APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001604-71.2015.4.04.7101/RS
RELATOR | : | CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR |
APELANTE | : | FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE - FURG |
APELADO | : | VERA TERESA SPEROTTO BEMFICA |
ADVOGADO | : | HALLEY LINO DE SOUZA |
: | MARIANA LANNES LINDENMEYER |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. CARÁTER ALIMENTAR. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
O caso posto sob análise configura questão pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, tendo restado prevalente o entendimento de que, em razão do princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentar e da boa-fé da parte que recebeu a verba, o pedido de ressarcimento de valores não comporta provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de agosto de 2017.
EDUARDO GOMES PHILIPPSEN
Relator
Documento eletrônico assinado por EDUARDO GOMES PHILIPPSEN, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9064725v5 e, se solicitado, do código CRC 9B41EEA5. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Eduardo Gomes Philippsen |
Data e Hora: | 15/08/2017 10:50 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001604-71.2015.4.04.7101/RS
RELATOR | : | CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR |
APELANTE | : | FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE - FURG |
APELADO | : | VERA TERESA SPEROTTO BEMFICA |
ADVOGADO | : | HALLEY LINO DE SOUZA |
: | MARIANA LANNES LINDENMEYER |
RELATÓRIO
Esta apelação e remessa oficial atacam sentença proferida em ação ordinária, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, que discutiu sobre pedido de que a FURG se abstenha de realizar o desconto pretendido na remuneração da autora, bem como condene a ré à devolução de valores, caso já tenha realizado algum desconto.
O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi deferido para determinar à FURG que se abstenha de proceder os descontos referentes aos valores sobre os quais se funda a ação, até ulterior deliberação (Evento 3).
A sentença julgou procedente o pedido (Evento 40), assim constando do dispositivo:
"Ante o exposto, rejeito as preliminares suscitadas, torno definitiva a decisão antecipatória da tutela e JULGO PROCEDENTE o pedido veiculado na inicial, resolvendo o mérito da demanda, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios em favor da parte autora, os quais arbitro em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil.
Custas, ex lege.
Espécie sujeita a reexame necessário, na forma do art. 475, I, do CPC. Com ou sem recurso voluntário, oportunamente remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal."
Apela a Fundação Universidade Federal do Rio Grande - FURG (Evento 46), alegando sua ilegitimidade passiva "ad causam"; o litisconsórcio passivo necessário com a União; a inexistência de decadência administrativa: relação de trato sucessivo; a modificação do estado de direito: a renovação do prazo decadencial a cada norma; a impossibilidade da Administração Pública manter situações discriminatórias entre servidores; a existência de reestruturações na carreira dos servidores que determinaram a absorção do reajuste em questão e a necessária limitação do pagamento da URP/89 à data das reestruturações das carreiras dos servidores; a inexistência de violação à coisa julgada; a renovação do prazo decadencial a cada nova lei; a ausência de direito adquirido a regime jurídico e a observância da irredutibilidade de vencimentos; a inexistência de decadência administrativa no registro da aposentadoria pelo Tribunal de Contas da União (ato complexo - Jurisprudência pacífica do STF); a ausência de ofensa ao devido processo legal; a inconstitucionalidade e ilegalidade da percepção de valores em vista das recomposições da URP; a disparidades dos cálculos resultante da comparação entre a situação remuneratória do servidor, à época da prolação da sentença, e a situação surgida com a modificação da estrutura remuneratória após o provimento judicial (elementos de fato) e a viabilidade da cobrança dos valores indevidamente recebidos pela parte demandante. Subsidiariamente, requer a reforma da sentença para, no mínimo, excluir o valor recebido todo o mês pelo autor a título de URP, permitindo a retirada pela Administração. Também, subsidiariamente, postula a redução dos honorários advocatícios e defende a aplicabilidade do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997 com a redação determinada pela Lei nº 11.960/2009.
Houve contrarrazões.
O processo foi incluído em pauta.
É o relatório.
