Apelação Cível Nº 5047905-83.2018.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: LOURDES DOS REIS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
A parte autora ajuizou ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pleiteando concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à pessoa portadora de deficiência.
Processado o feito, foi proferida sentença, publicada em 14.08.2020, cujo dispositivo ficou assim redigido (ev. 105):
3. Dispositivo
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.
Opostos embargos de declaração pela parte autora (ev. 111), foram, contudo, rejeitados (ev. 116).
A parte autora apela alegando (ev. 116), a breve trecho, que a deficiência principiou em 1988, e por conseguinte, seja afastada a incidência do fator de conversão de 0,80, concedendo-se o benefício desde 22/08/2018. Alternativamente requer seja aplicado o cálculo feito pela Autarquia, no processo administrativo, reafirmada a DER para 14/08/2020, e considerado os recolhimentos de 2019 e 2020. Por fim, requer a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (22/08/2018) ou desde o momento em que passou a ser devida, mediante a reafirmação da DER.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Aposentadoria da pessoa com deficiência
O benefício em questão é previsto no § 1º do artigo 201 da Constituição Federal. Acerca deste dispõe a Lei Complementar nº 142/2013:
"Art. 2º Para o reconhecimento do direito à aposentadoria de que trata esta Lei Complementar, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Art. 3º É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou
IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
Parágrafo único. Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar.
Art. 4º A avaliação da deficiência será médica e funcional, nos termos do Regulamento.
Art. 5º O grau de deficiência será atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim.
Art. 6º A contagem de tempo de contribuição na condição de segurado com deficiência será objeto de comprovação, exclusivamente, na forma desta Lei Complementar.
§ 1º A existência de deficiência anterior à data da vigência desta Lei Complementar deverá ser certificada, inclusive quanto ao seu grau, por ocasião da primeira avaliação, sendo obrigatória a fixação da data provável do início da deficiência.
§ 2º A comprovação de tempo de contribuição na condição de segurado com deficiência em período anterior à entrada em vigor desta Lei Complementar não será admitida por meio de prova exclusivamente testemunhal.
Art. 7º Se o segurado, após a filiação ao RGPS, tornar-se pessoa com deficiência, ou tiver seu grau de deficiência alterado, os parâmetros mencionados no art. 3o serão proporcionalmente ajustados, considerando-se o número de anos em que o segurado exerceu atividade laboral sem deficiência e com deficiência, observado o grau de deficiência correspondente, nos termos do regulamento a que se refere o parágrafo único do art. 3º desta Lei Complementar".
Referida lei complementar estabeleceu, ainda, que regulamento do Poder Executivo definiria o que é deficiência grave, moderada e leve (art. 3º, parágrafo único), bem como que a avaliação da deficiência deveria ser médica e funcional (art. 4º).
O Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 8.145/2013, regulamentou a mencionada lei complementar e estabeleceu que a perícia deveria ser realizada nos termos de ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União (Decreto 3.048/99, art. 70-D). Esse ato conjunto de que trata o artigo 70-D do Decreto nº 3.048/99 foi editado por meio da Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP nº 01, de 27/01/2014, a qual aprovou o instrumento destinado à avaliação do segurado da Previdência Social e à identificação dos graus de deficiência.
Assim, estabeleceu-se que o grau de deficiência deveria ser atestado por perícia do INSS, mediante avaliação funcional realizada com base no conceito de funcionalidade disposto na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF, da Organização Mundial de Saúde, e mediante aplicação do Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria - IFBrA (parágrafo primeiro do artigo 2º).
De acordo com a Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP nº 01, de 27.01.2014, o critério para a classificação da deficiência em grave, moderada e leve é:
(i) deficiência grave quando a pontuação for menor ou igual a 5.739;
(ii) deficiência moderada quando a pontuação total for maior ou igual a 5.740 e menor ou igual a 6.354;
(iii) deficiência leve quando a pontuação total for maior ou igual a 6.355 e menor ou igual a 7.584.
(iv) pontuação insuficiente para concessão do benefício quando a pontuação for maior ou igual a 7.585.
Assim, se na soma da pontuação dos laudos da perícia médica e do serviço social o segurado obtiver pontuação menor ou igual a 7.584, terá direito ao benefício com tempo de contribuição reduzido. Caso contrário, não será possível aplicar a Lei Complementar 142/2013.
