APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020069-96.2017.4.04.9999/RS
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RELATOR |
: |
LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | GIRMAR LUIZ DA SILVA |
ADVOGADO | : | CARI ALINE NIEMEYER |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS NOCIVOS E A RUÍDOS. PROVA TÉCNICA POR SIMILARIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
3. Devidamente comprovada a exposição a ruídos e agentes químicos nocivos em razão da rotina de trabalho do segurado, deve-se reconhecer a especialidade do correspondente tempo de serviço.
4. Sistemática de atualização do passivo observará a decisão do STF consubstanciada no seu Tema nº 810.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de novembro de 2017.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9194683v9 e, se solicitado, do código CRC 32FBD0DD. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Luiz Carlos Canalli |
| Data e Hora: | 25/11/2017 00:07 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020069-96.2017.4.04.9999/RS
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RELATOR |
: |
LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | GIRMAR LUIZ DA SILVA |
ADVOGADO | : | CARI ALINE NIEMEYER |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta por GIRMAR LUIZ DA SILVA contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando o reconhecimento dos períodos de atividade especial e a concessão de aposentadoria especial, desde o primeiro pedido.
Disse que em 21/03/2007 protocolou, sob o nº 140.182.335-3, seu primeiro pedido de aposentadoria, tendo sido indeferido. Depois, em 16/12/2008, fez novo pedido, de nº 145.313.527-5, sendo concedido. Disse que, na oportunidade do encaminhamento administrativo do pedido, comprovou que trabalhou em locais sob a exposição de agentes agressivos prejudiciais à saúde, de modo habitual e permanente.
Citado, o INSS apresentou contestação. Defendeu que a concepção de que as condições especiais seriam reconhecidas desde que o indivíduo pertencesse a determinada categoria profissional foi abandonada pela legislação que regulamenta a matéria. Arguiu que, segundo as novas regras de legislação previdenciária, para que o indivíduo faça jus à aposentadoria especial é necessária a efetiva exposição às condições consideradas especiais. Mencionou que, para ser reconhecido o tempo de serviço como especial, faz-se necessária a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário, na forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Postulou a improcedência da demanda.
Nomeado o perito e sendo aceito o encargo, foi juntado laudo pericial.
Designada audiência de instrução e julgamento, na solenidade, ausente o demandado, foram ouvidas 03 testemunhas.
Sentenciando, em 21/09/2016, o juízo a quo julgou procedente a demanda, constando do dispositivo o seguinte:
Em face do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por GIRMAR LUIZ DA SILVA, DETERM/NANDO que o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL compute e averbe os períodos de atividade especial urbana, com a conversão legal, nas empresas e períodos constantes na inicial, concedendo ao autor a aposentadoria especial a contar de 21/03/2007, CONDENANDO-O ao pagamento das diferenças das prestações já vencidas, corrigidas pelo INPC, a contar do inadimplemento de cada parcela, mais juros de 12% ao ano, a contar da citação, abatendo-se os valores pagos pelo benefício posteriormente concedido, que deverá ser cancelado.
CONDENO o demandado, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios ao patrono da parte autora que fixo, atentando aos parâmetros do art. 85 do CPC, em 10% sobre o valor, total da condenação, não incidindo sobre as prestações vincendas (...).
O INSS recorre (evento 03 - APELAÇÃO55), sustentando que deve haver a aplicação da legislação vigente na época de prestação da atividade, sob pena de ser violado o princípio tempus regit actum; que não é possível considerar especial a atividade exercida em período anterior à vigência da Lei 3.807/60, por ausência de previsão legal; que após 05/03/1997, há obrigatoriedade adicional de se apresentar Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - LTCAT; que os agentes químicos precisam ser analisados por sua ação tóxica e pelo risco; que a concessão da aposentadoria especial depende de comprovação pelo segurado do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente com efetiva exposição aos agentes físicos, químicos, biológicos, ou associação de agentes, prejudiciais à saúde ou à integridade física; que a exposição a agentes nocivos não caracteriza atividade especial quando mitigada por EPI comprovadamente eficaz; que não podem ser utilizados laudos periciais referentes a empresas ou unidades diversas daquelas nas quais o trabalho foi prestado. Pede a improcedência do pedido.
Foram apresentadas contrarrazões (CONTRAZ57).
É o relatório.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
No caso em tela, todavia, quando publicada a sentença destes autos, não estava sujeita a reexame obrigatório, pois já na égide do novo CPC, no qual foi suprimido o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos.
Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não há condição (interesse) para o conhecimento da remessa.
Com efeito, considerando os elementos existentes nos autos, pode-se antever que o valor da renda mensal, multiplicado pelo número de meses da condenação, até a data da sentença, acrescido de correção monetária e de juros de mora nas condições estabelecidas na decisão de primeiro grau, resulta em valor manifestamente inferior a mil salários-mínimos.
Assim, não conheço da remessa oficial.
MÉRITO
A controvérsia no plano recursal restringe-se ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 28/03/1979 a 04/10/1984, na empresa Darci Calzetta, na atividade de servente e de 06/03/1997 a 21/03/2007, na empresa Metalcan S/A, na atividade de mecânico de manutenção, já tendo sido reconhecido como especial o período de 09/10/1984 a 05/03/1997, na empresa Metalcan S/A.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova. Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99.
Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente referido no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) após 06/03/1997, quando vigente o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei nº 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Intermitência na exposição aos agentes nocivos
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n. 0003929-54.2008.404.7003, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n. 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF n. 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; TRF4, EINF n. 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO:
Passo, então, ao exame dos períodos controvertidos nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
Período: 28/03/1979 a 04/10/1984
Empresa: Darci Calzetta
Atividades/funções: servente
Período: 06/03/1997 a 21/03/2007
Empresa: Metalcan S/A
Atividades/funções: mecânico de manutenção
Provas: Laudo Pericial; testemunhas; DSS8030
Conclusão do Perito quanto à exposição a agentes químicos nocivos e ruído:
Analisei a documentação dos autos, selecionando para o preparo das respostas aos quesitos formulados, os documentos de fls. 02 a 15, 24 a 30, 49, 52 a 78, 93 a 97, 122 a 124.
Informei nos autos as datas que realizaria as Vistorias Técnicas aos locais laborados ou nas empresas similares. Realizei-as em 12 e 13/11/2014 e concluí que ambas as atividades de SERVENTE em Indústria Moveleira e de MECÂNICO DE MANUTENÇÃO em Indústria Metalúrgica respectivamente na Darci Calzetta e Metalcan, são atividades especiais porque: O servente em indústria moveleira de madeira trabalha em todos os setores de produção, como auxiliar nas diversas operações, dentre o Corte, a Respiga, a Destopa, a Freza, a Lixação, a Asperação, a Pintura, o Acabamento, a Montagem, a Lustração, o Enceramento, o Envernizamento, estando em contato o Agente Físico Ruído, junto ao maquinário 85 <= R <= 105 dBA e Químicos da poeira, do pó, lixamento e produtos contendo hidrocarbonetos aromáticos e outros compostos de Carbono, Benzeno, Etano, Acetona, etc. E o mecânico de manutenção na Metalcan, manuseando óleos minerais, lubrificantes na montagem, desmontagem de diversos maquinários da empresa, nos serviços de solda, oxiacetileno ou elétrica, no torno mecânico, manuseando produtos contendo Hidrocarbonetos aromáticos e outros compostos de carbono, benzeno e diversos outros cancerígenos. E no maquinário de trabalho 85 dBA <= R <= 95 dBA. Para ambas as funções laborais (vide em Adendos), medidas sonométricas conforme NH01 - MT - FUNDACENTRO (evento 03, LAUDPERI34 e PET42).
