antonio Maciel ingressou com a ação ordinária em face da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, através da qual tenciona obter provimento jurisdicional determinando que "continue afastado de seu trabalho no Hospital Universitário, até o final da demanda, com a consequente concessão de aposentadoria especial", deduzindo a sua pretensão de mérito nos seguintes termos, in verbis:
(...)
c) Seja julgada PROCEDENTE a pretensão autoral, em todos os seus termos, reconhecendo como período especial todo lapso laborado na Universidade Federal de Santa Catarina, e, em ato contínuo que seja determinada a concessão da Aposentadoria Especial."
(...)
O autor sustenta na inicial, em sintese, que desde 26 de janeiro de 1988 é servidor da Universidade Federal de Santa Catarina, médico lotado no Hospital Universitário e, por ter implementado os requisitos necessários, em 25 de junho de 2015, quando já contava mais de 26 anos de tempo de serviço em condições especiais, requereu administrativamente sua aposentadoria especial, e seu pedido foi deferido, sendo, inclusive, publicado no Diário Oficial da União.
Não obstante, 15 (quinze) dias após a publicação no Diário Oficial, foi surpreendido por comunicado do Setor de Recursos Humanos da UFSC, dando conta de que seu pedido de aposentadoria até então aprovado, fora negado, porquanto as atividades desenvolvida pelo autor não são consideradas insalubres.
Disse que Não há justificativa plausível acerca da negativa de aposentadoria, uma vez que, a insalubridade é comprovada nos autos, e que o servidor ocupante de cargo cujas atribuições estejam sujeitas a exposição a agentes nocivos, e uma vez demonstrada tal exposição, faz jus a aposentadoria especial conforme as regras aplicadas aos segurados da Previdência Social, vinculados ao RGPS - Regime Geral de Previdência Social, com aplicação analógica daquela norma.
Discorreu sobre a legislação que rege a matéria, disse que tem direito à aposentadoria especial, porquanto demonstrado que as atividades por ele desenvolvidas eram insalubres.
A sentença dispôs:
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para: a) reconhecer a especialidade das atividades exercidas pelo autor no cargo de Médico nos períodos de 26 de janeiro de 1988 e 25 de junho de 2015;b) condenar a Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC conceder/manter o benefício de "aposentadoria especial" ao servidor a contar do requerimento administrativo, observada a legislação então vigente em relação aos cálculos dos proventos; c) extinguir o processo com resolução de mérito, com base no art. 487, I, do Código de Processo Civil de 2015.
Condeno a Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (art. 85, § 2º Código de Processo Civil de 2015, bem como a ressarcir o autor pelas custas processuais antecipadas.
Custas remanescentes na forma da lei.
A UFSC apresenta apelação. Requer:
seja dado provimento ao presente recurso para que sejam julgados improcedentes todos os pedidos deduzidos pelo Autor, para ver declarada a legalidade e a plena regularidade aos atos administrativos do Ente Público.
Prequestiona:
- art. 186, § 2º, Lei nº 8.112/90;
- arts. 57 e 58, Lei nº 8.213/91;
- arts. 2º, 37, caput, 40, § 4º, III, 195, § 5º, 201, caput e § 1º da Constituição Federal.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Consta da sentença:
II - FUNDAMENTAÇÃO
Presente a hipótese do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015, passo ao julgamento antecipado da lide.
Mérito
- Atividades Especiais
Trata-se de pedido de "aposentadoria especial" deduzido por servidor público federal, cujo pleito pressupõe o reconhecimento da especialidade de período trabalhado junto à Universidade Federal de Santa Catarina no cargo de médico, isso no íntervalo entre 26 de janeiro de 1988 e 25 de junho de 2015.
Cumpre observar que o pedido foi inicialmente deferido na via administrativa, sendo o ato administrativo posteriormente desconstituído sem que se assegurasse ao servidor o direito à ampla defesa e ao contraditório (vide iten "b" do ofício juntado no evento 28 - PROCADM3 - fls. 116/117).
Com efeito, segundo apanho do relato da inicial e do exame dos documentos que a acompanham (OUT8 e OUT21), após ter seu pedido de aposentadoria especial deferido, inclusive com publicação no Diário Oficial, o autor foi informado pela Coordenadora de Aposentadorias da Universidade Federal de Santa Catarina de que o ato de aposentadoria fora tornado sem efeito, com determinação de retorno ao trabalho em 15 (quinze) dias, porquanto, segundo se entendeu naquela via, não há nos autos a descrição detalhada das atividades desenvolvidas pelo servidor.
