APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008795-67.2015.4.04.7102/RS
RELATOR | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
APELANTE | : | VOLNEI AMADOR DA SILVA |
ADVOGADO | : | LUCIANA INES RAMBO |
APELADO | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA - UFSM |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MOTORISTA. PAGAMENTO DE HORAS-EXTRAS. ADICIONAL NOTURNO. COMPROVAÇÃO. OCORRÊNCIA.
As diárias visam a indenizar o servidor pelos eventuais afastamentos de sua localidade de trabalho, enquanto as horas extras (art. 73 da Lei nº 8.112/90) remuneram o excedente de trabalho prestado (mais de 8 horas por dia), fazendo o servidor jus ao seu recebimento concomitante por possuírem fatos geradores distintos.
Tendo o servidor prestado trabalho no período compreendido entre as 22 horas e 5 horas do dia subseqüente, tem direito à percepção de adicional noturno (art. 75 da Lei nº 8.112/90).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de maio de 2017.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8953639v4 e, se solicitado, do código CRC A1241ED7. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vivian Josete Pantaleão Caminha |
| Data e Hora: | 26/05/2017 14:17 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008795-67.2015.4.04.7102/RS
RELATOR | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
APELANTE | : | VOLNEI AMADOR DA SILVA |
ADVOGADO | : | LUCIANA INES RAMBO |
APELADO | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA - UFSM |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que, em ação ajuizada por servidor público federal em face da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, buscando o pagamento de adicional noturno e horas extraordinárias laboradas, assim determinou:
ANTE O EXPOSTO, rejeito as preliminares suscitadas e, no mérito, julgo improcedentes os pedidos formulados na peça inicial, nos termos da fundamentação precedente (art. 487, NCPC).
Condeno a parte autora no pagamento dos honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, fixando-os em 10% do valor da causa (art. 85, §2º, do NCPC). Afasto, contudo, a indigitada cobrança, porquanto a parte autora litigou sob o pálio da AJG.
Partes isentas do pagamento de custas judiciais (art. 4º, I e II, da Lei nº 9.289/96).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Em suas razões, a parte autora sustentou: (a) que computou de forma adequada as horas que entende como de serviço extraordinário; (b) que os documentos de trânsito eram ratificados por sua chefia imediata; (c) que laborou em condições noturnas e nem sempre percebeu o respectivo adicional. Pugnou, pois, pela reforma da sentença, com a condenação da Universidade ao pagamento de horas extras e de adicional noturno, com base na sua remuneração total e considerando o fator de divisão de 200 horas, além do pagamento de custas e honorários advocatícios. Sucessivamente, postulou a minoração da condenação fixada a título de honorários sucumbenciais, nos termos do §§ 6 e 8º do art. 85 do CPC.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O magistrado singular, ao sentenciar quanto aos pedidos formulados na inicial, assim se manifestou:
Vistos, etc.
Trata-se de ação ordinária promovida por VOLNEI AMADOR DA SILVA em desfavor da UFSM, buscando o pagamento de horas extraordinárias e de adicional por serviço noturno supostamente devidos.
Narrou o autor que é servidor da UFSM, exercendo o cargo de motorista, e que realiza frequentemente deslocamentos e viagens a serviço, extrapolando o limite legal da jornada diária, inclusive no período noturno. Aduziu que a ré não efetua o pagamento relativos a horas extras excedentes a 90 (noventa) anuais. Sustentou seu direito ao pagamento das horas extras excedentes a 90 (noventa) anuais, bem como o adicional noturno incidente sobre tal jornada extraordinária, defendendo o fator de divisão de 200 (duzentas) horas mensais. Requereu o reconhecimento do direito às horas extras e adicional noturno, considerando o fator de divisão de 200 horas, e a condenação da ré ao pagamento das horas extras laboradas, acrescidas de 50%, bem como o pagamento das horas trabalhadas aos sábados, domingos e feriados, com o acréscimo de 100%, mais adicional noturno, excetuadas as parcelas pagas administrativamente. Pediu a gratuidade da justiça.
Concedido o benefício da justiça gratuita.
Citada, a UFSM contestou. Arguiu preliminares e, no mérito, defendeu a improcedência do pedido.
Produzida prova oral (evento 70).
É o relatório.
Decido.
1. Preliminares
1.1. Falta de interesse de agir
Argumenta a ré que os valores atinentes a adicional noturno estão sendo pagos administrativamente, motivo pelo qual faltaria ao autor interesse processual quando a este pedido.
