Apelação Cível Nº 5026516-76.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JADIR PEREIRA DA SILVA (AUTOR)
RELATÓRIO
A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição, desde a Data de Entrada do Requerimento - DER, mediante o reconhecimento da especialidade das atividades laborais nos períodos de 02/05/1986 a 18/02/1989, de 01/08/1989 a 08/02/1992, de 17/02/1992 a 24/10/1992, de 01/11/1993 a 23/07/1994, de 01/08/1994 a 17/04/2009, de 20/01/2010 a 20/08/2012, de 04/11/2013 a 02/12/2013 e de 02/12/2013 a 05/04/2016.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 13/09/2018, cujo dispositivo tem o seguinte teor (ev. 52):
III. DISPOSITIVO
Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, resolvendo o mérito nos termos do art. 487, I e III, a, do Código de Processo Civil, o que faço para:
a) reconhecer a ocorrência de trabalho em condições insalubres nos períodos de 02/05/1986 a 18/02/1989, de 01/08/1989 a 08/02/1992, de 17/02/1992 a 24/10/1992, de 01/11/1993 a 23/07/1994, de 01/08/1994 a 17/04/2009 - de forma integral, de 20/01/2010 a 20/08/2012 e de 02/12/2013 a 05/04/2016;
b) condenar o réu a averbar os períodos aqui reconhecidos e a conceder ao autor aposentadoria especial com DIB/DER em 05/04/2016;
c) condenar o réu no pagamento das parcelas em atraso desde 05/04/2016, corrigidas monetariamente, conforme fundamentação.
Dada a sucumbência mínima da parte autora, nos termos do artigo 86, parágrafo único, do Novo Código de Processo Civil, condeno o INSS ao pagamento integral dos honorários sucumbência fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, §3°, do Novo Código de Processo Civil, dependendo da apuração do montante em eventual cumprimento de sentença, sempre observando o §5° do artigo 85 do CPC. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4).
Sem custas a restituir em virtude da gratuidade de justiça.
Intimem-se.
Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões, por 15 dias. Com ou sem elas, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4º Região, nos termos do art. 1010, § 3º, do CPC.
Em que pese ilíquida a sentença, o valor da condenação claramente é inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Assim, dispensado o reexame necessário, nos termos do artigo 496, §3°, I, do CPC.
O INSS apelou alegando que não houve avaliação quantitativa dos agentes químicos, que havia uso de EPI eficaz e que o PPRA de 2011 demonstra que a exposição era intermitente. Aduz ausência de fonte de custeio e requer que haja o afastamento compulsório das atividades especiais como condição para recebimento de aposentadoria especial. Impugnou os consectários legais (ev. 57)
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Prescrição Quinquenal
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de caráter alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito.
Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação, conforme os termos da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
Atividade Especial
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado, que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998 (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05.04.2011).
Tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28.4.1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29.4.1995 e até 5.3.1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 5.3.1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 6.3.1997, quando vigente o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99.
d) a partir de 1.1.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7.11.2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18.5.2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8.1.2010).
Equipamentos de Proteção Individual - EPI
A Medida Provisória n° 1.729/98 (posteriormente convertida na Lei 9.732/1998) alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha i) informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, e ii) recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Por esse motivo, em relação à atividade exercida no período anterior a 03.12.1998 (data da publicação da referida Medida Provisória), a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. O próprio INSS já adotou esse entendimento na Instrução Normativa n° 45/2010 (artigo 238, § 6º).
Em período posterior a 03.12.1998, foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal a existência de repercussão geral quanto ao tema (Tema 555). No julgamento do ARE 664.335 (Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, DJe 12.2.2015), a Corte Suprema fixou duas teses: 1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; 2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. Ou seja: nos casos de exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI, ou de menção em laudo pericial à neutralização de seus efeitos nocivos, uma vez que os equipamentos eventualmente utilizados não detêm a progressão das lesões auditivas decorrentes; em relação aos demais agentes, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência da utilização de EPI's é admissível, desde que estejam demonstradas no caso concreto a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade e, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador.
A matéria foi objeto de exame por esta Corte no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR Tema 15), tratando da eficácia dos EPI's na neutralização dos agentes nocivos. O acórdão foi assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) 5054341-77.2016.404.0000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Jorge Antonio Maurique,11.12.2017)
Como se vê, foi confirmado o entendimento acerca da necessidade de prova da neutralização da nocividade dos agentes agressivos, sendo relacionados ainda outras hipóteses em que a utilização de EPI não descaracteriza o labor especial (além do ruído, já afastado pela decisão do STF), consoante o seguinte trecho do voto condutor:
Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:
a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:
Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:
'§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)'
b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:
b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)
b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)
b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:
Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.
b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017)
Em suma, de acordo com a tese fixada por esta Corte no IRDR 15:
- quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, há a especialidade do período de atividade;
- quando a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, há possibilidade de questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI;
- a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: i) em períodos anteriores a 3.12.1998; ii) quando há enquadramento legal pela categoria profissional; iii) em relação aos agentes nocivos: ruído, biológicos, cancerígenos (como asbestos e benzeno) e periculosos (como eletricidade).
