Apelação/Remessa Necessária Nº 5013750-78.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELINA SERAFIN
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada na justiça estadual por CELINA SERAFIN (nascida em 30/09/1956) contra o INSS em 11/02/2013, pretendendo concessão de aposentadoria rural por idade com pedido de antecipação de tutela.
A sentença assim resumiu os contornos da lide:
(...)
CELINA SERAFIN ajuizou AÇÃO ORDINÁRIA DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO em face do INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS, ambos já qualificados. Aduziu a autora que requereu o benefício de aposentadoria por idade em 14/12/2011, como segurada especial, o qual foi indeferido, por não ter sido reconhecida a condição da autora durante todo o período de carência. Asseverou que exerceu atividade rural com os pais no período de 1967 até 1979, quando então foi trabalhar em um hospital na cidade de Sobradinho. Alegou que após a atividade urbana, retornou ao meio rural em 1996. Referiu que somando os períodos de atividade, possui mais de 22 anos de trabalho desenvolvido no meio rural, dos quais 11 anos e 8 meses foram desempenhados em regime de economia familiar com os pais e 11 anos em regime familiar com o companheiro. Disse fazer jus ao benefício postulado. Requereu o reconhecimento do período de 1967 a 1978 como segurada especial, em regime de economia familiar com os pais e o período de 2001 a 2011 como segurada especial, em regime de economia familiar com o companheiro, com a condenação do requerido ao pagamento do benefício de aposentadoria por idade, a conta da data do pedido administrativo. Pediu a AJG e acostou documentos (fls. 19/121).
Deferida a AJG (fl. 131).
Citado, o requerido contestou às fls. 133/142. Discorreu acerca dos requisitos legais para a concessão do benefício postulado. Referiu que o requisito etário restou comprovado pela autora, mas não há provas do efetivo exercício da atividade rural em regime de economia familiar ou individual, mesmo de forma descontínua. Asseverou que administrativamente somente foram reconhecidos 48 meses de contribuição (4 anos). Alegou que da análise dos documentos acostados pela autora, verificou-se que o conjunto familiar não sobrevivia apenas das cultivas cultivadas na propriedade da autora, pois o marido desenvolveu atividades laborativas. Manifestou-se quanto aos juros de mora para o caso de eventual procedência. Por fim, postulou a improcedência dos pedidos. Juntou documentos (fls. 143/246).
Houve réplica (fls. 252/259).
O Ministério Público declinou de intervir no feito (fl. 260).
Intimadas as partes acerca do interesse na produção de provas, a parte autora postulou a produção de prova testemunhal e o demandado nada requereu (fls. 261/262).
Deferida a prova oral, foi realizada a audiência, na qual foram ouvidas três testemunhas (fls. 294/295).
Declarada encerrada a instrução (fl. 296), as partes apresentaram memoriais (fls. 298/302).
Intimada a autora para acostar documentos, o que foi atendido às fls. 309/352. Dada vista ao réu, silenciou (fl. 352v).
(...)
A sentença (Evento 3 - SENT36), datada de 23/11/2017, julgou procedente o pedido da inicial, concedendo a antecipação de tutela e condenando o INSS a considerar, para fins de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo do benefício (14/12/2011), os seguintes períodos de atividade rural: de 1968 até 1978 e de 2001 até 2011 (DER). Condenou o INSS, ainda, ao pagamento de metade das custas e honorários fixados em dez por cento sobre o valor atualizado da condenação, excluídas as parcelas vincendas, até a data da sentença. No que diz respeito à correção monetária e aos juros, determinou que as parcelas vencidas devem ser corrigidas monetariamente nos termos fixados pela Lei 11.960/2009 até 25/03/2015. A partir 26/03/2015, definiu que a correção deve dar-se pelos índices do IPCA-E. Quanto aos juros de mora, determinou a incidência, a partir da citação, dos juros aplicados à caderneta de poupança. Sujeitou, finalmente, a sentença ao reexame necessário.