Sem razão a ré, uma vez que o pedido do autor está limitado às parcelas não pagas administrativamente (item b.2 do pedido formulado na inicial).
Preliminar rejeitada.
1.2. Impossibilidade jurídica do pedido
A matéria ventilada na preliminar confunde-se com o próprio mérito da presente causa, motivo pelo qual será examinada como tal, na sequência.
2. Mérito
2.1. Prescrição bienal
Alega a parte ré que as diferenças reclamadas pelo demandante revelam nítida natureza alimentar, pelo que estaria prescrito o direito de reclamar as parcelas devidas há mais de dois anos do ajuizamento da ação, consoante art. 206, §3º, do atual Código Civil. Reza o indigitado artigo que prescreve "em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem".
Contudo, entendo que a referida regra não se aplica ao caso sub judice, pois referido dispositivo serve tão somente para regular relações de cunho privado, especialmente quando tiverem como objeto o pagamento de pensão alimentícia.
In casu, em que pese o caráter alimentar da prestação, tratando-se de relação de natureza administrativa, regida pelo Direito Público, não tem aplicação a prescrição bienal do art. 206, §3º do CC. Ademais, em consonância com o princípio da isonomia, é de ser aplicado o mesmo prazo prescricional conferido à Fazenda Pública nas cobranças de dívidas de particulares.
Neste sentido:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS. ADICIONAL NOTURNO E HORAS-EXTRAS. FATOR DE DIVISÃO. 200 HORAS MENSAIS. ART. 19 DA LEI Nº 8.112/90. PRESCRIÇÃO BIENAL. INOCORRÊNCIA. APELO DO SINDICATO PROVIDO. 1. Afastada a alegação da ré quanto a ocorrência da prescrição bienal. As "prestações alimentares" a que se refere o art. 206, § 2º, do Código Civil de 2002 restringem-se àquelas de natureza civil e privada. Diferenças pagas a servidores públicos são prestações regradas pelo Direito Público, razão por que inaplicável ao caso o Código Civil, mas o Decreto nº 20.910/32. 2. Com o advento da Lei nº 8.112/90, a jornada máxima de trabalho dos servidores públicos federais passou a ser de 40 (quarenta) horas semanais, razão por que o adicional noturno deve ser calculado com base no divisor de 200 (duzentas) horas mensais. Precedentes desta Corte e do STJ. 3. Apelação da parte autora provida. (TRF4 5013554-56.2010.404.7100, D.E. 18/05/2011, grifei)
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ABONO DE PERMANÊNCIA EM SERVIÇO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CUMULAÇÃO. CANCELAMENTO. LIMITES AO DESFAZIMENTO DE ATO CONCESSÓRIO POR PARTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. COBRANÇA DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. PRESCRIÇÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. (...) 13. A Fazenda Pública sempre teve prazo prescricional de cinco anos em seu favor no que toca às dívidas passivas (Dec. 20.910/32 - no caso do INSS especificamente, CLPS, art. 98, e Lei 8.213/98, art. 103). Assim, em se tratando de débitos de particulares para com a Fazenda Pública, deve ser aplicado, por uma questão de simetria e isonomia, o mesmo prazo prescricional previsto para as dívidas passivas desta última. (...) (TRF4, AC 2008.70.00.018672-8/PR, Turma Suplementar, Rel. Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 13.07.2009, destaquei).
Pelos fundamentos acima, deve ser afastada a alegação de prescrição bienal sustentada pela parte ré.
2.2. Prescrição quinquenal
No caso, tratando-se de relação de natureza continuada, não há como se falar em prescrição bienal ou de fundo de direito, mas apenas das parcelas anteriores ao quinquênio que antecedeu ao ajuizamento da ação.
Nesse sentido a súmula 85 do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula nº 85 - Nas relações jurídicas de trato sucessivo, em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.
O Decreto nº 20.910/32 e o Decreto-Lei nº 4.597/1942 regulam a matéria nos seguintes termos (grifei):
DEC 20.910/32
Art. 1º - As dividas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
(...)
Art. 4º - Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, no reconhecimento ou no pagamento da divida, considerada liquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
Parágrafo Único. - A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições publicas, com designação do dia, mês e ano.
(...)
Art. 8º. - A prescrição somente poderá ser interrompida uma vez.
Art. 9º. - A prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do ultimo ato ou termo do respectivo processo.