Pois bem, a respeito do direito à aposentadoria especial do servidor público, assim dispõe a Constituição Federal:
Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)
(...)
§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
I - portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
II - que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
III - cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
O texto constitucional estatui que não haverá aposentadoria especial para o servidor público até o advento de lei complementar que defina os requisitos e critérios diferenciadores. Trata-se, pois, de norma não auto-aplicável, cuja integração compete ao Poder Legislativo e se faz por iniciativa privativa do Presidente da República (61, § 1º, II, da CF/88).
Sendo assim, não poderia o Judiciário determinar a concessão de espécie de benefício não previsto em lei, sob pena de invadir a atribuição específica dos Poderes Legislativo e Executivo, em manifesta afronta ao princípio da separação de poderes.
Contudo, no caso específico do autor, em que pede a concessão/manutenção de "aposentadoria especial", ocorre hipótese excepcional a ser examinada, porquanto a Suprema Corte vem admitindo a concessão do benefício mediante a aplicação integrativa do art. 57 da Lei 8.213/91, como determinado, por exemplo, quando do julgamento do Mandado de Injunção nº. 2.102, que apreciou situação semelhante.
Colhe-se do site da referida Corte Suprema as informações referentes ao Mandado de Injunção n. 2.102, onde foi deferida a pretensão do impetrante nos seguintes termos:
"concedo, em parte, a ordem injuncional para, declarando a mora legislativa na regulamentação do art. 40, § 4º, da Carta Magna, assegurar à impetrante o direito de ter o seu pedido administrativo de aposentadoria especial concretamente apreciado pela autoridade competente, mediante a aplicação integrativa do art. 57 da Lei 8.213/91. Comunique-se à autoridade impetrada. Publique-se. Arquive-se."
Claramente, o egrégio Supremo Tribunal Federal em situação idêntica reconheceu a mora legislativa para tratar do assunto e disciplinou, para o caso em apreço, a utilização do artigo 57, § 1º, da Lei n. 8.213/91.
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício.
§ 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49.
§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado.
§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.
§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício.
§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput.
§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.
O Mandado de Injunção antes referido, cujos fundamentos adoto como razão de decidir, repriso, assegurou o exame do direito do servidor público à "aposentadoria especial" com base nas disposições do artigo 57, § 1º, da Lei n. 8.213/91 (com 15, 20 ou 25 anos de tempo de serviço, conforme a hipótese legal).
Tal vem sendo também o entendimento do Tribunal Regiuonal Federal da 4ª Região, a exemplo da decisão que segue:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. POSSIBILIDADE. SÚMULA VINCULANTE nº 33. APLICAÇÃO. 1. No caso em apreço, tendo em vista que o autor computa mais de 25 anos de serviço público exercidos em condições especiais, é de ser concedida a segurança para que seja analisado o seu pedido de aposentadoria especial, computando-se todos os períodos exercidos em condições especiais, mesmo que anteriores à posse no cargo em que se dará a jubilação. 2. Desnecessário que os 25 anos de atividade especial sejam no cargo em que se dará a aposentadoria, visto que tal argumento de apelação não encontra amparo legal e/ou jurisprudencial. A Súmula Vinculante nº 33 e as inúmeras decisões do STF em sede de mandados de injunção não trazem tal requisito, tampouco o art. 57 da Lei 8.213/91, que é o regramento aplicável ao caso. (TRF4, APELREEX 5003565-59.2015.404.7000, TERCEIRA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 29/02/2016)
Pois bem, no que se refere ao reconhecimento de especialidade, é de se observar, inicialmente, que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente prestado, adquirindo o segurado direito à contagem e à comprovação na forma então exigida, não se aplicando retroativamente a lei que estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Para o enquadramento das categorias profissionais por presunção legal de penosidade, periculosidade e insalubridade devem ser observados os Decretos nº. 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte) e nº. 83.080/79 (Anexo II) até a data da entrada em vigor da Lei nº. 9.032, de 28.04.1995, que eliminou referida presunção. Por outro lado, para o enquadramento dos agentes prejudiciais à saúde do segurado, devem ser considerados os Decretos nº. 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte) e nº. 83.080/79 (Anexo I) até 05.03.1997, quando passou a vigorar o decreto nº. 2.172/97 (Anexo IV).
