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AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N. º 1. 657. 156/RJ. TEMA...

Data da publicação: 07/07/2020, 05:41:45

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DOENÇAS ONCOLÓGICAS. CACON/UNACON. PRESUNÇÃO DE ACERTO DA PRESCRIÇÃO MÉDICA. ESGOTAMENTO DAS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS DISPONÍVEIS NO SUS. DIRECIONAMENTO DA OBRIGAÇÃO. JUÍZO DA EXECUÇÃO. 1. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 3. Este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar. 4. In casu, o médico assistente, especialista em hematologia, referiu que não há tratamento disponível no SUS para doença recidivada (Leucemia pró-mielocítica aguda) e que o TRIÓXIDO DE ARSÊNIO é fundamental para atingir nova remissão e possibilitar que depois seja feito transplante de medula óssea. 5. O direcionamento da obrigação de fazer em matéria de direito à saúde deve ficar a cargo do juízo da execução. (TRF4, AG 5033771-65.2019.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 11/03/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5033771-65.2019.4.04.0000/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: MICHELE DO NASCIMENTO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, interposto pela União, contra decisão do Juízo da 4ª Vara Federal de Florianópolis-SC, que, nos autos do Processo n.º 5016530-12.2019.4.04.7200 (evento 7), deferiu a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada, determinando que os réus fossem obrigados a fornecer à parte autora, de forma solidária e gratuita, o medicamento TRIÓXIDO DE ARSÊNIO para tratamento de doença oncológica que lhe acomete (Leucemia pró-mielocítica aguda - CID 10 C92.4).

Em suas razões, a agravante sustenta não estarem presentes os requisitos autorizadores da tutela de urgência, nos termos do disposto no artigo 300 do Código de Processo Civil.

Refere a existência de alternativas eficazes disponíveis no SUS para tratamento da moléstia, discorrendo sobre a assistência oncológica no âmbito da rede pública e o processo de incorporação de tecnologias.

Argumenta, ainda, inexistir prova inequívoca do direito alegado, notadamente diante da ausência, até o momento, de perícia judicial, pugnando pela aplicação do Enunciado n.º 101 da Súmula deste Tribunal.

Requer a concessão de efeito suspensivo ao agravo para o fim de cassar a medida satisfativa deferida na origem.

Pleiteia, subsidiariamente, o direcionamento da obrigação de fazer ao Estado de Santa Catarina.

Sobreveio decisão monocrática, de minha lavra (evento 2), indeferindo a suspensão almejada.

Apresentadas as contrarrazões (evento 12), retornaram os autos conclusos para julgamento do mérito recursal.

É o relatório.

VOTO

Por ocasião da análise do pedido de concessão de efeito suspensivo, assim me manifestei:

A Constituição da República Federativa do Brasil, no que interessa ao deslinde desta causa, assim preconiza:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)

[...]

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III - participação da comunidade.

§ 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.

Exsurge dos dispositivos acima colacionados que o direito à saúde se traduz em um direito subjetivo público dos indivíduos de exigir do Estado prestações positivas, passíveis de garantia pela via judicial. Nesse aspecto, a velha concepção de que os preceitos constitucionais alusivos à matéria encerrariam diretrizes de caráter meramente programático restou há muito superada em face da necessidade imperiosa de que as normas definidoras das prerrogativas fundamentais, a exemplo dos direitos à vida e à saúde, tenham aplicação imediata, nos termos do artigo 5º, §1º, da Magna Carta, o que autoriza, por consectário, a interferência do Poder Judiciário, quando chamado a atuar, na concretização de tais direitos.

Inobstante, a problemática da judicialização do direito à saúde faz transparecer, à evidência, o conflito entre o que se convencionou denominar “mínimo existencial” e “reserva do possível”. Noutras palavras, em razão da carência de suportes financeiros suficientes à satisfação de toda e qualquer necessidade social, cumpre ao Poder Público, notadamente ao Legislativo e Executivo, enquanto formuladores e executores de políticas sanitárias, estabelecer prioridades e realizar escolhas alocativas, pautadas por critérios de macrojustiça. Doutro vértice, quando o Judiciário, norteado, a rigor, por parâmetros de microjustiça, entrega certa prestação de saúde a um determinado indivíduo que a postulou, acaba, por vezes, ignorando as consequências globais da destinação de recursos públicos em benefício de certa parte, com invariável prejuízo para o todo.

