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ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA. ATO COMPLEXO. REGISTRO NO TCU. DECADÊNCIA. ARTIGO 54 DA ...

Data da publicação: 07/07/2020, 08:34:35

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA. ATO COMPLEXO. REGISTRO NO TCU. DECADÊNCIA. ARTIGO 54 DA LEI Nº 9.784/1999. NÃO OCORRÊNCIA. 1. No tocante à decadência do direito da Administração de revisar seus atos, é firme na jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal o entendimento no sentido de que o prazo quinquenal, previsto no artigo 54 da Lei n.º 9.784/99, tem início somente após o registro do ato de concessão de aposentadoria ou pensão junto ao Tribunal de Contas da União, por se tratar de ato complexo, para cuja perfectibilização é imprescindível a ulterior chancela do órgão de controle externo, embora produza, desde logo, efeitos financeiros 2. Considerando que entre a data da decisão do TCU e a comunicação ao autor não houve o transcurso do prazo decadencial de 5 (cinco) anos, não há que se falar em decadência do direito da Administração Pública de rever o ato em questão. (TRF4, AC 5001733-50.2018.4.04.7205, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 27/09/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001733-50.2018.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

APELANTE: FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE - FUNASA (RÉU)

APELADO: LIRIO PORFIRIO (AUTOR)

ADVOGADO: JOSE AUGUSTO PEDROSO ALVARENGA (OAB SC017577)

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária ajuizada por LIRIO PORFIRIO em face da FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE - FUNASA por meio da qual busca seja declarada a ilegalidade do ato administrativo que determinou a desaverbação do tempo de serviço rural (01/01/1966 a 25/01/1972) devido à falta de contribuições no período de atividade, em decorrência da decadência. Postula seja reconhecida a desnecessidade de realizar recolhimento de contribuição previdenciária de tal lapso, em razão da segurança jurídica.

Sentenciando, o juízo a quo assim decidiu:

Ante o exposto, confirmando a tutela de urgência deferida (EVENTO5), JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, com resolução do mérito (art. 487, II, do CPC/15), para, declarando a nulidade da decisão proferida nos autos do processo do Tribunal de Contas da União TC-011.3336/2007-5 que excluiu do tempo de serviço prestado pelo autor o período relativo ao trabalho rural (01/01/1966 a 25/01/1972), determinar o restabelecimento do benefício de aposentadoria integral aos moldes em que inicialmente concedido.

Condeno a FUNASA ao pagamento de custas e honorários advocatícios ao patrono do autor, estes que fixo no percentual mínimo previsto nos incisos I a V do § 3º do art. 85 do CPC, atualizado pelo IPCA-E, devendo a parte fazer o devido enquadramento após apurar o montante devido, nos termos do art. 85, § 4º, II e IV, e § 5º do CPC.

Deixo de condenar a FUNASA à restituição de eventuais valores pagos a menor devido a proporcionalização da aposentadoria porquanto não há nos autos qualquer comprovação de que referida redução tenha sido implementada administrativamente.

Sentença não sujeita ao reexame necessário (artigo 496, §3º, inciso I, do CPC/15).

Inconformada, a FUNASA interpôs apelação alegando a inocorrência da decadência, uma vez que o ato de concessão de aposentadoria ou pensão junto ao Tribunal de Contas da União, por se tratar de ato complexo, exige, para cuja perfectibilizarão, a ulterior chancela do órgão de controle externo, embora produza, desde logo, efeitos financeiros. Defende que o TCU, em respeito às garantias constitucionais firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no Mandado de Segurança nº 25.116, garantiu ao autor o devido processo legal quando da análise de sua aposentadoria, de modo que não há qualquer ato da autarquia e do TCU eivado de nulidade, não havendo, consequentemente, afronta ao princípio da segurança jurídica, assim como qualquer decadência a ser declarada.

Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Da decadência

Como é sabido, os atos exarados pela Administração, por intermédio de seus agentes, podem ser por esta revistos, constituindo-se essa prerrogativa em um poder-dever. Todavia, a revisão não pode ser levada a efeito indefinidamente, devendo ser realizada dentro de um certo lapso de tempo, desde que haja imposição de interesse público relevante, por critério de conveniência e oportunidade, ou, ainda, a verificação de um vício que acarrete a ilegalidade ou ilegitimidade deste mesmo ato, tendo lugar, no primeiro caso, a revogação, e, no último, a anulação do ato administrativo (Súmula nº 473 do STF).

Registre-se, no entanto, que a anulação do ato administrativo de ofício pela Administração está condicionada a alguns requisitos, dentre os quais se destaca o prazo para que o ato ilegal seja tornado nulo, tendo em vista que os atos dimanados da Administração não podem ficar indefinidamente sujeitos à supressão da órbita jurídica, em respeito à imperiosa necessidade de segurança e estabilidade das relações jurídicas, bem como aos possíveis efeitos gerados a terceiros de boa-fé, excluídas as situações de má-fé, aqui inclusos os casos que envolvam fraude.

Esta necessidade de obediência a prazo estabelecido para a revisão do ato administrativo nulo é já de longa data reconhecida pela doutrina e jurisprudência, tendo-se afirmado que o princípio da boa-fé ou da confiança do administrado na Administração Pública e vice-versa - descendente direto do princípio da moralidade - deve ocupar lugar de destaque em qualquer classificação dos princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito (...), sendo que a respeitabilidade do princípio da boa-fé, do princípio da segurança das relações jurídicas e a relativização do princípio da legalidade, conjugadamente, implicam a fixação de limites substanciais à cogência da anulação dos atos administrativos, tanto à Administração quanto ao Poder Judiciário (...) (JUAREZ FREITAS, Estudos de Direito administrativo, p. 29).

Com efeito, o art. 53 e 54 da Lei n° 9.784/99, disciplina matéria nos seguintes termos:

"Art. 53. A administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé."

Nessa senda, a Administração terá o prazo de 5 (cinco) anos para proceder à revisão, contados da data em que foram praticados, decorrido o qual será o ato convalidado, não cabendo reavaliações, uma vez que operada a coisa julgada administrativa ou preclusão das vias de impugnação interna.

Contudo, no tocante à decadência do direito da Administração de revisar seus atos, é firme na jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal o entendimento no sentido de que o prazo quinquenal, previsto no artigo 54 da Lei n.º 9.784/99, tem início somente após o registro do ato de concessão de aposentadoria ou pensão junto ao Tribunal de Contas da União, por se tratar de ato complexo, para cuja perfectibilização é imprescindível a ulterior chancela do órgão de controle externo, embora produza, desde logo, efeitos financeiros.

Nesse sentido os seguintes precedentes:

ADMINISTRATIVO. PENSÃO. REVISÃO. DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADA. Não há se falar em decadência do direito da Administração de rever o ato de concessão de pensão, porque o prazo quinquenal, previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/99, tem início somente após o seu registro junto ao Tribunal de Contas da União. Com efeito, trata-se de ato complexo, para cuja perfectibilização é imprescindível a ulterior chancela do referido órgão (que, no caso, não ocorreu), embora produza, desde logo, efeitos financeiros (sob condição resolutiva). Tampouco, ainda que o benefício ostente natureza alimentar e a apelante seja pessoa idosa, há direito adquirido ou ato jurídico perfeito contra legem (artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal), nem afronta a direito à vida e à saúde física e mental (Lei n.º 10.741/03), inclusive porque houve apenas a redução e não a suspensão ou o cancelamento do benefício. (TRF4, 4ª Turma, Apelação/Reexame Necessário nº 5002805-09.2012.404.7100, Rel. Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, D.E. 26/06/2013 - grifei)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APRECIAÇÃO DA LEGALIDADE DO ATO DE CONCESSÃO INICIAL DE APOSENTADORIA. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA SE PASSADOS MAIS DE CINCO ANOS DAQUELE ATO. INAPLICABILIDADE AO CASO DA DECADÊNCIA PREVISTA NO ART. 54 DA LEI 9.784/99.

