Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. LABOR EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. DIREITO ADQUIRIDO. AGENTES BIOLÓGICOS. EPI. INEFI...

Data da publicação: 25/11/2022, 07:01:06

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. LABOR EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. DIREITO ADQUIRIDO. AGENTES BIOLÓGICOS. EPI. INEFICÁCIA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DER. AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. TEMA 709 STF. TRABALHADORES DA ÁREA DA SAÚDE. PANDEMIA DE COVID-19. IMPLANTAÇÃO. 1. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal. 2. Os agentes biológicos estão previstos nos códigos 1.3.1 do quadro Anexo do Decreto n.º 53.831/64, 1.3.1 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 e 3.0.0 e 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos n.º 2.172/97 e n.º 3.048/99. Os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa (art. 278, § 1º, I da IN 77/2015 c/c Anexo 14 da NR-15). 3. Não há necessidade de exposição permanente ao risco decorrente de agentes infecto-contagiosos para a caracterização do direito à aposentadoria especial (Precedentes desta Corte). 4. Não há vedação legal ao cômputo como especial de períodos trabalhados como contribuinte individual, tampouco à concessão de aposentadoria especial a essa categoria de segurados da Previdência Social. 5. A aposentadoria especial é devida desde a DER. No entanto, uma vez implantado o benefício, deve haver o afastamento da atividade tida por especial, sob pena de cessação do pagamento (Tema 709 STF). 6. Importa acrescer ao julgado que, em 15/3/2021, o relator do Tema 709, Excelentíssimo Ministro Dias Toffoli, acatou pedido do Procurador Geral da República e suspendeu a ordem de afastamento das atividades especiais aos funcionários da saúde em razão da pandemia mundial do COVID-19. Registro, contudo, que a verificação dos requisitos necessários para que a parte autora se beneficie da liminar referida deverá ser arguida e analisada no juízo da execução, como couber. 5. Apelação parcialmente provida. Determinada a imediata implantação do benefício. (TRF4, AC 5060859-50.2021.4.04.7100, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 17/11/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gab. Des. Federal Roger Raupp Rios - 6º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3277 - Email: groger@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5060859-50.2021.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MAURO MEYER (AUTOR)

RELATÓRIO

MAURO MEYER ajuizou ação de procedimento comum contra INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando a a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do desempenho de atividade especial, nos períodos trabalhados como médico de 01/11/1984 a 31/12/1984, de 11/01/1985 a 20/04/1985, de 01/05/1985 a 30/04/1987, de 30/01/1987 a 01/11/1989, de 21/07/1987 a 01/09/1987, de 28/01/1989 a 30/04/1989, de 01/02/1989 a 28/02/1989, de 01/09/1989 a 31/05/1990, de 28/09/1989 a 30/01/1990, de 01/07/1990 a 31/10/1992, de 01/12/1992 a 31/12/1992, de 01/05/1993 a 30/06/1993, de 01/08/1993 a 31/10/1993, de 01/12/1993 a 31/08/1994, de 01/09/1994 a 31/11/1994, de 01/04/1996 a 30/06/1996, de 01/03/1997 a 30/09/1997, de 01/02/1998 a 31/03/2003, de 01/04/2003 a 31/08/2003 e de 01/05/2003 a 11/06/2019 (DER).

Processado o feito, sobreveio sentença com o seguinte dispositivo (evento 30, SENT1):

Ante o exposto, extingo o feito, sem resolução de mérito, com base no art. 485, VI, do CPC, face à ilegitimidade passiva do INSS para ao reconhecimento da especialidade do labor desempenhado no período de 30/01/1987 a 24/01/1989 e de 28/09/1989 a 01/12/1990, afasto a prescrição e, no mérito propriamente dito, JULGO PROCEDENTE, EM PARTE, o pedido formulado na inicial, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:

