Agravo de Instrumento Nº 5021594-35.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: JOSE DE MORAIS ANTUNES
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
José de Morais Antunes interpôs agravo de instrumento, com requerimento de antecipação de tutela recursal, contra decisão proferida em procedimento comum (evento 23, DESPADEC1, dos autos originários), nos seguintes termos:
[...]
1. Trata-se de ação de procedimento comum, no qual a parte autora requer a revisão de benefício previdenciário.
Remetidos à Contadoria, esta apurou valor inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, como valor da causa (evento 21).
A matéria acerca da competência do Juizado Especial Federal Cível é absoluta.
A Lei 10.259/2001, que prevê a criação dos Juizados Especiais no âmbito da Justiça Federal, dispõe em seu art. 3º:
"Art. 3º Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças.
[...]
§ 2º Quando a pretensão versar sobre obrigações vincendas, para fins de competência do Juizado Especial, a soma de doze parcelas não poderá exceder o valor referido no art. 3o, caput.
Tendo em vista que o valor da causa é inferior a 60 salários mínimos, qual seja, R$ 3.057,77 o rito a ser seguido pelo presente feito é o do Juizado Especial Cível Federal, nos termos do art. 3º, caput e § 2º, da Lei n° 10.259/01.
2. Intime-se.
3. Preclusa, retifique-se a autuação do feito para a classe PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
[...]
Sustentou o agravante que, dentre outros pedidos, consta a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a soma dos salários-de-contribuição vertidos de forma simultânea, bem como aplicação da média sem limitação ao teto vigente, quando atualizados monetariamente, na fase de cálculo. Alegou que, portanto, ao excluir do cálculo do valor da causa uma parte do pedido, houve exame antecipado do mérito da ação. Postulou, ao final, a concessão de gratuidade da justiça.
Foi indeferido o pedido de antecipação de tutela recursal.
Sem contrarrazões, vieram os autos.
VOTO
Admissibilidade do agravo
Inicialmente, o presente recurso foi interposto tempestivamente contra decisão que, a rigor, não se enquadra nas hipóteses de cabimento do agravo de instrumento (art. 1.015 do CPC).
Porém, o julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, em sistemática de recurso repetitivo, no REsp 1696396/MT e no REsp 1704520/MT, deu oportunidade à construção de tese que permite o julgamento de recursos interpostos de decisões não contempladas na legislação, em contexto marcado pelo regime de urgência. A tese firmada no Tema n.° 988 do STJ é no seguinte sentido:
O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação.
Discute-se, no presente caso, a possibilidade de adequação do valor atribuído à causa para definição da competência do juízo.
Em situação como esta, a apreciação da questão apenas por oportunidade do julgamento de eventual apelação interposta de sentença superveniente conduziria certamente a um resultado tardio à parte recorrente, que teria que aguardar o fim do sobrestamento para somente ver corrigida apontada ilegalidade quanto esta já tiver ocasionado por completo os efeitos não pretendidos.
Admite-se, portanto, para prevenir a ineficácia da deliberação extemporânea em grau de recurso, também neste caso, a interposição do agravo de instrumento.
Mérito
O valor da causa deve corresponder à quantia correspondente à soma de todos os pedidos (artigo 292, VI, do CPC).
Contudo, diversas ações têm o critério de fixação do valor da causa expressamente estabelecidos na própria legislação (art. 292 do Código de Processo Civil).
O Código de Processo Civil de 2015 possibilita, para contornar a ausência de adequação do valor da indenização pretendida, expressamente a modificação ex officio do valor da causa pelo juiz, quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor (art. 292, §3º).