I - Nos termos dos precedentes firmados pelo Plenário do STF, não se opera a decadência prevista no art. 54 da Lei 9.784/99 no período compreendido entre o ato administrativo concessivo de aposentadoria ou pensão e o posterior julgamento de sua legalidade e registro pelo Tribunal de Contas da União - que consubstancia o exercício da competência constitucional de controle externo (art. 71, III, CF).

II - A recente jurisprudência consolidada do STF passou a se manifestar no sentido de exigir que o TCU assegure a ampla defesa e o contraditório nos casos em que o controle externo de legalidade exercido pela Corte de Contas, para registro de aposentadorias e pensões, ultrapassar o prazo de cinco anos, sob pena de ofensa ao princípio da confiança - face subjetiva do princípio da segurança jurídica.

III - Nesses casos, o prazo de 05 (cinco) anos deve ser contado a partir da data de chegada ao TCU do processo administrativo de aposentadoria ou pensão encaminhado pelo órgão de origem para julgamento da legalidade do ato concessivo de aposentadoria ou pensão e posterior registro pela Corte de Contas. (TRF4, 4ª Turma, AGRAVO DE INSTRUMENTO n° 5006429-26.2012.404.0000, Relator Juiz LORACI FLORES DE LIMA, j. 26/06/2012, D.E. 27/06/2012 - grifei).

Mandado de Segurança. 2. Acórdão da 2ª Câmara do Tribunal de Contas da União (TCU). Competência do Supremo Tribunal Federal. 3. Controle externo de legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões. Inaplicabilidade ao caso da decadência prevista no art. 54 da Lei 9.784/99. 4. Negativa de registro de aposentadoria julgada ilegal pelo TCU. Decisão proferida após mais de 5 (cinco) anos da chegada do processo administrativo ao TCU e após mais de 10 (dez) anos da concessão da aposentadoria pelo órgão de origem. Princípio da segurança jurídica (confiança legítima). Garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Exigência. 5. Concessão parcial da segurança. I - Nos termos dos precedentes firmados pelo Plenário desta Corte, não se opera a decadência prevista no art. 54 da Lei 9.784/99 no período compreendido entre o ato administrativo concessivo de aposentadoria ou pensão e o posterior julgamento de sua legalidade e registro pelo Tribunal de Contas da União - que consubstancia o exercício da competência constitucional de controle externo (art. 71, III, CF). II - A recente jurisprudência consolidada do STF passou a se manifestar no sentido de exigir que o TCU assegure a ampla defesa e o contraditório nos casos em que o controle externo de legalidade exercido pela Corte de Contas, para registro de aposentadorias e pensões, ultrapassar o prazo de cinco anos, sob pena de ofensa ao princípio da confiança - face subjetiva do princípio da segurança jurídica. Precedentes. III - Nesses casos, conforme o entendimento fixado no presente julgado, o prazo de 5 (cinco) anos deve ser contado a partir da data de chegada ao TCU do processo administrativo de aposentadoria ou pensão encaminhado pelo órgão de origem para julgamento da legalidade do ato concessivo de aposentadoria ou pensão e posterior registro pela Corte de Contas. IV - Concessão parcial da segurança para anular o acórdão impugnado e determinar ao TCU que assegure ao impetrante o direito ao contraditório e à ampla defesa no processo administrativo de julgamento da legalidade e registro de sua aposentadoria, assim como para determinar a não devolução das quantias já recebidas. V - Vencidas (i) a tese que concedia integralmente a segurança (por reconhecer a decadência) e (ii) a tese que concedia parcialmente a segurança apenas para dispensar a devolução das importâncias pretéritas recebidas, na forma do que dispõe a Súmula 106 do TCU. (STF, Tribunal Pleno, MS 24781, Relator Min. ELLEN GRACIE, Relator p/ Acórdão Min. GILMAR MENDES, julgado em 02/03/2011, DJe-110 DIVULG 08/06/2011 PUBLIC 09/06/2011 - grifei)