Outrossim, nos demais casos, mesmo que o PPP consigne a eficácia do EPI, restou garantida ao segurado a possibilidade de discutir a matéria e produzir provas no sentido de demonstrar a ineficácia do EPI e a permanência da especialidade do labor.
Por fim, entendo que os riscos à saúde ou exposição a perigo não podem ser gerados pelo próprio trabalhador, ou que se tenha na conduta do trabalhador o fator fundamental de agravamento de tais riscos. Ou seja, podendo tomar conduta que preserve a incolumidade física, opta por praticar conduta que acentue os riscos, concorrendo de forma acentuada na precariedade das condições de trabalho. Esse entendimento aplica-se principalmente nos casos de profissionais autônomos que negligenciam com seus ambientes de trabalho, não curando com seus próprios interesses, e com isso, posteriormente, imputam ao Estado os ônus de tal negligência.
Alegação de ausência de contribuição adicional como óbice ao reconhecimento da atividade especial. Inexistência de correlação com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, § 5º)
O argumento do INSS não prospera, porquanto inadequado aferir a existência de um direito previdenciário a partir do modo como formalizada a obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Se os elementos de prova contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade laboral desenvolvida pelo segurado, o reconhecimento de seu direito não é prejudicado por eventual erro na informação da atividade na GFIP ou pela ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
O que importa é que a atividade seja, na realidade, especial. Nesse caso, abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A constatação de eventual discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais poderá constituir um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.
De outro lado, é inadequada a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).
Quanto ao ponto, a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. Prestigia-se, neste ponto, a realidade e a necessidade da proteção ao trabalhador, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social estaria a violar o princípio da precedência do custeio.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM EM TEMPO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. INFORMAÇÕES PRESTADAS EM GFIP. IRRELEVÂNCIA. PRECEDÊNCIA DA FONTE DE CUSTEIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. (...). 5. Para fins de reconhecimento da especialidade da atividade, é irrelevante que a empresa não tenha informado, em GFIP, o caráter especial da atividade exercida pelo autor, bem como que não tenha recolhido a respectiva contribuição adicional. (...) (TRF4 5031012-27.2012.4.04.7000, Turma Regional Suplementar do PR, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 02.10.2018)
Agentes Químicos (Óleos, Graxas e Hidrocarbonetos Aromáticos)
Os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie Hidrocarbonetos e Outros Compostos de Carbono, independente de especificação sobre qual o tipo de óleo (STJ, AgInt no AREsp 1204070/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, 2ª T., j. 08.05.2018).
Nesse sentido, "os hidrocarbonetos constituem agente químico nocivo (Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e o Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 - códigos 1.2.11, 1.2.10; 1.0.3, 1.017 e 1.0.19, respectivamente), de modo que a atividade exercida sob a sua exposição habitual e permanente goza de especialidade" (TRF4 5024866-96.2014.4.04.7000, TRS/PR, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 05.08.2018).
Ademais, conforme entendimento consolidado neste Tribunal Regional Federal, "os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, especialmente hidrocarbonetos, não requerem a análise quantitativa de concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa" (AC 0020323-28.2015.4.04.9999, 5ª T., Rel. Juiz Federal Altair Antonio Gregório, D.E. 03.08.2018).
Em suma, "a exposição a hidrocarbonetos aromáticos e fumos metálicos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial" (TRF4, APELREEX 0009385-37.2016.4.04.9999, 6ª T., Rel. Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, D.E. 01.08.2018; TRF4, REOAC 0017047-23.2014.4.04.9999, TRS/SC, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 20.07.2018).
Caso concreto
Fixadas estas premissas, prossegue-se com o exame dos períodos questionados.
No caso dos autos, a controvérsia diz respeito à especialidade - ou não - dos períodos de 02/05/1986 a 18/02/1989, de 01/08/1989 a 08/02/1992, de 17/02/1992 a 24/10/1992, de 01/11/1993 a 23/07/1994, de 01/08/1994 a 17/04/2009 - de forma integral, de 20/01/2010 a 20/08/2012 e de 02/12/2013 a 05/04/2016.
A sentença examinou as provas e decidiu a questão com exatidão, mediante fundamentos com os quais concordo e utilizo como razões de decidir, os quais já refutam as alegações recursais do INSS, nos seguintes termos:
Diante das premissas supra, passo à análise dos períodos controvertidos.
Períodos: de 02/05/1986 a 18/02/1989 e de 01/08/1989 a 08/02/1992
Função: auxiliar de montagem e mecânico montador, respectivamente
CTPS: fl. 14, PROCADM1, evento 8
Segundo o PPP de fls. 43-45, PROCADM1, evento 8, o autor exerceu a função de auxiliar de montagem, no período de 02/05/1986 a 18/02/1989, no setor 'produção', exposto a ruído de 92 dB, sem uso de equipamento de proteção eficaz.
