Apelação Cível Nº 5008620-88.2020.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: AMARILDO SCALVI (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra sentença, publicada em 07/12/2021, proferida nos seguintes termos (
):Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO formulado na presente ação, extinguindo o feito com resolução de mérito, com fundamento do art. 487, I, do CPC, para reconhecer do exercício de atividade especial nos períodos de 02/08/1993 a 23/07/1996, 02/06/2003 a 06/06/2006 e de 03/03/2004 a 18/07/2019, os quais deverão ser averbados pelo INSS para fins de futura concessão de benefício previdenciário.
Considerando a sucumbência recíproca e com base no art. 86, caput, do CPC, fixo os honorários sucumbenciais em 10% sobre o valor da causa, na proporção de 50% em favor do procurador de cada parte.
Na mesma proporção, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais. O INSS está isento do pagamento de custas (art. 4°, I, Lei nº. 9.289/96).
A exigibilidade do pagamento dos honorários sucumbenciais e das custas processuais a cargo do autor fica suspensa diante dos efeitos suspensivos atribuídos pelo Agravo de Instrumento n° 5001724-67.2021.4.04.0000.
Em suas razões recursais, a parte autora requer a correção de erro material na sentença quanto ao somatório do tempo de atividades nocivas, com a consequente concessão da aposentadoria especial, desde a DER, bem como o cálculo da Renda Mensal Inicial com o maior salário de contribuição com a soma integral de todos os salários de contribuição, em períodos de atividade concomitante: 02/08/1993 a 23/07/1996 (Hospital Santo Antônio), 03/09/1993 a 09/08/1999 (Hospital Regional), 01/06/1999 a 12/08/1999 (Pronto Socorro AMU), 02/06/2003 a 06/06/2006 (Carlos Fogaça) e 03/03/2004 a 18/07/2019 (HRO). Subsidiariamente, pleiteia o deferimento do benefício mediante a reafirmação da DER para 12/11/2016 (
). Juntou documento ( ).Com contrarrazões (
), foram os autos remetidos a esta Corte para julgamento do recurso.Nesta Instância, foi determinado o sobrestamento do processo, tendo em conta a afetação ao Tema 1.070 do STJ (
).O autor postulou a desistência do pedido de soma integral de todos os salários de contribuição, dos períodos de atividade concomitante (
), com o que concordou o INSS ( ).É o relatório.
VOTO
Homologação do pedido de desistência
À vista da concordância do INSS, acolho a desistência do pedido de soma dos salários-de-contribuição nos períodos de atividades concomitantes e extingo parcialmente o processo, sem resolução de mérito, a teor do art. 485, inciso VIII e § 4º, do CPC, no tópico.
Limites da controvérsia
Considerando-se que não se trata de hipótese de reexame obrigatório da sentença (art. 496, § 3º, inciso I, do CPC) e à vista dos limites da insurgência recursal, a questão controvertida nos autos cinge-se à correção de erro material no cálculo do tempo especial do autor, com a consequente concessão do benefício, desde a DER ou mediante a reafirmação da DER.
Erro material na sentença
De fato, observo que laborou em equívoco o juiz a quo no cálculo do tempo especial prestado pelo autor, ao contabilizar 08 anos, 07 meses e 05 dias na soma do que fora computado administrativamente pelo INSS.
No Resumo de Documentos Para Cálculo de Tempo de Contribuição (
, pp. 108-122), consta que na via administrativa foram considerados como especiais os intervalos de 09/09/1985 a 04/11/1985, 07/03/1991 a 27/02/1993, 13/05/1991 a 26/02/1993, 01/03/1993 a 10/05/1993, 03/09/1997 a 05/03/1997, 06/03/1997 a 09/08/1999, 01/06/1999 a 07/08/1999 e 01/11/2000 a 09/05/2001, cujo somatório resulta em 08 anos, 09 meses e 13 dias.A divergência resulta da exclusão do lapso em que o autor esteve em gozo de benefício por incapacidade. Ocorre que, embora não tenha, expressamente, formulado pedido de cômputo de tempo especial entre 23/06/1998 e 31/08/1998, na inicial, foi articulado pedido nas seguintes letras:
Tal alegação não foi objeto de impugnação pelo INSS em nenhuma das ocasiões em que se manifestou nos autos, tampouco se trata de matéria de ordem pública, a ensejar a apreciação de ofício pelo julgador. É de ver-se, ainda, que nem no âmbito administrativo houve qualquer informação ao segurado no sentido de que o período de auxílio-doença não integraria o cálculo do tempo especial.