Consoante a orientação pacificada no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, além dos mencionados casos de enquadramento, é possível, ainda, a verificação do exercício de atividades especiais, por meio da aplicação da Súmula nº. 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos que assim dispõe: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento."
A documentação exigida para a comprovação do desenvolvimento de atividades sujeitas a condições nocivas é diversificada e encontra-se definida na legislação vigente à época da prestação laboral, consoante já salientado.
Para as atividades exercidas até a entrada em vigor da Lei nº 9.032, de 28.04.1995, é possível o reconhecimento da especialidade da atividade quando demonstrada a exposição a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para o agente ruído, que exige a aferição do nível de decibéis por meio de perícia técnica). Após a edição da mencionada lei, foi extinto o enquadramento por categoria profissional, tornando-se necessária também para estes segurados a demonstração da exposição efetiva a agentes prejudiciais de forma permanente, não ocasional nem intermitente, por qualquer meio de prova. Com a edição do decreto nº 2.172, de 05.03.1997 passou-se a exigir, para fins de reconhecimento da especialidade de modo geral, a comprovação da efetiva exposição do segurado a agentes agressivos, por meio da apresentação de formulário de informações, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Relativamente ao agente ruído, é importante esclarecer que o Anexo ao decreto nº. 53.831, de 25 de março de 1964, estabeleceu que a atividade será caracterizada como especial quando a efetiva exposição do trabalhador ao ruído for superior a 80 decibéis. Referido nível mínimo foi elevado para 90 decibéis por ocasião da edição do decreto nº. 83.080, de 24 de janeiro de 1979.
Este critério foi mantido até a edição do decreto nº. 611, de 21 de julho de 1992, que, ao regulamentar a Lei nº. 8.213/91 reiterou o disposto nos Anexos I e II, do decreto nº. 83.080/79 e no Anexo do decreto nº. 53.831/64, conferindo-lhes vigência simultânea, conforme o disposto em seu art. 292, in verbis:
"Art. 292. Para efeito de concessão das aposentadorias especiais serão considerados os Anexos I e II do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo decreto nº. 83.080, de 24 de janeiro de 1979, e o Anexo do decreto nº. 53.831, de 25 de março de 1964, até que seja promulgada a lei que disporá sobre as atividades prejudiciais à saúde e à integridade física".
Desta forma, por força de referida norma repristinadora, passou a ser considerada insalubre a atividade exposta permanentemente ao ruído com nível superior a 90 decibéis (Anexo, I, Código 1.1.5, decreto nº. 83.080/79), como também ao ruído com nível superior a 80 decibéis (Anexo ao decreto nº. 53.832/64).
A partir de 06 de março de 1997, com a edição do decreto nº. 2.172/97, substituído pelo decreto nº. 3.048/99, o nível exigido para o reconhecimento da insalubridade passou a ser o superior a 90 decibéis.
Após 18.11.2003, consideram-se nocivos os níveis de ruídos superiores a 85 decibéis, nos termos da alteração trazida pelo decreto nº. 4.882/03 ao decreto nº. 3.048/99.
Entretanto, considerando-se que o novo critério de enquadramento da atividade especial definido pelo decreto nº. 4.882/03 veio a beneficiar os segurados expostos ao agente ruído no ambiente de trabalho, bem como tendo em vista o caráter social do direito previdenciário, é cabível a aplicação retroativa da disposição regulamentar mais benéfica, reconhecendo-se a especialidade da atividade quando exercida com exposição a níveis de ruído superiores a 85 decibéis, desde 06.03.1997, data da vigência do decreto nº. 2.172/97.
É importante salientar que é pacífico o entendimento do Tribunal Regional da 4ª Região, bem como do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que os equipamentos de proteção individual não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovada a sua efetividade por meio de laudo pericial e desde que devidamente demonstrado o uso permanente pelo trabalhador durante a integralidade da jornada de trabalho, o que não restou comprovado nos presentes autos, como será visto adiante.
Esclarecidos tais pontos, passo à análise do período especial postulado, com base nos formulários e laudos periciais juntados aos autos.