No caso dos autos, diverge-se acerca da caracterização do tempo de contribuição capaz de ensejar a aposentação nos moldes da Lei Complementar n. 142/2013.
Teve a bem o Juízo a quo julgar improcedente o pedido entendendo que a parte autora possui tempo insuficiente à concessão da aposentadoria pleiteada, e considera, por igual, desatendidos os requisitos alternativos, visto não contar, ainda hoje, a autora com 55 anos de idade.
Da sentença apela a parte autora discorrendo pelo reconhecimento do início da deficiência em 1988, em ordem a afastar a incidência do fator de conversão de 0,80. Sucessivamente quer seja aplicado o cálculo realizado pela Autarquia, no processo administrativo, reafirmando-se a DER para 14.08.2020, considerando os recolhimentos de 2019 e 2030. Por fim, requer a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (22/08/2018) ou desde o momento em que passou a ser devida, mediante a reafirmação da DER.
A sentença, da lavra da MM. Juíza Federal Dra Vanessa dE Lazzari Hoffmann examinou e decidiu com precisão todos os pontos relevantes da lide, devolvidos à apreciação do Tribunal, assim como o respectivo conjunto probatório produzido nos autos. As questões suscitadas no recurso não têm o condão de ilidir os fundamentos da decisão recorrida. Evidenciando-se a desnecessidade da construção de nova fundamentação jurídica, destinada à confirmação da bem lançada sentença, transcrevo e adoto como razões de decidir os seus fundamentos, in verbis:
(...)
Do caso concreto
Administrativamente (evento 87, PROCADM3, p. 36-37), as perícias médica e perícia social indicaram um total obtido - 6.275 - a qualificar a deficiência da autora como moderada.
A perita social nomeada pelo Juízo apresentou laudo a indicar a pontuação de 3.275 (evento 43, QUESITOS2), o que remeteria a uma deficiência leve. Já o laudo do perito médico indica pontuação de 3.850, concluindo não haver deficiência (evento 76, LAUDO1) e, no evento 91, esclarece que a soma das pontuações totaliza 7.125, ou seja, estaria enquadrado como deficiência leve.
Ao contrário do que foi alegado, a perícia foi completa e utiliza o conceito da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e os elementos da Lei n. 13.146, de 6 julho de 2015.
Nada obstante, adota-se a conclusão administrativa pela deficiência moderada, por ter sido apontada pela própria ré.
Portanto, o ponto controvertido é a data de início da deficiência. A respeito, o perito judicial concluiu (evento 91):
R: Em relação às datas técnicas consideramos o seguinte: A data da instalação da deficiência poderia estar relacionada ao evento inicial e cirurgia aos 14 anos de idade. Porém, habitualmente há uma boa evolução desta condição nos primeiros anos, até a ocorrência de artrose do quadril (que ocorreria nos anos subsequentes). Neste caso, a data que melhor contemplaria o quadro de deficiência seria o agravamento daquela condição anterior e necessidade de nova cirurgia em 2003 de fato.
Por outro lado, diante dos argumentos técnicos apontados em perícia, não concordamos com a conclusão de deficiência moderada no caso concreto diante da fundamentação já disposta no corpo do laudo pericial, que, lembro, se reporta justamente á minha área de atuação:
Tecnicamente, com base nos elementos acima descritos, verifica-se alteração no domínio motor essencialmente. Identificamos neste caso alterações leves relacionadas à marcha (mobilidade e deslocamento), mas sem a necessidade de terceiros. Considerando que a Lei em questão contempla o indivíduo como um todo, não apenas o aparelho osteomuscular, verifica-se que apesar de prejuízos leves no item funcionalidade (discutidos acima), não existe comprometimento relevante da independência da autora e da participação em sociedade, não havendo, desta forma, enquadramento em deficiência conforme critérios contemplados no IBrF.
Os prontuários juntados no evento 30 já foram analisados pelo perito e não têm o condão de alterar a conclusão da data de início da deficiência. Com efeito, indicam uma enfermidade ainda na adolescência e a tentativa, inclusive cirúrgica, da sua mitigação. Entretanto, somente em 2003, com a nova cirurgia, é que se pode, de fato, concluir pela existência de deficiência.
Como visto, em se tratando de deficiência moderada, a segurada faz jus à aposentadoria quando completados 24 anos de tempo de serviço/contribuição ou 55 anos de idade, desde que atendida carência de 15 anos, comprovada a deficiência no mesmo período. No caso, a autor contava, em 21/08/2018, 23 anos, 2 meses e 22 dias, tempo insuficiente à concessão da aposentadoria pleiteada. Também não atendia aos requisitos alternativos, visto não contar, ainda hoje, 55 anos de idade.
