APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010894-20.2014.4.04.7110/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ROZALVO RODRIGUES DA SILVA |
ADVOGADO | : | JANETE BLANK |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA REVOGADA EM VIRTUDE DO JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. DESCABIMENTO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. INAPLICABILIDADE DO ART. 115 DA LEI DE BENEFÍCIOS.
1. Não obstante tenha sido revogada a antecipação dos efeitos da tutela, é incabível a restituição dos valores recebidos a tal título, uma vez que foram alcançados à parte autora por força de decisão judicial e auferidos de absoluta boa-fé.
2. O art. 115 da Lei nº 8.213/1991 é aplicável tão somente nas hipóteses em que o pagamento do benefício tenha ocorrido por força de decisão administrativa.
3. Nos casos em que há revogação da antecipação dos efeitos da tutela, deve ser aplicado, de forma temperada, o art. 297, parágrafo único, c/c art. 520, incisos I e II do Código de Processo Civil, em vista dos princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
4. Dentro do contexto que estão inseridos os benefícios previdenciários e assistenciais, não podem ser considerados indevidos os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada, não havendo que se falar, por consequência, em restituição, devolução ou desconto.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de agosto de 2016.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8427063v2 e, se solicitado, do código CRC FE34CD1. | |
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Signatário (a): | Rogerio Favreto |
Data e Hora: | 18/08/2016 16:17 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010894-20.2014.4.04.7110/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ROZALVO RODRIGUES DA SILVA |
ADVOGADO | : | JANETE BLANK |
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora requer a declaração de inexigibilidade do débito, bem como cancelamento de cobrança de valores percebidos por força de decisão judicial posteriormente cassada. Para tanto, sustentou que recebeu os valores de boa-fé e alegou a irrepetibilidade de prestações alimentícias.
Sentenciando, o MM. Juiz assim decidiu:
Diante do exposto, julgo procedentes os pedidos formulados em juízo, extinguindo o processo com análise do mérito (art. 269, I, do Código de Processo Civil), para o fim de:
- reconhecer a desnecessidade de devolução dos valores recebidos pela parte autora em razão da concessão de antecipação dos efeitos da tutela nos autos n. 2007.71.60.003572-3;
- condenar a ré ao ressarcimento dos montantes descontados do benefício da parte autora; e
- condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo, em atenção ao art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil e ao fato de que julgada a demanda sem a necessidade de instrução, em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Os valores do ressarcimento deverão ser apurados pela Contadoria Judicial, com base no julgado definitivo e nas informações que constam dos bancos de dados da Previdência Social, e incluir todas as parcelas não prescritas vencidas até a data de sua elaboração.
Quanto à correção monetária, deverão ser adotados os índices de correção de depósitos em caderneta de poupança.
Deve ser aplicado o mesmo percentual de juros de mora incidentes sobre a caderneta de poupança, não capitalizados, correspondentes a 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%; e 70% da taxa SELIC ao ano, mensalizada, nos demais casos.
Sem custas.
Concedo a antecipação dos efeitos da tutela, para o fim de que cessem os descontos na aposentadoria por tempo de contribuição de que titular a parte autora, determinando-se ao INSS que comprove nos autos, em 10 (dez) dias, a efetivação da medida.
Sentença sujeita ao reexame necessário (art. 475, I, do Código de Processo Civil).
Irresignado, o INSS igualmente apela sustentando que a parte autora deve restituir os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela revogada. Afirma, em síntese, que a boa-fé e a suposta natureza alimentar não impedem o ressarcimento.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Novo CPC (Lei 13.105/2015):
Direito intertemporal e disposições transitórias
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesses termos, para fins de remessa necessária e demais atos recursais, bem como quanto aos ônus sucumbenciais, aplica-se a lei vigente na data em que proferida a decisão recorrida.
Do mérito
Inicialmente, registro que não se está reconhecendo a inconstitucionalidade do art. 115 da Lei de Benefícios, tampouco afastando a sua aplicação em decorrência de interpretação constitucional. Nesse sentido, precedentes do STF: AI 820.685-AgR, ARE 701.883-PR e ARE 734.119-PR.
No caso concreto, está sendo discutida a necessidade de devolução de valores recebidos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada. Portanto, discute-se, em síntese, a responsabilidade da parte autora em razão de valores recebidos em razão de DECISÃO JUDICIAL posteriormente revogada.
Assim, a controvérsia diz respeito à aplicação do art. 297, parágrafo único, c/c art. 520, incisos I e II, do Código de Processo Civil, que prevê a responsabilização objetiva da parte autora nos casos em que a antecipação dos efeitos da tutela é posteriormente revogada.
Nesse sentido, não há responsabilidade objetiva da parte autora quando o pagamento indevido decorre de decisão judicial, em razão do princípio da segurança jurídica e da boa-fé, naqueles casos em que está sendo discutida a concessão de benefício previdenciário, ou seja, de caráter eminentemente alimentar.
Em relação ao disposto pelo art. 115, inc. II, da Lei nº 8.213/1991, a sua aplicação é limitada aos casos em que o pagamento do benefício tenha ocorrido por força de decisão ADMINISTRATIVA, o que não ocorreu ao caso dos autos, uma vez que o pagamento do benefício se deu por decisão judicial.
Por oportuno, as seguintes decisões desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. DESCABIMENTO.
1. Incabível a restituição de valores recebidos pelo segurado em sede de antecipação de tutela que vem a ser revogada, ainda que parcialmente, uma vez que foram alcançados à parte autora por força de decisão judicial e auferidos de absoluta boa-fé. Precedentes jurisprudenciais.
2. O art. 115, inciso II, c/c §1º, da Lei nº 8.213/91 incide nas hipóteses em que o pagamento do benefício se tenha operado por força de decisão administrativa, não judicial.
3. O art. 273, §3º, c/c art. 475-O, incisos I e II, do CPC deve ser aplicado com temperamentos, no caso dos autos, ante os princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
4. Dentro de todo o contexto em que inseridos os casos como o dos autos, não podem ser considerados indevidos os valores recebidos por força de antecipação de tutela relativos às pensões e aposentadorias, não se havendo de falar, em conseqüência, em restituição, devolução ou desconto.
(TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0004209-43.2012.404.0000, 6ª Turma, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, D.E. 24/08/2012)
PREVIDENCIÁRIO. COMPETÊNCIA DELEGADA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA REVOGADA EM VIRTUDE DO JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. DESCABIMENTO.
(...)
2. Não obstante tenha sido revogada a antecipação dos efeitos da tutela, é incabível a restituição dos valores recebidos a tal título, uma vez que foram alcançados à parte autora por força de decisão judicial e auferidos de absoluta boa-fé. Precedentes jurisprudenciais.
3. O art. 115, inciso II, c/c §1º, da Lei nº 8.213/91 incide nas hipóteses em que o pagamento do benefício se tenha operado por força de decisão administrativa, não judicial.
4. O art. 273, §3º, c/c art. 475-O, incisos I e II, do CPC deve ser aplicado com temperamentos, no caso dos autos, ante os princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
5. Dentro de todo o contexto em que inseridos os casos como o dos autos, não podem ser considerados indevidos os valores recebidos por força de antecipação de tutela relativos às pensões e aposentadorias, não se havendo de falar, em consequência, em restituição, devolução ou desconto.
(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017560-93.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, POR UNANIMIDADE, D.E. 18/01/2012)
Em conclusão, o art. 115 da Lei nº 8.213/1991 é aplicável tão somente nas hipóteses em que o pagamento do benefício tenha ocorrido por força de decisão administrativa.
Nos casos em que há revogação da antecipação dos efeitos da tutela, deve ser aplicado, de forma temperada, o art. 297, parágrafo único, c/c art. 520, incisos I e II, do Código de Processo Civil, em vista dos princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Cabe registrar, por oportuno, que, conquanto a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.401.560/MT (representativo de controvérsia julgado em 12/02/2014 e publicado no DJe de 13/10/2015), tenha firmado a tese de que, sendo a tutela antecipada provimento de caráter provisório e precário, a sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos, a Terceira Seção deste Regional, tem ratificado o entendimento no sentido de que é descabida a cobrança de valores recebidos em razão de decisão judicial, a exemplo dos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. CONVERSÃO DOS BENEFÍCIOS EM URV - ART. 20 DA LEI Nº 8.880/94. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. VIOLAÇÃO À LEI. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ - IMPOSSIBILIDADE. 1. Afirmada pelo STF a constitucionalidade da forma de conversão dos benefícios em URV determinada pelo artigo 20 da Lei nº 8.880/94, deve ser reconhecida, no acórdão rescindendo, sua violação. 2. É indevida a restituição de valores recebidos por força da decisão rescindenda, os quais, de caráter alimentar, até então estavam protegidos pelo pálio da coisa julgada. 3. Precedentes do STF e do STJ. (TRF4, AR 2003.04.01.030574-0, Terceira Seção, Relator Roger Raupp Rios, D.E. 11/11/2014)
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VIOLAÇÃO DO ART. 515 DO CPC. OMISSÃO DO ACÓRDÃO.