Assim, o perito concluiu pela insalubridade em grau médio para referidas atividades (evento 03, LAUDPERI34 e PET42).
Saliente-se, quanto ao Laudo Pericial, que nos casos em que a empresa não fornece documentos acerca dos agentes nocivos aos quais o segurado estava exposto no exercício das suas atividades, é possível que haja perícia em empresas similares, tal como procedeu o Perito.
Nesse norte o entendimento desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE NOCIVO CIMENTO. EPIS. PROVA TÉCNICA POR SIMILARIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. O trabalhador que rotineiramente, em razão de suas atividades profissionais, expõe-se ao contato com cimento, cujo composto é usualmente misturado a diversos materiais classificados como insalubres ao manuseio, faz jus ao reconhecimento da natureza especial do labor. 4. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. Em se tratando de ruído nem mesmo a comprovação de que a utilização de protetores reduzia a intensidade do som a níveis inferiores aos máximos deve afastar o reconhecimento da especialidade da atividade, pois já comprovado que a exposição por períodos prolongados produz danos em decorrência das vibrações transmitidas, que não são eliminadas pelo uso do equipamento de proteção. 5. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. 6. Na ausência de formulário preenchido pelo empregador, contendo dados precisos de prova da especialidade do labor, é possível a comprovação das atividades desempenhadas pelo segurado por outros meios como a utilização de laudo de empresa similar ou a realização de perícia técnica por similaridade. 7. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 0023901-67.2013.404.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, D.E. 04/10/2017)
Logo, quanto ao método empregado, perfeitamente válida a perícia realizada.
Conclusão constante da sentença quanto às atividades desempenhadas pelo autor, com base na prova documental e testemunhal:
Houve negativa da concessão na via administrativa quando do primeiro pedido sob alegação de falta de tempo para contribuição.
Ocorre que, conforme comprovado nos autos, as atividades desempenhadas pelo autor foram em condições insalubres, fazendo jus a conversão legal e, consequentemente, tendo atingido o tempo necessário para obtenção do beneficio, na data postulada administrativamente.
Com a juntada da documentação e perícia realizada, cujo laudo foi juntado às fls 148/172 e 183/184, não restaram dúvidas de que as atividades desempenhadas por ele nas empresas foram em condições especiais fazendo jus à conversão.
É notório que os trabalhadores destes setores, como o autor, que exerceu as funções diretamente na produção das fábricas, estão em contato permanente e diário com agentes insalubres.
Destaca-se que o enquadramento de atividade como especial ocorre quando restar comprovada a exposição habitual e permanente a algum dos agentes nocivos relacionados nos Decretos 53.813/64 e isto pode ser feito através de qualquer meio de prova, até mesmo através de aplicação analógica de laudo técnico pericial.
Observa-se que a documentação apresentada pelas empresas é prova inequívoca das condições laborais, com exposições insalubres, não havendo comprovação da distribuição de nenhum EPI.
Ademais, foram ouvidas testemunhas que relataram as condições de trabalho do autor, sempre em contato com agentes insalubres, de modo habitual e permanente, conforme depoimentos filmados e armazenados no CD de fl. 198.
Assim, o tempo nestas atividades deve ser considerado especial, com a conversão legalmente prevista.
De fato, as testemunhas atestaram o labor em contato com agentes químicos e ruído.
A testemunha (evento 07 - VIDEO1) disse que foi colega do autor na empresa Darci Calzetta, exercendo a mesma função, e que tinham contato direto com água e produtos químicos e que havia bastante ruído. Afirmou ainda que não usavam equipamentos de proteção.
Por seu turno, a testemunha (evento 07 - VIDEO2) afirmou que foi colega do autor na empresa Darci Calzetta, que havia barulho, e não tinham equipamento de proteção.
E a testemunha (evento 07 - VIDEO3) disse que usava água e soda, e que tinha o barulho das máquinas, da marcenaria, e que não tinham protetor de ouvido, nem máscara, nem luva.
Pois bem. No que concerne à exposição a graxas e óleos, referida no Laudo Pericial, a composição química dos óleos é a seguinte: variável de hidrocarbonetos (aldeído, ésteres, aldeídos, cetonas, fenóis, etc.).
E, no caso em exame, além da exposição a graxas e óleos, o autor estava exposto a pressão sonora habitual e permanente, de até 95 dBA em uma das empresas e de até 105 dBA na outra, o que enseja ao reconhecimento da especialidade, com base no código 1.1.6 do anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do anexo I do Decreto nº 83.080/79, e código 2.0.1 dos Anexos IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99.
Com efeito, quanto ao agente nocivo ruído, o Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25-03-1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24-01-1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05-03-1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06-05-1999, alterado pelo Decreto nº 4.882, de 18-11-2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1:
- Até 05.03.97: Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Superior a 80 dB) e Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (Superior a 90 dB).
- De 06.03.97 a 06.05.99: Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 (Superior a 90 dB).
- De 07.05.99 a 18.11.2003 Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, na redação original (Superior a 90 dB).
- A partir de 19.11.2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (Superior a 85 dB).
Embora a redução posterior do nível de ruído admissível como prejudicial à salubridade tecnicamente faça presumir ser ainda mais gravosa a situação prévia (a evolução das máquinas e das condições de trabalho tendem a melhorar as condições de trabalho), pacificou o egrégio Superior Tribunal de Justiça que devem limitar o reconhecimento da atividade especial os estritos parâmetros legais vigentes em cada época (REsp 1333511 - CASTRO MEIRA, e REsp 1381498 - MAURO CAMPBELL).
Revisando a jurisprudência desta Corte, providência do colegiado para a segurança jurídica da final decisão esperada, passa-se a adotar o critério da egrégia Corte Superior, de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.171/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, 28/05/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Ademais, ainda que as empresas tivessem fornecido protetores de ouvido, a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98, que alterou o § 2.º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Importante registrar que a própria Autarquia adotou esse entendimento (Instrução Normativa 45/10, art. 238). Ademais, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 462.858/RS, Rel. Min. Paulo Medina, 6.ª T, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovada a sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e desde que devidamente demonstrado o correto uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho, o que não restou comprovado nos presentes autos.
Outrossim, os equipamentos contra ruído não são suficientes para evitar e deter a progressão dessas lesões auditivas originárias do ruído, porque somente protegem o ouvido dos sons que percorrem a via aérea. O ruído origina-se das vibrações transmitidas para o esqueleto craniano e através dessa via óssea atingem o ouvido interno, a cóclea e o órgão de Corti." (Irineu Antônio Pedrotti, Doenças Profissionais ou do Trabalho, LEUD, 2ª ed., São Paulo, 1998, p. 538). Nesse sentido foi o julgamento do ARE 664335 (tema reconhecido com repercussão geral pelo STF sob o número 555).
Dessarte, em se tratando de trabalhador que laborou na indústria moveleira de madeira, em operações tais como de corte, respiga, destopa, freza, lixação, asperação, pintura, acabamento, montagem, lustração, enceramento, exposto permanentemente a níveis altos de ruído das máquinas da marcenaria, de até 105 dBA, e como mecânico de manutenção, com maquinário de trabalho que emite ruídos de até 95 dBA, a atividade é especial. Isso, e mais o contato não eventual com os agentes químicos já referidos. Assim, tendo em conta o período de labor já reconhecido pelo INSS como especial, aliado ao período reconhecido na sentença e ora mantido, o requerente conta com mais de 25 anos de labor especial, e já contava com esse tempo em março de 2007, quando do primeiro pedido administrativo.
Em suma, pelos fundamentos expostos, deve ser mantida a conclusão da sentença, no tocante a estar caracterizada a especialidade da atividade exercida pelo requerente nos períodos de 28/03/1979 a 04/10/1984 e de 06/03/1997 a 21/03/2007, e quanto à concessão do benefício de aposentadoria especial a partir de 21/03/2007.
CONSECTÁRIOS E PROVIMENTOS FINAIS
Sistemática de atualização do passivo
Juros de mora e correção monetária
A controvérsia relativa à sistemática de atualização do passivo do benefício restou superada a partir do julgamento do RE nº 870.947/SE, pelo excelso STF, submetido ao rito da repercussão geral e de cuja ata de julgamento, publicada no DJe de 25-9-2017, emerge a síntese da tese acolhida pelo plenário para o Tema nº 810 daquela Corte.
E nesse particular aspecto, vale anotar ser uníssono o entendimento das turmas do STF no sentido de que possam - devam - as demais instâncias aplicar a tese já firmada, não obstante a ausência de trânsito em julgado da decisão paradigmática. Nesse sentido: RE 1006958 AgR-ED-ED, Relator o Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 18-09-2017 e ARE nº 909.527/RS-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 30-5-16. Essa, ademais, a letra do artigo 1.030, inciso I, e do artigo 1.035, § 11, ambos do CPC.
Em face disso, assim como do intrínseco efeito expansivo de decisões dessa natureza, deve a sua eficácia incidir ao caso ora sob exame.
Nessa linha, a atualização do débito previdenciário, até o dia 29-6-2009, deverá observar os parâmetros constantes no Manual para Orientação e Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal. E, após essa data, ou seja, a contar de 30-6-2009, coincidente com o início da vigência do artigo 5º da Lei nº 11.960/2009, pelo qual conferida nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, deverá ser utilizada a metodologia ali prevista para os juros de mora; e, a título de correção monetária, será aplicado o IPCA-E.
Convém registrar que a Corte Suprema abordou e solveu a questão da atualização monetária em perfeita sintonia com o que já havia sintetizado em seu Tema nº 96, o qual tratava da atualização da conta objeto de precatórios e requisições de pequeno valor, estabelecendo jurídica isonomia entre essas situações.
Logo, no caso concreto, observar-se-á a sistemática do aludido manual, até 29-6-2009. Após, os juros de mora incidirão conforme estabelece o artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação que lhe foi dada pelo artigo 5º da Lei nº 11.960/2009; no que tange à correção monetária, tendo a sentença estabelecido o INPC como fator de correção monetária, ausente recurso da parte autora, deve esse ser mantido, porque sua variação percentual no período é, conquanto mínima, inferior a do IPCA-E.
Honorários advocatícios
Quanto aos honorários advocatícios, adoto o entendimento constante de precedente do Superior Tribunal de Justiça (REsp 556.741) no sentido de que a norma a reger a sucumbência é aquela vigente na data da publicação da sentença. Assim, para as sentenças publicadas ainda sob a égide do novo CPC, aplicável, quanto à sucumbência, o novel regramento.
Assim, no que tange à verba sucumbencial, tendo em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, uma vez que foram apresentadas contrarrazões, devem ser majorados os honorários advocatícios a cargo da autarquia previdenciária, de acordo com os ditames legais previstos no artigo 85 do novo CPC, em especial seus § 2º e 11, de 10% para 15%, incidentes sobre o valor das parcelas vencidas até a data da publicação do presente acórdão.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
A sentença não se sujeita ao reexame necessário e, deve ser mantido o reconhecimento dos períodos de trabalho como sendo de desempenho de atividade especial, bem como a concessão da aposentadoria especial, negando-se provimento o apelo do INSS.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5020069-96.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00146419320098210041
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | GIRMAR LUIZ DA SILVA |
ADVOGADO | : | CARI ALINE NIEMEYER |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/11/2017, na seqüência 260, disponibilizada no DE de 07/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
: | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA | |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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