VOTO
A discussão posta nestes autos diz respeito a pedido de que a FURG se abstenha de realizar o desconto pretendido na remuneração da autora, bem como condene a ré à devolução de valores, caso já tenha realizado algum desconto.
Remessa oficial
Cabe conhecer da remessa oficial, uma vez que não há condenação em valor certo, afastada a incidência do § 2º do art. 475 do Código de Processo Civil (Súmula/STJ nº 490).
Preliminares
Em relação às preliminares, compartilho do mesmo entendimento manifestado pelo magistrado a quo, juiz federal Sérgio Renato Tejada Garcia, vejamos:
"(...)
Não merece guarida a preliminar de ilegitimidade passiva da FURG.
O princípio da autonomia universitária, previsto no artigo 207 da Constituição Federal, estabelece que "as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão aos princípios de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão". Nessa senda, o poder decisório para a prática de atos administrativos com repercussão sobre proventos, vencimentos ou indenizações é um consectário da aludida autonomia administrativa e de gestão financeira.
Na hipótese dos autos, embora a supressão da parcela salarial tenha sido efetuada em cumprimento de decisão do Tribunal de Contas da União, é a FURG o ente responsável pelo pagamento dos funcionários, e seu dirigente o ordenador de despesas. Logo, está presente a legitimidade passiva ad causam da instituição de ensino, sendo fator irrelevante para conferir legitimidade à União Federal o fato de a Universidade dar cumprimento às decisões do TCU. Sobre a questão, colaciono os seguintes precedentes do e. TRF da 4ª Região:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. BOA-FÉ. ILEGITIMIDADE PASSIVA E LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. DESCABIMENTO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE.
A FURG detém autonomia jurídica, administrativa e financeira, de modo que daí decorre o poder de decisão para a prática dos atos administrativos que deflagrem alteração de proventos ou vencimentos, ou seja, é entidade autônoma e por isso detém legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda e pela mesma razão descabe o litisconsórcio necessário com a união Federal. A matéria não comporta maiores discussões, tendo em vista o entendimento da Terceira Seção do Egrégio STJ quanto aos valores percebidos de boa-fé pelo servidor, no sentido de que "é incabível o desconto das diferenças recebidas indevidamente pelo servidor, em decorrência de errônea interpretação ou má aplicação da lei pela Administração Pública, quando constatada a boa-fé do beneficiado." (REsp n° 645.165/CE, Relatora Ministra Laurita Vaz, in DJ 28/3/2005). (MS 10740/DF, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 09.08.2006, DJ 12.03.2007 p. 197) Majorada a verba honorária para 10% sobre o valor da condenação, cujo valor revela-se suficiente para remunerar o trabalho desenvolvido pelo procurador da parte-autora.
(TRF4, APELREEX 5005710-81.2012.404.7101, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 27/03/2014)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES PERCEBIDOS DE BOA FÉ. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
1. A FURG é parte legítima para figurar no pólo passivo da lide, pois é entidade dotada de autonomia administrativa e financeira, que pratica atos de gestão funcional referentes aos seus servidores, como também de gestão orçamentária e financeira.
2. A jurisprudência dominante inclina-se no sentido de que o servidor público civil ou militar que, de presumida boa-fé, recebeu valores, em decorrência de errônea interpretação ou aplicação de norma legal pela Administração, sem ter influenciado ou interferido na sua concessão, está dispensado de devolver os valores tidos por indevidamente pagos àquele título.
(TRF4, AC 5002319-21.2012.404.7101, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 23/01/2014)
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, em ação ordinária, deferiu em parte medida antecipativa, para suspender o ato que determinou o retorno do impetrante à atividade. A FURG afirma, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, por ser mera executora de determinação emanada pelo TCU. Sustenta a inocorrência de decadência. Tece considerações sobre a ilegalidade do cômputo do tempo de serviço rural anterior a 1991 independentemente do recolhimento de contribuições. Requer a concessão de medida antecipativa. É o relatório. Decido. Legitimidade passiva. O objeto da ação é o reconhecimento de nulidade do ato por meio do qual foi determinado o retorno do agravado à atividade e cassada a sua aposentadoria, o que, a toda evidência, é de responsabilidade exclusiva do ente autárquico. O fato da respectiva Universidade estar dando cumprimento a uma decisão do TCU é irrelevante para conferir legitimidade passiva à união. (...)