DL 4.597/42
Art. 2º O Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a prescrição qüinqüenal, abrange as dívidas passivas das autarquias, ou entidades e órgãos paraestatais, criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições, exigidas em virtude de lei federal, estadual ou municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação contra os mesmos.
Na dicção das normas transcritas acima, a interrupção do prazo prescricional, que somente poderá ocorrer uma vez, recomeça a correr, pela metade (dois anos e meio), da data do ato que a interrompeu ou do ultimo ato ou termo do respectivo processo (DEC 20.910/32, art. 1º, 8º e 9º). Na mesma linha, a Súmula 383 do STF preconiza:
STF SÚMULA Nº 383 - 03/04/1964 - DJ DE 8/5/1964
A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo.
As hipóteses interruptivas da prescrição devem ser buscadas na legislação civil (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 23. ed. rev. e atual. até a emenda constitucional 53, de 19.12.2006. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 1014). In verbis:
L 10.406/02 (CC)
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;
III - por protesto cambial;
IV - pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;
V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.
Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.
Nessa linha, o requerimento administrativo suspende (não interrompe) a prescrição até a comunicação final da decisão ao interessado, ou seja, o prazo prescricional permanece paralisado até o desfecho do processo administrativo. Tal é a orientação de nosso TRF4:
PREVIDENCIÁRIO. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS FAVORÁVEL. PAGAMENTO DE PARCELAS EM ATRASO. (...) 5. O requerimento administrativo é causa suspensiva da prescrição. A suspensão mantém-se durante o período de tramitação do processo administrativo, até a comunicação da decisão ao interessado. 6. A citação válida interrompe a prescrição (art. 219 do CPC), voltando o prazo prescricional a correr por metade (Decreto n. 20.910/32 e Decreto-Lei n. 4.597/42). 7. Hipótese em que, decorridos mais de dois anos e meio a contar da causa interruptiva, resta prejudicada a interrupção do prazo prescricional quinquenal, contando-se a prescrição quinquenal, pois, a partir do ajuizamento da presente ação. (TRF4, AC 0000531-08.2009.404.7119, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/05/2011)
Na hipótese dos autos, restam atingidas pela prescrição quinquenal as parcelas remuneratórias anteriores a 12/11/2010 (05 anos do ajuizamento da demanda).
2.3. Horas extraordinárias
A jornada normal de trabalho do servidor público é conhecida e está expressamente definida no ordenamento jurídico pátrio:
*Constituição Federal de 1988:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; (vide Decreto-Lei nº 5.452, de 1943)
(...)
art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Vide ADIN nº 2.135-4)
(...)
§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (grifei)
* Lei n. 8.112/90:
Art. 19. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 8.270, de 17.12.91)
* Decreto n. 1.590/95:
Art. 1º A jornada de trabalho dos servidores da Administração Pública Federal direta, das autarquias e das fundações públicas federais, será de oito horas diárias e:
I - carga horária de quarenta horas semanais, exceto nos casos previstos em lei específica, para os ocupantes de cargos de provimento efetivo;
Portanto, a jornada normal no serviço público federal é de 08 (oito) horas diárias e 40 (quarenta) horas semanais.
No que se refere às horas excedentes à jornada normal do servidor (serviço extraordinário), a Lei 8.112/90 estabelece que:
Art. 73. O serviço extraordinário será remunerado com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento) em relação à hora normal de trabalho.
Art. 74. Somente será permitido serviço extraordinário para atender a situações excepcionais e temporárias, respeitado o limite máximo de 2 (duas) horas por jornada.
Como é sabido, a remuneração devida por conta do serviço extraordinário, aquele prestado além da jornada normal - que, no caso do serviço público, justifica-se como forma de evitar o enriquecimento sem causa da Administração -, pressupõe, por óbvio, que o número de horas efetivamente laboradas seja superior àquele estabelecido legalmente.
De todo modo, ainda que esteja comprovado o trabalho em regime de horas extras, tal circunstância não gera, por si só, direito à percepção de adicional por serviço extraordinário (horas extras). Conforme entendimento majoritário na jurisprudência, o pagamento de adicional por serviço extraordinário no serviço público depende de autorização prévia e expressa da autoridade competente.
No caso dos autos não foi comprovado o direito sustentando pelo autor. Explico.