1. Omisso o acórdão quanto ao pedido de reforma da sentença para desobrigar a autora da devolução de parcelas do auxílio-doença recebidas por força de antecipação de tutela revogada, admite-se a rescisão com fundamento no art. 485, V, do CPC.
2. O pagamento originado de decisão devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas, e mediante o permissivo do art. 273 do CPC, tem presunção de legitimidade e assume contornos de definitividade no sentir da segurada, dada a finalidade a que se destina de prover os meios de subsistência.
3. Evidenciada a boa-fé, o beneficiário não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, sob pena de inviabilização do instituto da antecipação de tutela no âmbito dos direitos previdenciários.
4. Hipótese em que não se constata a alegada violação do princípio da reserva do plenário por declaração tácita de inconstitucionalidade dos arts. 115 da Lei nº 8.213/91 e 475-O do CPC.
5. Ação rescisória julgada procedente; dispensada a autora da restituição das verbas recebidas durante a vigência da antecipação de tutela.
(AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0015157-78.2011.404.0000/PR, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 09-08-2013)
A própria Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça reconhece a irrepetibilidade dos valores recebidos a título de tutela antecipada quando a decisão é confirmada pelo Tribunal de origem:
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA QUE DETERMINA O RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR MORTE. CONFIRMAÇÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DECISÃO REFORMADA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.
1. A dupla conformidade entre a sentença e o acórdão gera a estabilização da decisão de primeira instância, de sorte que, de um lado, limita a possibilidade de recurso do vencido, tornando estável a relação jurídica submetida a julgamento; e, de outro, cria no vencedor a legítima expectativa de que é titular do direito reconhecido na sentença e confirmado pelo Tribunal de segunda instância.
2. Essa expectativa legítima de titularidade do direito, advinda de ordem judicial com força definitiva, é suficiente para caracterizar a boa-fé exigida de quem recebe a verba de natureza alimentar posteriormente cassada, porque, no mínimo, confia - e, de fato, deve confiar - no acerto do duplo julgamento.
3. Por meio da edição da súm. 34/AGU, a própria União reconhece a irrepetibilidade da verba recebida de boa-fé, por servidor público, em virtude de interpretação errônea ou inadequada da Lei pela Administração. Desse modo, e com maior razão, assim também deve ser entendido na hipótese em que o restabelecimento do benefício previdenciário dá-se por ordem judicial posteriormente reformada.
4. Na hipótese, impor ao embargado a obrigação de devolver a verba que por anos recebeu de boa-fé, em virtude de ordem judicial com força definitiva, não se mostra razoável, na medida em que, justamente pela natureza alimentar do benefício então restabelecido, pressupõe-se que os valores correspondentes foram por ele utilizados para a manutenção da própria subsistência e de sua família. Assim, a ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais.
5. Embargos de divergência no recurso especial conhecidos e desprovidos.
(EREsp 1086154/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 20/11/2013, DJe 19/03/2014).
Esta posição é acolhida também pelo Supremo Tribunal Federal:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO: INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 15.4.2009.
A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito a repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido."( AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 829.661/MG. Rel. Ministra Rosa Weber. 1ª Turma. Maioria. Julgado em 18/06/2013. DJE 07/08/2013).
Em reforço, transcrevo excerto da decisão monocrática proferida pelo Ministro Roberto Barroso, quando da apreciação de agravo interposto pelo INSS contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário (ARE 7342.31/RS, DJe 30/04/2015):
"O recurso extraordinário é inadmissível. Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes: AI 841.473-RG, Rel. Min. Presidente; e ARE 638.548-AgR, Rel. Min. Luiz Fux".
