Agravo de Instrumento Nº 5011525-70.2022.4.04.0000/SC
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: JUDITE DALAZEN DEL CASTANHEL
RELATÓRIO
Cuida-se de agravo de instrumento manejado pelo INSS contra a decisão proferida pelo Juízo Substituto da 3ª Vara Federal de Criciúma/SC que, nos autos da execução de sentença nº 5003039-38.2010.4.04.7204, reconheceu a boa-fé da segurada no recebimento de valores superiores aos devidos a título de benefício previdenciário, determinando a suspensão dos descontos realizados sobre o valor mensal da sua aposentadoria, bem como a restituição do montante já descontado.
Alegou a parte agravante, em resumo, que o "fundamento utilizado pelo despacho é equivocado, eis que a comprovação de boa-fé dos recebimentos é irrelevante ao caso, pois os valores pagos a maior decorrem do cumprimento de decisão judicial precária/não transitada em julgado".
Argumentou que "a própria autora concordou e efetuou a devolução voluntária da importância de R$ 11.297,48, correspondente aos valores recebidos a maior no período de 03/2005 a 11/2009 (Eventos 86, 88 e 101 do Processo originário nº 5003039- 38.2010.404.7204/SC)".
Prosseguiu dizendo que, "pela coerência, nada mais razoável que também devolva as diferenças vencidas posteriormente, até a data da implantação da renda mensal correta na via administrativa do INSS".
Pugnou pelo provimento do recurso, "para fim de reconhecer o débito administrativo decorrente do cumprimento do julgado, autorizando o INSS a retomar a consignação dos valores pagos a maior até a revisão da RMI/RMA".
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Assim estabeleceu a decisão agravada (evento 196 - DESPADEC1):
A decisão do evento 172, deferiu a tutela de urgência para o fim de determinar que o INSS suspenda, em 48 horas, os descontos sobre a aposentadoria por tempo de contribuição nº 144.674.951-4, relativos ao complemento negativo de R$ 20.861,92 (evento 162, out2, p. 238), bem como suspendeu o processo em razão do Tema 979 do STJ.
Restituição dos valores pagos além dos devidos.
Assim decidiu o STJ no Tema 979, em 10.03.2021:
Tese Firmada:
Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
Modulação dos efeitos:
Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão." (Acórdão publicado no DJe de 23/4/2021).
Afetado na sessão do dia 09/08/2017 (Primeira Seção).
Vide Controvérsia 4/STJ.
Vide Tema 692/STJ.
O Tema 692/STJ diferencia-se deste, pois, de acordo com o Ministro Relator: "Ressalte-se que a referida controvérsia é distinta da solucionada no julgamento do Tema n. 692, vinculado ao Recurso Especial Repetitivo 1.401.560/MT, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. p/ Acórdão Min. Ari Pargendler, no qual a Primeira Seção firmou o entendimento de que "a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos" (decisão publicada no DJe de 16/08/2017).
Pois bem.
Inicialmente, importante afirmar que não se trata de valores recebidos pela parte autora a título de tutela antecipada, motivo pelo qual se aplica o tema 979 do STJ.
No caso em tela, resta claro que houve erro material na sentença proferida no processo 200572040026995, quando da fixação da RMI e da DIB do benefício da Exequente, senão vejamos trecho da decisão do evento 172:
Como se pode observar, o INSS vem descontando parcela mensal sobre o valor da aposentadoria da parte autora, uma vez que apurou diferenças em razão da redução da RMI promovida em grau de recurso, após correção do erro material verificado na sentença proferida nso autos 2005.72.04.002699-5, que havia fixado, por equívoco, a DIB 29/03/2005 (evento 162, out2, p. 216), quando o correto era 16/05/2003.
O INSS implantou o benefício conforme sentença (evento 162, out2, p. 234, sob o nº 1446749514), com RMI de R$ 728,70. Posteriormente, corrigiu a RMI do benefício consoante decisão proferida pelo TRF4 para R$ 694,50 (evento 162, out2, p. 251). Em razão da redução do valor da RMI, a autarquia apurou o valor de R$ 20.861,92 (evento 162, out2, p. 238) que teria a autora recebido a maior, o que motivou os descontos mensais em seu benefício.