A atribuição do valor da causa, por outro lado, não exige a demonstração do valor exato do conteúdo patrimonial em discussão, sobretudo quando a determinação precisa e rigorosa é impossível ou requer o auxílio de profissional especializado. Em ações previdenciárias, essa exigência acabaria inviabilizando o acesso à Justiça, já que os segurados não dispõem de recursos para custear a contratação de perito contador. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite que o valor da causa seja fixado por estimativa nessas hipóteses:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE AMBIENTAL. RESÍDUOS INDUSTRIAIS TÓXICOS DEPOSITADOS EM LOCAL ONDE FOI CONSTRUÍDO CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. VALOR DA CAUSA. PROVEITO ECONÔMICO. MENSURAÇÃO IMEDIATA INVIÁVEL. FIXAÇÃO POR ESTIMATIVA. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Conforme os ditames dos arts. 258 e 259, II, do CPC/73, o valor da causa deve corresponder ao conteúdo econômico da demanda, considerado como tal o benefício a ser auferido pela parte, caso o pedido venha a ser julgado procedente, devendo corresponder à soma de todos os valores pretendidos na ação de indenização. 2. Admite-se que o valor da causa seja fixado por estimativa, quando não for possível a determinação exata da expressão econômica da demanda, estando sujeito a posterior adequação ao valor apurado na sentença ou na fase de liquidação. Precedentes. 3. No caso, é razoável admitir o valor da causa estimado pelos autores, em caráter provisório, passível de posterior adequação ao valor apurado na sentença ou na fase de liquidação, sendo este, e não aquele, o que repercutirá na fixação dos ônus sucumbenciais. 4. Agravo interno parcialmente provido para conhecer do agravo e dar parcial provimento ao recurso especial. (AgInt no AREsp 813.474/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 06/08/2019, DJe 20/08/2019)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. NULIDADE DE PATENTE. QUANTIA ESTIMADA. POSSIBILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. REAVALIAÇÃO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. "A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de ser admissível a fixação do valor da causa por estimativa, quando constatada a incerteza do proveito econômico perseguido na demanda" (AgRg no AREsp n. 583.180/RJ, Relator Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/8/2015, DJe 27/08/2015). 2. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem incursão no contexto fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula n. 7 do STJ. 3. No caso concreto, as instâncias de origem avaliaram a prova dos autos para concluir que o valor atribuído à causa guarda correspondência com o possível proveito econômico pretendido pela parte. O acolhimento do pedido de redução da quantia estimada pelo autor encontra óbice na referida súmula. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1346772/RJ, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019)
Caso concreto
No presente caso, o agravante ajuizou a ação nº 50055800820194047114, com o seguinte pedido (evento 1, INIC1, do processo originário):
[...]
Diante do exposto e com base no direito supra aduzido, respeitosamente, requer a V. Exa.: (...)
d) seja julgado o feito integralmente procedente para determinar a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a soma dos salários-de-contribuição vertidos de forma simultânea, bem como, seja apurada a média sem limitação para, apenas após, seja aplicado o fator previdenciário e calculado o valor da nova RMI;
e) a implantação do novo RMI no benefício de nº 166926191-0;
f) a condenação da autarquia ré a pagar ao autor as diferenças resultantes, a contar da data da concessão do benefício (12/04/2014), ressalvado valores já recebidos administrativamente, com a aplicação de juros e correção monetária oficial, ora apurado em R$ 163.172,69 (cento e sessenta e três mil, cento e setenta e dois reais e sessenta e nove centavos, nos termos do demonstrativo incluso, e vincendas a serem apuradas em liquidação de sentença; (...)
Valor da causa: R$ 163.172,69.
[...]
No evento 5 do processo originário, foi assim determinado:
Intime-se a parte autora para emendar a inicial, no prazo de 15 dias, demonstrando documentalmente que houve salários-de-contribuição superiores ao teto da Previdência Social, nas empresas RBSTV, Disvale e Fruki.
Esclareço que o CNIS (como objetivado pelo autor) não é prova dos salários-de-contribuição, mas sim dos salários brutos (isso porque a contribuição social patronal incide sobre o salário bruto, informação que a Receita Federal necessita). É bastante provável que a empresa tenha descontado do autor contribuição social limitada ao teto da Previdência Social, pois é o que determina a legislação (art. 28, § 5º da Lei 8.213/91).
A prova dos salários-de-contribuição é feita com a apresentação das folhas de pagamento, onde constam as informações do salário-de-contribuição e do valor descontado do empregado.
Não atendida a determinação, ou não havendo a prova de salário-de-contribuição superior ao teto, resta somente o pedido de soma das atividades concomitantes (no período de 5 meses - 11/2013 a 03/2014), devendo o autor, no mesmo prazo de 15 dias, apresentar novo cálculo de valor da causa.