(a) Reconhecer o tempo de trabalho exercido em condições especiais pela parte autora, nos períodos compreendidos de 11/01/1985 a 20/04/1985, de 01/05/1985 a 30/04/1987, de 01/02/1989 a 28/02/1989, de 01/09/1989 a 31/05/1990, de 01/07/1990 a 31/10/1992, de 01/12/1992 a 31/12/1992, de 01/05/1993 a 30/06/1993, de 01/08/1993 a 31/10/1993, de 01/12/1993 a 31/08/1994, de 01/11/1994 a 30/11/1994, de 01/04/1996 a 30/06/1996, de 01/03/1997 a 30/09/1997, de 01/02/1998 a 30/11/1999, de 01/12/1999 a 31/03/2003 e de 01/04/2003 a 11/06/2019, procedendo à conversão em tempo comum, mediante a aplicação do fator 1,4;

(b) Determinar ao INSS que averbe os períodos reconhecidos e que conceda o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral à parte autora, com data de início do benefício (DIB) no dia do pedido administrativo (11/06/2019), calculando a sua renda mensal inicial (RMI) sem incidência do fator previdenciário (caso mais benéfico), de acordo com o art. 29-C da Lei n.º 8.213/91, nos termos da fundamentação;

(c) Condenar o INSS ao pagamento das parcelas vencidas (entre a DIB e a DIP - ora fixada na data da efetiva implantação do benefício pelo INSS, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros nos termos da fundamentação.

As prestações vincendas, portanto, deverão ser pagas na via administrativa, reportando-se à data imediatamente posterior à efetiva implantação do benefício.

Considerando a mínima sucumbência da parte autora, condeno o INSS ao ressarcimento das custas processuais e ao pagamento dos honorários advocatícios da ex adversa, a serem calculados de acordo com o patamar mínimo estabelecido nos incisos do § 3º do art. 85 do CPC, quando da liquidação da presente sentença, em conformidade com o art. 85, § 4º, II, do CPC. Saliente-se, contudo, que a condenação compreende as parcelas vencidas até a data da prolação desta sentença, na forma da Súmula nº 111 do STJ e Súmula 76 do TRF da 4ª Região.

Sentença dispensada do reexame necessário, pois, ainda que a RMI seja fixada no teto e que sejam pagas todas as parcelas referentes aos últimos cinco anos com juros e correção monetária, a condenação não excederá a quantia de mil salários mínimos. Nesse sentido, orienta-se o TRF/4, por exemplo: 5001429-17.2019.4.04.7108, 5ª Turma, juntado aos autos em 25/07/2019; .033186-23.2018.4.04.9999, 6ª Turma, juntado aos autos em 29/07/2019.

Apela o INSS (evento 42, APELAÇÃO1). Requer o afastamento do reconhecimento da especialidade dos períodos de 11/01/1985 a 20/04/1985, de 01/05/1985 a 30/04/1987, de 01/02/1989 a 28/02/1989, de 01/09/1989 a 31/05/1990, de 01/07/1990 a 31/10/1992, de 01/12/1992 a 31/12/1992, de 01/05/1993 a 30/06/1993, de 01/08/1993 a 31/10/1993, de 01/12/1993 a 31/08/1994, de 01/11/1994 a 30/11/1994, de 01/04/1996 a 30/06/1996, de 01/03/1997 a 30/09/1997, de 01/02/1998 a 30/11/1999, de 01/12/1999 a 31/03/2003 e de 01/04/2003 a 11/06/2019, sustentando: a) ausência de comprovação de exposição permanente a agentes biológicos; b) impossibilidade de reconhecimento da especialidade de período laborado como autônomo, referindo que, como contribuinte individual, o autor não pode beneficiar-se da própria torpeza, notadamente em relação à não utilização de EPI; c) ausência de fonte de custeio. Sustenta, ainda, a impossibilidade de permanecer exercendo atividades nocivas após a aposentadoria especial (constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei 8.213/91).

Com contrarrazões (evento 45, CONTRAZAP1).

Vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade.

Recebo o apelo do INSS, pois cabível, tempestivo e dispensado de preparo.