A parte exequente requereu no pedido do evento 162 que o Juízo determine que a autarquia suspenda os descontos ilegais que vem realizando no beneficio da Autora, bem como restituía os valores descontados indevidamente, a contar de julho de 2016, com juros e correção monetária.
Contudo, a questão em análise envolve nitidamente recebimento de valores recebidos de boa-fé, uma vez que, pela narrativa dos acontecimentos, o erro no benefício da parte autora não foi promovido por ela.
De fato, a Exequente não pode ser penalizada por erro não cometido por ela, restando evidente o recebimento de boa-fé dos valores em questão.
Caberia ao INSS, no caso em tela, comprovar a má-fe da autora, o que não ocorreu e nem poderia ser diferente, pois, como visto, o erro que levou ao pagamento de valor superior ao devido foi judicial.
Sobre o tema, trago o seguinte julgado:
PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO. VALORES PAGOS POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DA LEI, ERRO MATERIAL OU OPERACIONAL DO INSS. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. Considerando a data em que ocorrida a impetração, antes do julgamento do Tema 979 do STJ, caberia à autarquia a insofismável demonstração da existência de má-fé por parte do segurado, sem o que há de prevalecer a presunção de boa-fé quanto aos valores recebidos pelo segurado. 2. Mesmo que se exigissem os requisitos imposto no referido Tema: (i) o pagamento decorrente de interpretação errônea da lei não é suscetível de repetição; (ii) o pagamento decorrente de erro material ou operacional é suscetível de repetição, salvo comprovada boa-fé do segurado; (iii) a exigência de comprovação da boa-fé vale para os processos distribuídos a partir de 23 de abril de 2021; (iv) a repetição, quando admitida, permite o desconto do percentual de até 30% do valor do benefício do segurado (Tema 979, STJ), no caso concreto verifica-se a inaptidão do segurado "para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento"(STJ, REsp 1381734/RN, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021, p. 31). (TRF4 5001561-48.2017.4.04.7204, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 05/08/2021)
Logo, confirmada a tutela de urgência deferida o evento 172, deverá o INSS abster-se de cobrar, definitivamente, da parte autora o complemento negativo de R$ 20.861,92 (evento 162, out2, p. 238).
Os valores descontados da renda mensal do benefício da Exequente (1446749514) devem ser a ela restituídos, com atualização monetária pelo INPC e juros moratórios idênticos aos juros aplicados à caderneta de poupança, com incidência uma única vez (juros não capitalizados), nos termos da redação da Lei n. 11.960/09.
Intimem-se.
Decorrido o prazo, expeça-se requisição de pagamento.
Oportunamente, dê-se baixa e arquive-se.
A respeito da matéria em debate, a jurisprudência deste Tribunal firmou-se no sentido da impossibilidade de repetição de valores recebidos de boa-fé pelo segurado, em face do caráter alimentar das prestações previdenciárias.
A propósito, os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE PELO SEGURADO POR ERRO ADMINISTRATIVO. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. Indevida a restituição e/ou desconto de valores pagos aos segurados por erro administrativo e cujo recebimento deu-se de boa-fé, em face do princípio da irrepetibilidade ou da não devolução dos alimentos. 2. Relativização do estabelecido nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. (TRF4 5019942-21.2014.404.7201, NONA TURMA, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 07/08/2017)
PROCESSO CIVL E PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO.DOS VALORES PAGOS EM RAZÃO DE ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ DO SEGURADO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES. IRREPETIBILIDADE. 1. É indevida a devolução de valores recebidos em decorrência de erro da Administração Pública no pagamento do benefício previdenciário, tanto em razão da boa-fé do segurado e da sua condição de hipossuficiente, como também em virtude do caráter alimentar das parcelas e da irrepetibilidade dos alimentos. (TRF4 5014634-88.2015.404.7000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 21/10/2016).
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. É indevida a devolução de valores recebidos em decorrência de erro da Administração Pública no pagamento do benefício previdenciário, tanto em razão da boa-fé do segurado e da sua condição de hipossuficiente, como também em virtude do caráter alimentar das parcelas. Precedentes do STJ e desta Corte. 2. No caso em tela, a autora, beneficiária de pensão por morte desde 1969, contraiu novo matrimônio em 1971, ato que levaria à perda da qualidade de dependente pela legislação da época (Decreto 60.501/67, art. 15, VI). Quando requereu a pensão por morte em decorrência do falecimento do novo cônjuge, em 2011, foi informada de que houve pagamento indevido da pensão por morte no período de 40 anos, havendo lançamento do débito. Irrepetibilidade dos valores recebidos de boa-fé. (TRF4, APELREEX 0014099-11.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 08/11/2016).
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. AUDITORIA. AUXÍLIO DOENÇA. ERRO ADMINISTRATIVO. VALORES PERCEBIDOS DE BOA-FÉ. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. LEI 11.960/09. DIFERIDOS. HONORÁRIOS. ADVOCATÍCIOS. 1. A Administração possui o poder-dever de anular seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade, assegurado o contraditório e ampla defesa. 2. A jurisprudência do STJ e também deste regional são uniformes no sentido de, em face do princípio da irrepetibilidade e da natureza alimentar das parcelas, não ser possível a restituição de valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro administrativo, e cujo recebimento deu-se de boa-fé pelo segurado. 3. Admitida a relativização do art. 115, II, da Lei nº 8.213/1991 e art. 154, §3º, do Decreto nº 3.048/1999, considerando o caráter alimentar da verba e o recebimento de boa-fé pelo segurado, o que se traduz em mera interpretação conforme a Constituição Federal. 4. Matéria referente aos critérios de aplicação dos juros de mora e correção monetária sobre os valores devidos que fica diferida para a fase de execução/cumprimento. 5. Honorários advocatícios arbitrados em valor condizente com a natureza da causa, o proveito econômico e o trabalho do profissional. (TRF4 5008574-21.2014.404.7005, DÉCIMA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 19/10/2017)
No mesmo sentido, a jurisprudência do STJ, como se vê das ementas a seguir:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (REsp 1550569/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 18/05/2016).
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016).
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o assunto, em exame de matéria repetitiva (Tema 979), fixando a seguinte tese:
Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. (REsp 1381734/RN, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021).
No mesmo julgamento, foram modulados os efeitos do representativo de controvérsia para atingir somente os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do acórdão (23-04-2021).
No caso concreto, o montante cuja restituição o INSS postula decorre da implantação da aposentadoria concedida pelo título judicial, efetivada com uma RMI superior àquela efetivamente devida, antes do julgamento definitivo dos embargos do devedor que opusera .
O primeiro ponto a se destacar, neste contexto, é que não se está diante de valores pagos a título de antecipação de tutela ou decisão judicial precária, como alega o INSS, mas sim do cumprimento da obrigação de fazer decorrente de acórdão já transitado em julgado.
A segunda questão a ser observada é que os valores empregados para a implantação do benefício foram apurados pela própria Autarquia Previdenciária, que indicou um montante incontroverso posteriormente reconhecido por excessivo. Ou seja, a segurada não concorreu para que o benefício fosse pago em valores superiores ao efetivamente devido.
Explico.
Compulsando os autos originários, verifica-se que no dia 16-11-2010 a segurada ajuizou execução de sentença visando à implantação da aposentadoria concedida pelo título judicial. Na ocasião, indicou uma RMI de R$ 808,22 (evento 1 - CALC4 - p. 9) e um montante total devido de R$ 104.587,21 (evento 1 - INIC1 - p. 3).
No dia 08-02-2011, o INSS opôs embargos à execução, impugnando os valores postulados pela segurada. Reconheceu devida a quantia de R$ 82.552,86 e indicou uma RMI de R$ 883,69 (evento 1 - CALC2 dos embargos à execução nº. 50003724520114047204).