Do caso concreto
A ficha de registro de empregado juntada no evento 28 - PROCADM3 - fls. 18/19, mostra que o autor foi contratado pela Universidade Federal de Santa Catarina em 26 de janeiro de 1988, para exercer o cargo de Médico, cujo vínculo perdurou até o jubilamento em 2015.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, subscrito pela Diretora do Departamento de Administração de Pessoal da Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC (evento 28 - PROCADM3 - fls. 84/85), comprova o labor do autor na aludida atividade de Médico entre 26 de janeiro de 1988 até 25 de junho de 2015, estando exposto ao fator de risco "biológico", sem a indicação de utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI.
Vê-se, portanto, que a Universidade Federal de Santa Catarina averbou nos assentamentos funcionais do servidor todo o período laborado na condição de Médico, anteriormente e posteriormente ao Regime Jurídico Único, atestando a exposição ao fator de risco no ínterim pleiteado.
De outro lado, o autor juntou aos autos vários Laudos Periciais produzidos em seu local de trabalho (Hospital Universitário da UFSC), que demonstram a habitual e efetiva exposição ao agente nocivo de natureza biológica (contato direto com pacientes e seus fluídos orgânicos, como sangue, secreção, etc.), a exemplo daqueles anexados ao evento 1 - LAUDO15/20.
Analisando a legislação aplicável à época, qual seja, os Anexos aos Decretos nº. 53.831/64 (item 1.3.2), nº. 83.080/79 (item 1.3.4) e 2.172/97 e nº. 3.048/99 (item 3.0.1), verifico que a atividade com exposição a agentes biológicos, como aquela desenvolvida pelo autor na condição de médico em estabelecimentos hospitalares nos períodos compreendidos entre 26 de janeiro de 1988 e 25 de junho de 2015, permitem o enquadramento como laborado em condição especial.
Neste sentido, as seguintes decisões:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO AUSENTE. MÉRITO CONTESTADO. DECRETOS Nº 83.080/79 E 53.831/64. LEI Nº 9.032/95. MÉDICO. CONDIÇÃO ESPECIAL PRESUMIDA ATÉ A PROMULGAÇÃO DA LEI Nº 9.032/95. CTPS. PPP. PROVA TESTEMUNHAL. SEGURADO AUTÔMONO. ARTS. 57 E 58 DA LEI Nº 8.213/91. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Em se tratando de benefícios previdenciários, necessário o prévio requerimento administrativo, a fim de gerar o conflito de interesses, legitimando, assim, o ingresso perante o Poder Judiciário, apesar do princípio constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional. 2. Entretanto, uma vez apresentada resistência à pretensão autoral, através de contestação ao mérito, formada está a lide, sendo necessária a intervenção do Poder Judiciário. 3. É devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, quando comprovado por prova documental - CTPS, DSS-8030, Laudo de Perícia Técnica, PPP, LTCAT - que a atividade exercida enquadra-se nos decretos n.º 53.831/64 83.080/79, 611/92, 2.172.97 e 3.048/99. 4. A qualificação do tempo de serviço como especial para efeito de sua conversão em tempo comum ou para concessão de aposentadoria especial se dá de acordo com a legislação em vigor à época da prestação do serviço. 5. Para o reconhecimento das condições especiais em que foi prestado o serviço pelo segurado, para fins de aposentadoria especial, até a vigência da Lei nº 9032/95, não se fazia necessária a apresentação de laudos periciais para comprovar a sua exposição aos agentes nocivos à saúde e à integridade física, bastando para tanto a previsão dos referidos agentes nos Anexos aos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. 6. Com edição da Lei nº 9032, de 28.04.95, o legislador ordinário passou a condicionar o reconhecimento do tempo de serviço em condições especiais à comprovação da exposição efetiva aos agentes nocivos à saúde e à integridade física do segurado, para fins de aposentadoria especial, que se dava através dos formulários SB-40 e DSS-8030. 7. Após a edição da Medida Provisória nº 1523, de 11.10.96, posteriormente convertida na Lei nº 9528, de 10.12.97, passou-se a exigir a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, através de formulário emitido pela empresa, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. 8. Insalubridade demonstrada. Exposição a raio x, vírus, bactérias e fungos. 9. Segurado autônomo faz jus ao recebimento de aposentadoria especial. Impossibilidade de distinção. Arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91. Precedentes. 10. Honorários advocatícios mantidos em R$ 1.000,00 (um mil reais). 11. Apelação não provida.(AC 00072398620104058000, Desembargador Federal Marcelo Navarro, TRF5 - Terceira Turma, DJE - Data::02/07/2013 - Página::413.)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. EXPOSIÇÃO. CONVERSÃO INVERSA. APOSENTADORIA ESPECIAL. 1. A exposição a agentes biológicos é prejudicial à saúde, ensejando o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 2. Segundo a jurisprudência dominante deste Tribunal, a exposição a agentes biológicos não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco de contração de doenças (EIAC nº 1999.04.01.021460-0, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ de 05-10-2005). 3. O uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, por si só, não elide os efeitos nocivos de atividade sujeita à exposição a agentes nocivos. No caso, conquanto os documentos façam referência ao uso de EPI, não restou comprovado nos autos o efetivo fornecimento, pela empresa, do referido dispositivo, tampouco demonstrado o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. 4. O tempo comum trabalhado antes da Lei 9.032/95 é possível de ser convertido em tempo especial, a chamada "conversão inversa". Ressalvado entendimento do Relator. 5. Preenchidos os requisitos legais, tem a segurada direito à concessão da aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo. (TRF4, AC 5004330-84.2012.404.7113, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Paulo Paim da Silva, D.E. 16/09/2013)
- Da aposentadoria especial.