Mérito

Pontos controvertidos

Nesta instância, considerando o recurso interposto, são controvertidos os seguintes pontos:

- especialidade dos períodos de 11/01/1985 a 20/04/1985, de 01/05/1985 a 30/04/1987, de 01/02/1989 a 28/02/1989, de 01/09/1989 a 31/05/1990, de 01/07/1990 a 31/10/1992, de 01/12/1992 a 31/12/1992, de 01/05/1993 a 30/06/1993, de 01/08/1993 a 31/10/1993, de 01/12/1993 a 31/08/1994, de 01/11/1994 a 30/11/1994, de 01/04/1996 a 30/06/1996, de 01/03/1997 a 30/09/1997, de 01/02/1998 a 30/11/1999, de 01/12/1999 a 31/03/2003 e de 01/04/2003 a 11/06/2019, tendo em vista a exposição a agentes biológicos;

- possibilidade de reconhecimento da especialidade de período em que o autor verteu contribuições na condição de contribuinte individual;

- afastamento da especialidade diante da ausência de fonte de custeio;

- (im)possibilidade de permanecer exercendo atividades nocivas após a aposentadoria especial (constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei 8.213/91).

Das atividades especiais

Considerações gerais

O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Nesse sentido, é a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no REsp 1603743/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 28/05/2019; REsp 1151363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011) e desta Corte (TRF4, AC 5002503-16.2018.4.04.7117, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 25/06/2021; TRF4, AC 5042509-86.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 17/06/2021; TRF4, ARS 5042818-97.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 06/04/2020).

Dessa forma, considerando a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:

a) No período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04-08-2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07-11-2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;

b) A partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n.º 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória n.º 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;

c) A partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n.º 1.523/96 (convertida na Lei n.º 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos n.º 2.172/97 (Anexo IV) e n.º 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto n.º 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30-06-2003).

Dos agentes biológicos

Os agentes biológicos estão previstos nos códigos 1.3.1 do quadro Anexo do Decreto n.º 53.831/64, 1.3.1 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 e 3.0.0 e 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos n.º 2.172/97 e n.º 3.048/99.

Destaca-se, contudo, o caráter exemplificativo dos fatores e situações de risco previstas nos Anexos dos Decretos n.º 53.831/64, 83.080/79, 2.172/97 e 3.048/99, como reiteradamente vem afirmando a jurisprudência desta Corte e dos Tribunais Superiores. Assim, ainda que tais Decretos prevejam a especialidade apenas de atividades em ambiente hospitalar onde sejam tratados "pacientes portadores de doenças infectocontagiosas", havendo demonstração, mediante perícia técnica, da efetiva exposição do segurado a agentes biológicos nocivos à saúde mesmo em ambiente diverso daquele previsto pela norma regulamentadora, é de ser reconhecida a natureza especial da atividade.

No que tange ao nível de concentração dos agentes biológicos, os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa (art. 278, § 1º, I da IN 77/2015), pois se trata de agente nocivo constante no Anexo 14 da NR-15, aprovada pela Portaria n.º 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego.

Frise-se que a 3ª Seção desta Corte fixou o entendimento de que não há necessidade de exposição permanente ao risco decorrente de agentes infecto-contagiosos para a caracterização do direito à contagem do período como tempo especial (TRF4, EINF 2007.71.00.046688-7, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, D.E. 07/11/2011).

Equipamentos de Proteção - EPI

A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03/12/1998, data da publicação da MP n.º 1.729, de 02 de dezembro de 1998, convertida na Lei n.º 9.732, de 11 de dezembro de 1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei n.º 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. A própria autarquia já adotou esse entendimento na Instrução Normativa n.º 45/2010 (art. 238, § 6º).

Em período posterior a dezembro de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPIs é admissível desde que haja laudo técnico afirmando, inequivocamente, que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou (STJ, REsp 720.082/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 10/04/2006, p. 279; TRF4, EINF 2001.72.06.002406-8, Terceira Seção, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 08/01/2010).

Sobre o ponto, o Supremo Tribunal Federal resolveu a controvérsia ao julgar o Tema 555 da repercussão geral (ARE n.º 664.335, Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, publ. no DJ do dia 12/02/2015), fixando duas teses:

1) "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; e

2) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".

Ademais, para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado é necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho. Nesse ponto, destaco ter restado estabelecido pela 3ª Seção desta Corte que “a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário” (TRF4 5054341-77.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/12/2017).