Como é cediço, A Administração tem o dever de fundamentar as suas decisões, de forma a fornecer subsídios que permitam ao administrado contrapôr-se a ela em caso de não concordância, impondo-se a reabertura do processo administrativo na hipótese de ser proferida decisão desprovida de fundamentação, a fim de que nova decisão seja proferida, com a exposição dos motivos de fato e de direito que levaram ao pronunciamento indeferitório. (TRF4 5005450-02.2020.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 19/11/2020).
Assim, o período de 23/06/1998 e 31/08/1998 deve compor o cálculo do tempo especial do autor, seja porque a autarquia não comunicou ao segurado, em decisão fundamentada, a orientação administrativa pela sua desconsideração, seja porque a restrição imposta no parágrafo único do artigo 65 do Decreto nº 3.048/99, à vista do princípio da aplicação da legislação vigente à época em que efetivamente prestado o trabalho submetido a condições especiais, somente se aplica a partir de 19/11/2003, data da publicação do Decreto nº 4.882/03, seja porque a Terceira Seção desta Corte, no julgamento do IRDR 5017896-60.2016.4.04.0000 (Tema 08), fixou a tese jurídica de que o período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando o trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento. (TRF4, 3ª Seção, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, julgado em 25/10/2017). Tal decisão foi mantida pelo STJ, no julgamento do Tema 998, que negou provimento aos RESPs nº 1.759.098, representativo de controvérsia, e nº 1.723.181, na sessão realizada em 26/06/2019 (Relator Ministro Napoleão Maia Filho, 1ª Seção).
Dito isso, impõe-se a correção de erro material na sentença, a teor do art. 494, inciso I, do CPC, sem que implique em supressão de grau de jurisdição.
Do direito da parte autora à concessão do benefício
Tempo especial
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
1 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 09/09/1985 | 04/11/1985 | Especial 25 anos | 0 anos, 1 meses e 26 dias | 3 |
2 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 07/03/1991 | 27/02/1993 | Especial 25 anos | 1 anos, 11 meses e 21 dias | 24 |
3 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 13/05/1991 | 26/02/1993 | Especial 25 anos | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
4 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 01/03/1993 | 10/05/1993 | Especial 25 anos | 0 anos, 2 meses e 10 dias | 3 |
5 | tempo especial reconhecido em juízo | 02/08/1993 | 23/07/1996 | Especial 25 anos | 2 anos, 11 meses e 22 dias | 36 |
6 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 03/09/1993 | 05/03/1997 | Especial 25 anos | 0 anos, 7 meses e 12 dias (Ajustada concomitância) | 8 |
7 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 06/03/1997 | 09/08/1999 | Especial 25 anos | 2 anos, 5 meses e 4 dias | 29 |
8 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 01/06/1999 | 07/08/1999 | Especial 25 anos | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
9 | tempo especial computado administrativamente pelo INSS | 01/11/2000 | 09/05/2001 | Especial 25 anos | 0 anos, 6 meses e 9 dias | 7 |
10 | tempo especial reconhecido em juízo | 02/06/2003 | 06/06/2006 | Especial 25 anos | 3 anos, 0 meses e 5 dias | 37 |
11 | tempo especial reconhecido em juízo | 03/03/2004 | 18/07/2019 | Especial 25 anos | 13 anos, 1 meses e 12 dias (Ajustada concomitância) | 157 |
Marco Temporal | Tempo especial | Tempo total (especial + comum s/ conversão) | Carência |
Até a DER (16/08/2019) | 25 anos, 0 meses e 1 dias | Inaplicável | 304 |
- Aposentadoria especial
Em 16/08/2019 (DER), a parte autora tem direito à aposentadoria especial (Lei 8.213/91, art. 57), porque cumpre o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99 (média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, sem incidência do fator previdênciário, e multiplicado pelo coeficiente de 100%).