Apelou o INSS (Evento 3 - APELAÇÃO37), alegando que a parte autora não comprovou o efetivo exercício de atividade rural em todos os períodos requeridos. Defendeu, ainda que o afastamento da atividade rural não poderia dar-se por um período superior a 36 meses, sob pena da perda da condição de segurado especial. Para o caso de ser mantida a sua condenação, requereu a autarquia que os juros e a correção monetária incidentes sobre a condenação se deem integralmente na forma da Lei 11.960/2009 e a sua isenção do pagamento de custas. Suscitou, ainda, o prequestionamento dos dispositivos legais e constitucionais referidos no recurso.
Com contrarrazões (Evento 3 - CONTRAZ38), vieram os autos a este Tribunal.
Foi requerida da Tribuna a reafirmação da DER para aposentadoria híbrida, se for o caso.
Dado vista ao INSS, este se manifestou na petição do E23.
VOTO
REEXAME NECESSÁRIO
A presente demanda possui valor líquido e certo sendo inaplicável a disciplina da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
O art. 496, §3º, I, do Código de Processo Civil/2015, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.
Diante da nova disposição legal sobre o tema, solicitou-se à Divisão de Cálculos Judiciais - DICAJ informações. A DICAJ por sua vez explicitou que, para que uma condenação previdenciária atingisse o valor de 1.000 salários mínimos, necessário seria que a RMI fosse fixada no valor teto dos benefícios previdenciários, bem como abrangesse um período de 10 (dez) anos entre a DIB e a prolação da sentença.
No caso concreto, é possível concluir com segurança absoluta que o limite de 1.000 salários mínimos não seria alcançado pelo montante da condenação, uma vez que a DIB é 14/12/2011 e a sentença é de 23/11/2017.
Assim sendo, não conheço da remessa necessária.
Observo que a necessidade de se analisar o conceito de sentença ilíquida em conformidade com as disposições do Novo CPC é objeto da Nota Técnica n.º 03, emitida pelo Centro de Inteligência da Justiça Federal.
Outrossim, havendo impugnação específica sobre o ponto, oportuniza-se à parte a apresentação de memória de cálculo do montante que entender devido, como forma de instruir eventual recurso interposto, o qual será considerado apenas para a análise do cabimento ou não da remessa necessária.
Destarte, passo à análise da matéria objeto do recurso interposto.
DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
INTERESSE PROCESSUAL
A sentença reconheceu os períodos de atividade rural de 1968 até 1978 e de 2001 até 2011, sem delimitar datas. No entanto, considerando os termos da inicial, é possível delimitar o pedido aos lapsos de 30/09/1968 (12 anos da autora) a 31/12/1978, e de 01/01/2001 a 14/12/2011 (DER).
No entanto, o INSS reconheceu administrativamente o exercício de atividade rural de 19/06/2007 a 13/12/2011 (Evento 3-ANEXOSPET4-p. 89-90), de forma que, em relação a esse período, o processo deve ser extinto sem julgamento de mérito, a teor do art. 485, VI, do NCPC.
Os períodos a examinar nesta ação, portanto, vão de 30/09/1968 a 31/12/1978, e de 01/01/2001 a 18/06/2007.
APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
Economia familiar - considerações gerais
O benefício de aposentadoria por idade do trabalhador rural qualificado como segurado especial em regime de economia familiar (inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991), é informado pelo disposto nos §§ 1º e 2º do art. 48, no inc. II do art. 25, no inc. III do art. 26 e no inc. I do art. 39, tudo da Lei 8.213/1991. São requisitos para obter o benefício:
1) implementação da idade mínima (cinquenta e cinco anos para mulheres, e sessenta anos para homens);
2) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida, ainda que a atividade seja descontínua.
Não se exige prova do recolhimento de contribuições (TRF4, Terceira Seção, EINF 0016396-93.2011.404.9999, rel. Celso Kipper, D.E. 16/04/2013; TRF4, EINF 2007.70.99.004133-2, Terceira Seção, rel. Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, D.E. 23/04/2011).