(TRF4, AG 5001993-92.2010.404.0000, Quarta Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, juntado aos autos em 15/06/2010)
Logo, está presente a legitimidade passiva ad causam da instituição de ensino, exclusivamente."
Reposição de valores ao erário
A questão já havia sido pacificada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência do Recurso Especial nº 612.101, em 22/11/2006, em que se decidiu não ser cabível a repetição dos valores, quando o pagamento se tiver dado por erro da Administração, e o servidor estiver de boa-fé. Em tal hipótese, assim, os efeitos da correção serão apenas ex nunc. A questão foi novamente decidida, agora em sede de recurso especial repetitivo, conforme acórdão que transcrevo:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ART. 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/90 VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. BOA-FÉ DO ADMINISTRADO. RECURSO SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC. 1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de interpretação equivocada de lei. 2. O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé. 3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público. 4. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido a regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ. 5. Recurso especial não provido. (REsp 1244182/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/10/2012)
Ainda que o recebimento da vantagem não seja devido, uma vez recebida, seja em decorrência de errônea aplicação da lei pela Administração, seja por força de decisão judicial mesmo que precária, seja por erro administrativo quanto à situação de fato, se o servidor a recebeu de boa-fé, não se pode exigir sua restituição. Isso porque a quantia recebida de forma indevida a título de vencimento, remuneração ou vantagens pecuniárias não serve de fonte de enriquecimento, mas de subsistência do servidor e de sua família, devendo, portanto, a ré restituir eventual valor indevidamente descontado.
Desta forma, não há que se falar em obrigação de restituição pela autora de quantias recebidas indevidamente (e de boa-fé) do erário, a título de vencimento ou vantagens pecuniárias. Sobre o assunto, trago à consideração também os seguintes precedentes, grifei:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido da impossibilidade dos descontos, em razão do caráter alimentar dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário, aplicando ao caso o Princípio da Irrepetibilidade dos alimentos. Precedentes. Súmula 83/STJ. 2. No julgamento do Recurso Especial 991.030/RS, de relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, a aludida questão foi pacificada no âmbito desta Corte de Justiça, tendo restado prevalente o entendimento no sentido de que, em razão do princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentar e da boa-fé da parte que recebeu a verba por força de decisão judicial, ainda que precária, o pedido de ressarcimento de valores pugnado pela autarquia não comporta provimento. 3. A decisão agravada, em questão que decidiu de acordo com a interpretação sistemática da legislação, especialmente nos termos do art. 115 da Lei n. 8.112/91, apenas interpretou as normas, ou seja, de forma sistemática, não se subsumindo o caso à hipótese de declaração de inconstitucionalidade sem que a questão tenha sido decidida pelo Plenário. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp 250.894/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 13/12/2012)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VPNI. COMPLEMENTAÇÃO SALÁRIO MÍNIMO. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 431/2008. ARTIGO 37, INCISO XV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IRREDUTIBILIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES AO ERÁRIO. IMPOSSILIDADE. 1. Assentado o entendimento de que o servidor público não tem direito adquirido a regime de remuneração, desde que assegurada a irredutibilidade de seus vencimentos/proventos. 2. Hipótese em que se afigura correta a manutenção da VPNI no contracheque dos autores tal como vinha ocorrendo, uma vez que a alteração legislativa promovida pela Medida Provisória nº 431/2008 não poderia provocar redução nominal de vencimentos àqueles servidores que regularmente percebiam a complementação de salário mínimo sob a sistemática anterior, na medida em que se trata de garantia constitucional. 3. A supressão da rubrica em questão somente poderá ser operada quando houver futura compensação/absorção por outros aumentos remuneratórios. 4. No que concerne à questão da obrigação ou não de o servidor público devolver montante recebido forma indevida, descabida a repetição dos valores, quando o pagamento se tiver dado por iniciativa da própria Administração e configurada a boa-fé do servidor, considerando o caráter alimentar da verba. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006083-46.2011.404.7102, 4ª TURMA, Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/01/2015)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. CARÁTER ALIMENTAR. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O fato de o pagamento não ter se efetuado em decorrência de erro administrativo, mas em face de decisão judicial, não afasta a boa-fé do servidor público. 2. Matéria pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, prevalecendo o entendimento no sentido de que, em razão do princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentar e da boa-fé da parte que recebeu a verba por força de decisão judicial, ainda que precária, o pedido de ressarcimento de valores pugnado não comporta provimento. (AgRg no AREsp 250894/PR, Relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julg. em 04.12.2012, DJe de 13.12.2012). (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5001964-66.2015.404.0000, 3ª TURMA, Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/03/2015)
Por fim, em atenção à apelação da FURG, devo referir que se mostra desnecessária a análise de argumentos relativos à inconstitucionalidade, ilegalidade ou absorção da URP (26,05%), pois a presente demanda trata, exclusivamente, acerca da impossibilidade de repetição dos valores já adimplidos.