Desse modo, para fazer jus ao benefício de aposentadoria especial, pedido expresso do autor na inicial, deve o segurado preencher os requisitos exigidos pelo artigo 57 da Lei nº. 8.213/91 (de aplicação integrativa por força do decidido no Mandado de Injunção nº. 2.102, que adoto como razão de decidir), in verbis:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
§ 1º. A aposentadoria especial, observado o disposto no artigo 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício.
Depreende-se da análise do dispositivo legal acima transcrito que para a concessão do benefício de aposentadoria especial o autor deverá comprovar além do cumprimento da carência prevista nos artigos 24 e 142 da Lei 8.213/91, o exercício de atividades em condições especiais durante 15 (quinze), 20 (vinte), ou 25 (vinte e cinco) anos.
No caso em comento, o autor exerceu atividade sujeita a condições especiais, com tempo de exposição previsto em 25 anos, nos períodos de 26 de janeiro de 1988 e 25 de junho de 2015 (anteriores e posteriores ao Regime Jurídico Único, averbados nos assentamentos funcionais do servidor), tal como reconhecido nestes autos, preenchendo, portanto, os requisitos necessários para a concessão da "aposentadoria especial", eis que laborou em atividades sujeitas a esta condição de forma exclusiva por tempo superior a 25 anos, não havendo falar em preenchimento de requisito etário.
Em conclusão, reconhecido o direito ao benefício, à Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC cabe mantê-lo, em juízo de procedência do pedido, observando que inexiste pedido de pagamento de parcelas atrasadas.
A sentença deve ser mantida.
Nos Mandados de Injunção, julgados pelo STF, foi reconhecida a falta de norma regulamentadora do direito à aposentadoria especial dos servidores públicos, removido o obstáculo criado por essa omissão e, supletivamente, tornou viável o exercício do direito consagrado no artigo 40, § 4º, da Constituição do Brasil, nos termos do artigo 57 da Lei 8.213/91.
Já quanto à prova da sujeição aos agentes agressivos, consta nos autos, PPP, subscrito pela Diretora do Departamento de Administração de Pessoal da Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC, comprova a sujeição do autor aos agentes biológicos, no período de 26 de janeiro de 1988 a 25 de junho de 2015.
Além disso, o autor junta no evento1, laudo 15 ao 20, realizado nas dependências do hospital universitário, demonstrando a sujeição a agentes biológicos, de forma habitual e permanente.
Desse modo, mantenho a sentença que reconheceu o direito de o autor obter aposentadoria especial.
Em face do artigo 85, § 11 do NCPC, majoro os honorários advocatícios para 12 %.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da UFSC.
Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/04/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007140-23.2016.4.04.7200/SC
ORIGEM: SC 50071402320164047200
RELATOR | : | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE |
PRESIDENTE | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PROCURADOR | : | Dr. Domingos Sávio Drech da Silveira |
APELANTE | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC |
APELADO | : | RENATO ANTONIO MACIEL |
ADVOGADO | : | Maíra Wollinger Maciel |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/04/2017, na seqüência 373, disponibilizada no DE de 27/03/2017, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UFSC.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE |
: | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR | |
: | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
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