Dessa forma, a pretensão de restituição dos valores recebidos por força de antecipação de tutela encontra óbice, no caso em exame, na natureza alimentar de ditas verbas e na boa fé que pautou o seu recebimento pelo segurado, cabendo privilegiar assim estes dois institutos. Esse vem sendo o entendimento adotado por esta Corte de que são exemplo os seguintes julgados:
"APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PAGO INDEVIDAMENTE. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA E EXECUÇÃO FISCAL. INADMISSBILIDADE. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA EM VIRTUDE DO JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PERCENTUAL. 1. O débito oriundo do pagamento indevido de benefício previdenciário não se enquadra no conceito de dívida ativa não-tributária. Precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça. 2. Não obstante tenha sido revogada a antecipação dos efeitos da tutela, é incabível a restituição dos valores recebidos a tal título, uma vez que foram alcançados à parte autora por força de decisão judicial e auferidos de absoluta boa-fé. Precedentes jurisprudenciais. 3. O art. 115, inciso II, c/c §1º, da Lei nº 8.213/91 incide nas hipóteses em que o pagamento do benefício se tenha operado por força de decisão administrativa, não judicial. 4. O art. 273, §3º, c/c art. 475-O, incisos I e II, do CPC deve ser aplicado com temperamentos, no caso dos autos, ante os princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. 5. Dentro de todo o contexto em que inseridos os casos como o dos autos, não podem ser considerados indevidos os valores recebidos por força de antecipação de tutela relativos às pensões e aposentadorias, não se havendo de falar, em conseqüência, em restituição, devolução ou desconto. 6. Em embargos à execução em matéria previdenciária, os honorários advocatícios devem ser fixados no percentual de 5% sobre o valor atualizado da causa. Precedentes desta Corte. (TRF4, AC 5002641-68.2013.404.7113, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 10/07/2014)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. PREQUESTIONAMENTO. VALORES RECEBIDOS DE BOA FÉ POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A acolhida dos embargos declaratórios só tem cabimento nas hipóteses de omissão, contradição ou obscuridade, sendo cabível a atribuição de efeitos infringentes somente em casos excepcionais. 2. A circunstância de o acórdão decidir contrariamente às pretensões do recorrente não possibilita o uso da via dos embargos declaratórios. 3. Estando evidenciada a tese jurídica em que se sustenta a decisão proferida nesta Instância, não é necessário declarar todos os dispositivos legais em que se fundamenta. 4. Para fins de recurso extraordinário, resta perfectibilizado o acesso à via excepcional por meio da oposição de embargos de declaração pleiteando o prequestionamento dos dispositivos constitucionais, ainda que os aclaratórios sejam desacolhidos. 5. Não pode o INSS cobrar os valores recebidos em razão de decisão judicial (antecipação de tutela concedida nos autos), conforme iterativa jurisprudência que consagrou o princípio da irrepetibilidade dos valores de benefícios previdenciários recebidos em situações similares, sempre que verificada a boa-fé do beneficiário. Precedente da Terceira Seção desta Corte. (TRF4 5003421-51.2012.404.7013, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Luiz Antonio Bonat, juntado aos autos em 23/07/2014)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. (TRF4, AG 5022012-17.2013.404.0000, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 08/11/2013)
Em conclusão, dentro do contexto que estão inseridos os benefícios previdenciários e assistenciais, não podem ser considerados indevidos os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada, não havendo que se falar, por consequência, em restituição, devolução ou desconto.
Dessa forma, não merece reforma a r. sentença, devendo o INSS ser condenado ao ressarcimento de eventuais valores descontados indevidamente.
Consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
a) Correção Monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que no julgamento das ADIs em referência a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
b) Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
A sentença deve ser adequada, quanto à correção monetária e aos juros de mora, aos critérios acima definidos
c) Honorários advocatícios:
Consoante entendimento consolidado na Turma, tem-se fixados os honorários advocatícios, vencido o INSS, à taxa 10% sobre as prestações vencidas até a sentença de procedência, nos termos da Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Entretanto, considerando que o juízo "a quo" possui melhores condições de aferir as circunstâncias do caso concreto (o grau e zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, bem como a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço), na medida em que mantém uma relação de maior proximidade com o profissional por ocasião da instrução processual e coleta da prova, entendo por bem manter a fixação dos honorários nos termos fixados pela sentença.
d) Custas processuais:
O INSS é isento do pagamento de custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010). Quando demandado perante a Justiça Estadual de Santa Catarina, a autarquia responde pela metade do valor (art. 33, p. único, da Lei Complementar Estadual nº. 156/97). Contudo, esta isenção não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4).
Conclusão
A sentença resta mantida integralmente quanto ao mérito.
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16/08/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010894-20.2014.4.04.7110/RS
ORIGEM: RS 50108942020144047110
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ROZALVO RODRIGUES DA SILVA |
ADVOGADO | : | JANETE BLANK |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16/08/2016, na seqüência 354, disponibilizada no DE de 22/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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