Embargos de declaração em mandado de segurança. Decisão monocrática. Conversão em agravo regimental. Negativa de registro de aposentadoria julgada ilegal pelo Tribunal de Contas da União. Inaplicabilidade ao caso da decadência prevista no art. 54 da Lei 9.784/99. Assegurado o direito ao contraditório e à ampla defesa. 1. Esta Suprema Corte possui jurisprudência pacífica no sentido de que o Tribunal de Contas da União, no exercício da competência de controle externo da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadorias, reformas e pensões (art. 71, inciso III, CF/88), não se submete ao prazo decadencial da Lei nº 9.784/99, iniciando-se o prazo quinquenal somente após a publicação do registro na imprensa oficial. 2. O TCU, em 2008, negou o registro da aposentadoria do ora recorrente, concedida em 1998, por considerar ilegal "a incorporação de vantagem de natureza trabalhista que não pode subsistir após a passagem do servidor para o regime estatutário". Como o ato de aposentação do recorrente ainda não havia sido registrado pelo Tribunal de Contas da União, não há que se falar em decadência administrativa, tendo em vista a inexistência do registro do ato de aposentação em questão. 3. Sequer há que se falar em ofensa aos princípios da segurança jurídica, da boa-fé e da confiança, pois foi assegurado o ao recorrente o direito ao contraditório e à ampla defesa, fato apresentado na própria inicial, uma vez que ele apresentou embargos de declaração e também pedido de reexame da decisão do TCU. 4. Agravo regimental não provido.(STF, 1ª Turma, MS 27746 ED, Relator Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 12/06/2012, DJe-176 DIVULG 05/09/2012 PUBLIC 06/09/2012 - grifei)

No caso em tela, a aposentadoria por tempo de serviço foi concedida ao autor em 25/06/1998 (DOU de 02/07/1998 - Evento 1, OUT10, pg. 59), sendo posteriormente alterada através da Portaria n. 74 de 30/08/2001, em cumprimento ao Mandado de Segurança n. 72.002207-5, que determinou a inclusão de tempo de serviço especial (Evento 10, OUT5). A negativa de registro do ato pelo Tribunal de Constas da União efetivou-se em 05/12/2017, nos termos do Acórdão nº 11.234/2017 (Evento 1, OUT 8), no julgamento do processo n.º 011.336/2007-5, autuado em 03/05/2007, conforme consulta realizada no site do TCU.

Portanto, considerando que o prazo decadencial tem início somente após o registro do ato de concessão de aposentadoria junto ao Tribunal de Contas da União, bem como que entre a data da decisão do TCU (05/12/2017 - Evento 1, OUT 8) e a comunicação ao autor não houve o transcurso do prazo decadencial de 5 (cinco) anos, não há que se falar em decadência do direito da Administração Pública de rever o ato em questão.

Desse modo, não ocorreu a decadência para a Administração revisão operada, merecendo reforma a sentença no ponto.

Ressalto, outrossim, em relação ao fundamento da recusa de registro do ato de aposentadoria, qual seja, a ausência de recolhimentos das contribuições previdenciárias, a questão não merece maiores digressões.

Em consulta ao Sistema Informatizado, constata-se que o autor, por meio do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Federal no Estado de Santa Catarina - SINTRAFESC, ajuizou ação anterior sob n. 2000.72.00.005086-1, objetivando o reconhecimento da legitimidade do período de trabalho rural prestado em regime de economia familiar, mantendo-se intacta a certidão pelo INSS, bem como sua aposentadoria junto à Fundação Nacional de Saúde.

A ação foi julgada parcial procedente para o fim de manter para todos os efeitos a certidão de tempo de serviço que lhe foi concedida, inclusive, sua aposentadoria estatutária, sem prejuízo da cobrança da indenização relativa ao período rural levado em conta para o deferimento do beneficio. Interposto recurso por ambas as partes, a sentença foi mantida por esta Corte no que se refere ao autor desta ação, tendo posteriormente sido confirmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 548.071. Confiram-se os termos do julgado desta Corte:

Tratando-se de servidores públicos, como no caso dos substituídos, que possuem regime próprio de previdência, a hipótese é de contagem recíproca, sendo exigível a indenização das contribuições previdenciárias relativas ao tempo de serviço rural correspondente.

A contagem recíproca do tempo de serviço, instituto previdenciário segundo o qual o segurado que esteve vinculado a diferentes sistemas previdenciários (público e privado) pode obter o benefício nos moldes de um único regime, somando-se os tempos em que laborou sob cada um deles, está inserta na Constituição Federal, no § 9º do art. 201, o qual prevê expressamente a compensação financeira entre os regimes previdenciários envolvidos. Veja-se:

"§ 9º Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca de tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes da previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei."

A Lei n.º 8.213/91, por sua vez, preconiza, em seu art. 94:

"Art. 94. Para efeito dos benefícios previstos no RGPS, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente."

Assim, cuidando-se da soma de tempo trabalhado sob regimes previdenciários distintos, deve haver o recolhimento das contribuições do tempo rural, já que a Constituição Federal exige a compensação financeira entre os regimes, nos termos do aludido § 9º do art. 201.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIN n° 1.664/UF, afastou a necessidade de indenização do período rural quando se tratar do Regime Geral da Previdência (atividade privada urbana + atividade rural), mantendo tal restrição, entretanto, em relação ao tempo de serviço público.

Desta forma, da análise dos dispositivos citados, tem-se que o cômputo de tempo de serviço rural para efeito de aposentadoria no serviço público pela contagem recíproca somente pode ser efetivado mediante a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias realizadas no período rural, ou a respectiva indenização.

É que, embora o art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91 tenha garantido ao trabalhador rural (segurado especial) a contagem do tempo de serviço independentemente do pagamento de contribuições, isto somente se dá quando se busca a aposentadoria como rurícola, nos moldes do art. 143 da mesma lei, ou na atividade urbana do regime geral. O mesmo não ocorre quando o que se pretende é o cômputo do tempo rural para obtenção de aposentadoria como servidor público, estatutário.

Neste sentido, os seguintes julgados do STJ e desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO. SERVIDOR PUBLICO ESTADUAL. APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO NA ATIVIDADE RURAL. CF, § 2º, ART 202. ARTIGO 55, § 2, DA LEI 8.213/91. MEDIDA PROVISÓRIA N.º 1.523/96. AUSÊNCIA DE PROVA DE CONTRIBUIÇÃO. - A regra da reciprocidade inscrita no parágrafo 2º do artigo 202, da Carta da República, assegura, para fins de aposentadoria, a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada mediante um sistema de compensação financeira. - A utilização do tempo de serviço prestado como trabalhador rural antes da entrada em vigor da Lei 8.2131/91, para fins de contagem recíproca, condiciona-se, segundo a letra do artigo 55, § 2" à comprovação do recolhimento das contribuições sociais do período de referência, como preconizado na redação que lhe foi conferida pela Medida Provisória n' 1.523196. - Precedentes. - Recurso ordinário desprovido. (ROMS n.º 9945-SC, 6ª Turma, Rel. Min. Vicente Leal, in DJ de 18-11-2002, p. 292)

RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA. SERVIÇO PÚBLICO. ATIVIDADE RURAL. CONTRIBUIÇÃO. I - Segundo precedente do colendo Supremo Tribunal Federal, 'a aposentadoria na atividade urbana mediante junção do tempo de serviço rural somente é devida a partir de 5 de abril de 1991, isto por força do disposto no artigo 145 da Lei 8.213/91, e na Lei 8.212/91, no que implicaram a modificação, estritamente legal, do quadro decorrente da Consolidação das Leis da Previdência Social - Decreto n.º 89.312/84. II - Para fins de aposentadoria no serviço público, a contagem recíproca admitida é a do tempo de contribuição no âmbito da iniciativa privada com a do serviço público, não se podendo confundir, destarte, com a simples comprovação de tempo de serviço. III - Indispensáveis, portanto, as contribuições pertinentes ao tempo em que exercida a atividade privada. (REsp n.º 297582-SC, Rel. Min. Félix Fischer, j. 06-04-2001)

PREVIDENCIÁRIO. DECLARATÓRIA. CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. SERVIDOR PÚBLICO. CONTAGEM RECÍPROCA DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR E PÚBLICO, PARA FINS DE APOSENTADORIA. NECESSIDADE DE INDENIZAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES. Para que possa haver contagem recíproca do tempo de serviço exercido na atividade rural anterior ao advento da nova Lei n.º 8.213/91 e público, para fins de aposentadoria neste regime, faz-se mister a indenização do valor relativo às contribuições previdenciárias. Inteligência do art. 201, § 9º da CF e dos arts. 55, § 2º, e 96, IV, da referida lei. Precedentes do STF, do STJ e do TRF da 4ª Região. (AC n.º 2001.04.01.085337-0, Rel. Juiz Paulo Afonso Brum Vaz, 5ª Turma, in DJ de 27-02-2002)

E o precedente por mim relatado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONTAGEM RECÍPROCA EM REGIMES DISTINTOS PARA FINS DE APOSENTADORIA. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO. INDENIZAÇÃO. 1. Para que possa haver contagem recíproca do tempo de serviço exercido na atividade rural anterior ao advento da nova Lei n.º 8.213/91 e atividade pública, para fins de aposentadoria neste regime, faz-se mister a indenização do valor relativo às contribuições previdenciárias. (...) (AI n.º 2004.04.01.050638-4/RS, Rel. Des. Fed. Luís Alberto d'Azevedo Aurvalle, 6ª T., un. j. 06-07-05, in DJ 13-07-05)

Portanto, para fins de aposentadoria em regime diverso do geral, deverá necessariamente haver a devida indenização ou a comprovação das contribuições realizadas no período.

Merece ser ressalvado, porém, que, já estando os substituídos em inatividade, deve-se preservar a sua condição de aposentados, sob pena de quebra da estabilidade do sistema, sem impedir o INSS da cobrança das contribuições referentes aos períodos rurais computados. Nessa linha, também já decidiu este Tribunal:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA NO SERVIÇO PÚBLICO. RECOLHIMENTO DAS RESPECTIVAS CONTRIBUIÇÕES. (...) 2. Já tendo sido deferido o benefício da aposentadoria, deve-se, em atenção ao princípio da estabilidade das relações jurídicas, manter o reconhecimento do período de atividade rural, resguardando-se o direito do INSS em postular a cobrança das respectivas contribuições. (AC n.º 2001.71.14.0026389/RS, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 6ª Turma, j. 09-04-2002)

Deve ser destacado, ainda, que anteriormente à edição da Lei nº 8.213/91 não havia previsão legal alguma quanto ao aproveitamento de tempo rural para fins de contagem de tempo de serviço para aposentadoria, independentemente da respectiva contribuição. Assim, a Lei nº 8.213/91 veio para normatizar a situação dos trabalhadores rurais que exerceram a atividade, obviamente em período anterior a sua edição. A Lei nº 8.213/91, no seu art. 55, § 2º, repita-se, consagrou o direito ao aproveitamento do tempo de serviço rural para fins de aposentadoria no Regime Geral da Previdência Social (e tão-só), sem a respectiva contribuição.