No intervalo de 01/08/1989 a 08/02/1992, o demandante, de acordo com o formulário de fls. 47-49, PROCADM1, evento 8, exerceu o cargo de mecânico montador, no setor 'produção', exposto a ruído de 92 dB, sem uso de equipamento de proteção eficaz.
Conforme informações na parte final dos documentos mencionados, ambos foram confeccionados com base em avaliação ambiental de agosto de 1993.
Referido laudo técnico está acostado nas fls. 59-63, PROCADM1, evento 8. Nota-se que faz uma relação de ruídos de acordo com determinadas áreas analisadas no setor de produção. Ou seja, a análise ambiental foi feita em pontos do setor, e não por função. Os pontos analisados revelam ruído superior a 80 dB, com exceção de um (rampa de descarga e movimentação de chapas), cujo ruído aferido foi igual a 80 dB.
Desse modo, possível o reconhecimento da especialidade dos períodos em comento, haja vista que comprovado, de modo suficiente, ruído superior ao limite de tolerância de 80 dB, considerando a pressão sonora das máquinas existentes no setor de produção de forma conjunta.
O motivo do indeferimento constante da decisão administrativa do evento 39 (ausência de menção às funções de montagem e mecânico montador) deve ser afastado, pois, como dito, a forma de avaliação das condições ambientais não se deu por função, mas sim, por pontos no setor.
Fica deferido o pedido.
Período: de 01/08/1994 a 17/04/2009
Função: soldador
Empregador: Suzuki Indústria e Comércio de Máquinas Ltda
CTPS: fl. 24, PROCADM1, evento 8
Nestes autos, foram reconhecidos os períodos de 01/08/1994 a 31/08/1999, de 19/11/2003 a 31/05/2004 e de 01/06/2006 a 17/04/2009 - evento 39.
Desse modo, são controversos os períodos de 01/09/1999 a 18/11/2003 e de 01/06/2004 a 31/05/2006.
O formulário de fls. 51-55, PROCADM1, evento 8 informa que o autor, no intervalo de 01/08/1994 a 17/04/2009 exerceu a função de soldador, no setor de 'solda tig'.
Como fatores de risco, o referido documento indica ruído de 83 dB entre 01/09/1999 a 28/02/2003, sem uso de equipamento de proteção auricular, bem como de 87 dB, de 01/03/2003 a 31/05/2004, com uso de protetor auditivo. No período de 01/06/2004 a 31/05/2006, o formulário aponta ruído de 82 dB.
Também há informação sobre exposição a fumos metálicos (carbono, silício, manganês, cobre, cromo, níquel, e óxidos nítricos) entre 01/03/2003 a 31/05/2006, com uso de equipamento de proteção eficaz (CA 9626).
Os laudos técnicos de 1999 e 2000 indicam ruído médio de 83,5dB e 83 dB, respectivamente, no setor 'soldas elétricas - tig', conforme se vê das fls. 65-75, PROCADM1, evento 8.
Os laudos técnicos elaborados em março de 2003 e agosto de 2005 informam aferição de ruído de 88 dB no setor 'solda tig', para a função soldador, consoante se vê das fls. 77-79 e 85-89, PROCADM1, evento 8 (ou LAUDO14 e LAUDO16, evento1).
Por sua vez, os PPRAs elaborados em junho de 2004 e junho de 2006, apuram, em relação ao mesmo setor e cargo, ruído equivalente de 83 dB e 84,9 dB - fls. 79-83, PROCADM1, evento 8 (ou LAUDO 15, evento 1) e LAUDO17, evento 1.
Por fim, mencione-se o laudo técnico de junho de 2007, o qual aferiu ruído de 92 dB para o mesmo cargo e setor - LAUDO18, evento 1.
Com isso, possível o reconhecimento da especialidade do período de 01/06/2004 a 31/05/2006, pois comprovado, por meio de laudos técnicos a exposição do autor a ruído de 88 dB, ou seja, superior ao limite de tolerância de 85 dB.
Neste sentido, observe-se que não é razoável a adoção do ruído aferido em junho de 2004, de 83 dB, ou aferido em junho de 2006, de 84,9 dB, se considerados os laudos de 2005 e 2007, pois não há motivos para uma variação de ruído tão expressiva entre junho de 2004 e agosto de 2005 ou entre 2005 e 2007, quando novamente o ruído aferido foi superior ao limite de tolerância. Note-se que nem mesmo a hipótese de alteração de layout se mostra admissível, pois via de regra, esta torna melhores as condições de trabalho e não promove alternância entre condições melhores e piores.
No período anterior, de 01/09/1999 a 18/11/2003, não é possível o reconhecimento da especialidade em razão do ruído, pois não ficou demonstrada exposição a pressão sonora superior a 90 dB.