Visando à instrução daquele feito, em 24-03-2011, foi prestada informação pela Contadoria Judicial, da qual se extrai (evento 8 - INF1):
1. A CONTA EMBARGADA: não demonstrou de que forma apurou a RMI de R$ 808,22, de forma que a análise de sua conta fica prejudicada;
2. A CONTA DO INSS: apurou diferenças com base em RMI calculada para 29/03/2005, no valor de R$ 883,69;
3. Salvo melhor entendimento, as diferenças devidas devem ser apuradas com base na RMI calculada para 16/05/2003 (DER), no valor de R$ 893,27, com diferenças a partir de 29/03/2005 (data do ajuizamento), como estabelecido no decisum;
4. De se anotar que a autarquia já implantou o benefício 42/144674046-0 com RMI de R$ 893,27 para 03/2005, conforme INFBEN que ora juntamos, com DIP a partir de 01/12/2009;
5. O total apurado por esta Contadoria alcança R$ 94.971,07 para 09/2010.
As informações e os cálculos elaborados pela Contadoria Judicial foram homologados pela sentença proferida em 17-10-2011, que acolheu parcialmente os embargos (evento 17 - SENT1).
Contra a sentença, o INSS interpôs recurso de apelação, sob os seguintes fundamentos (evento 22 - APELAÇÃO1):
Com efeito, em que pese a Contadoria Judicial tenha consignado que “3. Salvo melhor entendimento, as diferenças devidas devem ser apuradas com base na RMI calculada para 16/05/2003 (DER), no valor de R$ 893,27, com diferenças a partir de 29/03/2005 (data do ajuizamento), como estabelecido no decisum”, verifica-se que a própria Contadoria Judicial reconhece que “2. A CONTA DO INSS: apurou diferenças com base em RMI calculada para 29/03/2005, no valor de R$ 883,69” e que “4. De se anotar que a autarquia já implantou o benefício 42/144674046-0 com RMI de R$893,27 para 03/2005, conforme INFBEN que ora juntamos, com DIP a partir de 01/12/2009”.
Ou seja, partindo-se da premissa que a RMI deve ser calculada para 16/05/2003, e que o INSS, na verdade, apurou a RMI para 29/03/2005, o valor devido ao autor, ora embargado, é ainda menor do que o inicialmente apurado pelo INSS e apontado na inicial dos presentes embargos. De fato, consoante simulação efetuada pelo Setor de Cálculos, em anexo, a RMI do benefício para 16/05/2003 é R$694,50, tomando-se no período básico de cálculo os salários-de-contribuição anteriores a esta data.
É cediço que ao patrimônio público devem ser emprestadas as maiores atenções, porquanto fruto da disponibilidade de todos que integram a sociedade brasileira.
Não é sem razão que a indisponibilidade do interesse e patrimônio público revela-se como pilar do direito administrativo, conforme nos ensina o eminente professor Celso Antônio Bandeira de Mello.
Assim, a sentença merece ser reformada para que seja considerado como a RMI o valor de R$694,50, conforme cálculos em anexo, devendo os autos retornar à Contadoria Judicial para a confecção de novos cálculos, observando-se os índices oficiais de correção utilizados pelo INSS, bem como descontando os valores pagos pelo INSS na esfera administrativa, conforme, aliás, já determinado na sentença.
Apenas naquele momento, em 22-11-2011, após o julgamento dos embargos do devedor, é que o INSS apresentou novos cálculos, indicando como correta uma RMI de R$ 694,50 (evento 22 - CALC2).
O apelo da Autarquia Previdenciária foi provido, por acórdão que assim estabeleceu (evento 6 - VOTO2 da AC nº. 5000372-45.2011.4.04.7204):
Desta forma, impõe-se o refazimento dos cálculos dos atrasados, que devem partir do valor da RMI na DIB (16/05/2003), correspondente a R$ 694,50 (evento 2, calc2). Tal valor evoluirá até 29/03/2005, a partir de quando são devidas as prestações em atraso, pelos índices fixados no título.
Entendo evidenciada, neste contexto, a boa-fé objetiva da segurada, uma vez que os valores adotados para a implantação administrativa do benefício foram apurados pelo próprio INSS, sendo inclusive superiores ao valor da RMI que havia sido indicada na inicial da execução de sentença.
Assim, cumpre aplicar a ressalva constante da parte final da tese fixada pelo STJ no julgamento do citado Tema Repetitivo nº 979, determinando-se ao INSS que, de imediato, cesse os descontos realizados sobre o valor da renda mensal do benefício da segurada, bem como restitua os valores eventualmente já ressarcidos a esse título.
Em situação semelhante, já decidiu neste mesmo sentido esta Turma Julgadora:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REEXAME NECESSÁRIO. VALORES PERCEBIDOS A TÍTULO DE BENEFÍCIOS INACUMULÁVEIS. INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. BOA-FÉ OBJETIVA DO SEGURADO. IRREPETIBILIDADE. TEMA 979 STJ. ORDEM CONCEDIDA. 1. Tem a parte impetrante direito à declaração da inexistência do débito referente ao ato administrativo que exige da parte autora a devolução de valor de R$ R$101.883,29 (cento e um mil oitocentos e oitenta e três reais e vinte e nove centavos), recebidos a título de auxílio-acidente nº 94/063.244.401-0, no período de 26/08/2014 a 31/12/2019. 2. Hipótese em que a parte impetrante buscava ver reconhecida a irrepetibilidade dos valores que lhe foram pagos indevidamente a título de benefício inacumulável, em razão da boa-fé no recebimento. 3. O STJ, ao julgar o REsp 1.381.734/RN, selecionado como recurso repetitivo, Tema 979, firmou tese no sentido de que os pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 4. Evidenciado que o pagamento indevido ocorreu exclusivamente em virtude de erro operacional da Administração ao não proceder ao cancelamento do benefício de auxílio-acidente no momento devido, não se podendo exigir do beneficiário, que não concorreu para o erro verificado, a inequívoca compreensão de que a manutenção do pagamento do benefício fosse indevida, especialmente quando a constatação da irregularidade, pelo próprio INSS, ocorreu mais de cinco anos após o início do pagamento irregular. 5. Presente a boa-fé, nos moldes em que definida no julgamento do Tema 979 do STJ, são irrepetíveis as parcelas indevidas percebidas pelo demandante a título de auxílio-acidente, a contar da data de início da aposentadoria, devendo a Autarquia se abster de efetuar a cobrança respectiva. 6. Mantida a sentença que concedeu a segurança. (TRF4 5000425-69.2020.4.04.7217, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 14/12/2022)
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos da fundamentação.
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Data e Hora: 13/3/2024, às 17:10:57
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Agravo de Instrumento Nº 5011525-70.2022.4.04.0000/SC
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: JUDITE DALAZEN DEL CASTANHEL
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. RESSARCIMENTO DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE AO SEGURADO. TEMA 979 DO STJ. RESSALVA. BOA FÉ OBJETIVA DEMONSTRADA NA HIPÓTESE.
1. No julgamento do Tema Repetitivo nº 979, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido" (REsp 1381734/RN, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021).
2. Na mesma sessão, foram modulados os efeitos do representativo de controvérsia para atingir somente os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do acórdão (23-04-2021).
3. No caso concreto, restou demonstrada a boa-fé objetiva da segurada, uma vez que os valores adotados para a implantação administrativa do benefício foram apurados pelo próprio INSS (sendo inclusive superiores ao valor da RMI que havia sido indicada na inicial da execução de sentença), tendo aplicação, portanto, a ressalva constante da parte final da citada tese.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 12 de março de 2024.
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Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 13/3/2024, às 17:10:57
Conferência de autenticidade emitida em 21/03/2024 04:01:34.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 05/03/2024 A 12/03/2024
Agravo de Instrumento Nº 5011525-70.2022.4.04.0000/SC
RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: JUDITE DALAZEN DEL CASTANHEL
ADVOGADO(A): LEONARDO SANTOS DE OLIVEIRA (OAB SC017479)
ADVOGADO(A): CRISTINA FRELLO JOAQUIM GUESSI (OAB SC029655)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 05/03/2024, às 00:00, a 12/03/2024, às 16:00, na sequência 492, disponibilizada no DE de 23/02/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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