Agravo de Instrumento Nº 5035684-19.2018.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: ALLISON ALEXANDRO BUGS
RELATÓRIO
O presente agravo de instrumento, com requerimento de atribuição de efeito suspensivo, foi interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra decisão, proferida em ação que tem por objeto a concessão do benefício assistencial, que indeferiu o pedido de revogação da antecipação da tutela.
Alegou o agravante, em síntese, que não estão presentes os requisitos para a concessão do benefício assistencial, tendo em vista que o grupo familiar não é hipossuficiente. Argumentou que não há provas de que o primo paterno integra o grupo familiar. Destacou que a renda familiar per capita ultrapassa dois salários mínimos. Sustentou que o autor reside em casa própria de alvenaria, em bom estado de conservação e com diversos bens e que sua mãe exerce atividade empresarial em um minimercado.
Foi indeferido o pedido de efeito suspensivo.
Não foram apresentadas contrarrazões.
VOTO
Os requisitos para o deferimento da tutela de urgência estão indicados no art. 300 do Código de Processo Civil, que assim dispõe:
A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Conclui-se, portanto, ser indispensável para o deferimento de provimento antecipatório não só a probabilidade do direito, mas também a presença de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, aos quais se deverá buscar, na medida do possível, maior aproximação do juízo de segurança previsto na norma, sob pena de subversão da finalidade do instituto da tutela antecipatória.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
A situação de risco social deve ser analisada inicialmente sob o ângulo da renda per capita do núcleo familiar, que deverá ser inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento no Tema 185 que a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, de modo a se presumir absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 3ª Seção, julgado em 28/10/2009).
Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985 (este com repercussão geral), estabeleceu que o critério legal de renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo encontra-se defasado para caracterizar a situação de miserabilidade, não se configurando, portanto, como a única forma de aferir a incapacidade da pessoa para prover sua própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Na mesma oportunidade, o Plenário do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 580.963/PR, também declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS, com base nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas portadoras de deficiência. De acordo com o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.
Mais recentemente, a Primeira Seção do STJ, com fundamento nos princípios da igualdade e da razoabilidade, firmou entendimento segundo o qual, também nos pedidos de benefício assistencial feitos por pessoas portadoras de deficiência, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício, no valor de um salário mínimo, recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único, do art. 34, do Estatuto do Idoso. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO. 1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente. 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. 3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.(REsp 1355052/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015).
Assim, em regra, integram o cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos pelo cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, com a redação dada pela Lei n.º 12.435/2011).
Devem ser excluídos do cálculo, todavia, o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (TRF4, EINF 5003869-31.2010.404.7001, 3ª Seção, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10 de fevereiro de 2014), bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (TRF4, APELREEX 2006.71.14.002159-6, 6ª Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 10 de setembro de 2015).
No presente caso, o autor requereu, em 24/07/2013, a concessão do benefício assistencial nº 602.635.746-0 por conta de ser portador de retardo mental grave e Síndrome de Down, o qual foi indeferido em razão de o INSS considerar que a renda per capita do grupo familiar é superior ou igual a 1/4 do salário mínimo (evento 1 - OUT2, pág. 17).
A tutela antecipada foi deferida judicialmente em 22/10/2013 (evento 1 - OUT2, pág. 30).
O estudo social, realizado em 19/04/2017, informou que, além do autor, residem no mesmo núcleo familiar a mãe, Lorena Schanne Bugs, e o primo paterno, Arcelino Adroaldo Bugs (evento 1 - OUT2, págs. 135/138).
Ainda, o estudo social indicou que o imóvel é de alvenaria e que está em boas condições de higiene, além de que a rua é pavimentada e possui saneamento de esgoto. Também constatou a presença de um automóvel ano 2010, um telefone celular e eletrodomésticos, como geladeira, aparelho televisores, rádio, chuveiro elétrico, ar condicionado, ventiladores, etc.
Além disso, ficou comprovado que a mãe do autor, nascida em 20/11/1945, aufere renda proveniente de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição e pensão por morte, cada uma no valor aproximado de um salário mínimo (evento 1 - OUT2, pág. 45). Assim, considerando que a mãe do autor é idosa, um dos benefícios previdenciários deve ser excluído para cálculo da renda familiar.
Logo, tendo em vista que não há nos autos elementos acerca da atuação da mãe do autor como empresária individual, nem indicação de qualquer receita percebida pela eventual existência do minimercado e que o MM. Juiz determinou a complementação do estudo social (evento 1 - OUT2, pág. 174), mostra-se prematura, neste momento processual, a revogação da tutela de urgência concedida na origem. É razoável, pois, que se aguarde o resultado da complementação do estudo social determinado pelo juízo.
O perigo de dano está caracterizado pela impossibilidade de o beneficiário promover o próprio sustento, no qual o atraso na concessão do benefício constitui uma violação irreparável, pois o bem jurídico ofendido é infungível, sendo, para a tutela antecipada, consequência lógica da pura e simples demora na concessão do benefício.
Destaque-se que a mera possibilidade de irreversibilidade do provimento, de ordem puramente econômica, não se há de erigir em óbice à antecipação da tutela em matéria previdenciária ou assistencial sempre que a efetiva proteção dos direitos à vida, à saúde, à previdência ou à assistência social não puder ser realizada sem a providência antecipatória. A hipótese, aqui, é de risco de irreversibilidade inverso.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000750382v2 e do código CRC 7aeb5f38.Informações adicionais da assinatura:
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Agravo de Instrumento Nº 5035684-19.2018.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: ALLISON ALEXANDRO BUGS
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO assistencial. TUTELA DE URGÊNCIA. Requisitos. PERIGO DE DANO E verossimilhança DO DIREITO.
1. Os requisitos para a concessão da tutela de urgência são a probabilidade do direito pleiteado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo caso não concedida.
2. O fato de não haver nos autos elementos acerca da atuação da mãe do autor como empresária individual, nem indicação de qualquer receita percebida pela eventual existência do minimercado, evidencia a probabilidade do direito alegado.
3. O caráter alimentar do benefício e a ausência de renda capaz de assegurar a sobrevivência digna do autor revelam o perigo de dano.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 04 de dezembro de 2018.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000750384v4 e do código CRC c540b9b1.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 5/12/2018, às 19:28:15
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/12/2018
Agravo de Instrumento Nº 5035684-19.2018.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: ALLISON ALEXANDRO BUGS
ADVOGADO: DEBORA ELOIZA TODENDI
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/12/2018, na sequência 53, disponibilizada no DE de 16/11/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
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