Quanto aos agentes químicos, foram constatados como presentes no ambiente de trabalho por meio dos laudos confeccionados em setembro de 2000 e junho de 2006 (LAUDO13 e LAUDO17, evento 1). Contudo, a ausência de avaliação anterior não pode vir em prejuízo ao trabalhador. Note-se que, em se tratando da função de soldador, é possível a presunção de que a exposição a fumos metálicos é inerente às suas funções. Assim, a conclusão é de que os referidos laudos apenas constataram as condições já existentes em épocas anteriores.
Diga-se, ainda quanto ao laudo de 2006, que relaciona como fumos metálicos agentes químicos como cromo, manganês e níquel, todos em concentração de 0,01 mg/m3, sem informar uso de equipamento de proteção.
Sendo assim, sopesadas as provas apresentadas, deve-se considerar comprovada a exposição a fumos metálicos nos períodos controversos, de forma habitual e permanente, sem que tenha sido demonstrada a eficácia dos equipamentos de proteção.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. REVISÃO DE APOSENTADORIA. ATIVIDADE ESPECIAL. SOLDADOR. RUÍDO. FUMOS METÁLICOS. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. DIB NA DER DO PEDIDO DE REVISÃO. TUTELA ESPECÍFICA DO ART. 461 DO CPC INDEVIDA. PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO NUMÉRICA DOS ARTIGOS. 1. ... 3. Deve ser reconhecida a especialidade em face da exposição habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a fumos metálicos, pois inerente à atividade de soldador, tais como fumos de manganês, fumos de silício, fumos de cobre, fumos de chumbo e fumos de óxido de ferro, elencados no formulário apresentado. 4. ... (TRF4, APELREEX 5014214-92.2011.404.7107, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 16/08/2013)
Dessa forma, possível o reconhecimento da especialidade nos períodos de 01/09/1999 a 18/11/2003 e de 01/06/2004 a 31/05/2006, em razão da exposição a agentes químicos.
Período: de 17/02/1992 a 24/10/1992
Empregador: Moller Indústria Metalúrgica Ltda
Função: 1/2 oficial soldador
CTPS: fls. 14 e 18, PROCADM1, evento 8
As anotações da CTPS são suficientes para a demonstração que o demandante permaneceu na mesma atividade de soldador por todo o período de contrato de trabalho, entre 17/02/1992 e 24/10/1992.
O código 2.5.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 relaciona os soldadores como expostos a atividade insalubre.
Sendo assim, entendo suficientes as provas constantes dos autos para a demonstração da especialidade dos períodos, sendo dispensável apresentação de laudo técnico, haja vista tratar-se de período sob égide de legislação que relacionava previamente as atividades consideradas insalubres.
Fica deferido o pedido em relação ao período supra especificado.
Período: de 01/11/1993 a 23/07/1994
Empregador: Indumec - Indústria Mecânica Ltda
Função: mecânico montador
CTPS: fls. 24 e 28, PROCADM1, evento 8
De acordo com o formulário de fls. 46-50, PROCADM2, evento 8, o autor trabalhou como mecânico montador no período em questão, realizando atividades de montagem de máquinas e estruturas, exposto a ruído de 86 dB, radiações não ionizantes, além de poeiras e fumos metálicos da solda / lixamento, no setor 'montagem'.
O laudo técnico de 2015, constante dos autos como LAUDO2, evento 23, confirma a exposição a ruído médio de 86 dB, com uso de equipamento de proteção, bem como informa que a exposição a radiação ionizante e agentes químicos como fumos metálicos e óleos, graxas ou lubrificantes, é eventual.
A extemporaneidade do laudo não prejudica a análise de seu conteúdo, prevalecendo a presunção de que as condições ambientais de trabalho tendem a melhorar com o passar do tempo. Assim, reputam-se ao menos iguais as condições havidas antes da avaliação, quando não piores. Nesse sentido vem decidindo o TRF4, exemplificativamente:
PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO AUXILIO-DOENÇA ININTERRUPTO. AUSÊNCIA RETORNO A TRABALHO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUIDO. EPIs. INDEFERIMENTO DA APOSENTADORIA ESPECIAL OU POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NA DER. AVERBAÇÃO DO LABOR ESPECIAL. TUTELA ESPECIFICA. 1. ... 5. O fato de o laudo pericial/técnico/PPP não ser contemporâneo ao exercício das atividades laborativas não é óbice ao reconhecimento do tempo de serviço especial, visto que, se em data posterior ao labor despendido, foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, reputa-se que, à época do labor, a agressão dos agentes era igual, ou até maior, dada a escassez de recursos materiais existentes para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho das tarefas. 6. ... (TRF4 5002764-87.2013.4.04.7009, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 11/07/2017)
Além disso, não houve comprovação de que o uso de EPI, no caso concreto, tenha afastado a nocividade do referido agente em relação aos distúrbios causados na saúde do trabalhador, para além da perda da audição.
Assim, possível o reconhecimento das condições especiais de trabalho em razão da exposição a ruído superior a 80 dB, limite de tolerância para o período.
