Apelação Cível Nº 5005178-51.2019.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: BERNARDETE COSMANN MOLLMANN (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta em face da sentença que denegou mandado de segurança que visa determinar ao impetrado que dê continuidade ao procedimento administrativo de requerimento de benefício previdenciário, emitindo a GPS para o recolhimento das contribuições atinentes aos meses de 01/2017 a 04/2018, na qualidade de contribuinte individual.
Sustenta, em síntese, que requereu o pagamento na condição de contribuinte individual e não como facultativo, como aparece no CNIS. Ademais, é ilógico autorizar o recolhimento da diferença de 11% para 20%, como foi feito pela segurada ainda no NB anterior registrado com o n. 178.431.204-2, e não se autorizar a recolher um período posterior, todo ele no percentual de 20% ainda mais, não decadente. Ressalta, por outro lado, que não está sendo solicitado que o período a ser indenizado seja computado como carência. (e.
).Com as contrrarazões (e.
), vieram os autos a esta Corte para julgamento.A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo regular prosseguimento do feito (e.
).É o relatório.
VOTO
A sentença foi vazada nestes termos (e.
):
Trata-se de Mandado de Segurança interposto com o objetivo de obter provimento jurisdicional que garanta à impetrante o direito ao recolhimento de contribuições em atraso, na qualidade de contribuinte facultativo, e a consequente reabertura do procedimento administrativo relativo ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição formulado pela autora.
Segundo a impetrante, apresentou pedido administrativo de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, que foi indeferido por falta de tempo. Parte do período foi desconsiderado por terem sido recolhidas contribuições de 11%, quando o correto seria 20% sobre o salário de contribuição, nos termos do artigo 21, § 2º, inciso I, e § 3º, da Lei n. 8212/91.
A impetrante efetuou a complementação dos recolhimentos e voltou a apresentar requerimento do benefício, em 19/01/2019, no qual requereu o recolhimento de contribuições de 01/2017 a 04/2018, como contribuinte facultativa, pedido que foi indeferido sob o argumento de que esta já havia perdido a qualidade de segurada em janeiro de 2017.
Alegou que ao reconhecer o direito à complementação das contribuições o INSS reconheceu sua condição de contribuinte individual, nos termos do artigo 21, § 2º, da Lei n. 8212/91.
Não podem ser acolhidos os argumentos da impetrante, não havendo que se falar em direito líquido e certo ao recolhimento de contribuições como contribuinte facultativo após a perda da qualidade de segurada.
O artigo 13 define o segurado facultativo:
Art. 13. É segurado facultativo o maior de 14 (quatorze) anos que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, desde que não incluído nas disposições do art. 11.
O artigo 15, § 1º, inciso VI, da Lei n. 8213/91, por sua vez, estabelece que o prazo de manutenção da qualidade de segurado do contribuinte facultativo é de 06 meses após a última contribuição.
A impetrante havia efetuado sua última contribuição como facultativa foi efetuada em dezembro de 2016, quanto o requerimento para recolhimento a destempo ocorreu apenas em 2019, quando já há muito havia ocorrido a perda da qualidade de segurada.
Como bem referido pela autoridade impetrada, o fato de ter sido permitido o acréscimo das contribuições quanto ao período de 03/2014 a 12/2016, não determinou o seu reconhecimento como contribuinte individual, pois o dispositivo legal citado, inclusive na inicial pela impetrante, se destina também aos contribuintes facultativos:
"Art. 21. A alíquota de contribuição dos segurados contribuinte individual e facultativo será de vinte por cento sobre o respectivo salário-de-contribuição.(...)" (grifo nosso)
Diga-se, que segurado contribuinte individual é aquele que exerce atividade descrita no art.12, V, da Lei de Custeio da Previdência (LC), ou no art. 11, V, da Lei de Benefícios (LB), seja sob a denominação de empresário, autônomo ou equiparado a autônomo, estando, portanto, imediatamente filiado ao Regime Geral na qualidade de segurado obrigatório, e no viés tributário dessa relação, na condição de sujeito passivo da obrigação tributária, a qual nasce com a realização do fato gerador (exercer atividade remunerada descrita na LC ou na LB ).
Já o contribuinte facultativo, por sua vez, não exerce qualquer das atividades que determine sua filiação obrigatória ao Regime Geral (RG), sendo-lhe facultado (e não obrigatório) contribuir para o custeio da Seguridade Social, se tiver o intuito de se tomar igualmente segurado da Previdência Social.