Por fim, cita-se o que ficou decidido no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR-15) quanto às situações que dispensam a prova da eficácia do EPI:

Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:

a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:

Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:

"§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)"

b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:

b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)

b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)

b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:

Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017 )

Contribuinte individual

Cumpre destacar a possibilidade de reconhecimento da especialidade de atividades e a consequente concessão de aposentadoria especial ao segurado filiado na condição de segurado contribuinte individual.

Com efeito, ao prever o direito à aposentadoria especial, a Lei n.º 8.213/91 é clara ao estabelecer que será devida, uma vez cumprida a carência, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Como é sabido, a categoria segurado contempla não apenas o empregado, mas também, entre outros, o contribuinte individual.

O Decreto n.º 4.729/2003, ao alterar a redação do art. 64 do Decreto n.º 3.048/1999, limitando a concessão de aposentadoria especial apenas ao contribuinte individual filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, cria restrição não lastreada no texto da lei; extrapolando, portanto, seu poder regulamentar.

A lei não nega ao contribuinte individual a possibilidade de ver reconhecida a especialidade das atividades desempenhadas - tampouco de obter aposentadoria especial -, não se podendo fazer a distinção onde a lei não fez.

A circunstância de a Lei n.º 8.212/91 não trazer norma específica sobre o custeio da aposentadoria especial do contribuinte individual não afasta o direito ao benefício, que decorre, como visto, de expressa disposição da lei de benefícios. Não se está a instituir benefício novo, sem a correspondente fonte de custeio. Trata-se de benefício já existente passível de ser auferido por segurado que implementa as condições previstas na lei de benefícios.

Nesse passo, é necessária a prova da atividade efetivamente exercida pelo segurado nos períodos em que houve recolhimento como autônomo/contribuinte individual; além da comprovação de que era desempenhada sob condições nocivas à saúde.

É nessa linha a jurisprudência amplamente majoritária desta Corte: TRF4, AC 5000487-69.2021.4.04.7122, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 13/07/2021; TRF4, AC 5044178-39.2020.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 12/07/2021; TRF4, AC 5050546-35.2018.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/07/2021. Também do Superior Tribunal de Justiça: AgInt no AREsp 1697600/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/04/2021, DJe 29/04/2021; REsp 1793029/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/02/2019, DJe 30/05/2019.

Do caso concreto

No que toca à análise da especialidade dos períodos controvertidos, a sentença registra:

A parte autora fundamentou na inicial que exerceu atividade especial de médico, nos seguintes períodos:

* de 01/11/1984 a 31/12/1984, de 01/05/1985 a 30/04/1987, de 01/02/1989 a 28/02/1989, de 01/09/1989 a 31/05/1990, de 01/07/1990 a 31/10/1992, de 01/12/1992 a 31/12/1992, de 01/05/1993 a 30/06/1993, de 01/08/1993 a 31/10/1993, de 01/12/1993 a 31/08/1994, de 01/09/1994 a 31/11/1994, de 01/04/1996 a 30/06/1996, de 01/03/1997 a 30/09/1997, de 01/02/1998 a 31/03/2003, como médico - contribuinte individual.

* de 11/01/1985 a 20/04/1985, como médico, no Hospital de Reumatologia - massa falida

* de 21/07/1987 a 01/09/1987, como médico, para Policlínica Central - em liquidação extrajudicial.

* de 01/04/2003 a 31/08/2003, como médico cirurgião ortopedista e traumatologista, para LM Especialidades Médicas.

* de 01/05/2003 a 11/06/2019 (DER), como médico cirurgião ortopedista e traumatologista, para Unimed Porto Alegre.

Inicialmente, é preciso sublinhar que o Hospital de Reumatologia, a exemplo da Policlínica Central, não está mais ativo. Não obstante, as contribuições vertidas como autônomo pelo autor abrangem a quase totalidade dos períodos concomitantes trabalhados para a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Hospital Militar de Porto Alegre, Policlínica Central e Hospital de Reumatologia, de modo que a extinção dos nosocômios e a inviabilidade de se reconhecer a especialidade dos períodos vinculados a regime próprio não terão maior repercussão.

