| D.E. Publicado em 03/05/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012320-55.2013.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | JOÃO CARLOS SCHNEIDER |
ADVOGADO | : | Vitor Ugo Oltramari |
: | Clarissa Oltramari | |
: | Henrique Oltramari | |
: | Wagner Segala | |
: | Ana Paula Longo Colussi | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO RETIDO. IMPROVIMENTO. PROVA PERICIAL. IMPERTINÊNCIA. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVISÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. PRAZO. DEZ ANOS. INOCORRÊNCIA. RECEBIMENTO DE VALORES DE BENEFÍCIO. MÁ-FÉ. NÃO CONFIGURAÇÃO. INEXIBILIDADE DO DÉBITO RELACIONADO A SUPOSTO RECEBIMENTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. FALTA DE COMPROVAÇÃO DE TRABALHO REBUNERADO CONCOMITANTE COM A PERCEÇÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PARCIAL ACOLHIMENTO DO RECURSO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. Restando evidente a impertinência da pretendida prova pericial para o deslinde da questão suscitada na ação originária, de cunho declaratório de inexigibilidade de valores, deve ser mantido o indeferimento de sua realização e, consequentemente, improvido o agravo retido. Nesse sentido, revela-se inadequado o acolhimento da preliminar de cerceamento de defesa em razão do referido indeferimento da aludida prova.
2. Todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei n.º 9.784/99 passaram a observar o prazo decadencial de 10 (dez) anos, a contar de 01-02-1999, pois a MP n.º 138/2003 entrou em vigor antes de decorridos cinco anos a contar do advento daquela lei. Para os atos praticados após tal data incide o prazo decadencial decenal, a contar da data da respectiva prática do ato.
3. Revelando-se consistente o conjunto probatório constante nos autos, no sentido de confirmar a inexistência do recebimento concomitante de valores decorrentes de atividade laboral e de benefício previdenciário, denota-se a inexistência de má-fé relacionado a tais fatos, bem como a inexigibilidade do inerente débito discutido na ação originária.
4. Honorários advocatícios a cargo do ente previdenciário, fixados em 10% sobre o valor da causa.
5. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Federal, o INSS está isento do pagamento das custas judiciais (art. 4º da Lei 9.289/96).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, afastar a preliminar de cerceamento de defesa, e dar parcial provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de abril de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8816970v8 e, se solicitado, do código CRC 50C11D17. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012320-55.2013.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | JOÃO CARLOS SCHNEIDER |
ADVOGADO | : | Vitor Ugo Oltramari |
: | Clarissa Oltramari | |
: | Henrique Oltramari | |
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APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente ação declaratória de inexistência de débito, na qual se discute a decadência do direito de revisar ato de concessão de benefício previdenciário, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00. Suspensa a exigibilidade, nos termos da lei 1060/1950.
Sustenta a parte autora, em sede preambular, cerceamento de defesa, ao entendimento quanto à necessidade de prova pericial para esclarecer se no período em que houve contribuições previdenciárias em seu nome estava incapacitado para o labor. No mais, revela insurgência com o afastamento da decadência, ao fundamento de que, consoante o disposto no art. 54 da Lei nº 9.784/99, é de 05 (cinco) anos o prazo para revisão de ato concessivo de aposentadoria. Destaca a configuração de boa-fé na hipótese dos autos, acarretando a impropriedade da devolução de valores recebidos. Pugna pela apreciação de agravo retido e, no tocante ao mérito, pela procedência da ação originária, a fim de que seja declarada a inexistência do débito imputado ao recorrente pelo INSS.
Não tendo sido apresentadas contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Do exame do agravo retido e da alegação de cerceamento de defesa
Ressalto, inicialmente, que, de acordo com o § 1° do art. 523 do CPC/73, não se conhece do agravo retido se a parte não requerer expressamente, nas razões ou contrarrazões da apelação, sua apreciação pelo Tribunal. Preenchido tal requisito pela parte recorrente, conheço do recurso.
A parte autora interpôs agravo retido em face da decisão da fl. 116, que indeferiu a produção de prova pericial nos seguintes termos:
Indefiro a produção de prova pericial médica, visto que a questão fática importante para o deslinde do feito diz sobre o exercício ou não de atividade laborativa concomitante ao período em que recebeu o benefício previdenciário por incapacidade, o que ensejaria fraude; e não quanto ao estado de saúde do autor à época do suposto exercício de trabalho enquanto percebia auxíli-doença, uma vez que a concessão do mesmo pelo INSS é suficiente no sentido de atestar a incapacidade laboral transitória do segurado.
Em que pesem os termos da fundamentação recursal, segundo se depreende do ato judicial impugnado, a questão foi abordada com a devida propriedade no Juízo a quo, não havendo, portanto, reparos quanto ao tema a serem promovidos na via recursal. De fato, não se vislumbra, na hipótese, a necessidade de realização da pretendida prova para o fim a que se destina.Cuida-se de discussão atinente ao reconhecimento ou não de decadência no tocante à possibilidade de revisão de concessão de benefício previdenciário, constatada a ocorrência de apontada irregularidade.
Assim, não merece acolhida a pretensão deduzida no agravo retido.
Tendo em conta as considerações delineadas a respeito da impertinência da pretendida perícia para o deslinde da controvérsia originária, constata-se também a impropriedade da preliminar de cerceamento de defesa argüida pela parte autora.
Da decadência
No ato judicial impugnado (fl. 130 v.), a questão inerente à decadência foi examinada, sendo exaradas as seguintes considerações:
De acordo com entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo n.º 1.114.938/AL (Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 3ª Seção, Unânime, julgado em 14/04/2010), os benefícios previdenciários concedidos antes do advento da Lei n.º 9.784/99, têm, como termo inicial do prazo decadencial, a data de vigência da norma que o estabeleceu, ou seja, 01/02/1999. Já para os benefícios concedidos sob a égide da referida legislação, o termo inicial do prazo decadencial a ser considerado é a data do respectivo ato.
Considerando-se, ademais, que o elastecimento do prazo de cinco anos (art. 54 da Lei n.º 9.784/99) para dez anos (MP n.º 138, de 19 de novembro de 2003) - se deu antes do decurso de cinco anos da vigência da Lei n.º 9.784/99, em qualquer hipótese, tanto para benefícios concedidos antes quanto para os concedidos após o advento da Lei n.º 9.784/99, o prazo decadencial aplicável é de dez anos.
No caso concreto, não há falar em decadência da faculdade de a Administração Pública revisar o ato, pois o prazo fatal previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/99 somente pode ser contado a partir da entrada em vigor dessa lei - até porque até então inexistia previsão de prazo neste sentido -, não se tendo esgotado até a data em que o INSS iniciou o procedimento administrativo para apurar irregularidade, o qual ocorreu em 17-09-2008 (fl.73 verso).
No âmbito do Direito Previdenciário, foi estipulado, pela primeira vez, pela Lei n.º 6.309, de 15.12.1975, prazo decadencial de cinco anos para a revisão, por parte da Administração, dos processos de interesse dos beneficiários. Previa o seu artigo 7.º:
Art. 7º - Os processos de interesse de beneficiários e demais contribuintes não poderão ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo.
Tal lei vigorou de 01.02.1976 (primeiro dia do segundo mês seguinte ao da publicação) a 12.04.1992, quando foi revogada pela Medida Provisória n. 302, de 10.04.1992, em vigor a partir de 13.04.1992, posteriormente convertida na Lei n.º 8.422/92. Destaca-se que o referido art. 7.º foi reproduzido no art. 214 da CLPS de 1976 e, com brevíssimas modificações, no art. 207 da CLPS de 1984.
Com o advento da Lei n.º 8.213/91, não houve previsão de prazo decadencial para a revisão do ato concessório do benefício previdenciário por parte da Administração (assim como não havia tal previsão na Lei nº 8.422/92), o que somente veio a se modificar com a entrada em vigor da Lei n.º 9.784/99 (em 01.02.1999), que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal e que, em seu art. 54, estabeleceu o prazo decadencial de cinco anos:
Art. 54 - O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º - No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º - Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Posteriormente, a MP 138 (publicada no D.O.U. de 20.11.2003), convertida na Lei n.º 10.839/04, acrescentou o art. 103-A à Lei n.º 8.213/91, estabelecendo prazo decadencial de dez anos para o INSS anular atos administrativos, salvo comprovada má-fé:
Art. 103-A - O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º - No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º - Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
Observada a evolução legislativa quanto ao tema, impende dizer que é pacífico o entendimento do egrégio STJ no sentido de que o prazo decadencial de cinco anos estabelecido pela Lei 9.784/99 só pode ser contado a partir do início da sua vigência, ante a impossibilidade de sua retroação.