De acordo com a documentação colacionada ao feito, especialmente em relação às ordens de trânsito expedidas pela UFSM, infere-se que o autor anotou como horas extras período que deveria ter sido mensurado como horas normais de trabalho. Veja-se, por exemplo, a Ordem de Trânsito nº 370/STO/2010 (evento 8 - PROCADM3, fl. 5). Nesse documento, o postulante apontou 6 (seis) horas extras no dia 30/04/2010 e 1 (uma) hora extra no dia 01/05/2010, sendo que a viagem teve início às 15 horas do dia 30/04/2010, com retorno a uma hora do dia 01/05/2010, ou seja, uma viagem que durou 10 horas gerou sete horas extras, o que não é razoável conceber. Ao que tudo indica, o registro de horas extras pelo autor se deu de forma equivocada.
Na verdade, o autor fez confusão entre as verbas salariais, quais sejam, horas extras e diárias. As horas extras são devidas apenas quando ao tempo de condução do veículo ultrapassar as 8 (oito) horas diárias. Já o lapso em que o autor permanece afastado de sua residência é retribuído através do pagamento de diárias. Nesses termos, o autor não pode tencionar auferir horas extras pelo simples fato de estar distante de sua moradia, em viagem a serviço da UFSM, haja vista tal circunstância já ser remunerada pelas diárias.
Embora as testemunhas tenham referido que o servidor conduzido pelo motorista conferia as anotações nas ordens de trânsito, é de se ressaltar que as informações eram preenchidas pelo próprio requerente. Não bastasse tal constatação, ressalto que a prova testemunhal foi uníssona no sentido de que as viagens eram realizadas por dois motoristas, havendo revezamento entre os servidores no ofício da direção do veículo.
Ainda que as ordens de trânsito anexadas sejam endereçadas ao autor, é fato que as viagens eram realizadas em conjunto com outro servidor, não dizendo respeito a documentação somente às atividades da parte requerente. Desse modo, não é possível apurar as horas de condução do autor, bem como as horas cumpridas pelo outro motorista, uma vez que o demandante não apresentou nenhuma prova com o condão de esclarecer tal conjuntura.
Segundo a testemunha VANDERLEY DA COSTA VASCONCELOS (Evento 77 - AUDIO5), a orientação aos servidores consistia em que conduzissem o veículo por 4 (quatro) horas, com pausa de 20 (vinte) minutos, acrescidos de mais 4 (quatro) horas de direção, com descanso obrigatório de 11 (onze) horas fora do veículo. Assim, o cálculo das horas extras deve ser apurado descontando-se os períodos de descanso, ou seja, devem ser mensuradas tão somente as horas em que o servidor esteve conduzindo meio de transporte a serviço da UFSM.
De fato, a contraprestação pelo serviço extraordinário somente é devida quando forem excedidas as oito horas diárias na condução de veículo a serviço da UFSM. Da leitura das ordens de trânsito juntadas aos autos, não se observam horas extras efetivamente realizadas pelo autor. Tão pouco há meios de se apurar a compensação do excesso de serviço em folga. Ressalto que o demandante é remunerado com diárias para cobrir eventuais despesas com o deslocamento, não podendo pleitear horas extras apenas pelo fato de estar em viagem.
É ônus da parte comprovar o direito postulado. In casu, o autor não demonstrou que desempenhava as horas extras alegadas. Tendo em vista que apenas pode ser considerado em efetivo serviço o servidor enquanto dirige o veículo, com a exclusão do tempo em que permaneceu em descanso, não há como reconhecer a procedência do pedido veiculado na inicial, de sorte que a improcedência da presente demanda é medida que se impõem.
2.4. Adicional noturno
Não obstante o autor defenda que não percebe adicional noturno, verifico que a prova dos autos aponta outra direção. Com efeito, as fichas financeiras colacionadas pela UFSM (evento 8 - PROCADM11), comprovam que o adicional noturno vem sendo alcançado ao autor. Portanto, não há falar em ilegalidade cometida pela autarquia ré quanto ao ponto.
(grifei)
O regime de pagamento de horas extras e de adicional noturno no serviço público federal está previsto nos artigos 19, 73, 74 e 75 da Lei nº 8112/90:
Art. 19. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 8.270, de 17.12.91)
§ 1º O ocupante de cargo em comissão ou função de confiança submete-se a regime de integral dedicação ao serviço, observado o disposto no art. 120, podendo ser convocado sempre que houver interesse da Administração. (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
§ 2º O disposto neste artigo não se aplica a duração de trabalho estabelecida em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 8.270, de 17.12.91)
(...)