Afastamento da atividade
O Supremo Tribunal Federal, recentemente, concluiu o julgamento do RE nº 791.961/PR (Relator Ministro Dias Toffoli, Plenário, DJe 19/08/2020), representativo de controvérsia (Tema 709), em decisão assim ementada (destaquei):
Direito Previdenciário e Constitucional. Constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91. Percepção do benefício de aposentadoria especial independentemente do afastamento do beneficiário das atividades laborais nocivas a sua saúde. Impossibilidade. Recurso extraordinário parcialmente provido.
1. O art. 57,§ 8º, da Lei nº 8.213/91 é constitucional, inexistindo qualquer tipo de conflito entre ele e os arts. 5º, inciso XIII; 7º, inciso XXXIII; e 201,§ 1º, da Lei Fundamental. A norma se presta, de forma razoável e proporcional, para homenagear o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os direitos à saúde, à vida, ao ambiente de trabalho equilibrado e à redução dos riscos inerentes ao trabalho.
2. É vedada a simultaneidade entre a percepção da aposentadoria especial e o exercício de atividade especial, seja essa última aquela que deu causa à aposentação precoce ou não. A concomitância entre a aposentadoria e o labor especial acarreta a suspensão do pagamento do benefício previdenciário.
3. O tema da data de início da aposentadoria especial é regulado pelo art. 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91, que, por sua vez, remete ao art. 49 do mesmo diploma normativo. O art. 57,§ 8º, da Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social cuida de assunto distinto e, inexistindo incompatibilidade absoluta entre esse dispositivo e aqueles anteriormente citados, os quais também não são inconstitucionais, não há que se falar em fixação da DIB na data de afastamento da atividade, sob pena de violência à vontade e à prerrogativa do legislador, bem como de afronta à separação de Poderes.
4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
5. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento.
Posteriormente, o STF decidiu acolher, em parte, os embargos de declaração opostos ao Tema 709 para (RE nº 791.961/PR, Relator Ministro Dias Toffoli, Plenário Virtual, sessão de 12/02/2021 a 23/02/2021):
a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas;
b) propor a alteração na redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida:
“4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral:
“(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não;
(ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão .”;
c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento;
d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento.
Dito isso, necessário estabelecer as seguintes diretrizes:
(a) Deve ser observada a imposição inserta no § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, implicando a cessação do pagamento do benefício, e não a sua cassação ou cancelamento, a permanência do segurado aposentado no exercício da atividade que o sujeite a agentes nocivos ou caso a ela retorne voluntariamente.
Há que se observar, porém, que o Plenário do STF, na sessão virtual realizada entre 24/09/2021 e 01/10/2021, resolveu acolher os embargos opostos pelo Ministério Público Federal para modular os efeitos, excepcionalmente (sic) e temporalmente, da incidência do acórdão, no tocante aos profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, ficando suspensos os efeitos do acórdão proferido nos autos, enquanto estiver vigente a referida lei, que dispõe sobre as medidas de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (RE nº 791.961/PR, Relator Ministro Dias Toffoli).
(b) Não obstante o STF tenha concluído pela constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, restou assentado que o termo inicial do benefício deve ser fixado de acordo com a previsão contida nos artigos 49 e 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91, ou seja, na DER, e não na data do afastamento da atividade.
Assim, conclui-se que o desligamento da atividade se torna exigível tão somente a partir da efetiva implantação do benefício, sem prejuízo às prestações vencidas no curso do processo que culminou na concessão da aposentadoria especial, seja ele judicial ou administrativo. Portanto, não há óbice ao recebimento de parcelas do benefício de aposentadoria especial no período em que o segurado permaneceu no exercício de atividades nocivas. É a ilação que se infere do voto do Relator, Ministro Dias Toffoli, conforme excerto abaixo reproduzido:
A Lei nº 8.213/91, em seu art. 57, § 2º, cuidou de disciplinar o tema da data de início da aposentadoria especial, fazendo uma remissão ao art. 49 daquele mesmo diploma legislativo. Eis que, desse modo, a legislação de regência já cuidou de regular o assunto, estabelecendo que o benefício será devido (i) da data do desligamento do emprego, quando requerido até essa data, ou até noventa dias depois dela (inciso I, alínea a); (ii) da data do requerimento, quando não houver desligamento do emprego ou quando o benefício for requerido após o prazo previsto na alínea a (inciso I, alínea b). Conforme se nota, inexiste, no referente ao assunto, vácuo legislativo, de modo que afastar a previsão do art. 57, § 2º, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social para fazer valer, em detrimento dessa norma, o art. 57, § 8º - quando esse nem sequer foi editado com vistas a regular a questão da data de início dos benefícios - significaria evidente violência às prerrogativas do Poder Legislativo.