Correção monetária e juros de mora
No tópico, merecem parcial provimento a apelação e a remessa oficial, pois comungo do mesmo entendimento do Desembargador Federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior e desta Turma, externado em diversos precedentes, vejamos:
Com relação à correção monetária e aos juros, apesar de haver uma série de entendimentos consolidados na jurisprudência, e que são inafastáveis, há ainda intensa controvérsia nos Tribunais quanto à aplicação da regra do artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, que previu a aplicação dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança aos débitos judiciais.
Com efeito, o entendimento até então pacífico na jurisprudência pela aplicação da regra da Lei 11.960/2009 restou abalado com a decisão do STF no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, que declarou a inconstitucionalidade, por arrastamento, da expressão "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança" contida no art. 5º da lei. Essa decisão, que criou aparente lacuna normativa relativamente à atualização de débitos judiciais, foi seguida de decisão do STJ que, em sede de recurso especial repetitivo, preconizou a aplicação, no período em foco, dos critérios de remuneração e juros aplicáveis à caderneta de poupança apenas a título de juros moratórios, concomitantemente à aplicação da variação do IPCA como índice de atualização monetária (REsp 1.270.439/PR, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 26/06/2013, DJe 02/08/2013).
Ainda que os acórdãos proferidos no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 (inclusive quanto à modulação de seus efeitos, decidida na sessão de 25 de março de 2015) tenham sido largamente utilizados como fundamento para inúmeras decisões judiciais versando sobre atualização e juros de débitos judiciais no período anterior à sua inscrição em precatório (inclusive do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso especial repetitivo), sobreveio nova decisão do STF no julgamento da Repercussão Geral no RE 870.947, em 14 de abril de 2015, no sentido de que aquelas decisões se referiam, em verdade, apenas ao período posterior à expedição do requisitório, e não ao período anterior, no qual a controvérsia sobre a constitucionalidade da atualização pela variação da TR permanecia em aberto. Dessa forma, o "Plenário virtual" do STF reconheceu a repercussão geral da controvérsia sobre "a validade jurídico-constitucional da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre condenações impostas à Fazenda Pública segundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança (Taxa Referencial - TR), conforme determina o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09", de forma que essa questão deverá ser objeto de apreciação futura do Pleno do STF.
Diante deste quadro de incerteza quanto ao tópico e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória da lide, entendo ser o caso de relegar para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de atualização monetária e juros a serem aplicados no período posterior à entrada em vigor da Lei 11.960/2009 (período a partir de julho de 2009, inclusive), quando provavelmente a questão já terá sido dirimida pelos tribunais superiores, entendimento ao qual a decisão muito provavelmente teria de se adequar ao final e ao cabo, tendo em vista a sistemática dos recursos extraordinários e especiais repetitivos prevista nos arts. 543-B e 543-C do CPC. Evita-se, assim, que o processo fique paralisado, ou que seja submetido a sucessivos recursos e juízos de retratação, com comprometimento do princípio da celeridade processual, apenas para resolver questão acessória, quando a questão principal ainda não foi inteiramente solvida.
Nessa perspectiva, quanto aos juros e à correção monetária, restam fixados os seguintes balizamentos:
(a) dado tratar-se de entendimento pacificado, fica desde já estabelecido que os juros moratórios e a correção monetária relativos a cada período são regulados pela lei então em vigor, conforme o princípio tempus regit actum; consequentemente, sobrevindo nova lei que altere os respectivos critérios, a nova disciplina legal tem aplicação imediata, inclusive aos processos já em curso. Ressalto, contudo, que essa aplicação não tem efeito retroativo, ou seja, não alcança o período de tempo anterior à lei nova, que permanece regido pela lei então vigente, nos termos do que foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.205.946/SP (02/02/2012);
(b) da mesma forma, por não comportar mais controvérsias, até junho de 2009, inclusive, a correção monetária e os juros devem ser calculados conforme os critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 134/2010 do Conselho da Justiça Federal e modificado pela Resolução 267/2013 do mesmo órgão, respeitada a natureza do débito;
(c) quanto ao período a partir da entrada em vigor da Lei 11.960/2009 (julho de 2009), conforme antes afirmado, a decisão acerca dos critérios aplicáveis a título de juros e correção monetária fica relegada para quando da execução do julgado, à luz do entendimento pacificado que porventura já tenha já emanado dos tribunais superiores, sem prejuízo, obviamente, da aplicação de eventual legislação superveniente que trate da matéria, sem efeitos retroativos.
Honorários advocatícios
Também merecem parcial provimento a apelação e a remessa oficial para condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios, fixados, nos termos do artigo 20, § 3º, alíneas "a", "b" e "c", e § 4º, do Código de Processo Civil, em R$ 2.000,00 (dois mil reais). Valor em conformidade com o entendimento desta Turma em ações similares.
Conclusão
Na questão de fundo, não verificando motivos que justifiquem a alteração do posicionamento adotado, mantenho a sentença de procedência do pedido, visto que o caso posto sob análise configura questão pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, tendo restado prevalente o entendimento de que, em razão do princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentar e da boa-fé da parte que recebeu a verba, o pedido de ressarcimento de valores não comporta provimento, devendo, portanto, a ré restituir eventual valor indevidamente descontado.
Parcialmente providas a apelação e a remessa oficial para fixar a correção monetária e os juros de mora de acordo com o entendimento da Turma acerca do assunto.
Em relação aos honorários advocatícios, parcialmente providas a apelação e a remessa oficial para condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios fixados, nos termos do artigo 20, § 3º, alíneas "a", "b" e "c", e § 4º, do Código de Processo Civil, em R$ 2.000,00 (dois mil reais). Valor em conformidade com o entendimento desta Turma em ações similares.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial.
EDUARDO GOMES PHILIPPSEN
Relator
Documento eletrônico assinado por EDUARDO GOMES PHILIPPSEN, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9064724v12 e, se solicitado, do código CRC 3B327744. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Eduardo Gomes Philippsen |
Data e Hora: | 15/08/2017 10:50 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/08/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001604-71.2015.4.04.7101/RS
ORIGEM: RS 50016047120154047101
RELATOR | : | Juiz Federal EDUARDO GOMES PHILIPPSEN |
PRESIDENTE | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE - FURG |
APELADO | : | VERA TERESA SPEROTTO BEMFICA |
ADVOGADO | : | HALLEY LINO DE SOUZA |
: | MARIANA LANNES LINDENMEYER |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/08/2017, na seqüência 593, disponibilizada no DE de 11/07/2017, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal EDUARDO GOMES PHILIPPSEN |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal EDUARDO GOMES PHILIPPSEN |
: | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA | |
: | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Luiz Felipe Oliveira dos Santos, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9126613v1 e, se solicitado, do código CRC 4E786D0B. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Luiz Felipe Oliveira dos Santos |
Data e Hora: | 09/08/2017 16:50 |