Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. TRF4. 5000374-49.2020.4.04.7220...

Data da publicação: 03/12/2021, 15:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. Não obstante o Decreto nº 2.172/97 não tenha incluído em seu rol de agentes nocivos a eletricidade, é possível o enquadramento da atividade como especial no período posterior a 05/03/1997, se comprovado através de perícia que o trabalhador estava exposto a tensões superiores a 250 volts. Interpretação conjugada do Decreto nº 53.831/64 (Código 1.1.8 do Quadro Anexo) com a Súmula nº 198 do TFR. Orientação assentada no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.306.113. A exposição do segurado ao agente periculoso eletricidade sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. Cabe ainda destacar que o tempo de exposição ao risco eletricidade não é necessariamente fator condicionante para que ocorra um acidente ou choque elétrico. Assim, por mais que a exposição do segurado ao agente nocivo eletricidade acima de 250 volts (alta tensão) não perdure por todas as horas trabalhadas, trata-se de risco potencial, cuja sujeição não depende da exposição habitual e permanente. (TRF4, AC 5000374-49.2020.4.04.7220, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 25/11/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000374-49.2020.4.04.7220/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MOACIR JOSE BORBA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta contra sentença, publicada em 19/07/2021, proferida nos seguintes termos (evento 36):

Ante o exposto, acolho em parte os pedidos da parte autora, extinguindo o feito com apreciação do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para condenar o INSS a:

a) averbar como tempo de serviço especial os períodos de 01/07/1994 a 31/12/2004, 01/01/2005 a 01/02/2007, 02/02/2007 a 01/02/2009, 02/02/2009 a 21/12/2009, 22/12/2009 a 20/12/2011, 21/12/2011 a 20/12/2012, 21/12/2012 a 20/12/2013, 21/12/2013 a 20/12/2015, 21/12/2015 a 20/12/2016, 21/12/2016 a 20/12/2018 e 21/12/2018 a 12/08/2019;

b) implantar o benefício previdenciário de aposentadoria especial (NB 195.082.163-0), a contar da DER (07/09/2019), consoante cálculo mais vantajoso ao segurado, observada a obrigatoriedade de afastamento da atividade especial; fica ressalvado ao autor o direito ao benefício mais vantajoso; e

c) pagar os valores atrasados, acrescidos de correção monetária e juros, nos termos da fundamentação*.

*Juros e correção monetária

Cada prestação será monetariamente corrigida pelo IGPD-I até dezembro/2003, com acréscimo de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação. A partir de janeiro/2004, a atualização deverá ser feita pelo INPC, também cumulada com os juros de mora. A partir da publicação em 30/06/2009 da Lei nº 11.960, que deu nova ao artigo 1º-F da Lei n. 9.494, bem como em razão do decidido pelo Supremo Tribunal Federal em 20/09/2017 no Recurso Extraordinário nº 870.947, a correção monetária deve ser realizada pelo IPCA-E, e juros moratórios idênticos aos juros aplicados à caderneta de poupança, com incidência uma única vez.

No tocante à reafirmação da DER (em sendo o caso), o STJ definiu que, no que tange ao termo inicial dos juros de mora, a obrigação só surge se descumprida a intimação específica para implantação do benefício (46º dia após a intimação específica sem a implantação do benefício) (EDcl no REsp 1727064/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 19/05/2020, DJe 21/05/2020).

DADOS DA IMPLANTAÇÃO: (X) CONCESSÃO ( ) RESTABELECIMENTO)
NB195.082.163-0
Espécieaposentadoria especial
DIB07/09/2019
DIPprimeiro dia do mês da implantação do benefício
DCBnão se aplica
RMIA APURAR

Transitada em julgado, requisite-se o cumprimento da presente sentença ao Gerente Executivo do INSS, devendo a CEAB-DJ promover a juntada aos autos de extrato do CONBAS, memória de cálculo da RMI, bem como, nos casos que envolvem complemento positivo, ou que haja benefício concomitante/mensalidade de recuperação a ser deduzido, promover a juntada do HISCRE detalhado do crédito em questão, a fim de viabilizar a elaboração do cálculo dos atrasados.

Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% do valor do proveito econômico obtido pelo autor (art. 85, § 3º e § 4º, I do CPC), a serem calculados em liquidação de sentença. Atente-se para a Súmula 111 do STJ.

Deixo de condenar o autor ao pagamento de honorários advocatícios, já que decaiu em parte mínima do pedido, consoante parágrafo único do art. 86 do CPC.

Em suas razões recursais, o órgão previdenciário investe contra o deferimento do benefício à parte autora, sob os seguintes argumentos: (a) após o advento do Decreto nº 2.172/97 não é possível o enquadramento do labor como nocivo pela sujeição do trabalhador à eletricidade; (b) a atividade periculosa não configura risco à integridade física ou à saúde do obreiro, de forma que não enseja a concessão da aposentadoria especial; e (c) não restou provada a exposição habitual e permanente a agentes nocivos, na forma da Lei nº 8.213/91 e dos decretos regulamentares. Por fim, prequestiona afronta à matéria altercada (evento 40).

Com contrarrazões (evento 45), foram os autos remetidos a esta Corte para julgamento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Limites da controvérsia

Considerando-se que não se trata de hipótese de reexame obrigatório da sentença (art. 496, § 3º, inciso I, do CPC) e à vista dos limites da insurgência recursal, as questões controvertidas nos autos cingem-se às condições da prestação de serviço nos intervalos de 01/07/1994 a 31/12/2004, 01/01/2005 a 01/02/2007, 02/02/2007 a 01/02/2009, 02/02/2009 a 21/12/2009, 22/12/2009 a 20/12/2011, 21/12/2011 a 20/12/2012, 21/12/2012 a 20/12/2013, 21/12/2013 a 20/12/2015, 21/12/2015 a 20/12/2016, 21/12/2016 a 20/12/2018 e 21/12/2018 a 12/08/2019, bem como quanto ao direito do autor à aposentadoria especial. Pois bem.

Exame do tempo especial no caso concreto

A questão pertinente à análise da nocividade das condições ambientais do trabalho prestado pela parte autora foi percucientemente examinada pelo juiz a quo na sentença, razão pela qual, a fim de evitar tautologia, reproduzo os seus fundamentos, os quais adoto como razões de decidir (evento 36):

Dos períodos controversos:

Período(s):11/01/1994 a 30/06/1994, 01/07/1994 a 31/12/2004, 01/01/2005 a 21/12/2009 e 21/12/2009 a 12/08/2019
Empresa:PBG S/A e Comau do Brasil Indústria e Comércio Ltda (serviço prestado nas fábricas da PBG S/A)
Cargo/setor:- 11/01/1994 a 30/06/1994, como estagiário, Empresa PBG S/A;
- 01/07/1994 a 31/12/2004, na função de Eletricista de Manutenção, na Fábrica PBIV, Empresa PBG S/A;
- 21/12/2009 a 12/08/2019, na função de Eletricista de Manutenção, na Fábrica PBIV, Empresa PBG S/A;
- 01/01/2005 a 21/12/2009, na função de Eletricista de Manutenção, nas Fábricas PBIV, PBV, PBVI, Empresa Comau do Brasil Indústria e Comércio Ltda
Provas:CTPS (ev. 1, PROCADM8, páginas 10 a 19)
PPP (ev. 1, PROCADM8, páginas 20 a 24, 33 a 35)
LTCAT (ev. 12, LAUDO2 a LAUDO10)
Agentes nocivos:- 01/07/1994 a 31/12/2004: Físico Ruído 80,6 dB(A); Químico Óleo/Graxas (hidrocarbonetos); Acidente Eletricidade 380V / 440V;
- 01/01/2005 a 01/02/2007: Ruído de 82,1 dB(A);
- 02/02/2007 a 01/02/2009: Ruído de 83,6 dB(A);
- 02/02/2009 a 21/12/2009: Ruído de 87,3 dB(A);
- 21/12/2009 a 20/12/2011: Ruído 92,3 dB(A); Eletricidade 380V / 440V;
- 21/12/2011 a 20/12/2012: Ruído 92,2 dB(A); Eletricidade 380V / 440V;
- 21/12/2012 a 20/12/2013: Ruído 86,3 dB(A); Eletricidade 380V / 440V;
- 21/12/2013 a 20/12/2015: Ruído 86,3 dB(A); Eletricidade 380V / 440V;
- 21/12/2015 a 20/12/2016: Ruído 85,3 dB(A); Eletricidade 380V / 440V;
- 21/12/2016 a 20/12/2018: Ruído 85,6 dB(A); Eletricidade 380V / 440V; calor;
- 21/12/2018 a 12/08/2019: Ruído 89,2 dB(A); Eletricidade 380V / 440V.
Conclusão: Inicialmente, o período de 11/01/1994 a 30/06/1994 não está contido em nenhum dos PPPs apresentados pelo autor, tampouco se aplica o reconhecimento por categoria profissional. Outrossim, não há informação precisa da atividade e local em que prestado o estágio indicado, não sendo possível a análise acerca da especialidaade no referido período.
O PPP da empresa "PBG S/A" (nova denominação da Portobello S.A ou Cerâmica Portobello S/A), com indicação dos responsáveis técnicos pela aferição, aponta que a parte autora trabalhou sujeita a manutenção elétrica em redes de 380V e 440V nos períodos de 01/07/1994 a 31/12/2004 e 21/12/2009 a 12/08/2019, abrangendo os lapsos controvertidos acima indicados.
O PPP da empresa "Comau do Brasil Ind e Com Ltda"., também contendo os responsáveis técnicos pelas medições, indica que a parte autora ocupou o cargo de Eletricista de Manutenção no período de 01/01/2005 a 21/12/2009, descrevendo as atividades sem especificar as voltagens a que estava sujeito.
Também foram juntados os laudos técnicos de condições do ambiente de trabalho - LTCAT da empresa "PBG S/A" para os anos de 2003, 2004, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 e 2019. Para 2003 e 2004 constou expressamente nas funções de eletricista a exposição em redes elétricas de 380V e 440V. Para os demais anos os laudos, apesar de não quantificar a voltagem, apontaram a exposição habitual e permanente dos eletricistas a risco "alto" com direito ao adicional de periculosidade.
O TRF4 tem decidido ser possível o reconhecimento da especialidade do labor desenvolvido com exposição à eletricidade média superior a 250 volts após 05.03.1997, com fundamento na Súmula 198 do extinto TFR e na Lei n. 7.369/85, regulamentada pelo Decreto 93.412/96. Nesse sentido, para os períodos controvertidos trabalhados da empresa PBG S/A, resta forçoso reconhecer a especialidade, ante a apresentação de PPP e laudo técnico.No que diz respeito à empresa "Comau", apesar da parte autora ter juntado apenas PPP, permaneceu exercendo suas atividades no mesmo setor nas dependências das fábricas da PBG S/A, alterando-se apenas o empregador, empresa terceirizada que prestava serviços a ela.Corrobora tal afirmação a cópia da CTPS da parte autora, que consta admissão pela "Cerâmica Portobello S/A" em 01/07/1994 e saída pela "Comau do Brasil Ind. e Com. Ltda" em 27.12.2009, com a observação de que o empregado foi transferido da "Portobello" para a "Comau" em 01.01.2005, mantendo-se inalterados o contrato de trabalho. (ev. 1 - PROCADM8, página 17).Dessa forma, não houve mudança de sede, pois se assim tivesse ocorrido haveria um registro em CTPS de admissão e saída na "Portobello" e outro registro de admissão e saída para a "Comau".Ora, em se mantendo as mesmas condições de trabalho para as quais reconhecida a especialidade nos períodos laborados na "PBG S/A", não é razoável excluir o reconhecimento da especialidade em razão da mera formalidade de ter alterado a pessoa jurídica empregadora.Assim, também deve ser reconhecida a especialidade para o período trabalhado na empresa Comau do Brasil Ind e Com Ltda.Assim, reconheço a especialidade dos períodos de 01/07/1994 a 31/12/2004 (empresa PBG), 01/01/2005 a 21/12/2009 (empresa Comau) e de 21/12/2009 a 12/08/2019 (empresa PBG).

O Recorrente insurge-se contra o deferimento do benefício à parte autora ao argumento de que, com o advento do Decreto nº 2.172/97, a periculosidade e a penosidade deixaram de figurar no rol de agentes nocivos a justificar a concessão de aposentadoria especial.

A atividade do eletricitário constava como perigosa no Código 1.1.8 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, envolvendo as operações em locais com eletricidade em condições de perigo de vida; trabalhos permanentes em instalações ou equipamentos elétricos com risco de acidentes, pelos eletricistas, cabistas, montadores, dentre outros, cuja jornada normal ou especial fixada em lei para os serviços expostos a tensão superior a 250 volts, caracterizando, assim, a especialidade do trabalho.

De fato, os Decretos nºs 83.080/79 (Anexo II), 2.172/97 (Anexo IV) e 3.048/99 (Anexo IV) não contemplaram tal descrição. Ocorre que, além das hipóteses de enquadramento dos agentes nocivos conforme previsão nos decretos regulamentares, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos.