Dito de outra forma, caso acolhido o pedido da autarquia nesse ponto, o Supremo Tribunal Federal estaria claramente a legislar, o que lhe é terminantemente vedado. O legislador, no exercício de suas atribuições constitucionalmente conferidas, houve por bem fixar uma determinada disciplina para a data de início do benefício – essa disciplina encontra-se no art. 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91. A referida norma encontra-se em harmonia com o ordenamento jurídico e, até o momento, não teve sua constitucionalidade questionada. Não há razão, portanto, para se negar aplicação a ela. O que o INSS pretende é que o Supremo Tribunal Federal ignore a existência desse dispositivo, perfeitamente válido e eficaz, e determine a aplicação, em seu lugar, do art. 57, § 8º, do mesmo diploma legislativo, o qual se destina, aliás, a cuidar de situações distintas: as daquelas hipóteses em que o trabalhador permanece ou retorna à atividade especial. Ora, é evidentemente defeso a esta Corte atender a tal pleito, ante a evidente afronta à separação de Poderes e à vontade do legislador, legitima e validamente expressa.
É evidente o escopo da decisão da Suprema Corte no afã de garantir que o segurado não seja prejudicado pela demora na análise do seu pedido de concessão de aposentadoria especial.
(c) O julgamento exarado pelo STF não se traduz em óbice à imediata implantação da aposentadoria especial, por força de antecipação de tutela deferida no acórdão, à luz do art. 497 do CPC. Isso porque o art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91 prevê vedação à concomitância no exercício da atividade nociva e a percepção da aposentadoria especial. Não se pode, todavia, condicionar a concessão do benefício ao desligamento da atividade. O § 8º do art. 57 adverte que o segurado não poderá continuar. Continuar pressupõe a anterior concessão. O condicionamento é à continuidade. A lei previdenciária não criou um requisito para a aposentadoria especial que possa ser apreciado a latere dos demais.
Destarte, eventual suspensão do benefício não pode dispensar o devido processo legal, incumbindo ao INSS, na via administrativa, proceder à notificação do segurado para defesa, oportunizado-se prazo para que comprove o afastamento da atividade nociva ou, então, para que regularize a situação entre ele e o INSS.
O Decreto 3.048/99, no parágrafo único do art. 69 (redação mantida pelo Decreto nº 10.410, de 01/07/2020), estatui que O segurado será imediatamente notificado da cessação do pagamento de sua aposentadoria especial, no prazo de sessenta dias contado da data de emissão da notificação, salvo comprovação, nesse prazo, de que o exercício dessa atividade ou o operação foi encerrado.
(d) Não há falar em restituição de eventuais parcelas pagas ao segurado por força de antecipação de tutela. No julgamento do Embargos Declaratórios, o STF, ao modular os efeitos da tese de repercussão geral, foi categórico no sentido de que não se questiona a irrepetibilidade dos valores de natureza alimentar, recebidos de boa-fé, sobretudo quando vinham sendo depositados por força de ordem judicial. Os indivíduos que vinham auferindo o benefício previdenciário em razão de pedidos deferidos pelo Poder Judiciário - ou mesmo voluntariamente pela Administração - encontram-se isentos de qualquer obrigação de devolução dos valores recebidos até a proclamação do resultado deste julgamento. Descabido, pois, o sobrestamento do feito em razão da afetação ao Tema 692 do Superior Tribunal de Justiça.