Por fim, com a edição da MP 138/03 que, como visto, modificou o prazo decadencial, na esfera previdenciária, de cinco para dez anos, antes do transcurso de cinco anos desde a vigência da Lei 9.784/99, verifica-se, na prática, que:
1 - para os benefícios concedidos desde o início de vigência desta (desde 01.02.1999, portanto), o prazo decadencial a incidir é o de dez anos, contados da data em que foi praticado o ato administrativo (ou da percepção do primeiro pagamento, conforme o caso), salvo comprovada má-fé;
2 - o prazo decadencial de dez anos também deve ser aplicado quando o ato administrativo foi praticado anteriormente à vigência da Lei 9.784/99 (e depois da revogação da Lei 6.309/75). Nessa hipótese, conta-se o prazo a partir da entrada em vigor da Lei 9.784/99, ante a impossibilidade de sua retroação, conforme entendimento do STJ.Esse foi o entendimento firmado pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento, em 14.04.2010, do REsp nº 1114938/AL, sob a sistemática de recursos repetitivos, da Relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.787/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei 9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99 incide o prazo decadencial e 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência (01.02.99). Ressalva do ponto de vista do Relator.
2. Antes de decorridos 5 anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus benefíciários.
3. Tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato.
4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5a. Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor.
Ocorre, entretanto, que como salientado acima, o entendimento firmado pelo STJ diz respeito ao prazo decadencial a incidir sobre os atos administrativos praticados entre a revogação da Lei 6.309/75 e a entrada em vigor da Lei 9.784/99, período de "vazio legislativo", em que não havia previsão de prazo decadencial para que a Administração anulasse seus próprios atos.
Na prática, todos os casos subsumidos inicialmente à regência da Lei n.º 9.784/99, portanto, passaram a observar o prazo decadencial de dez anos a contar de 01-02-1999, pois a MP n.º 138/2003 entrou em vigor antes de decorridos cinco anos a contar do advento daquela lei.
De todo o exposto, quanto à decadência, conclui-se que:
a) atos praticados até 14-05-1992 (revogação da Lei n.º 6.309/75): incide o prazo de cinco anos, a contar da data do ato a ser revisado;
b) atos praticados entre 14-05-1992 e 01-02-1999: incide o prazo de dez anos (Lei n.º 10.839/2004), a contar de 01-02-1999;
c) para os atos praticados após 01-02-1999: incide o prazo decadencial de dez anos, a contar da data da respectiva prática do ato.
No que concerne ao caso concreto, verifica-se que a questão controvertida apresentada em Juízo diz respeito à possibilidade de revisão do benefício de aposentadoria por invalidez (NB 1217945323) concedido em 19/02/2002, tendo sido registrado nos autos (fl. 73 verso) que o INSS iniciou o procedimento administrativo para apuração de irregularidades no recebimento referido benefício previdenciário em 17-09-2008.
Levando-se em conta que a DIB da aposentadoria por invalidez é de 19/02/2002 (data da prática do ato), o INSS, portanto, teria o prazo de até 10 (dez) anos para revisão do referido ato administrativo. Assim, tendo o ente previdenciário iniciado o procedimento administrativo de apuração de irregularidades em 17/09/2008, depreende-se que, efetivamente, não decorreu o prazo decenal para a autarquia revisar o aventado ato administrativo de concessão do benefício em questão, razão pela qual não merece reparos a sentença no que diz com o tópico.
Da devolução de valores recebidos de boa-fé
Destaca a parte autora a configuração de boa-fé na hipótese, o que configura indevida a devolução de valores recebidos a título de benefício previdenciário.
O tema recursal suscitado foi examinado no Juízo a quo, sendo tecidas a respeito as seguintes considerações:
Cinge-se a controvérsia na exigibilidade, ou não de ressarcimento de valores de benefícios, recebidos indevidamente.
Dos autos se extrai que o demandante recebeu benefícios previdenciários (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez) 01-02-1997 a 18-02-2002, período que concomitantemente desenvolveu atividade remunerada e verteu contribuições previdenciárias.
Ora, conforme prescrevem os artigos 59 e 42 da Lei 8.231/91, o benefício pressupõe incapacidade para o exercício de suas atividades laborais. A própria aposentaria por invalidez é cancelada no momento em que se verifica que o segurado retorna à atividade (art. 46, Lei 8.213/91).
Esse foi o caso dos autos, onde restou comprovado que mesmo depois de receber auxílio-doença, o segurado permaneceu exercendo atividade remunerada. Não é verossímil a afirmação do autor e o relato das testemunhas, os quais afirmaram que, de fato, quem estava exercendo atividade remunerada era o filho do autor menor, mas por exigência do empregador ( Olindo Noezle) a contribuição previdenciária foi paga em nome do demandante.
Ora, o homem médio não contrata alguém e recolhe contribuição para terceiro, especialmente se o trabalhador for menor. É descabida a alegação do autor. Até porque, se isto ocorreu, porque não veio o empregador, Olindo, afirmar em Juízo que contratou uma pessoa e verteu contribuições para um terceiro.
Finalmente, quanto aos débitos pretendidos pela autarquia, no processo administrativo de cobrança dos valores recebidos a título de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, devem ser feitas algumas considerações.
É consabido que os Tribunais Superiores vem-se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos artigos 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3048-99.
No mesmo sentido, manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça, como se extrai dos seguintes precedentes:
AGRAVO REGIMENTAL. DEVOLUÇÃO DE DIFERENÇAS RELATIVAS À PRESTAÇÃO ALIMENTAR. DESCABIDA. O caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que tais benefícios, quando recebidos a maior em boa-fé, não sejam passíveis de devolução. Agravo regimental a que se nega provimento". (AgRg no Resp nº 705.249/SC, Rel. Ministro Paulo Medina, DJ de 20/02/2006)
Portanto, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, é indevida a cobrança dos valores pagos quando não resta comprovada a má-fé.
Contudo, entendo que este não é o caso presente. O segurado desenvolveu atividade laborativa, mesmo recebendo benefício de auxílio doença e aposentadoria por invalidez e, quer fazer crer que não era ele quem exercia atividade laborativa, mas sim seu filho. Aliás, se de fato não trabalhou para Olindo Noezle, porque tal pessoa não veio a juízo confirmar tal fato.
Assim, entendo que a má-fé, que não se presume, resta demonstrada, razão por que deve devolver todos os valores indevidamente recebidos. (fls. 131/131v.)
Em sua defesa, a parte recorrente alega que as 03 (três) testemunhas arroladas (fls. 129) foram categóricas ao afirmar que ele parou de trabalhar após o recebimento do benefício previdenciário por incapacidade. Afirma que os recolhimentos em GFIP foram feitos pelo empregador, desconhecendo o fato de que o autor já se encontrava aposentado, sendo tal prática confirmada em depoimento testemunhal.
Com efeito, da análise das provas acostadas aos autos, resta devidamente comprovado que a parte autora não exerceu atividade laborativa remunerada nos períodos em que esteve em gozo de benefício por incapacidade. Denota-se dos autos (fl. 129) que a prova testemunhal colhida em audiência corroborou que o autor, de fato, não exerceu atividade de trabalho remunerado nos períodos discutidos.
Assim, não se verifica, na hipótese, a ocorrência de má-fé no recebimento de valores, a título de benefício previdenciário por incapacidade laboral.
Da inexistência de débito
A fim de evitar tautologia, a argumentação inerente ao tema vale-se dos próprios fundamentos pertinentes ao item anteriormente abordado, que foram no sentido de confirmar que a prova dos autos acaba por denotar que o autor não exerceu atividade de trabalho remunerado após o recebimento de benefício por incapacidade laboral; procedimento que embasou o ajuizamento da ação originária.
Nesse contexto, penso que, não obstante a relevância da fundamentação deduzida no ato judicial ora impugnado, merece reparo a sentença, pelo que declaro a inexigibilidade dos valores cobrados pelo INSS na ação originária, bem como a regularidade da percepção do benefício de aposentadoria por invalidez pela parte autora, nos termos que restou concedido.
Dos honorários e custas
Honorários advocatícios a cargo do ente previdenciário, fixados em 10% sobre o valor da causa.
Das custas
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Federal, o INSS está isento do pagamento das custas judiciais, a teor do que preceitua o art. 4º da Lei n. 9.289/96.
Da conclusão
Resta improvido o agravo retido, afastada a preliminar de cerceamento de defesa, devendo, no entanto, ser parcialmente provido o apelo da parte autora, não se reconhecendo a decadência, todavia, acolhendo-se a pretensão recursal no que tange ao reconhecimento do recebimento de valores de benefício de boa-fé, bem como relativamente à declaração de inexigibilidade dos valores cobrados pelo INSS na ação originária, vez que confirmado pelo conjunto probatório que o recorrido não exerceu atividade laboral remunerada após o recebimento do benefício por incapacidade de trabalho.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo retido, afastar a preliminar de cerceamento de defesa, e dar parcial provimento ao apelo da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/04/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012320-55.2013.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 10911200003558
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | JOÃO CARLOS SCHNEIDER |
ADVOGADO | : | Vitor Ugo Oltramari |
: | Clarissa Oltramari | |
: | Henrique Oltramari | |
: | Wagner Segala | |
: | Ana Paula Longo Colussi | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/04/2017, na seqüência 285, disponibilizada no DE de 04/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO, AFASTAR A PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA, E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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