Dito isso, vale repisar que não há impedimento ao reconhecimento da atividade especial do segurado contribuinte individual, bastando que seja feita prova da efetiva exposição a agentes nocivos ou do desempenho de atividade que possa ser enquadrada por categoria profissional. Afinal, não há óbice na legislação previdenciária, não podendo o segurado ser prejudicado pela ausência de previsão do custeio específico do benefício pelo legislador.

É esse o entendimento da TNU e da TRU da 4ª Região:

"O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física" (Súmula nº 62 da TNU).

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL (AUTÔNOMO). HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. AGENTES AGRESSIVOS. COMPROVAÇÃO. PRECEDENTES STJ, TNU E TRF4. 1. (...). 3. "O segurado empresário ou autônomo, que recolheu contribuições como contribuinte individual, tem direito à conversão de tempo de serviço de atividade especial em comum, quando comprovadamente exposto aos agentes insalubres, de forma habitual e permanente, ou quando decorrente categoria considerada especial, de acordo com a legislação". (TRF4, AC 0003435-23.2011.404.9999/SC, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira e AC 0005162-62.2008.404.7108/RS, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, DE de 12/07/2011). (IUJEF 0000211-45.2008.404.7166, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, D.E. 29/08/2011)

Na mesma linha, especificamente tratando da questão da fonte de custeio: APELREEX nº 5001497-32.2012.404.7101, Relator Ézio Teixeira, Sexta Turma, D.E. 09/05/2013.

Necessário, portanto, a demonstração do efetivo exercício da atividade, ou seja, é preciso haver comprovação da própria função alegadamente exercida, a fim de que seja possível, especificadas as atividades desempenhadas, analisar a especialidade do trabalho.

No caso, para comprovar a atividade de médico autônomo, bem como sua especialidade, a parte autora trouxe aos autos diversos documentos, dentre os quais se destacam os seguintes:

a) Diploma de graduação no curso de Medicina, em 26/12/1983 (Ev01, Diploma6);

b) Atestado de conclusão do programa de residência médica em ortopedia/traumatologia no Hospital de Clínica de Porto Alegre (Ev01, Out7);

c) Certidão emitida pela Secretaria Municipal da Fazenda de Porto Alegre segundo a qual o autor possuiu registro como profissional autônomo no ISSQN com atividade de médico desde 01/12/1984 a 28/02/1999;

d) Declaração da Unimed Porto Alegre, segundo a qual o autor é associado desde 22/06/1988;

e) PPP emitido pela Unimed Porto Alegre, segundo o qual, desde 21/07/1993 o autor, na função de médico ortopedista e traumalogista, no Hospital Moinhos de VEnto, está sujeito ao contato com agentes biológicos, tais como microorganismos, bactérias, fungos, parasitas, protozoários e vírus;

f) Declaração prestada pelo Superintendente Médico do Hospital Moinhos de Vento, segundo a qual o autor é membro ativo do corpo clínico da instituição desde 21/07/1993;

Como se nota, a prova material produzida é robusta, sendo suficiente para comprovar o exercício da atividade médica pela parte autora. Neste contexto, é de se considerar comprovado o exercício da profissão de médico pelo autor desde a graduação.

Nesse passo, cumpre reiterar que, até 28/04/1995, a atividade de médico é enquadrada como especial, pois expressamente prevista no Decreto nº 53.831/64 (código 2.1.3) e no Decreto nº 83.080/79 (código 2.1.3). Sendo que, em se tratando de contribuinte individual, até 28/04/1995, basta a comprovação da habitualidade e permanência na atividade para tornar possível o reconhecimento da especialidade da atividade.

Nesse sentido, o TRF/4:

PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. ATIVIDADE ESPECIAL. CIRURGIÃO-DENTISTA. AGENTES BIOLÓGICOS. INTERMITÊNCIA DA EXPOSIÇÃO. FONTE DE CUSTEIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.3. É possível o reconhecimento de atividade especial desenvolvida por contribuinte individual, mediante prova documental da habitualidade e permanência na atividade exercida até 28/04/1995, dispensada a apresentação do PPP, com supedâneo no art. 257 da IN 45/2010, e, a partir de 29-04-95, por meio de laudo pericial que demonstre a efetiva exposição a agentes nocivos.(...). (TRF4, APELREEX 5028150-74.2012.404.7100, QUINTA TURMA, Relator (AUXÍLIO LUGON) TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 13/08/2014) (grifei)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS BIOLÓGICOS E RADIAÇÃO IONIZANTE. CATEGORIA PROFISSIONAL. DENTISTA. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL. LEI N. 9.032/95. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.3. A exposição a radiação ionizante e à agentes nocivos biológicos (decorrentes do contato com pacientes) enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.4. A atividade de dentista exercida até 28-04-1995 deve ser reconhecida como especial em decorrência do enquadramento por categoria profissional.(...). (TRF4, APELREEX 5000472-61.2010.404.7001, SEXTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 27/03/2014) (grifei)

Por conseguinte, considerando que o conjunto probatório trazido aos autos permite concluir pelo exercício habitual e permanente da profissão de médico pelo autor, impõe-se chancelar o reconhecimento da especialidade da atividade desenvolvida, pelo enquadramento na categoria profissional, até 28/04/1995.

Já a partir da vigência da Lei n.º 9.032/95, faz-se necessária a comprovação da exposição habitual e permanente a agentes nocivos à saúde, a fim de qualificar a atividade como especial.

Para tanto, foi anexado PPP elaborado pela Unimed Porto Alegre/RS, segundo o qual, desde 21/07/1993 o autor, na função de médico ortopedista e traumalogista, no Hospital Moinhos de Vento, está sujeito ao contato com agentes biológicos, tais como microorganismos, bactérias, fungos, parasitas, protozoários e vírus (Ev01, PPP14).

Destarte, considerando a prova produzida, é possível o enquadramento dos agentes a que o autora esteve exposto no item 1.3.2 do Decreto 53.831/64, no item 1.3.4 do Decreto 83.080/79, bem como no item 3.0.1, do Anexo IV, do Decreto n.º 3.048/99.

Além disso, no Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, item 3.0.1 consta como sendo nocivo (agente biológico) o trabalho realizado em estabelecimentos de saúde em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados, enquadrando-se perfeitamente na situação dos autos.

Portanto, resta comprovado o desempenho de atividade exposta a agentes nocivos, de forma habitual e permanente, na função de médico.

A sentença não merece reparos, eis que analisou a prova produzida a modo percuciente e em consonância com o entendimento desta Corte acerca das questões controvertidas.

Com efeito, conforme exposto, restou comprovada a exposição a agentes biológicos (doenças infecto-contagiosas) durante todo o período e, conforme referido, a 3ª Seção desta Corte fixou o entendimento de que não há necessidade de exposição permanente ao risco decorrente de agentes infecto-contagiosos para a caracterização do direito à contagem do período como tempo especial.

Outrossim, também nos termos da fundamentação já delineada, o fornecimento e uso de EPI não impede o reconhecimento da especialidade no caso de exposição a agentes biológicos (item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017).

Desprovido, portanto, o apelo no ponto.

Termo inicial do benefício e necessidade de afastamento da atividade especial

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 791.961 - Tema 709, fixou a seguinte tese quanto à questão da necessidade de afastamento do trabalhador da atividade nociva para fins de concessão da aposentadoria especial:

i) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. ii) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.

Opostos embargos de declaração, estes restaram acolhidos em parte para:

"a) esclarecer que não há falar em inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, em razão da alegada ausência dos requisitos autorizadores da edição da Medida Provisória que o originou, pois referida MP foi editada com a finalidade de se promoverem ajustes necessários na Previdência Social à época, cumprindo, portanto, as exigências devidas;

b) propor a alteração na redação da tese de repercussão geral fixada, para evitar qualquer contradição entre os termos utilizados no acórdão ora embargado, devendo ficar assim redigida: “4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.”;

c) modular os efeitos do acórdão embargado e da tese de repercussão geral, de forma a preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data deste julgamento;

d) declarar a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, até a proclamação do resultado deste julgamento, nos termos do voto do Relator, vencido parcialmente o Ministro Marco Aurélio, que divergia apenas quanto à modulação dos efeitos da decisão." (destaquei)

