AGRAVO INTERNO EM Apelação Cível Nº 5045219-79.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: MARIA LAIDE DE MELO CARNEIRO
RELATÓRIO
Trata-se de agravo interno interposto contra a decisão do evento 85, lançada nos seguintes termos:
Trata-se de recurso especial interposto pelo INSS, com fundamento no art. 105, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, contra acórdão de Órgão Colegiado desta Corte, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. atividade rural. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL. 1. O trabalhador rural que implemente a idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei n. 8.213/91). 2. Considera-se demonstrado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício. 3. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC (1973), bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC (2015), independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.
Sustenta a parte recorrente que a referida decisão violou o disposto no artigo 143 da Lei 8.213/91, assim como negou vigência ao artigo 1.022 do CPC, porquanto alega a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural à parte autora, não obstante a parte autora tenha informado que se afastou das lides rurais antes de completar a idade mínima.
Em que pese a alegação de afronta ao art. 1.022 do Novo CPC, tendo em conta a ausência de suprimento da omissão indicada nos embargos declaratórios - ainda que opostos para efeito de prequestionamento - cumpre observar, quanto à questão de fundo, que o presente recurso não reúne as necessárias condições de admissibilidade, tornando despiciendo o exame da violação, em tese, ao apontado dispositivo infraconstitucional, conforme abaixo fundamentado.
O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o recurso especial representativo da controvérsia, pacificou o assunto ora tratado nos seguintes termos:
Tema STJ nº 642 - O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
Em relação à vexata quaestio o Órgão julgador desta Corte decidiu a hipótese apresentada nos autos em consonância com o entendimento do STJ, de forma que a pretensão recursal não merece trânsito.
Assim, revela-se inviável o prosseguimento do recurso especial, tendo em conta a sistemática prevista na legislação processual (art. 1.030, I, b, ou art. 1.040, I, do CPC).
Ante o exposto, nego seguimento ao recurso especial.
Intimem-se.
Sustenta a parte agravante que o Tema 642 do STJ não guarda relação com o julgamento do recurso especial interposto pelo INSS, pois o recurso versa sobre a questão da contemporaneidade da prova material, o que não foi analisado no Tema 642.
É o relatório.
VOTO
Considerando a condição de trabalhador rural da parte, correta a decisão que aplicou o tema 642 do STJ:
Tema STJ 642 - O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
Quanto à alegação de que a decisão não está de acordo com o requerido no recurso especial não deve prosperar, uma vez que o INSS não alegou a necessidade de contemporaneidade de prova no REsp, somente referindo tal tese em agravo interno, tratando-se, portanto, de inovação recursal.
Além do que, o voto analisou a questão:
Caso Concreto
A parte autora implementou o requisito etário (55 anos) em 17.03.2012, pois nascida em 17.03.1957 (ev. 1, OUT3) e requereu o benefício administrativamente em 20.03.2014 (ev. 1, OUT4). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades rurais nos 180 meses anteriores ao implemento da idade mínima ou nos 180 meses anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável, mesmo que de forma descontínua.
Como início de prova material do labor rurícola, constam dos autos os seguintes documentos:
- notas fiscais de comercialização da produção agrícola, emitidas em nome da parte autora, datadas de 1997 a 2001, 2003, 2004, 2005, 2007, 2010, 2012, 2013 (ev. 1, OUT5-OUT8);
- contratos de arrendamento de imóveis rural em nome da parte autora e de seu cônjuge, datada de 2003, 2005 e 2009 (ev. 1, OUT9-OUT11);
- matrícula de um imóvel rural com área de 6 alqueires, expedida pelo Registro de Imóveis da Comarca de Sapopema-PR, datada de 05.10.1994, demonstrando que o cônjuge da parte autora adquiriu as terras em 05.10.1994 e vendeu-as em 06.12.1999 (ev. 1, OUT12);
- ficha geral de atendimento do SUS em nome da parte autora, na qual é qualificada como lavradora, datada de 1995 a 2009 (ev. 1, OUT13);
- ficha do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Sapopema-PR, indicando a filiação da parte autora à entidade em 2009, bem como registrando o recolhimento de contribuições sindicais entre os anos de 2009 a 2011 (ev. 1, OUT14);
Na audiência de instrução e julgamento (ev. 46), foram inquiridas testemunhas, que informaram o exercício de atividades rurais pela parte autora, no período de carência. Em linhas gerais, contaram que a parte autora sempre trabalhou na roça, conforme transcrição a seguir das audiências:
Em seu depoimento pessoa, a autora narrou que: "atualmente não está mais trabalhando na roças, está parada desde quando seu marido morreu há uns 6-7 anos; recebe pensão de morte; ela trabalhava com milho, feijão, porco e galinha, enquanto seu marido mexia com gado; trabalharam desde quando eles se casaram ate o falecimento de seu marido, cerca de 35 anos; quando se casaram, eles moravam em uma chácars de 12 alqueires, mas a venderam e passaram a arrendar terras; apenas o marido e ela trabalhavam, sem empregados; o marido cuidava de menos de 50 cabeças de boi e vaca; enquanto seu marido vendia os bois, ela cuidava da casa , mexia com as galinhas e também em plantação com a ajuda da filha; a autora ajudava a cuidar dos bois quando podia; a autora mora na cidade; os sítios que arrendavam não possuíam maquinários; a lavoura que plantavam era mais para subsistência, quando sobrava o que plantavam eles vendiam mas era pouca coisa." (ev. 45, VIDEO1)
A testemunha Orlando Brito relatou que: "conhece a autora há mais de 20 anos; ele alugou pasto pro marido da autora, cerca de 23 alqueires, e o resto de sua propriedade ele trabalhava; sabe q autora morava em uma chácara e depois de um tempo foi morar na cidade; o marido da autora tinha um pouco de gado e arrendava terras pra deixar sua criação; a autora ia algumas vezes pra ajudar cuidar o marido com a criação de gado; . além do gado, eles plantavam para as despesa, como mandioca, feijão, milho, porco ou galinha, em 1 alqueire ou menos; a autora e o marido trabalhavam juntos na plantação, sem empregados; não tinham maquinários e não soube de nenhum outro emprega que a autora pudesse ter." (ev. 45, VIDEO2)
Por fim, a testemunha João Ramos Lopes relatou que: "tem conhecimento do trabalho rural realizado pela parte autora; sabe que desde 1994/1995 a autora e o marido compraram um sítio e moraram na propriedade até 1999/2000; nessas terras plantavam arroz, feijão, mandioca e umas criações; mais tarde a autora e o marido venderam a propriedade e passaram a arrendar terras, vivendo dos sítios com criação e lavoura para a sobrevivência; não possuíam funcionários; após o falecimento do marido, a autora foi morar com a filha." (ev. 45, VIDEO3)
No caso, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material, não se exigindo prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material, conforme fundamentado nas premissas iniciais deste voto. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente do labor rural da parte autora no período de carência legalmente exigido.
A análise de vários elementos como a localização do imóvel, o tipo de cultura explorada, a quantidade de produção comercializada, o número de membros familiares a laborar na atividade rural, a utilização ou não de maquinário agrícola, a de mão de obra de terceiros de forma não eventual e a extensão do imóvel, é que permitirão um juízo de valor seguro acerca da condição de segurado especial em regime de economia familiar. As circunstâncias de cada caso concreto é que vão determinar se o segurado se enquadra ou não na definição do inc. VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 (TRF4, EIAC n. 2000.04.01.043853-1/RS, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, 3ª Seção, DJU de 11.02.2004; TRF4, AC 0011205-91.2016.4.04.9999, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. 23.01.2017).
Observa-se no caso concreto que o preço das notas fiscais, mesmo somadas, não representam valores altos, do mesmo modo que a quantidade de gados que o cônjuge da autora possuía também não era um número elevado. De acordo com o que foi dito na audiência de instrução e julgamento (ev. 46), a autora informou que possuíam menos de 50 cabeças de gado. Por ser um número pequeno de criação bovina, consequentemente, não era necessário empregados, podendo apenas a autora e seu cônjuge cuidar sozinhos da criação, fato que foi confirmado pelas testemunhas.
Ainda, verifica que a autora e seu cônjuge não possuíam propriedades, precisando arrendar terras para criar os gados conforme contratos anexados nos autos (ev. 1, OUT9-OUT11), sendo utilizados apenas 12,1 ha, 29,04 ha e 1,42 ha de cada propriedade. Além disso, foi confirmado pela autora e pelas testemunhas que a autora cuidava da casa, mas também ajudava o cônjuge na criação dos bois e trabalhava na plantação de mandioca, milho, arroz e feijão para a subsistência de seu núcleo familiar.
Nesse contexto, demonstrado o efetivo exercício de trabalho rural no período de carência, é devido o benefício de aposentadoria rural por idade a partir da data do requerimento administrativo.
Extrai-se da ementa do acórdão (Evento 64) objeto do recurso especial:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. atividade rural. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL.
1. O trabalhador rural que implemente a idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei n. 8.213/91).
2. Considera-se demonstrado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício.
3. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC (1973), bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC (2015), independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.
Dessa forma, é caso de ser mantida a negativa de seguimento do recurso especial do INSS.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo interno.
Documento eletrônico assinado por LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001219556v2 e do código CRC 07ea7abf.Informações adicionais da assinatura:
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AGRAVO INTERNO EM Apelação Cível Nº 5045219-79.2017.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: MARIA LAIDE DE MELO CARNEIRO
EMENTA
AGRAVO INTERNO. TRABALHADOR RURAL. APLICAÇÃO DA SISTEMÁTICA DO RECURSO REPETITIVO COM BASE NO TEMA STJ Nº 642. NEGATIVA DE SEGUIMENTO DO RECURSO.
1. O novo Código de Processo Civil prevê a figura do agravo interno para a decisão do Vice-Presidente que nega seguimento aos recursos especial e/ou extraordinário.
2. Da análise das razões do agravo interno, verifica-se que a tese recursal centra-se na necessidade de comprovação da atividade campesina no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, objeto do Tema 642, motivo pelo qual deve ser mantida a decisão que negou seguimento ao recurso especial quanto ao Tema 642.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de agosto de 2019.
Documento eletrônico assinado por LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001219557v3 e do código CRC 316e421c.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 21/08/2019
Apelação Cível Nº 5045219-79.2017.4.04.9999/PR
INCIDENTE: AGRAVO INTERNO
RELATOR: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: MARIA LAIDE DE MELO CARNEIRO
ADVOGADO: LINALDO FELICIANO DE DEUS (OAB PR060840)
ADVOGADO: JULIANO MACIEL ABRÃO (OAB PR047208)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 21/08/2019, na sequência 13, disponibilizada no DE de 05/08/2019.
Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juiz Federal MARCELO MALUCELLI
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY
Secretário
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