No mais, veja-se que o Tribunal Regional da 4ª Região tem entendido que é inerente à função de mecânico a exposição a hidrocarbonetos. Confira-se:
Nestes termos, o seguinte trecho de voto proferido pelo Desembargador Federal Osni Cardoso Filho:
"... Quanto à exposição aos agentes químicos, especialmente hidrocarbonetos, o entendimento consolidado é no sentido de que os riscos ocupacionais por eles gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. A exposição a radiações não ionizantes e fumos de solda enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial, de acordo com jurisprudência do Tribunal regional Federal da 4ª Região. Para a caracterização da especialidade, não se exige exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de trabalho, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada, salvo exceções (periculosidade, por exemplo). Habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho. Nesse sentido: EINF 2004.71.00.028482-6/RS, Relator Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. de 8/1/2010 e EIAC 2000.04.01.088061-6/RS, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, DJU 3/3/2004.... (TRF4, APELREEX 5061762-37.2011.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Osni Cardoso Filho, juntado aos autos em 18/09/2015) (grifo não constante do original)
Além disso, não se vê indicação de proteção individual apropriada para neutralização do agente nocivo, ressaltando que é imprescindível a proteção respiratória contra os efeitos deletérios dos hidrocarbonetos aromáticos, não bastando apenas luvas e/ou creme protetor para as mãos. Neste ponto, diga-se que o próprio INSS reconheceu, no § 6º, do art. 238 da Instrução Normativa nº 45/2010, que somente será considerada a adoção de EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 03/12/1998. Cito a decisão do Tribunal Regional da 4ª Região, no AC 0023416-33.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 03/03/2016:
"...
Acerca desses equipamentos, registra-se que há informação de fornecimento. Contudo, não há prova de controle ou mesmo de treinamento para o correto e permanente uso deles. Além disso, a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP n.º 1.729/98, convertida na Lei n.º 9.732/98, que alterou o § 2.º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Importante registrar que a própria Autarquia adotou esse entendimento (Instrução Normativa 45/10, art. 238).
Ademais, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 462.858/RS, Rel. Min. Paulo Medina, 6.ª T, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovada a sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e desde que devidamente demonstrado o correto uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho, o que não restou comprovado nos presentes autos.
No caso da exposição a hidrocarbonetos, deve ser esclarecido que o fornecimento e até mesmo o uso de creme protetor de segurança e luva para proteção contra óleos e graxa são equipamentos destinados apenas à proteção das mãos e dos braços, promovendo tão somente proteção cutânea. O mesmo se diga quanto aos óculos de proteção e guardapó. Ocorre que a exposição do trabalhador a hidrocarbonetos aromáticos causa danos ao organismo que vão além de patologias cutâneas, pois, conforme o posicionamento desta Turma, "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011) - sublinhado.
..."
Dessa forma, fica deferido o pedido em relação ao período em comento, tanto em virtude da exposição a ruído quanto a agentes químicos.
Não bastasse isso, o período foi reconhecido como trabalhado em condições especiais em decorrência do ruído, consoante análise técnica do evento 39.
Período: de 20/01/2010 a 20/08/2012
Empregador: Consórcio Conpar
Função: soldador tig
CTPS: fl. 5, CTPS6, evento 1
O formulário de fls. 36-42, PROCADM2, evento 8 demonstra que o autor exerceu a função de soldador tig por todo o período supra especificado, no setor 'gerência da carteira gasolina' executando serviços de solda para preenchimento de espaços em tubulações, estruturas metálicas e outros, bem como dando acabamento às peças, utilizando mini lixadeiras e retíficas, exposto a ruído de 82 dB e a fumos metálicos e radiações não ionizantes, com uso de equipamento de proteção.
Foram anexados laudos técnicos no evento 30.
O laudo técnico de 2012 informa, para o soldador, a aferição de ruído entre 80 dB e 84 dB (fl. 17, LAUDO2). Nada menciona sobre fumos metálicos.
Já o referente ao ano de 2011 (fls. 61 e 90, LAUDO4) constata exposição do soldador a radiação não ionizante e fumos metálicos como manganês, cobre, ferro, cromo e níquel, com uso de equipamentos de proteção, entre eles máscara de solda e respirador PFF2. Embora haja constatação de ruído contínuo, não houve sua mensuração.
Por fim, o laudo técnico de 2010 (fls. 12 e 87, LAUDO3) constata exposição do soldador a fumos metálicos como manganês, cobre, ferro e níquel, de modo contínuo, com uso de equipamentos de proteção, entre eles máscara de solda e respirador PFF2. Embora haja constatação de ruído contínuo, não houve sua mensuração.
Apesar da indicação de equipamentos de proteção individual nos laudos técnicos, não há confirmação de sua eficácia nos laudos supramencionados.
Sendo assim, sopesadas as provas apresentadas, deve-se considerar comprovada a exposição a fumos metálicos nos períodos controversos, de forma habitual e permanente, sem que tenha sido demonstrada a eficácia dos equipamentos de proteção.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. REVISÃO DE APOSENTADORIA. ATIVIDADE ESPECIAL. SOLDADOR. RUÍDO. FUMOS METÁLICOS. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. DIB NA DER DO PEDIDO DE REVISÃO. TUTELA ESPECÍFICA DO ART. 461 DO CPC INDEVIDA. PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO NUMÉRICA DOS ARTIGOS. 1. ... 3. Deve ser reconhecida a especialidade em face da exposição habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a fumos metálicos, pois inerente à atividade de soldador, tais como fumos de manganês, fumos de silício, fumos de cobre, fumos de chumbo e fumos de óxido de ferro, elencados no formulário apresentado. 4. ... (TRF4, APELREEX 5014214-92.2011.404.7107, SEXTA TURMA, Relator EZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 16/08/2013)
Dessa forma, possível o reconhecimento da especialidade no intervalo em epígrafe, em razão da exposição a agentes químicos.
Período: de 04/11/2013 a 02/12/2013
Empregador: CNH Latin América Ltda
Função: soldador
CTPS: fl. 25, PROCDM2, evento 8
Embora em relação a tal período exista anotação em CTPS e tenha sido apresentado PPP ainda na seara administrativa (fls. 54-56, PROCADM2, evento 8), fato é que se trata de período concomitante em relação a vínculo empregatício diverso, mais extenso, de 27/07/2013 a 12/12/2013, junto a Metropolitana Vigilância Comercial e Industrial Ltda. Note-se que este último foi computado na contagem de fl. 100, PROCADM2, evento 8, ao passo que o intervalo em comento não o foi.
Assim, o pedido deve ser julgado improcedente, no ponto.
Período: de 02/12/2013 a 05/04/2016
Função: soldador qualificado
Empregador: Trox do Brasil - Difusão de Ar Acústica Filtragem e Ventilação Ltda
CTPS: fl. 6, CTPS6, evento 1
Segundo o formulário de fls. 12-14, PROCADM2, evento 8, o autor, no período em comento, exerceu a função de soldador qualificado, no setor 'dampers', exposto a ruído de 90,08 dB, com uso de equipamento de proteção eficaz, bem como a fumos metálicos, sem uso de equipamento de proteção.
Os laudos técnicos acostados no evento 23 (LAUDO3 e LAUDO4) confirmam tais informações e as acrescem, informando tratar-se de exposição a ruído de modo habitual e permanente, e de exposição a fumos de solda, habitual e intermitente.
Neste ponto, vale esclarecer que, de acordo com a decisão do STF supra, o uso de EPI não pode ser considerado eficaz para eliminação da nocividade do ruído porque a agressão ao organismo vai além da perda da função auditiva. Portanto, a atenuação/neutralização indicada no formulário não deve impressionar porque verificada apenas a eficácia do EPI em relação ao sentido da audição, sem mensuração da proteção aos demais danos causados pelo ruído.
Com isso, confirmado por meio de laudo técnico a exposição do autor a pressão sonora superior ao limite de tolerância vigente durante o contrato de trabalho em comento, de 85 dB.
Quanto aos agentes químicos, a descrição das atividades não permite a conclusão de que se tratava de exposição de forma habitual e intermitente, mas sim, de modo habitual e permanente, até porque a exposição a fumos de solda se presume inerente às atividades de soldador.
Os laudos técnicos acostados aos autos não arrolam nem confirmam a eficácia de equipamentos de proteção relacionados aos agentes químicos.
Assim, o pedido deve ser julgado procedente, no ponto.
Renovo o entendimento de que não é necessária avaliação quantitativa para reconhecimento da especialidade por agentes químicos nocivos. Ademais, a menção a uso de equipamento de proteção não é suficiente ilidir o reconhecimento da especialidade, devendo haver prova técnica no sentido de que os equipamentos de proteção efetivamente eliminavam o agente nocivo do ambiente laboral, ou que o neutralizavam por completo. Além disso, não obstante o PPRA de 2011 indique a exposição intermitente a agentes químicos para soldador de chaparia, soldador de arco submerso, soldador MIG/MAG, soldador TIG/ER (ev. 30, LAUDO4, p. 61), o mesmo laudo informa exposição contínua a agentes químicos nocivos para o soldador TIG/ER e para o soldador TIG/ELETRO (idem, p. 90). No período 20/01/2010 a 20/08/2012 (objeto do recurso de apelação do INSS que versa sobre a intermitência dos agentes químicos com base no PPRA de 2011 - ev. 57, pp. 7-8), a parte autora trabalhou como "soldador TIG" (ev. 1, CTPS6, p. 5, folha 14 da carteira) e, deste modo, deve prevalecer o entedimento mais favorável ao segurado, no caso, a informação de exposição contínua aos agentes químicos para tal espécie de trabalho (constante no ev. 30, LAUDO4, p. 90). Por fim, o argumento relativo à ausência de fonte de custeio já se encontra refutado em tópico anterior desta fundamentação.