Da análise do quanto transcrito, destaca-se: a) a alteração em parte da tese firmada, a fim de fixar a cessação do pagamento do benefício, e não a cassação ou cancelamento do benefício em si, em caso de segurado que tiver implantado o benefício e permanecer ou retornar à atividade especial; e b) a modulação dos efeitos da decisão proferida, a fim de preservar os segurados que tiveram o direito reconhecido por decisão judicial transitada em julgado até a data de julgamento dos embargos (23/02/2021), fixando-se, também, a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial ou administrativa, observado o mesmo limite temporal (23/02/2021).

Cabe sintetizar, então, o que restou decidido até o momento:

a) A regra prevista no § 8º do art. 57 da Lei n.º 8.213/91 é constitucional e acarreta a cessação do pagamento do benefício, e não a sua cassação ou cancelamento, nos casos em que o segurado que recebe aposentadoria especial permaneça no exercício da atividade que o sujeite a agentes nocivos ou caso a ela retorne voluntariamente.

b) O termo inicial do benefício é regido pelo art. 49 da Lei n.º 8.213/91, ou seja, é devido desde a DER, e não na data do afastamento da atividade.

c) O segurado não pode ser prejudicado pela demora na concessão do benefício, de modo que o desligamento da atividade só é exigível a partir da efetiva implantação do benefício, na via administrativa ou judicial, inclusive por decisão provisória e precária. Assim, até a efetiva implantação do benefício, é cabível o recebimento das prestações vencidas em relação ao período em que o segurado permaneceu na atividade nociva.

d) Foram preservados os casos com trânsito em julgado até a proclamação do resultado do julgamento dos embargos de declaração opostos ao Tema 709, isto é, 23/02/2021. Da mesma forma, são irrepetíveis os valores recebidos de boa-fé até a mesma data. Disso decorre que o beneficiário de tutela provisória, caso não se afaste da atividade nociva até 23/02/2021, sujeitar-se-á à suspensão do pagamento do benefício.

Observa-se, portanto, que, EM REGRA, a aposentadoria especial é devida desde a DER. No entanto, uma vez implantado o benefício, deve haver o afastamento da atividade tida por especial, sob pena de cessação do pagamento.

Por outro lado, importa referir que, em 15/3/2021, o relator do Tema 709, Excelentíssimo Ministro Dias Toffoli, acatou pedido do Procurador Geral da República e suspendeu a ordem de afastamento das atividades especiais aos funcionários da saúde em razão da pandemia mundial do COVID-19. Confira-se:

“Previamente à análise dos novos embargos de declaração interpostos nos autos, dada a gravidade da situação aqui descrita e, ainda, em vista da expressa concordância do embargado, acolho o pedido apresentado pelo Procurador-Geral da República e, nos termos do art. 1.026, § 1º, do CPC, suspendo, liminarmente, e em relação aos profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, os efeitos do acórdão proferido nos autos, que apreciou os anteriores recursos de embargos de declaração aqui opostos.”

Registro, contudo, que a verificação dos requisitos necessários para que a parte autora se beneficie da liminar referida deverá ser arguida e analisada no juízo da execução, como couber.

Assim, vai parcialmente provido o apelo do INSS no ponto.

Honorários recursais

Considerando o disposto no art. 85, § 11, CPC, e que está sendo dado parcial provimento ao recurso, não é o caso de serem majorados os honorários fixados na sentença, eis que, conforme entendimento desta Turma, "a majoração dos honorários advocatícios fixados na decisão recorrida só tem lugar quando o recurso interposto pela parte vencida é integralmente desprovido; havendo o provimento, ainda que parcial, do recurso, já não se justifica a majoração da verba honorária" (TRF4, APELREEX n.º 5028489-56.2018.4.04.9999/RS, Relator Osni Cardoso Filho, julgado em 12/02/2019).

Tutela específica - implantação do benefício

Tendo em vista o disposto no art. 497 do CPC/2015, correspondente ao art. 461 do CPC/1973, e a circunstância de que os recursos excepcionais, em regra, não possuem efeito suspensivo, o julgado deve ser cumprido imediatamente (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), no prazo máximo de trinta dias úteis.

Conclusão

Apelação do INSS parcialmente provida para fixar que, EM REGRA, a aposentadoria especial é devida desde a DER; no entanto, uma vez implantado o benefício, deve haver o afastamento da atividade tida por especial, sob pena de cessação do pagamento (ressalvada a hipótese de suspensão da ordem de afastamento das atividades especiais aos funcionários da saúde em razão da pandemia mundial do COVID-19, o que deverá ser arguido e analisado no juízo da execução, como couber).

Determinada a implantação do benefício.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo e por determinar a imediata implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003555963v5 e do código CRC 197f9df7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGER RAUPP RIOS
Data e Hora: 17/11/2022, às 17:32:55


5060859-50.2021.4.04.7100
40003555963.V5


Conferência de autenticidade emitida em 25/11/2022 04:01:06.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gab. Des. Federal Roger Raupp Rios - 6º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3277 - Email: groger@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5060859-50.2021.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MAURO MEYER (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria especial. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. LABOR EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. DIREITO ADQUIRIDO. AGENTES BIOLÓGICOS. EPI. INEFICÁCIA. contribuinte individual. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DER. AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. TEMA 709 STF. TRABALHADORES DA ÁREA DA SAÚDE. PANDEMIA DE COVID-19. implantação.

1. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal.

2. Os agentes biológicos estão previstos nos códigos 1.3.1 do quadro Anexo do Decreto n.º 53.831/64, 1.3.1 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 e 3.0.0 e 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos n.º 2.172/97 e n.º 3.048/99. Os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa (art. 278, § 1º, I da IN 77/2015 c/c Anexo 14 da NR-15).

3. Não há necessidade de exposição permanente ao risco decorrente de agentes infecto-contagiosos para a caracterização do direito à aposentadoria especial (Precedentes desta Corte).

4. Não há vedação legal ao cômputo como especial de períodos trabalhados como contribuinte individual, tampouco à concessão de aposentadoria especial a essa categoria de segurados da Previdência Social.

5. A aposentadoria especial é devida desde a DER. No entanto, uma vez implantado o benefício, deve haver o afastamento da atividade tida por especial, sob pena de cessação do pagamento (Tema 709 STF).

6. Importa acrescer ao julgado que, em 15/3/2021, o relator do Tema 709, Excelentíssimo Ministro Dias Toffoli, acatou pedido do Procurador Geral da República e suspendeu a ordem de afastamento das atividades especiais aos funcionários da saúde em razão da pandemia mundial do COVID-19. Registro, contudo, que a verificação dos requisitos necessários para que a parte autora se beneficie da liminar referida deverá ser arguida e analisada no juízo da execução, como couber.

5. Apelação parcialmente provida. Determinada a imediata implantação do benefício.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo e por determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 16 de novembro de 2022.



Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003555964v3 e do código CRC 0303c61a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROGER RAUPP RIOS
Data e Hora: 17/11/2022, às 17:32:56


5060859-50.2021.4.04.7100
40003555964 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 25/11/2022 04:01:06.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 08/11/2022 A 16/11/2022

Apelação Cível Nº 5060859-50.2021.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

PROCURADOR(A): THAMEA DANELON VALIENGO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MAURO MEYER (AUTOR)

ADVOGADO: AMELIA DE BORTOLI KELLER (OAB RS060819)

ADVOGADO: ROGERIO DE BORTOLI KELLER (OAB RS029238)

ADVOGADO: JUCELAINE MARIA ZUCOLOTTO KELLER (OAB RS057243)

ADVOGADO: ROGERIO DE BORTOLI KELLER

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 08/11/2022, às 00:00, a 16/11/2022, às 16:00, na sequência 537, disponibilizada no DE de 25/10/2022.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO E POR DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 25/11/2022 04:01:06.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora