APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008426-79.2015.4.04.7100/RS
RELATORA | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ESTELITA DA SILVA |
ADVOGADO | : | MARCELO LIPERT |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO.
1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais dele decorrentes.
2. No caso, não se vislumbra que as tarefas desempenhadas pela parte autora eram, de modo permanente, exclusivas do cargo de analista do seguro social.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de março de 2016.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8157648v4 e, se solicitado, do código CRC 2C74A888. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008426-79.2015.4.04.7100/RS
RELATORA | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ESTELITA DA SILVA |
ADVOGADO | : | MARCELO LIPERT |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação e remessa oficial contra sentença na qual foi julgado parcialmente procedente o pedido de pagamento das diferenças entre a remuneração que o autor percebe, no cargo de Técnico do Seguro Social, e a relativa à função que alegadamente desempenha, equivalente à do cargo de Analista do Seguro Social, em virtude de desvio de função, nos seguintes termos:
Ante o exposto, rejeito a preliminar e julgo parcialmente procedente a presente ação, para o fim de condenar a demandada ao pagamento das diferenças remuneratórias pleiteadas na inicial, relativas ao período não prescrito, limitada a condenação, porém, à data da comunicação desta sentença à ré.
Tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora, a ré deverá arcar com honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, com base no artigo 20 do CPC.
Interposto recurso de apelação e satisfeitos os pressupostos recursais, recebo-o no efeito cabível e determino que se oportunizem contrarrazões à parte recorrida; oportunamente, remeta-se o feito ao TRF/4º. Duplo grau obrigatório.
Publique-se. Intimem-se.
O INSS defende a incidência da prescrição bienal ou trienal e ineficácia do protesto interruptivo. Alega não estar configurado desvio de função, conforme entendimento já pacificado nesta Corte de que a situação descrita nos autos não caracteriza desvio de função. Reitera aos argumentos expostos na contestação, requerendo a reforma da sentença para que o pedido seja julgado improcedente. Sucessivamente, requer a reforma da sentença no que se refere aos critérios de atualização monetária, bem como a redução da verba honorária.
Com contrarrazões, vieram os autos.
É o relatório.
Peço dia.
VOTO
De início, não merece acolhida a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, sob o argumento de que a parte autora postula um aumento real de remuneração por meio de ato jurisdicional. A alegação, em realidade, confunde-se com o próprio mérito da causa, de modo que passo a analisá-la sob esse contexto.
No tocante à prescrição, afasto a aplicação do prazo previsto no Código Civil, visto que a matéria aqui examinada é regida por norma especial, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Aplica-se, portanto, o prazo quinquenal.
Quanto ao mérito, o autor, ocupante do cargo de Técnico do Seguro Social, pretende o reconhecimento do desvio de função em relação ao cargo de Analista do Seguro Social.
A matéria de direito não comporta maiores discussões pois está pacificado o entendimento de que, comprovado desvio de função, o servidor tem direito às diferenças salariais, decorrentes da diferença vencimental entre os cargos. Trata-se de prática irregular que deve, entretanto, ser devidamente remunerada, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração Pública. Assim o STJ: "O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais dele decorrentes. Precedentes.". (REsp 619.058/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 15/03/2007, DJ 23/04/2007).
No caso dos autos, contudo, tenho que não está caracterizado o desvio de função, conforme passo a demonstrar.
Segundo a narrativa desenvolvida na petição inicial, o autor realiza atividades tais como:
- realização de auditagem prévia de benefícios, com apuração de eventuais irregularidades na documentação apresentada;
- atuação direta em análise de defesa escrita apresentada por segurados em processos com suposta concessão irregular de benefícios (v.g análise da regularidade da concessão de benefício em face de existência contestada de união estável; verificação de acumulação indevida de benefícios), decidindo pela procedência ou improcedência (acolhimento ou não) dos argumentos expostos, implicando a manutenção ou suspensão do benefício em discussão (propiciando . nessa última hipótese, a abertura de prazo ao segurado para interposição de recurso), etc.
- análise de requerimento e concessão de benefícios previdenciários, análise de requerimentos de pedido de revisão de benefício, concessão de certidão de tempo de contribuição, cálculo de contribuições em atraso;
- decisões sobre pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, elaboração de cartas de exigências endereçadas aos postulantes a benefícios, requisitando documentação tida por indispensável;
- notificação de beneficiários, cientificando-os acerca de supostas irregularidades de benefícios, bem como oportunizando contraditório no prazo legal.
Quanto à descrição legal das atribuições dos cargos de Técnico de Seguro Social, ocupado pelo autor, e de Analista do Seguro Social, paradigma adotado na petição inicial, a Lei nº 10.667/03 as previa da seguinte forma, para os cargos então denominados Analista Previdenciário e Técnico Previdenciário:
Art. 6º. [...]
I - Analista Previdenciário:
a) instruir e analisar processos e cálculos previdenciários, de manutenção e de revisão de direitos ao recebimento de benefícios previdenciários;
b) proceder à orientação previdenciária e atendimento aos usuários;
c) realizar estudos técnicos e estatísticos; e
d) executar, em caráter geral, as demais atividades inerentes às competências do INSS;
II - Técnico Previdenciário: suporte e apoio técnico especializado às atividades de competência do INSS.