A renovação do Regime Geral de Previdência Social da Lei 8.213/1991 previu regra de transição em favor do trabalhador rural, no art. 143:
Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Complementando o art. 143 na disciplina da transição de regimes, o art. 142 da Lei 8.213/1991 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a uma tabela de redução de prazos de carência no período de 1991 a 2010, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
O ano de referência de aplicação da tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991 será aquele em que o segurado completou a idade mínima para haver o benefício, desde que, até então, já disponha de tempo rural correspondente aos prazos de carência previstos. É irrelevante que o requerimento de benefício seja apresentado em anos posteriores ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, devendo ser preservado o direito adquirido quando preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos (§ 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido, observada a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Nesse caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao cumprimento da carência equivalente para obter o benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, mas sim nos anos subsequentes, de acordo com a tabela mencionada, com exigências progressivas.
Ressalvam-se os casos em que o requerimento administrativo e a implementação da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994 (vigência da MP 598/1994, convertida na Lei 9.063/1995, que alterou o art. 143 da Lei 8.213/1991), nos quais o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural anterior ao requerimento por um período de cinco anos (sessenta meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213/1991, exigindo que a atividade rural deva ser comprovada em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada a favor do segurado. A regra atende às situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente comprovar trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no § 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991 e, principalmente, em proteção ao direito adquirido. Se o requerimento datar de tempo consideravelmente posterior à implementação das condições, e a prova for feita, é admissível a concessão do benefício.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, Plenário, RE 631240/MG, rel. Roberto Barroso, j. 03/09/2014).
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, DJe 19/12/2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu este Tribunal que: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida em geral entre os trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).
Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural também não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. No caso de haver conflito entre as provas colhidas na via administrativa e as tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, uma vez que produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25jun.2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 373 do CPC2015 (inc. II do art. 333 do CPC1973).
DO CASO CONCRETO
O requisito etário, cinquenta e cinco anos, cumpriu-se em 30/09/2011 (nascimento em 30/09/1956). O requerimento administrativo deu entrada em 14/12/2011. Deve-se comprovar, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, o exercício de atividade rural nos cento e oitenta meses imediatamente anteriores ao cumprimento do requisito etário ou ao requerimento administrativo.
Em sua petição inicial (Evento 3 - INIC2), a parte autora afirmou que (1) trabalhou com os pais na agricultura no período de 1967 a 1978; que (2) de 1979 a 1996 permaneceu na atividade urbana, sempre mantendo a sua CTPS assinada e efetuando as devidas contribuições; e que (3) a partir de 1996 retornou à atividade rural, nela permanecendo a partir de então. Requereu, assim, a concessão da aposentadoria rural por idade, computando para fins de carência o período em que permaneceu trabalhando na lavoura com os pais e o período de labor rural exercido com o companheiro, este a partir de 2001 e até a DER, uma vez que não possui provas do exercício de atividade rural no período de 1997 a 2000.
A sentença assim analisou as provas orais e materiais, reconhecendo o exercício da atividade rural da parte autora nos períodos postulados, com exceção do tempo em que ainda não havia completado 12 anos:
(...)
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, foram apresentados:
- Cópia da certidão de nascimento (fl. 27);
- Cópia da CTPS (fls. 28/53);
- Matrícula de imóvel rural (fls. 56/58, 75/85);
- Ficha de Sindicato Rural (fls. 59/60
- Notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas dos anos de 2001/2007, 2008/2011 (fls. 61/74, 86/94);
- Declaração de atividade rural (fls. 95/97).
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Na audiência de instrução foram ouvidas três testemunhas, as quais confirmaram o trabalho rural exercido pela autora no período postulado na inicial, qual seja, de 1967 a 1978 em regime de economia familiar com os pais e o período de 2001 a 2011 com o companheiro.
Vejamos:
A testemunha Anselmo Folgiarini relatou que conhece a autora há mais de 40 anos, a qual trabalhava no cultivo de fumo, feijão, milho, mandioca e batata, com os pais e depois com o marido. Não tinham empregados. Pelo que sabe a autora não se afastou da agricultura.
Vilmar Homero Kittel referiu que conhece a autora há 50 anos, a qual residia com os pais e trabalhava na lavoura. O depoente foi vizinho dos pais da autora, os quais viviam da agricultura, com o cultivo de fumo, feijão, milho, mandioca e verduras. O trabalho era familiar, sem o auxílio de empregados. Pelo que sabe a autora sempre trabalhou na lavoura.
Armindo Arnildo Kittel conhece a autora há 48 anos, a qual trabalhava na agricultura com os pais, que cultivavam feijão, milho e fumo. Pelo que sabe os pais da autora sempre foram agricultores, assim como esta. Desde que conhece a autora, sempre trabalhou na agricultura.
A prova testemunhal, portanto, é precisa e uníssona no sentido de que a autora exerceu atividade rural na condição de segurada especial, no período em que residiu com os pais, em regime de economia familiar.
Conforme consta nos autos, o pedido foi indeferido pelo demandado na via administrativa sob o argumento de que a autora não comprovou atividade rural durante todo o período de carência.
No entanto, quanto ao primeiro período, não há como reconhecer o cômputo da atividade rural a partir de 1967, pois a autora tinha 11 anos de idade, sendo admitido tão somente a partir dos 12 anos de idade.
Para corroborar:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AVERBAÇÃO DE TEMPO RURAL. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. Admitida a contagem do período de trabalho rural em regime de economia familiar a partir dos 12 anos, mediante comprovação por início de prova material (inclusive por meio de documentos em nome de terceiros, membros do grupo familiar), complementada por prova testemunhal robusta e idônea. 2. Indeferida a averbação do período em que inexista prova material, corroborada por prova testemunhal, ainda que desnecessária a apresentação de documentos para cada ano de atividade rural. (TRF4, AC 5036037-40.2015.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 14/11/2017). - grifei
Assim, diante da prova produzida, comprovando o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, deve ser reconhecido o período de 1968 até 1978.
Quanto ao período de 2001 a 2011, a autora comprovou que exerceu atividade rural com o companheiro Arceli Rodrigues da Silva, consoante documentos de fls. 61/74 e 86/94, que demonstram a comercialização de produtos rurais pelo casal.
Desta forma, diante do conjunto probatório documental e testemunhal, restou demonstrado o exercício da atividade rural pela autora nos períodos postulados, os quais devem ser reconhecidos como atividade rural. (grifos no original)
(...)
Em seu apelo o INSS alega que a parte autora não comprovou o exercício de atividade rural nos períodos requeridos. No que diz respeito ao tempo em que teria exercido o labor rural com os pais, alegou que não há prova documental em nome da autora, sendo que a documentação apresentada está toda em nome dos seus genitores. Já no que diz respeito à atividade rural com o companheiro, a partir de 2001, afirma que as notas fiscais apresentadas são de baixo valor, o que leva a crer que a produção agrícola não seria suficiente no sentido de manter o grupo familiar. Reforçou que mesmo que se considerasse as referidas notas fiscais, o tempo coberto por elas não seria suficiente para o cumprimento da carência de 180 meses.
No que diz respeito à alegação de que não há comprovação da atividade rural no período requerido pela autora, entendo que assiste razão em parte ao INSS. Como visto no tópico que tratou das condições gerais para a concessão da aposentadoria rural, no caso do regime de economia familiar as provas podem estar em nome dos membros do grupo familiar do demandante. Tampouco se sustenta a afirmação de que o fato de as notas de produtor rural serem de valor baixo demonstrariam que o labor rural não seria essencial para o sustento da família da parte autora. Nesse sentido, há que se levar em conta que a produção rural, ainda que não represente um ganho substancial no sentido monetário, costuma ser essencial para a subsistência da família dos agricultores, uma vez que esta consome a sua própria produção, sendo assim imprescindível para a sua sobrevivência.
No entanto, no que se refere ao segundo período, de 2001 a 2011, só pode ser comprovada a atividade rural pela autora a partir de 2007, consoante declarado pela própria autora no documento constante de E3, ANEXOSPET4, pp. 77/78, o que coincide com a data de aquisição de lote rural pelo companheiro da autora (E3, ANEXOSPET4, p. 65). Assim, embora existam notas de comercialização de produtos agrícolas a partir de 2001, o fato é que a comprovação do regime de economia familiar exige prova da posse (por meio de contrato de parceria, de arrendamento ou outro) ou propriedade de terra rural em conjunto com notas de comercialização, já que não há como produzir produtos agrícolas sem haver um lote rural para o plantio. Ademais, a prova testemunhal não é segura, sobretudo no que diz respeito ao período durante o qual a autora trabalhou em regime de economia familiar, eis que as três testemunhas ouvidas nos autos, srs. Anselmo, Armindo e Vilmar (E7, VIDEOS1, 2 e 3), afirmam conhecer a autora há mais de 40 anos e que ela nunca teria se afastado das lides rurais, o que é desmentido pelo relato da própria autora e documentos por ela acostados à petição inicial, que comprovam exercício de atividade urbana devidamente registrada em CTPS no mínimo de 1979 a 1996.
Dessa forma, entendo que deve ser reformada em parte a sentença, para que seja reconhecido somente o exercício de atividade rural de 30/09/1968 a 31/12/1978. No caso concreto, como visto, a parte autora, segundo ela própria admite na sua petição inicial e está comprovado nos autos (Evento 3 - ANEXOSPET4, p. 100), afastou-se do campo para exercer a atividade urbana em 1979 e apenas retornou à atividade rural, segundo afirma, em 1996, havendo comprovação do labor rural apenas a partir de 2007.
Havendo tão grande período de afastamento de atividades agrícolas - de 1979 a 2007 - não é possível a concessão de aposentadoria por idade como rurícola, inclusive porque, na maior parte do período de carência (1999 a 2014), a autora não comprova a condição de agricultora.
No entanto, reconhecido o período rural de 30/09/1968 a 31/12/1978, cabe verificar a possibilidade de concessão de aposentadoria mista ou híbrida, tendo como base o princípio da fungibilidade, conforme entendimento deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. FUNGIBILIDADE. REQUISITOS LEGAIS. ART. 48, § 3º, DA LEI Nº 8.213/1991. ATIVIDADE URBANA E ATIVIDADE RURAL. PROVA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES RELATIVAS AO PERÍODO RURAL. DESNECESSIDADE. 1. Não preenchidos, por parte do requerente ao benefício, os requisitos para a concessão da aposentadoria rural por idade, mas preenchidos os requisitos da aposentadoria por idade híbrida, é possível a concessão desta, independente do pedido. Não configura decisão extra petita deferir benefício diverso do pedido, uma vez configurado pelo segurado os requisitos legais, tendo em vista o princípio da fungibilidade das ações previdenciárias. Direito subjetivo do segurado ao melhor benefício que fizer jus. 2. Tem direito à aposentadoria por idade, mediante conjugação de tempo de serviço/contribuição rural e urbano durante o período de carência, nos termos do § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008, o segurado que cumpre o requisito etário de 60 anos, se mulher, ou 65 anos, se homem. 3. Ao § 3º do artigo 48 da Lei 8.213/1991 não pode ser emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. 4. O tempo de serviço rural pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria por idade híbrida, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. 5. Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal. 6. Comprovados o preenchimento do requisito etário e o exercício de atividades laborais urbanas e rurais no período exigido de carência, a parte autora faz jus à concessão do benefício. 7. Em face da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal concedendo efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos ao julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947, a definição do índice de correção monetária sobre os valores atrasados deve ser diferida para a fase de execução/cumprimento da sentença. (TRF4, AC 5009189-11.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 28/03/2019)
APOSENTADORIA MISTA OU HÍBRIDA
A aposentadoria por idade de que trata o art. 48 da Lei 8.213/1991 poderá ser outorgada ao segurado que compute tempo de efetivo exercício de atividade rural, ainda que descontínuo, insuficiente para contagem equivalente ao período de carência. Nesses casos é possível haver o benefício de aposentadoria por idade com fundamento no § 3º do art. 48 da Lei 8.213/1991, a denominada aposentadoria por idade mista ou híbrida. Referido dispositivo legal assim declara:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11 (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício deatividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
A intenção da alteração introduzida pela Lei 11.718/2008 na Lei de Benefícios foi possibilitar ao trabalhador rural que não se enquadre na previsão do § 2º haver aposentadoria por idade, aproveitando contribuições em outra categoria de segurado computadas em conjunto com o tempo de efetivo exercício de atividade rural. Em contrapartida foi elevada a idade mínima para sessenta anos (mulheres) e para sessenta e cinco anos (homens). Busca-se com isso contemplar o trabalhador que conta tempo rural insuficiente para aposentadoria rural, e conjuga em seu histórico previdenciário vínculos urbanos, o que poderia descaracterizar a condição de segurado especial e impedir a fruição de benefício.
A natureza jurídica da aposentadoria mista ou híbrida é de uma modalidade de aposentadoria urbana. Aproveita-se o tempo de exercício efetivo de atividade rural para efeitos de carência, computando cada mês como de salário-de-contribuição pelo valor mínimo. Reforça a conclusão o disposto no § 4º do art. 48 da Lei 8.213/1991, impondo para os casos do § 3º do mesmo artigo de lei que a renda mensal será apurada em conformidade com o inc. II do art. 29 da Lei de Benefícios. Essa remissão, e não ao art. 39 da Lei 8.213/1991, confirma que se trata de modalidade de aposentadoria urbana, ou, no mínimo, a ela equiparada. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE MISTA OU HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. LEI Nº 11.718/2008. LEI 8.213, ART. 48, § 3º. TRABALHO RURAL E TRABALHO URBANO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO A SEGURADO QUE NÃO ESTÁ DESEMPENHANDO ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. POSSIBILIDADE.
1. É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a teor do disposto na Lei nº 11.718, de 2008, que acrescentou § 3º ao art. 48 da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumprido o requisito etário de 60 anos para mulher e de 65 anos para homem.
2. Ao § 3º do artigo 48 da LB não pode ser emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade.
3. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, para o caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem), o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo no que toca ao período rural.
4. Não há, à luz dos princípios da universalidade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, e bem assim do princípio da razoabilidade, como se negar a aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91, ao trabalhador que exerceu atividade rural, mas no momento do implemento do requisito etário (sessenta ou sessenta e cinco anos), está desempenhando atividade urbana.
5. A denominada aposentadoria por idade mista ou híbrida, por exigir que o segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, em rigor é, em última análise, uma aposentadoria de natureza assemelhada à urbana. Assim, para fins de definição de regime deve ser equiparada à aposentadoria por idade urbana. Com efeito, a ConstituiçãoFederal, em seu artigo 201, § 7º, II, prevê a redução do requisito etário apenas para os trabalhadores rurais. Exigidos 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a aposentadoria mista, pode-se dizer, constitui praticamente subespécie da aposentadoria urbana, ainda que com possibilidade de agregação de tempo rural sem qualquer restrição.
6. Esta constatação (da similaridade da denominada aposentadoria mista ou híbrida com a aposentadoria por idade urbana) prejudica eventual discussão acerca da descontinuidade do tempo (rural e urbano). Como prejudica, igualmente, qualquer questionamento que se pretenda fazer quanto ao fato de não estar o segurado eventualmente desempenhando atividade rural ao implementar o requisito etário.
(TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0005399-12.2015.404.9999, rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 25/06/2015)
Ainda, conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não importa o preenchimento simultâneo da idade e carência. Vale dizer, caso ocorra a implementação da carência exigida antes mesmo do preenchimento do requisito etário, não constitui óbice para o seu deferimento a eventual perda da condição de segurado (§ 1º, do artigo 3º da Lei nº 10.666/03) (TRF4, Quinta Turma, AC 0025467-17.2014.404.9999, rel. Rogerio Favreto, D.E. 29/05/2015). O referido § 1º do art. 3º da Lei 10.666/2003, assim dispõe:
Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
Conclui-se, pois, que o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício (TRF4, Terceira Seção, EI 0008828-26.2011.404.9999, rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 10/01/2013).
O que importa é contar com tempo de contribuição correspondente à carência exigida na data do requerimento do benefício, além da idade mínima. Esse tempo, tratando-se de aposentadoria do § 3º do art. 48 da L 8.213/1991, conhecida como mista ou híbrida, poderá ser preenchido com períodos de trabalho rural e urbano.
Não é relevante, outrossim, o tipo de trabalho, rural ou urbano, que o segurado está exercendo quando completa as condições previstas em lei, como já esclarecido pelo Superior Tribunal de Justiça:
[...] seja qual for a predominância do labor misto no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo, o trabalhador tem direito a se aposentar com as idades citadas no § 3º do art. 48 da Lei 8.213/1991, desde que cumprida a carência com a utilização de labor urbano ou rural. Por outro lado, se a carência foi cumprida exclusivamente como trabalhador urbano, sob esse regime o segurado será aposentado (caput do art. 48), o que vale também para o labor exclusivamente rurícola (§§1º e 2º da Lei 8.213/1991)
(STJ, Segunda Turma, REsp1407613/RS, rel. Herman Benjamin, j. 14/10/2014, Dje 28/11/2014, trânsito em julgado em 20/02/2015)
Cabe ressaltar, finalmente, que a possibilidade, nos casos de concessão da aposentadoria na modalidade híbrida ou mista, do aproveitamento para fins de carência de tempo de atividade rural anterior à vigência da Lei 8.213/1991 e a desnecessidade de o segurado estar exercendo a atividade rural por ocasião do cumprimento do requisito etário e/ou da entrada do requerimento administrativo, foram selecionadas como matéria representativa de controvérsia pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1674221/SP):
Tema 1007: Possibilidade de concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, mediante o cômputo de período de trabalho rural remoto, exercido antes de 1991, sem necessidade de recolhimentos, ainda que não haja comprovação de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo.
CASO CONCRETO
Como visto acima, é possível, no caso, o cômputo do período de atividade rural de 30/09/1968 a 31/12/1978, inclusive para fins de carência. Portanto, na DER (14/12/2011), a parte autora tinha, além dos 09 anos, 05 meses e 09 dias reconhecidos administrativamente (Evento 3-ANEXOSPET4-p. 90), mais 10 anos, 03 meses e 01 dia de tempo rural computável, totalizando 19 anos, 08 meses e 10 dias de tempo de atividade. No entanto, o requisito etário para a concessão de aposentadoria por idade híbrida à segurada mulher somente foi atingido em 30/09/2016, já no curso desta ação, considerando que a autora nasceu em 30/09/1956.
Tendo em conta o entendimento deste Tribunal no sentido da desnecessidade de preenchimento simultâneo dos requisitos de idade e carência para fins de concessão de aposentadoria por idade urbana (TRF4, APELREEX 0002240-27.2016.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, D.E. 08/08/2017), nada impede a concessão do benefício de aposentadoria por idade mista ou híbrida, desde a data do implemento do requisito etário (30/09/2016), reafirmando-se a DER para essa data. Não há parcelas prescritas.
CONSECTÁRIOS
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)
Juros de mora
Mantém-se a sentença no ponto.