Outra distinção que merece atenção na hipótese dos autos é a que se estabelece entre filiação e inscrição: para aqueles que exercem as atividades do art. 12, V, da Lei na 8.212/91 (LC), ou do art. 11, V da Lei na 8.213/91 (LB), a filiação ao RG é imediata e independe da inscrição ou do recolhimento da contribuição junto ao INSS; estes são passos posteriores.
Já para o facultativo, a filiação é concomitante à inscrição e ao recolhimento da contribuição, e depende de ato de vontade do referido contribuinte, não é obrigatória.
A legislação acerca da matéria, atendendo às distinções entre as categorias e os institutos, assim dispõe:
Lei n.º 8.212/91 estabelece:
"Art. 45. (...)
§1°. Para comprovar o exercício de atividade remunerada, com vistas à concessão de benefícios, será exigido do contribuinte individual, a qualquer tempo, o recolhimento das correspondentes contribuições
§2°. Para apuração e constituição das créditos a que se refere o parágrafo anterior, A Seguridade Social utilizará como base de incidência o valor da média aritmética simples dos 36 (trinta e seis) últimos salários-de-contribuição.
(...)
§ 4°Sobre os valores apurados na forma dos §§ 2° e 3° incidirão juros moratórios de 0,5% (zero virgula cinco por cento) ao mês, capitalizados anualmente, e multa de 10% (dez por cento).
§ 6° O disposto no § 4° não se aplica aos casos de contribuição em atraso a partir da competência de abril de 1995, obedecendo-se, a partir de então, às disposições aplicadas às empresas em geral. "
O Decreto n° 3.048/99, por sua vez, refere:
"Art. 11. (..)
§3°. A filiação na qualidade de segurado facultativo representa ato volitivo, gerando efeito somente a partir da inscrição e do primeiro recolhimento, não podendo retroagir e não permitindo o pagamento de contribuições relativas a competências anteriores à data da inscrição, ressalvado o § 3° do art. 28.
Art 124. Caso o segurado contribuinte individual man~feste interesse em recolher contribuições relativas a período anterior a sua inscrição, a retroação da data do inicio das contribuições será autorizada, desde que comprovado o exercício de atividade remunerada no respectivo período, observado o disposto nos § § 2 ° do art. 12, no § 1° do art. 128 e no art. 244." (grifado)
Com base no exposto, vê-se que, em se tratando de categorias diversas (o individual e o facultativo), não há que se falar em violação ao princípio da isonomia.
Ao segurado contribuinte individual é dado recolher as contribuições em atraso, inclusive antes da sua inscrição, uma vez que ele já é filiado ao RG, desde o exercício da atividade remunerada devidamente enquadrada na LC (ou na LB). Então, desde a sua filiação, já é sujeito passivo da obrigação tributária de pagar a contribuição. E, ao fazer o pagamento a destempo, deve arcar com os ônus do seu atraso, isto é, pagar juros e multa, nos termos do § 4º do art. 45 da LC. Atente-se para o fato de que, ao individual, só é permitido o recolhimento retroativo à filiação, mesmo que anterior à inscrição, como forma de comprovar o exercício de atividade remunerada, justamente porque a obrigação de pagar a contribuição previdenciária nasce, para ele, com a realização da atividade descrita ou no art. 11, V, da LC, ou no art. 12, V, da LB.
Já para o segurado contribuinte facultativo a situação é outra. Como ele não exerce atividade remunerada, e não está filiado de plano ao RG. Logo, não é contribuinte de coisa alguma até que manifeste a sua intenção de contribuir. É a partir deste momento, quando se inscreve e recolhe a contribuição, que o facultativo se filia. Daí, não é possível contribuir de forma retroativa à inscrição, com limite à data da filiação, porque ambos institutos se configuram concomitantemente, quando se trata do segurado facultativo. Impossível recolher contribuições atrasadas em se tratando de facultativo, simplesmente porque elas não existem. O facultativo paga quando e se quiser.
A valer a tese da impetrante, aplicação analógica para o facultativo disposto no art. 45 da LC, estaria a se cobrar de quem nunca teve a obrigação de pagar coisa alguma ao INSS.
Desta forma, por se tratar de categorias de segurados distintas entre si, o tratamento a ser despendido a cada uma delas também deve ser diferente. Descabido, portanto, falar-se em quebra da igualdade ou de violação ao princípio da legalidade porque o Decreto teria restringido o que a Lei n° 8.212/91 não restringiu. Na verdade, a lei nunca autorizou o segurado contribuinte facultativo a recolher contribuições atrasadas.
Na esteira deste entendimento, confira-se:
"PREVIDENCIARIO. TEMPO DE SERVIÇO. ESTUDANTE. SEGURADO FACULTATIVO. IMPOSSIBILIDADE DE FILIAÇÃO RETROATIVA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 8º, LETRA "c" DO DECRETO N° 611/92. RECURSO NÃO CONHECIDO.