Logo, nego provimento à apelação do INSS.
Aposentadoria Especial
Os requisitos exigidos para a concessão de aposentadoria especial são os seguintes: (a) comprovação de tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, durante o período mínimo de quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme a atividade laborativa; (b) comprovação de efetiva exposição aos agentes nocivos (químicos, físicos ou biológicos) pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício; (c) para fins de carência, comprovação de um mínimo de 15 anos de contribuição (180 contribuições mensais), nos termos do art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, ou período menor se a filiação ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS) foi anterior a 24/07/91, conforme tabela do art. 142 Lei nº 8.213/91.
Contagem do tempo de serviço/contribuição e carência
Mantida a sentença no mérito, conservo a decisão de origem quanto ao exame dos pressupostos para concessão do benefício em epígrafe:
Do direito à aposentadoria especial
Somando-se: a) os períodos especiais reconhecidos nesta sentença (de 02/05/1986 a 18/02/1989, de 01/08/1989 a 08/02/1992, de 17/02/1992 a 24/10/1992, de 01/11/1993 a 23/07/1994, de 01/08/1994 a 17/04/2009 - de forma integral, de 20/01/2010 a 20/08/2012 e de 02/12/2013 a 05/04/2016) tem-se que o autor totaliza tempo suficiente para a aposentadoria especial, conforme tabela a seguir:
Desse modo, e considerando que o documento de fl. 104, PROCADM2, evento 8 comprova cumprimento do requisito carência, está demonstrado o direito à aposentadoria especial.
Afastamento do trabalho em atividade especial
O artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, na redação conferida pela Lei nº 9.732/98, estabelece que "aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei". Por seu turno, o mencionado artigo 46 refere que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
A Corte Especial deste Tribunal Regional Federal havia declarado a inconstitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade Nº 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, 31.05.2012.
Todavia, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a Repercussão Geral da matéria em 27.3.2014 (Tema nº 709), e concluiu o julgamento do RE 791961 em 05.06.2020, fixando as seguintes teses:
I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.
Nos embargos de declaração opostos, cujo julgamento virtual foi finalizado em 23/02/2021, o Supremo Tribunal Federal proferiu a seguinte decisão:
"O Tribunal, por maioria, acolheu, em parte, os embargos de declaração para a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) propor a alteração na redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia apenas quanto à modulação dos efeitos da decisão. Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021."
A ausência de trânsito em julgado não impede a aplicação dos precedentes firmados pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF, ARE 686607 ED, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., j. 30.10.2012; RMS 35348 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., j. 10.5.2019).
Assim, deve ser observada a decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 709 da Repercussão Geral para os fins de cumprimento do julgado.
Quanto aos efeitos da aplicação do Tema 709 no caso concreto, deve ser observado o disposto no item II da tese firmada, que estabeleceu os parâmetros de sua aplicabilidade, a serem observados na implantação do benefício, tanto na via administrativa, quanto em juízo:
(ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.”
Nos casos em que há antecipação da tutela, no curso do processo, essa decisão judicial não prejudicará o segurado, conforme a premissa que orientou a tese fixada no referido item II do Tema. Nesse sentido, excerto da fundamentação do voto condutor, do Ministro Dias Toffoli, no Recurso Extraordinário 791961, paradigma do Tema 709:
De todo modo, não me parece que, ocorrendo o reconhecimento do direito à aposentadoria especial ao trabalhador que não se afastou daquela atividade nociva, a DIB deva ser fixada na data do afastamento do labor e não na data do requerimento. Isso porque, julgada procedente a ação, subentende-se que a resistência da autarquia era, desde o requerimento, injustificada. Dito de outro modo, o postulante efetivamente fazia jus ao benefício desde o requerimento administrativo. Deverá ele ser penalizado por uma resistência imotivada do INSS, sobretudo quando sabidamente os processos administrativo e judicial alongam-se por tempo demasiado? Não é razoável exigir o afastamento do trabalho logo quando da postulação, pois entre essa e o eventual deferimento decorre um tempo durante o qual o indivíduo evidentemente necessita continuar a obter renda para seu sustento, sendo incerto, ademais, nesse primeiro momento, inclusive, o deferimento da aposentação.
Quando, ao final do processo, o segurado tem seu direito à aposentadoria reconhecido e fica evidenciada a falta de fundamento para a resistência do INSS desde a entrada do requerimento, o segurado deve ser penalizado com a postergação da data de início do benefício para o momento em que ele se afastar da atividade? Com a devida vênia, aqui me afigura acertada a convicção esboçada pelo Tribunal a quo, o qual, a respeito desse ponto, assinalou que o segurado, quando prossegue no exercício da atividade, possui direito a receber as parcelas vencidas do benefício desde a data do requerimento administrativo.