Parágrafo único. O Poder Executivo poderá dispor de forma complementar sobre as atribuições decorrentes das atividades a que se referem os incisos I e II.
Já a Lei nº 11.501/07, que alterou a denominação do cargo, estabeleceu como atribuições do cargo de Técnico do Seguro Social (anexo I, tabela III): "Realizar atividades técnicas e administrativas, internas ou externas, necessárias ao desempenho das competências constitucionais e legais a cargo do INSS, fazendo uso dos sistemas corporativos e dos demais recursos disponíveis para a consecução dessas atividades". Em relação ao cargo de Analista do Seguro Social, foram mantidas as suas atribuições genéricas.
Como se vê, na definição das atribuições do cargo de Técnico do Seguro Social, optou o legislador por adotar fórmula aberta. Previu, assim, de forma ampla e genérica, a realização de atividades de suporte, técnicas e administrativas, necessárias ao desempenho das competências institucionais próprias do INSS. Não foi traçada distinção expressa em relação às atividades próprias do cargo de Analista do Seguro Social, para o qual, aliás, adotou-se igualmente cláusula genérica, no art. 6º, I, d, da Lei nº 10.667/03.
Nota-se, portanto, que a distinção entre os cargos de Analista do Seguro Social e Técnico do Seguro Social se dá fundamentalmente em relação aos requisitos para o ingresso na carreira, compreendendo o nível de escolaridade exigida e a aprovação no concurso público próprio. Já a distinção no tocante à distribuição de atribuições apenas se apreende a partir de uma leitura lógico-sistemática da legislação, segundo a qual as tarefas de maior complexidade devem ser cometidas aos servidores investidos no cargo de Analista do Seguro Social. Tal distribuição, entretanto, diante da clara intenção do legislador em adotar fórmula genérica, deve ficar sujeita à conveniência da Administração, que poderá gerenciar os recursos humanos disponíveis da forma que melhor lhe convier, com a margem de discricionariedade que a lei lhe garantiu, visando a alcançar a maior eficiência possível na prestação do serviço público.
Nesse contexto, conquanto as atividades desenvolvidas pelo autor possam, de um lado, ser enquadradas como atribuições do cargo de Analista do Seguro Social, não se pode, de outro, excluí-las peremptoriamente das atribuições típicas de Técnico do Seguro Social.
Em suma, não se vislumbra que as tarefas por ele desempenhadas são, de modo habitual e permanente, exclusivas do cargo de analista previdenciário. E o caráter habitual e permanente da irregularidade - é importante frisar - seria imprescindível para a configuração do desvio de função, uma vez que se está tratando de situação de excepcionalidade em face de valores constitucionais, tais como o princípio da legalidade e a exigência de concurso público.
Nesse sentido, precedente da 2ª Seção desta Corte, verbis:
EMBARGOS INFRINGENTES. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DO SEGURO SOCIAL. DESEMPENHO DE ATIVIDADES PRÓPRIAS DE ANALISTA DO SEGURO SOCIAL. DESVIO DE FUNÇÃO NÃO CONFIGURADO.
. Não há falar em desvio de função se o servidor desempenha as atribuições que estão inseridas na previsão legal pertinente à carreira e ao cargo que ocupa, pois está executando aquilo que integra o conteúdo de suas atribuições e deveres para com a administração pública, que o remunera pelo exercício daquelas atividades.
. Pela forma como foram redigidas as atividades dos cargos de técnico e analista do seguro Social (Lei nºs 10.667/03 e 11.501/07) percebe-se que a diferença entre eles não está nas atribuições, mas na escolaridade exigida para cada cargo, sendo que a vaguidade das funções previstas para o técnico não caracterizam o desvio de função.
. Nas carreiras do seguro Social a escolaridade superior não é inerente nem necessária ao desempenho das atribuições do cargo
. Ainda que a prova eventualmente produzida pudesse apontar para a semelhança entre algumas das atividades realizadas na unidade administrativa em que lotado o servidor, isso não significa que o técnico estivesse realizando atribuições privativas de cargo superior (Analista Previdenciário).
. No INSS as atividades-fim são realizadas por ambos os cargos e não há distinção privativa entre tais tarefas entre agentes públicos de nível superior e de nível intermediário, tudo apontando para que tais atividades possam ser igualmente exercidas por pessoal de nível intermediário, como historicamente era feito no INSS, antes da criação do cargo de analista do seguro Social.
. Em não tendo o servidor comprovado que exercia atribuições típicas e próprias do cargo de analista do seguro Social, não tem direito às diferenças remuneratórias decorrentes de equiparação salarial com analista do seguro Social.
(TRF4; EMBARGOS INFRINGENTES Nº 5006770-72.2010.404.7000/PR; RELATOR: CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR; julg. em 11/04/2013)
Portanto, considerando a situação delineada nos autos, entendo pelo total provimento do apelo do INSS, afastando-se o alegado desvio de função.
Reformada a sentença, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 20, §§, do CPC, restando suspensa a condenação em virtude da assistência judiciária gratuita.
Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamenta sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial.
Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16/03/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008426-79.2015.4.04.7100/RS
ORIGEM: RS 50084267920154047100
RELATOR | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Dr Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ESTELITA DA SILVA |
ADVOGADO | : | MARCELO LIPERT |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16/03/2016, na seqüência 90, disponibilizada no DE de 02/03/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
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