Nesse cenário, a tomada de decisão em matéria de saúde exige do magistrado notável racionalidade para compatibilizar, tanto quanto possível, direitos individuais indispensáveis à realização prática da dignidade da pessoa humana com a máxima efetividade das políticas públicas destinadas à coletividade.

Veja-se, pois, que a legislação infraconstitucional atinente à dispensação de fármacos (Lei n.º 8080/90), ao regular o comando normativo expresso no artigo 197 da Carta da República, tratou de vincular as ações do Sistema Único de Saúde à corrente intitulada de “Medicina com base em evidências”. Confira-se:

Art. 5º São objetivos do Sistema Único de Saúde SUS:

I - a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde;

II - a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômico e social, a observância do disposto no § 1º do art. 2º desta lei;

III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas.

Art. 6º Estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS):

I - a execução de ações:

[...]

d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;

[...]

Art. 19-M. A assistência terapêutica integral a que se refere a alínea d do inciso I do art. 6o consiste em: (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

I - dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P; (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

[...]

19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011) 1o A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, cuja composição e regimento são definidos em regulamento, contará com a participação de 1 (um) representante indicado pelo Conselho Nacional de Saúde e de 1 (um) representante, especialista na área, indicado pelo Conselho Federal de Medicina. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

§ 2o O relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS levará em consideração, necessariamente: (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

I - as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do medicamento, produto ou procedimento objeto do processo, acatadas pelo órgão competente para o registro ou a autorização de uso; (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

II - a avaliação econômica comparativa dos benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas, inclusive no que se refere aos atendimentos domiciliar, ambulatorial ou hospitalar, quando cabível. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

À vista de tal regramento, é possível concluir não haver direito incondicional a qualquer medicamento disponível no mercado, sob pena de gerar grave lesão à ordem administrativa e comprometer o próprio funcionamento do Sistema Único de Saúde. Além do que uma medicação em desconformidade com os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) do SUS deve ser vista com cautela, porquanto tende, em princípio, a contrariar um consenso científico vigente a respeito.

De toda sorte, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada n.º 175/CE, em 17-03-2010, estabeleceu, de forma paradigmática, critérios para solução judicial dos casos concretos envolvendo o direito à saúde. Naquela oportunidade, o Relator, Ministro Gilmar Mendes, concluiu que, a rigor, "deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente".

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça, reverberando a inteligência externada pelo Pretório Excelso, firmou entendimento de que a indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. (STJ, AgRg no AREsp 697.696/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 26-06-2015; STJ, AgRg no REsp 1.531.198/AL, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 08-09-2015; STJ, AgRg no AREsp 711.246/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 21-08-2015; STJ, AgRg no AREsp 860.132/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 13-04-2016).

Em idêntico sentido, transcrevo precedentes desta Corte:

MEDICAMENTOS. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS EXISTENTES. 1. Somente fará jus ao fornecimento do medicamento pelo Poder Público a parte que demonstra a respectiva imprescindibilidade, que consiste na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e da ausência de alternativa terapêutica. 2. Inexistente a prova de que tenha se esgotado a possibilidade de tratamento pelo estabelecimento da rede de atenção oncológica com aqueles medicamentos fornecidos a todos indistintamente, não há evidência nos autos acerca da presença dos requisitos autorizadores da tutela pretendida. (TRF4, Terceira Turma, Apelação n.º 50066499720174047000, rel. Desembargadora Fededal Marga Inge Barth Tessler, j. 06-03-2018)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. CONCESSÃO DE MEDICAMENTO. INDISPENSABILIDADE DO FÁRMACO. 1. O direito à saúde se traduz em um direito subjetivo público dos indivíduos de exigir do Estado prestações positivas, passíveis de garantia pela via judicial. Nesse aspecto, a velha concepção de que os preceitos constitucionais alusivos à matéria encerrariam diretrizes de caráter meramente programático restou há muito superada em face da necessidade imperiosa de que as normas definidoras das prerrogativas fundamentais, a exemplo dos direitos à vida e à saúde, tenham aplicação imediata, nos termos do artigo 5º, §1º, da Magna Carta, o que autoriza, por consectário, a interferência do Poder Judiciário, quando chamado a atuar, na concretização de tais direitos. 2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência, do esgotamento ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3. In casu, à luz do acervo probatório anexado aos autos originários, notadamente a prova pericial, restaram demonstradas a necessidade e adequação da medicação requerida. (TRF4, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Apelação Cível n.º 5000303-03.2017.4.04.7204, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, j. 28-08-2019)

Impende salientar, ainda, que a egrégia Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 25-04-2018, concluiu, sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 1.036, CPC/2015), o julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), de relatoria do Ministro Benedito Gonçalves, acerca da obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, ocasião em que foi firmada a seguinte tese jurídica:

A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:
i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.

Cumpre referir que o colegiado, na sessão de 12-09-2018, ao julgar os embargos de declaração opostos pelo Estado do Rio de Janeiro em face do acórdão que fixou a tese acima colacionada, entendeu por dar-lhes parcial provimento, sem efeitos infringentes, para o fim de esclarecer que onde se lê: "existência de registro na ANVISA do medicamento", leia-se: "existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência". Demais disso, houve por bem alterar o termo inicial da modulação de efeitos do recurso repetitivo para a data de publicação do aresto embargado, isto é, 04-05-2018.

A par da intelecção firmada pela Corte Superior de Justiça, considerando os princípios constitucionais da isonomia e segurança jurídica, e levando em conta que a presente ação foi ajuizada em 12-07-2019, posteriormente, portanto, ao citado marco modulatório, reputo inescusável o acatamento ao precedente estabelecido (art. 927, III, CPC/2015).

Assentadas tais premissas, passo ao exame do caso concreto.

De início, quanto à necessidade de que o deferimento de tutela provisória seja precedido de prova pericial, entendo que a adoção inflexível deste critério acabaria por esvaziar o inescusável acautelamento judicial de casos urgentes, pois, na maior das vezes, a realização de perícia técnica não se dá initio litis. Ademais, a própria natureza sumária do juízo de cognição exarado em análise de eventual tutela provisória desobriga o julgador a revelar alto grau de certeza jurídica acerca da pretensão posta em juízo, bastando-lhe, para fins de sua outorga, a constatação da plausibilidade do direito material vindicado, assim como do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, nos termos do artigo 300, caput, do Novo Código de Processo Civil.

Compulsando os autos principais, vislumbro, pois, que tais requisitos restaram satisfeitos.

A uma porque o médico assistente, especialista em hematologia, afirmou que sua paciente já se submeteu a tratamento quimioterápico de indução no âmbito do SUS, havendo, contudo, recidiva da doença (evento 1, ATESTEMED17). Afirmou que a quimioterapia de segunda linha com o medicamento pleiteado tem eficácia comprovada para o quadro clínico da autora, sendo considerada terapia de urgência.

Disse, ainda, que não há tratamento disponível no SUS para doença recidivada e que é fundamental o Trisenox para atingir nova remissão e possibilitar que depois seja feito transplante de medula óssea (evento 1, FORM12, fl. 3)

A duas porque que este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar. A esse respeito, transcrevo os seguintes julgados:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DEFERIMENTO. A parte autora realiza tratamento oncológico pelo Sistema Único de Saúde (SUS) junto a estabelecimento cadastrado como CACON (Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), afigurando-se prescindível a realização de perícia prévia à análise da antecipação de tutela postulada. (TRF4, AG 5016461-46.2019.4.04.0000, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, j. 31-07-2019)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ESGOTAMENTO DAS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS DISPONÍVEIS NO SUS. TUTELA PROVISÓRIA. DOENÇAS ONCOLÓGICAS. CACON/UNACON. PRESUNÇÃO DE ACERTO DA PRESCRIÇÃO MÉDICA. 1. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS. 3. In casu, a parte autora evidenciou a adequação do fármaco reclamado, bem como o fato de ter recebido tratamento fornecido pela rede pública, sem, contudo, alcançar resultados satisfatórios. 4. Este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar. (TRF4, AG 5025194-98.2019.4.04.0000, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Relator Des. Federal Celso Kipper, j. 28-08-2019, sem o grifo no original)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. MEDICAMENTOS. DOENÇA GRAVE. PERÍCIA. CACON. A ausência de perícia não obsta a concessão da tutela antecipada pois os estabelecimentos de saúde habilitados como CACON são competentes para indicar a medicação necessária e adequada no âmbito do sistema público de saúde. (TRF4, AG 5047808-68.2017.4.04.0000, Quarta Turma, Relator Des. Federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, juntado aos autos em 14/12/2017)