(e) Ainda que haja suspensão do pagamento do benefício, o INSS deverá proceder à averbação do tempo especial reconhecido nos autos, a fim de que se incorpore ao patrimônio jurídico do segurado, já que, Conforme o entendimento da Terceira Seção deste Tribunal, o trabalho prestado se incorpora imediatamente ao patrimônio jurídico do trabalhador. (TRF4, AC 5000156-60.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 12/06/2020). O direito à contagem de tempo de serviço/contribuição se incorpora ao patrimônio jurídico do segurado no momento da prestação da atividade. (TRF4, AC 5028504-25.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 18/03/2020).
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo índice oficial e aceito na jurisprudência, qual seja:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-10-2019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula nº 204 do STJ), até 29/06/2009. A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema nº 810 da repercussão geral (RE nº 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe nº 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do acórdão (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC. Na eventualidade de o montante da condenação ultrapassar 200 salários mínimos, sobre o valor excedente deverão incidir os percentuais mínimos estipulados nos incisos II a V do § 3º do art. 85, de forma sucessiva, na forma do § 5º do mesmo artigo.
Custas processuais: O INSS é isento do pagamento de custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Conclusão
- Sentença mantida quanto ao cômputo de tempo especial nos lapsos de 02/08/1993 a 23/07/1996, 02/06/2003 a 06/06/2006 e 03/03/2004 a 18/07/2019.
- Sentença reformada para (a) corrigir erro material no cálculo de tempo de atividades nocivas; e (b) condenar o INSS a implantar em favor da parte autora a aposentadoria especial e a pagar as parcelas devidas desde a DER (16/08/2019), acrescidas de correção monetária e juros de mora, na forma da fundamentação, além da verba honorária, devendo ser observada a restrição imposta no art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
Possível desde logo a determinação de implantação do benefício, sem prejuízo da respectiva cessação, caso o INSS verifique que o segurado permaneceu ou retornou ao exercício de atividade especial, nos termos da decisão do STF no Tema 709.
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.
Dados para cumprimento: ( x ) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão | |
NB | 46/190.551.483-0 |
Espécie | aposentadoria especial |
DIB | 16/08/2019 |
DIP | No primeiro dia do mês da implantação do benefício |
DCB | não se aplica |
RMI | a apurar |
Observações |
Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Requisite a Secretaria da Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por homologar a desistência da ação quanto ao pedido de soma dos salários-de-contribuição nos períodos de atividades concomitantes e, em consequência, no tópico, extinguir o feito, sem resolução de mérito, a teor do art. 485, inciso VIII, do CPC; dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003189658v5 e do código CRC 0002f9ec.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 18:21:19
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Apelação Cível Nº 5008620-88.2020.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: AMARILDO SCALVI (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS.
A Administração tem o dever de fundamentar as suas decisões, com a exposição dos motivos de fato e de direito que culminaram no indeferimento do benefício, de forma a fornecer subsídios que permitam ao administrado se contrapor a ela em caso de discordância. O período em gozo de benefício por incapacidade deve integrar a soma do tempo especial computado pelo INSS se o segurado não foi comunicado sobre a orientação administrativa de exclusão do período de auxílio-doença no cálculo do tempo de serviço, para fins de aposentadoria especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, homologar a desistência da ação quanto ao pedido de soma dos salários-de-contribuição nos períodos de atividades concomitantes e, em consequência, no tópico, extinguir o feito, sem resolução de mérito, a teor do art. 485, inciso VIII, do CPC; dar provimento à apelação da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003189659v3 e do código CRC c1e4dd18.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 18:21:19
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:17:15.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5008620-88.2020.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: AMARILDO SCALVI (AUTOR)
ADVOGADO: DÉBORA CASTELLI MONTEMEZZO (OAB SC013007)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 47, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, HOMOLOGAR A DESISTÊNCIA DA AÇÃO QUANTO AO PEDIDO DE SOMA DOS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO NOS PERÍODOS DE ATIVIDADES CONCOMITANTES E, EM CONSEQUÊNCIA, NO TÓPICO, EXTINGUIR O FEITO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, A TEOR DO ART. 485, INCISO VIII, DO CPC; DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:17:15.