Art. 73. O serviço extraordinário será remunerado com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento) em relação à hora normal de trabalho.
Art. 74. Somente será permitido serviço extraordinário para atender a situações excepcionais e temporárias, respeitado o limite máximo de 2 (duas) horas por jornada.
Art. 75. O serviço noturno, prestado em horário compreendido entre 22 (vinte e duas) horas de um dia e 5 (cinco) horas do dia seguinte, terá o valor-hora acrescido de 25% (vinte e cinco por cento), computando-se cada hora como cinqüenta e dois minutos e trinta segundos.
§ único. Em se tratando de serviço extraordinário, o acréscimo de que trata este artigo incidirá sobre a remuneração prevista no art. 73.
Quanto ao pagamento de horas extras que excedam a duas, tenho que, apesar de existir um limite legal, a Administração não pode impor ao servidor uma jornada de trabalho que não poderá ser remunerada.
Nesse sentido:
A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região apresenta-se pacificada no sentido de admitir o pagamento de horas extras no serviço, afastando qualquer ofensa ao princípio da legalidade. Embora a lei preveja o regime de compensação, assim como a excepcionalidade do pagamento de horas extras, havendo a prestação do serviço em horas excedentes, é devido pagamento do adicional por serviço extraordinário, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração (AC 5025192-18.2012.404.7100, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA).
ADMINISTRATIVO. REMESSA OFICIAL. SERVIDOR PÚBLICO. HORAS EXTRAS. POSSIBILIDADE PAGAMENTO. PRINCÍPIO DO NÃO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. Malgrado exista um limite legal para o pagamento de horas-extras, deve ser considerado que a Administração não poderia impor ao servidor uma jornada de trabalho que não poderá ser remunerada, uma vez que isso caracterizaria o enriquecimento indevido da Administração, que não paga as horas-extras exercidas além do limite imposto pelo Decreto n.º 948/03, mas também não possibilita a compensação dessas horas extraordinárias, descumprindo inclusive o disposto nos artigos 11 e 14 da sua Instrução Normativa n.º 001/2002. (TRF4, REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 5000335-36.2011.404.7101, 4ª TURMA, Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 25/09/2014)
Igualmente, não se pode confundir o pagamento de diárias com o pagamento de horas extras, de vez que possuem fundamentos legais distintos, bem como finalidades diversas. As diárias visam a indenizar o servidor pelos eventuais afastamentos de sua localidade de trabalho, enquanto as horas-extras remuneram o excedente de trabalho prestado (mais de 8 horas dia).
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. MOTORISTA. HORAS-EXTRAS. ADICIONAL NOTURNO. HONORÁRIA. 1. As diárias visam a indenizar o servidor pelos eventuais afastamentos de sua localidade de trabalho (art. 58 da Lei nº 8.112/90), enquanto as horas-extras (art. 73 da Lei nº 8.112/90) remuneram o excedente de trabalho prestado (mais de 8 horas por dia), fazendo o servidor jus ao seu recebimento concomitante por possuírem fatos geradores distintos. 2. Tendo o servidor prestado trabalho no período compreendido entre as 22 horas e 5 horas do dia subseqüente, tem direito à percepção de adicional noturno (art. 75 da Lei nº 8.112/90). 3. Há limitação expressa (art. 74 da Lei nº 8.112/90) ao pagamento de até 2 (duas) horas por jornada de trabalho. Assim, eventuais horas excedentes a estas 2 horas devem ser compensadas com folgas, a cargo da Administração. 4. Demonstrado, a efetiva prestação de serviço em domingos e feriados, incumbe à Administração proceder ao pagamento respectivo. 5. Ante a sucumbência mínima da parte autora, honorários arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, a cargo da Universidade. A sentença condenou a UFRG a pagar honorários de R$:2.000,00. O valor corresponde a pouco mais 10% do valor atribuído à causa (R$:19.000,00). Considerando que a parte autora decaiu minimamente, com a limitação das duas horas extras diárias, concluo que o valor fixado conforma-se com o padrão aceito pela Corte, devendo ser mantido. Por essas razões, com fundamento no art. 557 do CPC, nego seguimento a ambas apelações. (TRF4, AC 2005.71.00.025876-5, Terceira Turma, Relator José Jacomo Gimenes, D.E. 07/01/2011)
Importa referir que o fato de o autor haver preenchido o seu cartão ponto não é empecilho para o reconhecimento do adicional extraordinário, visto que a Administração não pode ser beneficiada pela própria torpeza - respeito ao princípio da boa-fé objetiva. Ora, se a própria Administração admitiu a prestação do serviço em horário extraordinário, beneficiando-se deste, não pode, agora, alegar que não o autorizou ou que o autor que apontava seu próprio horário, até porque há assinatura da chefia imediata dando anuência ao horário constante nos cartões ponto. A alegação encontra óbice no princípio do venire contra factum proprium.