Isso registrado, vislumbro como mais acertado, quanto a esse tema específico, que, nas hipóteses em que o indivíduo solicita a aposentadoria e continua a exercer o labor especial, a data de início do benefício deva ser a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão. Entendendo ser essa uma compreensão que bem harmoniza a segurança jurídica, o direito do segurado e o conteúdo do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
Destarte, nos casos em que houve antecipação da tutela em juízo, não haverá efeito retroativo prejudicial ao segurado, que poderá permanecer na atividade sem prejuízo do recebimento do benefício, nos termos da modulação dos efeitos determinada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos embargos de declaração no Tema 709, visto que após a apreciação do tema de Repercussão Geral, foram opostos embargos de declaração, cujo julgamento virtual foi finalizado em 23/02/2021, em que o Supremo Tribunal Federal proferiu a seguinte decisão:
"O Tribunal, por maioria, acolheu, em parte, os embargos de declaração para a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas; b) propor a alteração na redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.”; c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento; d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia apenas quanto à modulação dos efeitos da decisão. Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021."
Como se nota, o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos da tese de repercussão geral no sentido de preservar o direito de permanência dos segurados que recebem aposentadoria especial nas atividades especiais até a data do julgamento do embargos declaratórios, isso é, 23/02/2021.
Com a modulação de efeitos realizada no Tribunal Superior, é necessário o afastamento da atividade nociva como condição ao recebimento da aposentadoria especial, a partir da respectiva decisão do STF no julgamento daqueles EDs (em 23/02/2021).
Ressalva-se, contudo, os casos de profissionais da saúde que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, abrangidos pelos efeitos da decisão, em 15/03/2021, do Ministro Dias Toffoli, Relator do RE 791961 (Tema STF nº 709):
"(...) nos termos do art. 1.026, § 1º, do CPC, suspendo, liminarmente, e em relação aos profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, os efeitos do acórdão proferido nos autos, que apreciou os anteriores recursos de embargos de declaração aqui opostos."
Consectários da Condenação
Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Lei 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei 8.213/91), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 810, RE 870.947, Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJE de 20.11.2017, item "2" (embargos de declaração rejeitados sem modulação dos efeitos em 03.10.2019, trânsito em julgado em 03.03.2020), e do Superior Tribunal de Justiça no Tema 905, REsp. 1.492.221/PR, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 20.03.2018 , item "3.2" da decisão e da tese firmada.
Juros Moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29.06.2009;
b) a partir de 30.06.2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/97, consoante decisão do STF no RE 870.947, DJE de 20.11.2017.
Conclusão
Em casos símeis (v.g. 5017234-19.2014.4.04.7000), processos têm sidos restituídos à Turma para juízo de retratação, a fim de adequar o julgado aos referidos Temas, mesmo que o apelante não peça especificamente a aplicação do INPC em seu apelo.
Destarte, o apelo merece parcial provimento no ponto, para determinar a aplicação do INPC na correção monetária.
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios são devidos, em regra, no patamar de 10%, observados os percentuais mínimos previstos em cada faixa do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil para as condenações proferidas a partir de 18.03.2016, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).
Parcialmente provido o recurso, não cabe majoração da verba honorária na instância recursal.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Tutela Antecipada
Quanto à antecipação dos efeitos da tutela, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (TRF4, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7, Rel. para Acórdão, Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 9.8.2007).
Assim sendo, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação a artigos do Código de Processo Civil e da Constituição Federal, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação: provida parcialmente para determinar a aplicação das teses firmadas pelo STF no Tema 709 da Repercussão Geral, e do INPC na correção monetária.
- de ofício, é determinada a implantação do benefício no prazo de 45 dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002504215v4 e do código CRC 0589110a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 26/5/2021, às 12:51:13
Conferência de autenticidade emitida em 03/06/2021 04:03:04.
Apelação Cível Nº 5026516-76.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JADIR PEREIRA DA SILVA (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria especial. Atividade especial. agentes nocivos. reconhecimento. AGENTES QUÍMICOS.
A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.
Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
A exposição habitual e permanente a agentes químicos nocivos a saúde permite o reconhecimento da atividade especial. Para tanto, basta a análise qualitativa (exposição aos agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho), independentemente de análise quantitativa (concentração, intensidade, etc.).
Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal.
Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 25 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002504216v3 e do código CRC c4822ba2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 26/5/2021, às 12:51:13
Conferência de autenticidade emitida em 03/06/2021 04:03:04.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 18/05/2021 A 25/05/2021
Apelação Cível Nº 5026516-76.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JADIR PEREIRA DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: MARIELEM BEATRIZ FOGIATTO (OAB PR049135)
ADVOGADO: CLEBER GIOVANI PIACENTINI (OAB PR032882)
Certifico que este processo foi incluído no 2º Aditamento da Sessão Virtual, realizada no período de 18/05/2021, às 00:00, a 25/05/2021, às 16:00, na sequência 1554, disponibilizada no DE de 07/05/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
SUZANA ROESSING
Secretária
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