Veja-se, pois, que a inteligência firmada nesta Corte supervaloriza a orientação médica do profissional vinculado à Rede de Atenção Oncológica, sendo exatamente esta a hipótese sub examine, na qual a prescrição do fármaco se deu no âmbito do Serviço de Hematologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis-SC, nosocômio que ostenta a qualidade de UNACON (evento 01, RECEIT19).

A três porque este Colegiado - recentemente - já deferiu o fármaco ora requerido para jurisdicionado cujo quadro de saúde é de todo similar ao da parte autora, a saber:

PREVIDENCIÁRIO E SAÚDE. MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. PREVALÊNCIA DA ESSENCIALIDADE DO DIREITO À SAÚDE SOBRE OS INTERESSES FINANCEIROS DO ESTADO. 1. A União, Estados-Membros e Municípios têm legitimidade passiva e responsabilidade solidária nas causas que versam sobre fornecimento de medicamentos. 2. A solidariedade não induz litisconsórcio passivo necessário, mas facultativo, cabendo à parte autora a escolha daquele contra quem deseja litigar, sem obrigatoriedade de inclusão dos demais. Se a parte escolhe litigar somente contra um ou dois dos entes federados, não há a obrigatoriedade de inclusão dos demais. 2. Para fazer jus ao recebimento de medicamentos fornecidos por entes políticos, deve a parte autora comprovar a sua atual necessidade e ser aquele medicamento requerido insubstituível por outro similar/genérico no caso concreto. 3. Mantida a sentença para condenação da parte demandada ao fornecimento do medicamento à paciente paradigma, conforme prescrição médica (perícia judicial). (TRF4, AC 5010399-55.2018.4.04.7200, TRS-SC, Relator Desembargador Federal Jorge Antônio Maurique, juntado aos autos em 06/09/2019)

Dessarte, assimilado o referido quadro fático-probante, e havendo prova do registro do fármaco na ANVISA, bem como da incapacidade financeira da autora - atualmente em gozo de auxílio-doença no valor de R$ 1.117,96 - de arcar com o custo do tratamento prescrito, o qual supera a quantia de R$ 100.000,00 (cem mil reais), entendo deva ser mantida a tutela de urgência deferida na origem.

Direcionamento da obrigação

Gizo que a intervenção do Poder Judiciário, neste particular, revela-se inviável, porquanto o vínculo da solidariedade franqueia a possibilidade de os devedores da obrigação serem demandados isolada ou conjuntamente, de modo que o acerto financeiro entre os entes deve ocorrer na via administrativa.

Dispositivo

Ante o exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo.

Diante do conteúdo da deliberação singular acima transcrito, não vejo razões para alterar o posicionamento por mim então adotado.

Sobre a responsabilidade financeira e o direcionamento da obrigação, passo a tecer as seguintes considerações.

A norma constitucional extraída do artigo 196 da Carta Magna consagra a responsabilidade solidária dos entes federativos em matéria de saúde pública, eis que o vocábulo "Estado", considerado em sua maior amplitude, retrata o Poder Público como um todo, alcançando, indubitavelmente, a União, os Estados propriamente ditos, o Distrito Federal e os Municípios.

A reforçar tal ilação, o artigo 23, inciso II, bem como o artigo 198, caput e §1º, ambos do Texto Maior, trataram de firmar a competência comum das pessoas federativas com relação à prestação de serviços públicos de saúde e de instituir um Sistema Único de Saúde (SUS), cujo financiamento fosse levado a efeito a partir dos recursos orçamentários de todos os entes.

A jurisprudência corrente dos Tribunais Superiores orienta-se, de maneira uniforme, no sentido de que a responsabilidade dos entes federados traduz litisconsórcio passivo facultativo, de modo que, em ações deste jaez, é dado ao cidadão enfermo obter os medicamentos de que necessite perante quaisquer das pessoas políticas, cabendo-lhe, portanto, o direito subjetivo de demandá-las em conjunto ou isoladamente.

Nada obstante, destaco que o Supremo Tribunal Federal, na sessão de 23 de maio de 2019, ao julgar os embargos de declaração opostos pela União contra decisão do Plenário Virtual no RE n.º 855178/SE (Tema 793), com relatoria para o acórdão do Ministro Edson Fachin, fixou, por maioria, a seguinte tese de repercussão geral:

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro (grifei)

Embora a Corte Suprema tenha reafirmado sua jurisprudência prevalente - no sentido de reconhecer a responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de direito à saúde -, tratou de inovar no cenário jurídico, ao exigir, de forma expressa, que o magistrado direcione o cumprimento da obrigação, segundo as normas de repartição de competências, assim como condene a pessoa política legalmente responsável pelo financiamento da prestação sanitária a ressarcir quem suportou tal ônus.

Quanto ao pleito de direcionamento da obrigação, invoco a recente compreensão do Superior Tribunal de Justiça de que a tese firmada no julgamento do Tema 793 pelo Supremo Tribunal Federal, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença (AgInt no CC n.º 166.964/RS, Rel. Min. Og Fernandes, 1ª Seção, j. 23/10/2019), razão pela qual relego ao juízo da execução o encargo de direcionar o cumprimento da ordem judicial.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001659829v4 e do código CRC 4c6f9ed4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 10/3/2020, às 20:24:7


5033771-65.2019.4.04.0000
40001659829.V4


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:41:45.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5033771-65.2019.4.04.0000/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: MICHELE DO NASCIMENTO

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. RECURSO ESPECIAL N.º 1.657.156/RJ. TEMA 106 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DOENÇAS ONCOLÓGICAS. CACON/UNACON. PRESUNÇÃO DE ACERTO DA PRESCRIÇÃO MÉDICA. ESGOTAMENTO DAS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS DISPONÍVEIS NO SUS. DIRECIONAMENTO DA OBRIGAÇÃO. JUíZO DA EXECUÇÃO.

1. Nos termos definidos no julgamento do REsp n.º 1.657.156/RJ (Tema 106 - STJ), a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.

2. A indispensabilidade do medicamento vindicado nas demandas alusivas às prestações de saúde deve ser aferida não apenas em razão da comprovada eficácia do fármaco no tratamento de determinada doença, mas, também, da inexistência ou da patente inefetividade das opções terapêuticas viabilizadas pelo SUS.

3. Este Tribunal tem entendimento cristalizado no sentido de que, em casos de tratamento de doenças oncológicas perante unidades credenciadas como CACON/UNACON, existe, a princípio, presunção de acerto da prescrição médica, razão pela qual, nesses casos, dispensa-se a realização de perícia antes do exame do pleito liminar.

4. In casu, o médico assistente, especialista em hematologia, referiu que não há tratamento disponível no SUS para doença recidivada (Leucemia pró-mielocítica aguda) e que o TRIÓXIDO DE ARSÊNIO é fundamental para atingir nova remissão e possibilitar que depois seja feito transplante de medula óssea.

5. O direcionamento da obrigação de fazer em matéria de direito à saúde deve ficar a cargo do juízo da execução.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 09 de março de 2020.



Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001659830v4 e do código CRC a4441b8b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 10/3/2020, às 20:24:7


5033771-65.2019.4.04.0000
40001659830 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:41:45.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 02/03/2020 A 09/03/2020

Agravo de Instrumento Nº 5033771-65.2019.4.04.0000/SC

RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: MICHELE DO NASCIMENTO

ADVOGADO: ANDRÉ DIAS PEREIRA (DPU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 02/03/2020, às 00:00, a 09/03/2020, às 14:00, na sequência 628, disponibilizada no DE de 18/02/2020.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:41:45.

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