Acerca da celeuma, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em recurso repetitivo, no julgamento do Tema nº 534, concluiu que É cabível o enquadramento como atividade especial do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, com tensão superior a 250v, exercido após a vigência do Decreto nº 2.172/1997, para fins de aposentadoria especial, desde que a atividade exercida esteja devidamente comprovada pela exposição aos fatores de risco de modo permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais. Na ocasião, restou firmada a tese jurídica no sentido de que As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). (RESP nº 1.306.113, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJE 07/03/2013).

Logo, a exposição do trabalhador à tensão média superior a 250 volts, após 05/03/1997, autoriza a caracterização da atividade como especial.

Necessário anotar que a exposição de forma intermitente à tensão elétrica não descaracteriza o risco produzido pela eletricidade, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, por diversas vezes, ainda que não de forma permanente, tem contato com a eletricidade. Assim, tratando-se de periculosidade por sujeição a altas tensões elétricas, o requisito da permanência não é imprescindível, já que o tempo de exposição não é fator condicionante para que ocorra um acidente ou choque elétrico, tendo em vista a presença constante do risco potencial, não restando desnaturada a especialidade da atividade pelos intervalos sem perigo direto.

Com efeito, já decidiu esta Corte que A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das funções cometidas ao trabalhador, que está integrada à sua rotina de trabalho. Em se tratando de exposição a atas tensões, o risco de choque elétrico é inerente à atividade, cujos danos podem se concretizar em mera fração de segundo. (AC nº 5059172-48.2015.404.7100, Quinta Turma, Relatora Juíza Federa Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 12/06/2017).

Impende destacar a diferença essencial entre a exposição a certos agentes, como o frio e o calor, que atuam lentamente, e cujas condições negativas sobre o organismo humano geralmente exigem maior de tempo de contato, e a exposição à periculosidade. Neste último caso, deve-se sopesar o risco (maior ou menor) em relação ao tempo (mais curto ou longo) de contato com o referido agente, buscando-se uma solução de equilíbrio que não exija o contato permanente a um agente extremamente perigoso, ou tampouco um contato eventual em relação a um fator cujos riscos se mostrem mais amenos.

Nesses termos, a exposição do trabalhador às tensões elétricas, conforme enunciadas, revelam um fator de risco bem superior à média, porquanto um único momento de desatenção pode implicar em uma fatalidade, o que não é o caso de outros agentes que exigem maior tempo de contato. Nestas condições, exigir do trabalhador um contato permanente com o agente eletricidade seria o mesmo que exigir condições não humanas de trabalho, que demandariam atenção redobrada durante todo o período da jornada de trabalho, e muito provavelmente implicariam o perecimento físico, ou pelo menos na degradação psicológica do segurado.

Ainda, deve-se lembrar, ademais, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.

A Turma Nacional de Uniformização, no julgamento do PEDILEF nº 0501567-42.2017.4.05.8405/RN, representativo de controvérsia (Tema 210), concluiu por firmar a tese no sentido de que, Para aplicação do artigo 57, §3.º, da Lei n.º 8.213/91 à tensão elétrica superior a 250 V, exige-se a probabilidade da exposição ocupacional, avaliando-se, de acordo com a profissiografia, o seu caráter indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, independente de tempo mínimo de exposição durante a jornada. (Relator Juiz Federal Bianor Arruda Bezerra Neto, trânsito em julgado em 26/05/2020).

Da suposta ausência de contribuição adicional como óbice ao reconhecimento da atividade especial. A inexistência de correlação com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º)

O argumento não prospera. É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.

O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.

De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).

Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.

Conclusão quanto ao tempo de atividade especial

Possível o reconhecimento da nocividade do labor prestado nos períodos de 01/07/1994 a 31/12/2004, 01/01/2005 a 01/02/2007, 02/02/2007 a 01/02/2009, 02/02/2009 a 21/12/2009, 22/12/2009 a 20/12/2011, 21/12/2011 a 20/12/2012, 21/12/2012 a 20/12/2013, 21/12/2013 a 20/12/2015, 21/12/2015 a 20/12/2016, 21/12/2016 a 20/12/2018 e 21/12/2018 a 12/08/2019.

Do direito da parte autora à concessão do benefício

A soma do tempo especial que está sendo reconhecido em juízo totaliza 25 anos, 01 mês e 12 dias, suficientes à concessão da aposentadoria especial, a contar da DER (07/09/2019), bem como ao recebimento das parcelas devidas desde então.

Implantação do benefício

Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.

Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.

Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo índice oficial e aceito na jurisprudência, qual seja:

- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-10-2019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula nº 204 do STJ), até 29/06/2009. A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema nº 810 da repercussão geral (RE nº 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe nº 216, de 22/09/2017.

Honorários advocatícios

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016). Porém, diante da afetação do Tema nº 1.059 do STJ [(Im) Possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte ou quando o Tribunal nega o recurso do INSS, mas altera de ofício a sentença apenas em relação aos consectários da condenação.], resta diferida para a fase de cumprimento de sentença eventual majoração dos honorários advocatícios decorrente do presente julgamento.

Custas processuais: O INSS é isento do pagamento de custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Conclusão

- Sentença mantida quanto ao (a) cômputo de tempo especial nos lapsos de 01/07/1994 a 31/12/2004, 01/01/2005 a 01/02/2007, 02/02/2007 a 01/02/2009, 02/02/2009 a 21/12/2009, 22/12/2009 a 20/12/2011, 21/12/2011 a 20/12/2012, 21/12/2012 a 20/12/2013, 21/12/2013 a 20/12/2015, 21/12/2015 a 20/12/2016, 21/12/2016 a 20/12/2018 e 21/12/2018 a 12/08/2019; e (b) direito da parte autora à concessão da aposentadoria especial, a contar da DER (07/09/2019), bem como ao pagamento das parcelas devidas desde então, devendo ser observada a restrição imposta no art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.

- Sentença reformada para alterar, de ofício, o critério de atualização monetária do débito.

DISPOSITIVO

Pelo exposto, voto por, de ofício, fixar o critério de correção monetária conforme decisão do STF no Tema nº 810 e do STJ no Tema nº 905; diferir para a fase de cumprimento de sentença a eventual majoração da verba honorária por força do art. 85, § 11, do CPC; negar provimento à apelação do INSS e determinar a imediata implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002893870v2 e do código CRC 58c59311.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 25/11/2021, às 13:57:14


5000374-49.2020.4.04.7220
40002893870.V2


Conferência de autenticidade emitida em 03/12/2021 12:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000374-49.2020.4.04.7220/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MOACIR JOSE BORBA (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS.

Não obstante o Decreto nº 2.172/97 não tenha incluído em seu rol de agentes nocivos a eletricidade, é possível o enquadramento da atividade como especial no período posterior a 05/03/1997, se comprovado através de perícia que o trabalhador estava exposto a tensões superiores a 250 volts. Interpretação conjugada do Decreto nº 53.831/64 (Código 1.1.8 do Quadro Anexo) com a Súmula nº 198 do TFR. Orientação assentada no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.306.113. A exposição do segurado ao agente periculoso eletricidade sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. Cabe ainda destacar que o tempo de exposição ao risco eletricidade não é necessariamente fator condicionante para que ocorra um acidente ou choque elétrico. Assim, por mais que a exposição do segurado ao agente nocivo eletricidade acima de 250 volts (alta tensão) não perdure por todas as horas trabalhadas, trata-se de risco potencial, cuja sujeição não depende da exposição habitual e permanente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, fixar o critério de correção monetária conforme decisão do STF no Tema nº 810 e do STJ no Tema nº 905; diferir para a fase de cumprimento de sentença a eventual majoração da verba honorária por força do art. 85, § 11, do CPC; negar provimento à apelação do INSS e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 23 de novembro de 2021.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002893871v3 e do código CRC c482e616.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 25/11/2021, às 13:57:14


5000374-49.2020.4.04.7220
40002893871 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 03/12/2021 12:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 16/11/2021 A 23/11/2021

Apelação Cível Nº 5000374-49.2020.4.04.7220/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MOACIR JOSE BORBA (AUTOR)

ADVOGADO: NILVA TEREZINHA MAFRA (OAB SC017693)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 16/11/2021, às 00:00, a 23/11/2021, às 16:00, na sequência 43, disponibilizada no DE de 04/11/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, FIXAR O CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA CONFORME DECISÃO DO STF NO TEMA Nº 810 E DO STJ NO TEMA Nº 905; DIFERIR PARA A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA A EVENTUAL MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA POR FORÇA DO ART. 85, § 11, DO CPC; NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 03/12/2021 12:00:58.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora