Apelação Cível Nº 5010707-65.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: CLECI LOPES NICOLAO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 24-04-2020, na qual o magistrado a quo julgou procedente o pedido para conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença, desde a data do segundo requerimento administrativo, ou seja, 24-04-2019, mantido pelo prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença. Condenou o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas, e a parte autora, pelo princípio da causalidade, ao pagamento das despesas e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, observada eventual gratuidade.
Em suas razões, a parte autora sustenta, em síntese, que as doenças que incapacitam a autora estavam presentes na data do primeiro requerimento em 04-10-2018, devendo o início do benefício ser fixado em tal data ou, então, na data de ajuizamento da demanda (09-04-2019).
Requer, ainda, seja atribuída a sucumbência integralmente ao INSS, por ter a autora decaído minimamente de sua pretensão.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Resta, pois, averiguar a existência de incapacidade laboral que justifique a concessão do benefício postulado desde a data do requerimento administrativo, em 04-10-2018.
O magistrado a quo assim fundamentou sua decisão:
O art. 60, caput, da Lei n. 8.213/91 determina que, para os segurados especiais, o benefício de auxílio-doença será devido desde a data de início da incapacidade.
Para estabelecer a data provável de início da incapacidade, torna-se necessário analisar a situação concreta da autora.
A autora, em 3.7.2018, ajuizou a ação n. 5002073-76.2018.4.04.7210, no Juízo Federal de São Miguel do Oeste. Naquela demanda, houve a realização de perícia em 4.10.2018 e, como as conclusões médicas não apontavam para a existência de incapacidade para o exercício das atividades habituais, em 16.10.2018 houve a sentença de improcedência dos pedidos, com transito em julgado certificado em 16.11.2018.
Ocorre que, pelo que se extrai, na mesma data em que houve a realização da perícia na ação judicial (4.10.2018), a autora, possivelmente após o exame médico, compareceu no INSS e realizou novo requerimento administrativo (NB 625.085.191-0 - e. 1-17). Consequentemente, no dia 21.11.2018, a perícia administrativa também não constatou a existência de incapacidade da autora (e. 44-2-43).
Em 24.4.2019, já durante o curso deste processo, a autora novamente requereu a concessão de benefício por incapacidade administrativamente. Naquela oportunidade, houve o reconhecimento da incapacidade e o benefício foi de 24.4.2019 a 22.6.2019 (NB 188.614.667-2 - e. 44-2-9). Poucos dias antes do encerramento do benefício, em 13.6.2019, a perícia judicial designada nesta demanda também reconheceu a existência de incapacidade da autora, decorrente de patologias lombares, que também a impossibilitavam de exercer as suas atividades habituais (e. 11).
Diante de todo o contexto, percebe-se que autora não estava incapacitada em 4.10.2018 (data do requerimento administrativo do NB 625.085.191-0), mas que apenas houve o reconhecimento da incapacidade depois do ajuizamento desta demanda, em 24.4.2019 (com a consequente concessão de auxílio-doença até 22.6.2019 - NB 188.614.667-2 - e posterior confirmação da incapacidade na perícia judicial - e. 11). Logo, entendo que a data de 24.4.2019 deve ser tida como a data provável de início da incapacidade e, consequentemente, o marco inicial para a concessão do benefício (excluindo-se as prestações pagas durante o período de 24.4.2019 a 22.6.2018 - e. 44-2).
Assim, a negativa do benefício, ao tempo do ajuizamento da ação, foi, portanto, ato lícito que não merece reparo. Seria hipótese de improcedência dos pedidos, mas o art. 493 do CPC admite a consideração deste fato constitutivo superveniente e o princípio da primazia do acertamento da relação jurídica de proteção social recomenda que se defina de uma vez a situação da segurada. Assim, estabelecida a incapacidade posterior da segurada e satisfeitos todos os demais requisitos, deve-se conceder desde logo o benefício.
A sucumbência, então, deve ser invertida. É foi a segurada que deu causa ao ajuizamento desta ação, visto que quinze dias após ajuizá-la (com pedido de concessão de benefício indeferido administrativamente há seis meses atrás), requereu a concessão de novo benefício administrativamente, que lhe foi concedido de 24.4.2019 a 22.6.2019. A demanda, então, poderia ter sido evitada, caso a segurada houvesse, considerando o agravamento de suas patologias, requerido novamente o benefício administrativamente. Deu assim causa à instauração do processo e, mesmo obtendo o benefício, deve ser condenado ao pagamento das despesas e honorários advocatícios.
A perícia médica judicial, nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade para o trabalho, exerce importante influência na formação do convencimento do magistrado. Todavia, tal prova não se reveste de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, se uma das partes apresentar elementos probatórios consistentes que conduzam a juízo de convicção diverso da conclusão do perito judicial, ou se, apesar da conclusão final deste, a própria perícia trouxer elementos que a contradigam.