In casu, da análise dos documentos acostados aos autos, tem-se que o autor esteve a serviço da Universidade, em diversas oportunidades, durante mais de 8 (oito) horas diárias, inclusive em horários que se enquadram na hipótese do art. 75 da Lei nº 8.112/90 (OUT8-30, evento 1 do processo originário).
De outro lado, os documentos carreados pela parte ré também dão conta de horas extras e viagens (PROCADM3-11, evento 8 do processo originário).
A prova testemunhal produzida nos autos atesta que, em diversas ocasiões, o horário normal de expediente era excedido, e que o autor, na condição de motorista, permanecia à disposição da ré, sendo que o horário de saída e retorno era determinado conforme as necessidades da atividade a ser desenvolvida. Da mesma forma, foram mencionadas viagens de longo percurso que corroboram as anotações constantes nas folhas-ponto, sendo impossível delimitar as horas diárias permitidas na legislação, pois os motoristas deviam seguir viagem, não importando o horário (evento 70 do processo originário).
Portanto, restou comprovado que o autor exercia suas atividades, na condição de motorista da ré, em horário extraordinário e noturno, fazendo jus ao pagamento dos valores referentes ao serviço extraordinário e de caráter noturno, a serem apurados em liquidação de sentença, mediante comprovação, descontando-se as horas extras já pagas, bem como os dias em que houve compensação.
Outrossim, há que se observar que eventual recebimento de função afasta o percebimento de horas extras (art. 19 da Lei 8.112/90).
No que tange aos pedidos de reflexo dessas vantagens nas demais verbas, não prosperam por falta de base legal. Além disso, tais horas são prestadas em caráter precário e em situação excepcional, não integrando a remuneração da parte autora para cálculo de outras vantagens.
Consectários legais
No tocante aos acréscimos legais, cumpre destacar que o Supremo Tribunal Federal, nas ADIs n.ºs 4357, 4372, 4400 e 4425, reconheceu a inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de correção monetária, modulando os efeitos da decisão para mantê-la em relação aos precatórios expedidos ou pagos até 25/03/2015.
Todavia, a questão relativa à aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pela Lei 11.960/2009, no período anterior à inscrição da requisição de pagamento, ainda não foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a existência de repercussão geral da matéria (RE 870947).
Por essa razão, a especificação dos critérios de correção monetária e juros deve ser diferida para a fase da execução, de modo a racionalizar o andamento do processo. A ação de conhecimento deve centrar-se no reconhecimento do direito postulado, e qualquer controvérsia acerca dos encargos legais incidentes sobre o débito ora imputado à ré, dado o caráter instrumental e acessório, não pode impedir seu regular trâmite até o desfecho final, com o esgotamento de todos os recursos atinentes à matéria de fundo.
Reconhece-se, assim, por ora, que é devida a incidência de juros e correção monetária sobre o débito, nos termos da legislação vigente no período a que se refere, postergando-se a especificação dos índices e taxas aplicáveis para a fase de execução.
Honorários advocatícios
Invertida a sucumbência, os honorários advocatícios deverão ser suportados integralmente pela Universidade. Tendo em vista que a sentença foi prolatada sob a vigência do CPC/2015, sendo vencida a Fazenda Pública, há que se aplicar o disposto no art. 83, §3º. Como se trata de sentença ilíquida, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a IV do respectivo parágrafo, deverá ser diferida para a fase de liquidação do julgado (§4º, II, do art. 85), e observando-se o §11 do art. 85.
Prequestionamento
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
É o voto.
Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008795-67.2015.4.04.7102/RS
ORIGEM: RS 50087956720154047102
RELATOR | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PRESIDENTE | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PROCURADOR | : | Dr. Cláudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | VOLNEI AMADOR DA SILVA |
ADVOGADO | : | LUCIANA INES RAMBO |
APELADO | : | UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA - UFSM |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/05/2017, na seqüência 47, disponibilizada no DE de 03/05/2017, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
: | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE | |
: | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
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