Improcedente o pedido.
De feito, laudo judicial complementar (ev. 91), realizado em 27.11.2019, identificou o início da deficiência em 2003:
R: Em relação às datas técnicas consideramos o seguinte: A data da instalação da deficiência poderia estar relacionada ao evento inicial e cirurgia aos 14 anos de idade. Porém, habitualmente há uma boa evolução desta condição nos primeiros anos, até a ocorrência de artrose do quadril (que ocorreria nos anos subsequentes). Neste caso, a data que melhor contemplaria o quadro de deficiência seria o agravamento daquela condição anterior e necessidade de nova cirurgia em 2003 de fato.
Frise-se, demais, que o laudo fora subscrito por médico especialista em ortopedia. É de ver, ainda, que o objetivo principal da perícia não é corroborar os exames e atestados dos médicos particulares, mas evidentemente a avaliação da condição do segurado. Não havendo como se pretender desmerecer o laudo apenas pelo aspecto formal, sem, contudo, atacar pontualmente a substância e conteúdo dele, máxime quando as questões relativas à deficiência e ao quadro de saúde foram de forma técnica expressamente avaliadas e respondidas pelo perito judicial, o qual materializou suas conclusões de modo coerente e consistente. Aliás, o perito judicial foi nomeado exatamente para emitir o laudo pericial em razão da divergência de entendimento entre as partes quanto à capacidade ou incapacidade da parte autora trabalhar, devendo ser prestigiada sua conclusão, mormente sua posição imparcial e equidistante delas.
Por fim, conforme ponderou o Juízo de origem, os prontuários médicos já foram analisados pelo experto.
Reafirmação da Data de Entrada do Requerimento (DER)
Em face do pedido veiculado pela parte autora (ev. 122) passo à análise da possibilidade de reafirmação da Data de Entrada do Requerimento (DER).
A reafirmação da DER, para todas as situações que resultem benefício mais vantajoso ao interessado, é admitida pelo INSS, conforme Instrução Normativa nº 77/2015:
Art. 690. Se durante a análise do requerimento for verificado que na DER o segurado não satisfazia os requisitos para o reconhecimento do direito, mas que os implementou em momento posterior, deverá o servidor informar ao interessado sobre a possibilidade de reafirmação da DER, exigindo-se para sua efetivação a expressa concordância por escrito.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se a todas as situações que resultem em benefício mais vantajoso ao interessado.
Com efeito, a implementação dos requisitos para recebimento do benefício após a entrada do requerimento administrativo pode ser considerada como fato superveniente, nos termos dos artigos 462 do Código de Processo Civil de 1973 e 493 do Código de Processo Civil de 2015:
Art. 462. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença.
Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
A 3ª Seção deste Tribunal firmou entendimento quanto ao tema em incidente de assunção de competência. No julgamento de questão de ordem na AC 5007975-25.2013.4.04.7003, em 06.04.2017, restou uniformizada a jurisprudência no seguinte sentido:
INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. REAFIRMAÇÃO DA DER. POSSIBILIDADE. A 3ª Seção desta Corte tem admitido a reafirmação da DER, prevista pela Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS e ratificada pela IN nº 85, de 18/02/2016, também em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, admitindo-se cômputo do tempo de contribuição inclusive quanto ao período posterior ao ajuizamento da ação, desde que observado o contraditório, e até a data do julgamento da apelação ou remessa necessária. Incumbe à parte autora demonstrar a existência do fato superveniente (art. 493 do NCPC) em momento anterior à inclusão do processo em pauta de julgamento, através de formulário PPP, laudo da empresa, PPRA, LTCAT etc., oportunizando-se ao INSS manifestar-se sobre a prova juntada, bem como sobre a inconsistência dos registros do extrato do CNIS. Honorários advocatícios incidirão sobre as parcelas vencidas a contar da data da reafirmação da DER até a sentença ou o acórdão que reconhecer e conceder o direito à aposentadoria ao segurado. Juros de mora e correção monetária deverão ser calculados a contar da data em que reafirmada a DER. (ACREEO nº 5007975-25.2013.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, 18.4.2017)
O Superior Tribunal de Justiça, concluindo o julgamento do Tema 995, em acórdão publicado em 02.12.2019, firmou a seguinte tese:
É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
Em 21.05.2020 foi publicado o julgamento dos embargos de declaração opostos nos recursos especiais afetados ao Tema 995, cujo voto do Relator, Min. Mauro Campbell Marques, esclareceu que não há necessidade de novo requerimento administrativo para a reafirmação da DER; que a reafirmação pode ser deferida no curso do processo ainda que não haja pedido expresso na inicial; que pode ser reconhecido o direito a benefício diverso do requerido; que o benefício é devido a partir do momento em que reconhecido o direito; que pode ser juntada prova na fase de apelação; que se a reafirmação da DER for feita para data posterior ao ajuizamento da ação (o que era o objeto do Tema) os juros moratórios somente incidirão se o INSS não implantar o benefício no prazo de 45 dias, sendo então contados a partir desse momento, verbis:
Importante consignar que o prévio requerimento administrativo já foi tema decidido pelo Supremo Tribunal Federal, julgamento do RE 641.240/MG. Assim, mister o prévio requerimento administrativo, para posterior ajuizamento da ação nas hipóteses ali delimitadas, o que não corresponde à tese sustentada de que a reafirmação da DER implica na burla do novel requerimento.
A reafirmação da DER poderá ocorrer no curso do processo, ainda que não haja prévio pedido expresso na petição inicial. Conforme delimitado no acórdão recorrido, existindo pertinência temática com a causa de pedir, o juiz poderá reconhecer de ofício outro benefício previdenciário daquele requerido, bem como poderá determinar seja reafimada a DER.
Caso reconhecido o benefício por intermédio da reafirmação da DER, seu termo inicial corresponderá ao momento em que reconhecido o direito, sem atrasados.
Quanto à mora, é sabido que a execução contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a primeira consiste na implantação do benefício, a segunda, no pagamento de parcelas vencidas a serem liquidadas e quitadas pela via do precatório ou do RPV.
No caso da reafirmação da DER, conforme delimitado no acórdão embargado, o direito é reconhecido no curso do processo, não havendo que se falar em parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação.
Por outro lado, no caso de o INSS não efetivar a implantação do benefício, primeira
obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, surgirá, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora. Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, a serem embutidos no requisitório.
Quanto à obscuridade apontada, referente ao momento processual oportuno para se reafirmar a DER, afirma-se que o julgamento do recurso de apelação pode ser convertido em diligência para o fim de produção da prova.
Ante o exposto, acolho os embargos de declaração, sem efeito modificativo.
Em 26.08.2020, no julgamento de novos embargos de declaração, nos autos do REsp. 1.727.064, restou consignado pelo Ministro Relator (negritos no original):
Consoante se extrai da tese firmada é crível a ocorrência de reafirmação da DER no momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício pleiteado, sendo o período a ser considerado o interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias.
Do referido entendimento é possível extrair a compreensão no sentido de que no momento em que a reafirmação for levada a efeito, todos os requisitos legais necessários à concessão do benefício pleiteado serão reavaliados, notadamente aqueles implementados ao longo da tramitação processual nas instâncias ordinárias.
Ocorre que tal tese não se vincula à fixação do termo inicial à percepção do benefício em si, pois esse, por óbvio está condicionado à comprovação simultânea de todos os requisitos que lhe são inerentes.
Em síntese, a data da reafirmação da DER, isoladamente considerada, não é necessariamente coincidente com o termo a quo para a concessão do benefício por ela reconhecido.
Com efeito, resulta do julgamento do recurso especial repetitivo, a determinação de retorno dos autos ao Tribunal a quo para que, permitida a reafirmação da DER, seja efetivado o cômputo do tempo de serviço prestado no curso do processo, e reavaliado o preenchimento dos requisitos para aposentadoria especial.
Em outras palavras, o acórdão embargado apenas determina que o Tribunal examine, com base nos elementos probatórios presentes no período assinalado (reafirmação da DER), se há elementos aptos a conceder ao segurado a pleiteada aposentadoria especial. Uma vez presentes todos os elementos, estará facultado àquela instância substituir a então concedida aposentadoria por contribuição e fixar - mediante resultado oriundo de atividade probatória apta a apurar o momento em que preenchido todos os requisitos - novo termo inicial para o benefício em questão.
De fato, se ainda não implementadas as condições suficientes para a concessão do benefício na data do requerimento administrativo, inexiste óbice para considerar-se a satisfação dos requisitos em momento posterior, por imperativo da economia processual, desde que observado o necessário contraditório.
E como se vê do último parágrafo transcrito, "o momento em que preenchido todos os requisitos" será o "novo termo inicial para o benefício", assertiva que foi fixada pelo Ministro Relator, no mesmo julgamento, também ao apreciar os embargos de declaração opostos pelo "amicus curiae" Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP): "A Teoria foi observada por ser um dos fundamentos adotados no acórdão embargado, para se garantir o direito a partir de seu nascimento, isto é, a partir do preenchimento dos requisitos do benefício".
No caso, bem decidiu o Juízo de origem, em sede de embargos de declaração (ev. 116):
No entanto, consultando o CNIS, existem vínculos com a empresa UNINTER EDUCACIONAL S/A de 14/01/2019 a 28/02/2019 e com ITAÚ UNIBANCO S.A. a partir de 11/11/2019.
Nada obstante, não se pode olvidar que a deficiência teve seu início fixado a partir da cirurgia, realizada em 15/04/2003 (evento 1, PRONT12, p. 1). Portanto, no caso, incide o disposto no art. 70-E, do Decreto 3.048/99:
Art. 70-E. Para o segurado que, após a filiação ao RGPS, tornar-se pessoa com deficiência, ou tiver seu grau alterado, os parâmetros mencionados nos incisos I, II e III do caput do art. 70-B serão proporcionalmente ajustados e os respectivos períodos serão somados após conversão, conforme as tabelas abaixo, considerando o grau de deficiência preponderante, observado o disposto no art. 70-A: (Incluído pelo Decreto nº 8.145, de 2013)
MULHER | ||||
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | |||
Para 20 | Para 24 | Para 28 | Para 30 | |
De 20 anos | 1,00 | 1,20 | 1,40 | 1,50 |
De 24 anos | 0,83 | 1,00 | 1,17 | 1,25 |
De 28 anos | 0,71 | 0,86 | 1,00 | 1,07 |
De 30 anos | 0,67 | 0,80 | 0,93 | 1,00 |
HOMEM | ||||
TEMPO A CONVERTER | MULTIPLICADORES | |||
Para 25 | Para 29 | Para 33 | Para 35 | |
De 25 anos | 1,00 | 1,16 | 1,32 | 1,40 |
De 29 anos | 0,86 | 1,00 | 1,14 | 1,21 |
De 33 anos | 0,76 | 0,88 | 1,00 | 1,06 |
De 35 anos | 0,71 | 0,83 | 0,94 | 1,00 |
§ 1o O grau de deficiência preponderante será aquele em que o segurado cumpriu maior tempo de contribuição, antes da conversão, e servirá como parâmetro para definir o tempo mínimo necessário para a aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência e para a conversão. (Incluído pelo Decreto nº 8.145, de 2013)
§ 2o Quando o segurado contribuiu alternadamente na condição de pessoa sem deficiência e com deficiência, os respectivos períodos poderão ser somados, após aplicação da conversão de que trata o caput. (Incluído pelo Decreto nº 8.145, de 2013)
Assim, adotando-se o fator 0,80 para os períodos anteriores à deficiência, a autora não conta com tempo suficiente para a aposentação na modalidade pretendida, mesmo com a reafirmação da DER para a data da sentença. É o que se pode concluir da seguinte tabela:
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
1 | - | 20/09/1989 | 05/09/1990 | 0.80 Especial | 0 anos, 9 meses e 7 dias | 13 |
2 | - | 02/05/1992 | 08/02/1996 | 0.80 Especial | 3 anos, 0 meses e 6 dias | 46 |
3 | - | 01/07/1996 | 01/09/1997 | 0.80 Especial | 0 anos, 11 meses e 7 dias | 15 |
4 | - | 02/09/1997 | 30/10/1997 | 0.80 Especial | 0 anos, 1 mês e 17 dias | 1 |
5 | - | 01/11/1997 | 20/06/1998 | 0.80 Especial | 0 anos, 6 meses e 4 dias | 8 |
6 | - | 08/07/1998 | 30/09/1998 | 0.80 Especial | 0 anos, 2 meses e 6 dias | 3 |
7 | - | 02/03/1999 | 09/04/1999 | 0.80 Especial | 0 anos, 1 mês e 0 dias | 2 |
8 | - | 02/05/2001 | 17/04/2002 | 0.80 Especial | 0 anos, 9 meses e 7 dias | 12 |
9 | - | 16/09/2002 | 14/04/2003 | 0.80 Especial | 0 anos, 5 meses e 17 dias | 8 |