Em resposta, o autor apresentou petição no sentido de que fosse reconsiderada esta determinação (evento 8, PED_RECONSIDERAÇÃO1, do processo originário).
Foi proferida nova decisão (evento 10, DESPADEC1, do processo originário):
Intime-se a parte autora para emendar a inicial, no prazo de 15 dias, demonstrando documentalmente que houve salários-de-contribuição superiores ao teto da Previdência Social, nas empresas RBSTV, Disvale e Fruki.
Esclareço que o CNIS (como objetivado pelo autor) não é prova dos salários-de-contribuição, mas sim dos salários brutos (isso porque a contribuição social patronal incide sobre o salário bruto, informação que a Receita Federal necessita). É bastante provável que a empresa tenha descontado do autor contribuição social limitada ao teto da Previdência Social, pois é o que determina a legislação (art. 28, § 5º da Lei 8.213/91).
A prova dos salários-de-contribuição é feita com a apresentação das folhas de pagamento, onde constam as informações do salário-de-contribuição e do valor descontado do empregado.
Não atendida a determinação, ou não havendo a prova de salário-de-contribuição superior ao teto, resta somente o pedido de soma das atividades concomitantes (no período de 5 meses - 11/2013 a 03/2014), devendo o autor, no mesmo prazo de 15 dias, apresentar novo cálculo de valor da causa.
Requereu, o autor, a dilação do prazo para o cumprimento da decisão (evento 13, OUT1, do processo originário).
No evento 17, apresentou emenda à inicial e anexou documentos complementares.
Foi proferida a decisão do evento 19:
Remeto o feito à Contadoria do Juízo para que seja elaborado cálculo do valor da causa, atentando que a aplicação do fator previdenciário deve observar o teto vigente na época.
Sobrevindo a juntada, retornem os autos conclusos.
A Contadoria Judicial apresentou cálculos (evento 21, CALC1, CALC2 e CALC3, do processo originário).
Foi, então, proferida a decisão agravada.
Nada impede, como já referido, que o juiz promova a adequação do valor da causa. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INDEFERIMENTO DA INICIAL. INSTRUÇÃO DOCUMENTAL SUFICIENTE. FIXAÇÃO DO VALOR DA CAUSA POR ESTIMATIVA. ADEQUAÇÃO DO VALOR DA CAUSA PELO JUIZ. 1. Mostra-se sem fundamento o indeferimento de petição inicial instruída com os documentos necessários ao julgamento do mérito e que não apresenta qualquer defeito ou irregularidade formal. 2. A atribuição do valor da causa não exige a demonstração efetiva de sua representação monetária, o que permite admitir a sua fixação por estimativa, quando é impossível a sua determinação precisa ou, ainda, requer o auxílio de profissional especializado cujos serviços o segurado da previdência social não possui condições, em regra, de custear. 3. A compreensão judicial de que o valor da causa não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão, ou ao proveito econômico perseguido, deve ter por consequência, a sua correção ex officio e por arbitramento, com o apoio da contadoria judicial (art. 292, §3º, do CPC), mas não o indeferimento da inicial. (TRF4, AC 5016356-12.2019.4.04.7100, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 28/08/2020)
Em face do que foi dito, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.
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Agravo de Instrumento Nº 5021594-35.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: JOSE DE MORAIS ANTUNES
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ADEQUAÇÃO DO VALOR DA CAUSA PELO JUIZ.
A compreensão judicial de que o valor da causa não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão, ou ao proveito econômico perseguido, deve ter por consequência, a sua correção ex officio e por arbitramento, com o apoio da contadoria judicial (art. 292, §3º, do CPC).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de julho de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/07/2021 A 20/07/2021
Agravo de Instrumento Nº 5021594-35.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI
AGRAVANTE: JOSE DE MORAIS ANTUNES
ADVOGADO: FLAVIO DOMINGOS CHIESA (OAB RS066855)
ADVOGADO: EDNEI LIRIO ANTUNES (OAB RS062922)
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/07/2021, às 00:00, a 20/07/2021, às 14:00, na sequência 643, disponibilizada no DE de 02/07/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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