1. A filiação do segurado facultativo à Previdência Social segue uma disciplina diferente da que é di.spensada ao obrigatório, pois, enquanto para este basta o exercício de atividade prevista na Lei como de filiação necessária, para aquele é mister a manifestação volitiva no sentido de aderir à Seguridade Social.
2. Consoante extrai-se do art. 55, § 1º da Lei n.º 8.213/91, somente é admitida a contribuição retroativa dos segurados facultativos naquelas hipóteses em que a atividade exercida pelo segurado, tornou-se, com a edição do citado diploma legal, de filiação obrigatória.
3. Mesmo que não pudesse o recorrente, à época, filiar-se à Previdência Social, como estudante, por ausência de previsão legal, não pode fazê-lo hoje, ante o caráter não retroativo da inscrição do segurado facultativo junto à autarquia previdenciária.
4. Recurso especial não conhecido. "
(RESP n° 183.893; STJ - 6a T; ReI. Min. Fernando Gonçalves; DJU: 12/06/2000)"
Portanto, não há ilegalidade no indeferimento do pedido de recolhimento pretérito das contribuições da impetrante como facultativo em face da perda da qualidade de segurada que determinou a descaracterização de sua filiação e a impossibilidade de recolhimentos sem nova filiação nos mesmos moldes.
III. DISPOSITIVO
Ante o exposto, DENEGO a segurança pleiteada, extinguindo o processo cem resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I°, do Código de Processo Civil, conforme fundamentação acima.
Não obstante os fundamentos esposados pela apelante, não diviso reparos à solução adotada pelo juízo a quo, porquanto a filiação da impetrante é como segurada facultativa, consoante CNIS acostado e.
, restando há muito tempo assentado na jurisprudência o entendimento de que descabe a filiação retroativa:PREVIDENCIÁRIO. MONITORIA UNIVERSITÁRIA. CONTAGEM COMO TEMPO DE SERVIÇO. SEGURADO FACULTATIVO. FILIAÇÃO RETROATIVA. DESCABIMENTO.
1. Não há como retirar o caráter estritamente acadêmico da monitoria, tanto que seu exercício é restrito aos estudantes dos cursos de graduação. Tem como escopo principal, conforme se extrai do art. 41 da Lei n.º 5.540/1968, iniciar o treinamento de graduandos interessados em futuramente exercer o magistério superior.
2. Como estudantes, a teor da legislação pretérita e da atual, são considerados segurados facultativos. Desse modo o período em que exercida a função de monitor pode ser contado como tempo de serviço tão-somente se as contribuições previdenciárias à época tivessem sido recolhidas, ante a impossibilidade, nesse caso, de filiação retroativa. Precedente da Egrégia Sexta Turma.
3. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp n. 480.227/DF, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 2/9/2003, DJ de 6/10/2003, p. 302.)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SEGURADO FACULTATIVO. ESTUDANTE. IMPOSSIBILIDADE DO PAGAMENTO RETROATIVO DE CONTRIBUIÇÕES PARA CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO ANTES DA LEI 8.213/91 E DA PERTINENTE FILIAÇÃO. Ao segurado facultativo não há direito à contagem retroativa do tempo de serviço como estudante, em período anterior à previsão legal inicial e antes da filiação pela inscrição e pagamento da primeira contribuição. Precedentes do STJ e desta Corte. (TRF4, AC 5007828-52.2011.4.04.7105, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 23/07/2015)
Logo, inexistindo direito líquido e certo, deve ser ratificada a sentença que denegou a segurança.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da impetrante.
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Apelação Cível Nº 5005178-51.2019.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: BERNARDETE COSMANN MOLLMANN (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. apelação. MANdADO DE SEGURANÇA. RECOLHIMENTO RETROATIVO DE CONTRIBUIÇÕES COMO SEGURADO FACULTATIVO. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. IMPOSSIBILIDADE. SEGURANÇA DENEGADA
Inexistindo direito líquido e certo ao recolhimento retroativo de contribuições como contribuinte facultativo após a perda da qualidade de segurado, deve ser denegada a segurança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 18 de abril de 2023.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 11/04/2023 A 18/04/2023
Apelação Cível Nº 5005178-51.2019.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: BERNARDETE COSMANN MOLLMANN (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A): LEOMAR ORLANDI (OAB SC020888)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/04/2023, às 00:00, a 18/04/2023, às 16:00, na sequência 179, disponibilizada no DE de 28/03/2023.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA IMPETRANTE.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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