10 | - | 15/04/2003 | 10/11/2008 | 1.00 | 5 anos, 6 meses e 26 dias | 67 |
11 | - | 03/12/2008 | 16/01/2009 | 1.00 | 0 anos, 1 mês e 14 dias | 2 |
12 | - | 02/02/2009 | 01/02/2011 | 1.00 | 2 anos, 0 meses e 0 dias | 25 |
13 | - | 14/03/2011 | 22/03/2011 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 9 dias | 1 |
14 | - | 02/05/2011 | 02/12/2011 | 1.00 | 0 anos, 7 meses e 1 dia | 8 |
15 | - | 02/01/2012 | 28/09/2017 | 1.00 | 5 anos, 8 meses e 27 dias | 69 |
16 | - | 11/12/2017 | 20/04/2018 | 1.00 | 0 anos, 4 meses e 10 dias | 5 |
17 | - | 02/05/2018 | 21/08/2018 | 1.00 | 0 anos, 3 meses e 20 dias | 4 |
18 | - | 14/01/2019 | 28/02/2019 | 1.00 | 0 anos, 1 mês e 17 dias Período posterior à DER | 2 |
19 | - | 11/11/2019 | 14/08/2020 | 1.00 | 0 anos, 9 meses e 4 dias Período posterior à DER | 10 |
* Não há períodos concomitantes.
Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade |
Até 16/12/1998 (EC 20/98) | 5 anos, 6 meses e 17 dias | 86 | 25 anos, 1 meses e 13 dias |
Até 28/11/1999 (Lei 9.876/99) | 5 anos, 7 meses e 17 dias | 88 | 26 anos, 0 meses e 25 dias |
Até 22/08/2018 (DER) | 21 anos, 6 meses e 28 dias | 289 | 44 anos, 9 meses e 19 dias |
Até 13/11/2019 (EC 103/19) | 21 anos, 8 meses e 18 dias | 292 | 46 anos, 0 meses e 10 dias |
Até 14/08/2020 (Reafirmação DER) | 22 anos, 5 meses e 19 dias | 301 | 46 anos, 9 meses e 11 dias |
* Para visualizar esta planilha acesse https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/77VH7-JHKQV-XE
De igual modo, ainda que se considere as informações contidas no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), com a reafirmação da DER em 14.08.2020 ou 06.11.2020, a parte autora não alcança os 24 anos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria de pessoa com deficiência.
Desta guisa, fica mantida a sentença.
Honorários Advocatícios
Improvido o apelo, fixo a verba honorária em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do benefício da gratuidade da justiça.
Custas
Fica suspensa a exigibilidade das custas devidas pela parte autora, em face da assistência judiciária gratuita deferida.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação da parte autora: improvida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002193513v16 e do código CRC a65db5f1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 17/12/2020, às 10:2:3
Conferência de autenticidade emitida em 25/12/2020 12:02:50.
Apelação Cível Nº 5047905-83.2018.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: LOURDES DOS REIS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. REQUISITOS E CRITÉRIOS DIFERENCIADOS. ARTS. 6º E 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO. ARTS. 2º E 3º DA LC 142/2003. GRAUS DE DEFICIÊNCIA.
1. A Constituição Federal prevê a aposentadoria aos segurados do Regime Geral da Previdência Social com deficiência, mediante adoção de requisitos e critérios diferenciados, consoante seu art. 201, § 1º, regulado, no plano infraconstitucional, pela Lei Complementar 142/2003.
2. Ausente a prova do preenchimento de todos os requisitos legais, não é possível a concessão do benefício à parte autora na pretendida modalidade diferenciada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 15 de dezembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002193514v4 e do código CRC 416d3f98.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 07/12/2020 A 15/12/2020
Apelação Cível Nº 5047905-83.2018.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: LOURDES DOS REIS (AUTOR)
ADVOGADO: LARA BONEMER ROCHA FLORIANI (OAB PR060465)
ADVOGADO: ANTONIO BAZILIO FLORIANI NETO (OAB PR059501)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/12/2020, às 00:00, a 15/12/2020, às 16:00, na sequência 947, disponibilizada no DE de 26/11/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
SUZANA ROESSING
Secretária
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