Quando a mencionada Lei, na sua Seção VII, trata da "Contagem Recíproca de Tempo de Serviço" entenda-se a contagem de tempo de serviço em regimes diversos (ex. regime público e privado - Regime Geral da Previdência Social e regime estatutário). Refere o art. 96, IV, da Seção VII: "o tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de zero vírgula cinco por cento ao mês, capitalizados anualmente, e multa de dez por cento;" (Redação alterada pela MP nº 2.129-7/01, reeditada até a MP nº 2.187-13/01 e novamente alterada na parte final "com acréscimo de juros moratórios de um por cento ao mês e multa de dez por cento", pela MP 1.523/96, reeditada até ser convertida na Lei 9.528/97). Observe-se que a redação original do citado dispositivo já estabelecia a ressalva de que "o tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com os acréscimos legais;". Nesse sentido tive a oportunidade de me manifestar quando do julgamento do AI nº 2003.04.01.034961-4/RS, DJ de 10-08-05, do qual fui Relator.

Nestes termos, limitando-se esta ação ao reconhecimento da decadência do direito da Administração de revisão do ato administrativo, deve ser dado provimento à apelação da FUNASA, a fim de julgar improcedente os pedidos iniciais.

Dos honorários advocatícios

O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.

Cabe ainda destacar que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.

A partir dessas considerações, tenho que os honorários advocatícios são devidos à taxa de 10% sobre o valor da causa, conforme previsto no art. 85 do novo CPC, suspensa a exigibilidade da verba honorária enquanto perdurar os efeitos da assistência judiciária gratuita.

Conclusão

Reforma-se a sentença para afastar o reconhecimento da decadência.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da FUNASA.



Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001314072v15 e do código CRC c2744679.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 27/9/2019, às 11:6:25


5001733-50.2018.4.04.7205
40001314072.V15


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:34:34.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001733-50.2018.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

APELANTE: FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE - FUNASA (RÉU)

APELADO: LIRIO PORFIRIO (AUTOR)

ADVOGADO: JOSE AUGUSTO PEDROSO ALVARENGA (OAB SC017577)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. REVISÃO Do ato administrativo. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA. ATO COMPLEXO. REGISTRO NO TCU. DECADÊNCIA. ARTIGO 54 DA LEI Nº 9.784/1999. não OCORRÊNCIA.

1. No tocante à decadência do direito da Administração de revisar seus atos, é firme na jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal o entendimento no sentido de que o prazo quinquenal, previsto no artigo 54 da Lei n.º 9.784/99, tem início somente após o registro do ato de concessão de aposentadoria ou pensão junto ao Tribunal de Contas da União, por se tratar de ato complexo, para cuja perfectibilização é imprescindível a ulterior chancela do órgão de controle externo, embora produza, desde logo, efeitos financeiros

2. Considerando que entre a data da decisão do TCU e a comunicação ao autor não houve o transcurso do prazo decadencial de 5 (cinco) anos, não há que se falar em decadência do direito da Administração Pública de rever o ato em questão.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da FUNASA, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 24 de setembro de 2019.



Documento eletrônico assinado por ROGERIO FAVRETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001314073v3 e do código CRC 1c12fe95.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGERIO FAVRETO
Data e Hora: 27/9/2019, às 11:6:25


5001733-50.2018.4.04.7205
40001314073 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:34:34.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 24/09/2019

Apelação Cível Nº 5001733-50.2018.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA

APELANTE: FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE - FUNASA (RÉU)

APELADO: LIRIO PORFIRIO (AUTOR)

ADVOGADO: JOSE AUGUSTO PEDROSO ALVARENGA (OAB SC017577)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 24/09/2019, na sequência 343, disponibilizada no DE de 02/09/2019.

Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA FUNASA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO

Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:34:34.

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