No caso concreto, a parte autora possui 49 anos, e desempenha a atividade profissional de agricultora. Foi realizada perícia médica judicial, por especialista em ortopedia, em 13-06-2019 (Evento 11 - OUT1). Respondendo aos quesitos formulados, o perito afirmou que a autora é portadora de cervicalgia, dor em ombro direito e lombalgia (CIDs M54.2, M75.1 e M54.5), estando total e temporariamente incapacitada para o exercício de suas atividades laborais. Sugeriu o afastamento pelo período de 5 meses para realização de tratamento cirúrgico e correção da lesão do ombro direito.
O perito apontou não ser possível afirmar se havia incapacidade na data do requerimento administrativo.
Em que pese o apelo da parte autora, não há nos autos elementos que justifiquem a concessão do benefício na DER (04-10-2018).
Apesar de a autora ter sido amparada pela Autarquia Previdenciária por um longo período de tempo (08-10-2002 a 21-06-2018), em razão de problemas ortopédicos, o pedido de restabelecimento do benefício de auxílio-doença foi julgado improcedente, no processo n. 5002073-76.2018.4.04.7210, com trânsito em julgado em 16-11-2018, em razão de a perícia judicial, realizada em 04-10-2018 (mesma data da DER), não ter constatado incapacidade laboral.
Da mesma forma, a perícia administrativa, realizada em 21-11-2018 (evento 41 - ANEXO2, fl.3), não apontou incapacidade laborativa.
Ademais, embora a autora tenha ajuizado a presente ação somente em 09-04-2019, não trouxe aos autos nenhum documento médico que pudesse indicar a existência do estado incapacitante ou de redução da capacidade laboral, no período posterior a DER (04-10-2018). Todos os documentos juntados aos autos são anteriores a DER ou referentes ao período em que a autora estava recebendo benefício.
Consta nos autos, que após o ajuizamento da presente ação, foi concedido à autora o benefício de auxílio-doença (NB 188.614.667-2), no período de 24-04-2019 a 22-06-2019.
Portanto, é de ser mantida a sentença que concedeu o benefício de auxílio-doença a partir da concessão administrativa do novo benefício, em 24-04-2019, quando restou demonstrada a incapacidade da parte autora.
Asssim, nego provimento ao apelo da parte autora.
Ônus sucumbenciais
Não obstante a autora não ter logrado êxito em demonstrar que a incapacidade remonta à época do pedido administrativo (DER 04-10-2018), o indeferimento na via administrativa do benefício nº 625.085.191-0 deu causa à propositura da demanda. Ademais, foi reconhecida a incapacidade superveniente pela perícia judicial, bem como o benefício foi concedido para além do período de 24-04-2019 a 22-06-2019, reconhecido administrativamente.
Portanto, a parte autora sucumbiu em parte mínima do pedido, devendo o INSS suportar os ônus sucumbenciais.
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, os honorários advocatícios suportados pelo INSS devem ser fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, ressaltando ser incabível, no caso, a majoração dos honorários prevista § 11 do art. 85 do NCPC, a teor do posicionamento que vem sendo adotado pelo STJ (v.g. AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe 19-04-2017).
Honorários periciais
Sucumbente, deve o INSS suportar o pagamento do valor fixado a título de honorários periciais.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas judiciais na Justiça Federal, nos termos do art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96, e na Justiça Estadual de Santa Catarina, a teor do que preceitua o art. 33, parágrafo primeiro, da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com a redação dada pela Lei Complementar Estadual n. 729/2018.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003207608v40 e do código CRC 7985b9ff.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5010707-65.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: CLECI LOPES NICOLAO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE LABORAL. PROVA PERICIAL. AUSÊNCIA DE VALOR ABSOLUTO. FORMAÇÃO DE CONVICÇÃO. TERMO INICIAL. VERBAS SUCUMBENCIAIS.
1. A perícia médica judicial, nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade para o trabalho, exerce importante influência na formação do convencimento do magistrado. Todavia, tal prova não se reveste de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, se uma das partes apresentar elementos probatórios consistentes que conduzam a juízo de convicção diverso da conclusão do perito judicial, ou se, apesar da conclusão final deste, a própria perícia trouxer elementos que a contradigam.
2. No caso, não havendo nos autos nenhuma prova produzida pela segurada que indique a existência do seu estado incapacitante na data do requerimento do benefício, é de ser mantida a sentença que concedeu o benefício a partir da concessão administrativa do benefício.
3. Tendo a parte autora decaído de parcela mínima do pedido, os ônus de sucumbência devem ser arcados pelo INSS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003207609v4 e do código CRC e5a2f746.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5010707-65.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: CLECI LOPES NICOLAO
ADVOGADO: JOSE NICOLAO (OAB SC008569)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 763, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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