Honorários de sucumbência - fixação
Fixo os honorários de sucumbência no percentual mínimo das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85, percentual a ser definido por ocasião da liquidação do julgado, nos termos do art. 85, § 4º, II, ambos do NCPC. Diante da sucumbência recíproca, cada uma das partes arcará com metade dessa verba, observada a concessão de AJG à parte autora.
Termo final dos honorários de sucumbência
Considerando os termos da Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência", e da Súmula 111 do STJ (redação da revisão de 06/10/2014): "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença", os honorários no percentual fixado supra incidirão sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.
Custas
Cada uma das partes deve arcar com metade do pagamento das custas processuais, sendo que a metade devida pela parte autora tem exigibilidade suspensa pela concessão de AJG. O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014).
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
CONCLUSÃO
Não conhecimento da remessa oficial. Parcial provimento à apelação para: a) reduzir o período de atividade rural reconhecido; b) julgar o processo extinto sem julgamento de mérito relativamente aos períodos de 30/09/1968 a 31/12/1978, e de 01/01/2001 a 18/06/2007; c) conceder aposentadoria por idade híbrida desde a data do implemento do requisito etário; d) reconhecer a sucumbência recíproca, com rateio dos ônus respectivos na forma da fundamentação. De ofício, fixação do INPC como índice de correção monetária. Ordem para implantação imediata do benefício.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação e, de ofício, fixar o índice de correção monetária.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001605825v7 e do código CRC 96388562.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 11/3/2020, às 15:23:10
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5013750-78.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELINA SERAFIN
EMENTA
pREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. APELAÇÃO GENÉRICA. não conhecimento. CONSECTÁRIOS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. Não se conhece do recurso de apelação quanto ao mérito, por não expressar as razões de fato e de direito que ensejaram a sua inconformidade com a decisão prolatada, sob pena de ofensa ao estatuído no art. 1010 do CPC/2015 (ou art. 514 do CPC/1973).
2. No caso de aposentadoria mista ou híbrida o tempo de atividade rural comprovado anterior e posterior à 31/10/1991 deve ser reconhecido como tempo de serviço computável para fins de carência sem a necessidade de recolhimento da contribuição, não havendo a necessidade da indenização prevista no artigo 96 da Lei 8.213/1991. Tampouco há a necessidade de o postulante do benefício estar exercendo a atividade rural no momento do cumprimento do requisito etário ou do requerimento administrativo. Entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 1007.
3. Concessão de aposentadoria por idade mista ou híbrida a parte da DER reafirmada, quando da implementação do requisito etário.
4. Aplicação do INPC como índice de correção monetária também a partir de 30/06/2009.
5. Reconhecimento da sucumbência recíproca, com rateio dos ônus respectivos por igual entre as partes.
6. Ordem para imediata implantação do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação e, de ofício, fixar o índice de correção monetária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de maio de 2020.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001605826v3 e do código CRC c62238d0.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 6/5/2020, às 18:54:26
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 17/12/2019
Apelação/Remessa Necessária Nº 5013750-78.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: FERNANDA DA SILVA DUTRA por CELINA SERAFIN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELINA SERAFIN
ADVOGADO: ANA DILENE WILHELM BERWANGER (OAB RS076496)
ADVOGADO: JANE LUCIA WILHELM BERWANGER (OAB RS046917)
ADVOGADO: LUCAS KADES BURALDE (OAB RS115283)
ADVOGADO: FERNANDA DA SILVA DUTRA (OAB RS075340)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 17/12/2019, às 13:30, na sequência 247, disponibilizada no DE de 02/12/2019.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS A SUSTENTAÇÃO ORAL, O JULGAMENTO FOI SUSPENSO POR INDICAÇÃO DA RELATORA.
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 00:33:58.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/04/2020 A 05/05/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5013750-78.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELINA SERAFIN
ADVOGADO: ANA DILENE WILHELM BERWANGER (OAB RS076496)
ADVOGADO: JANE LUCIA WILHELM BERWANGER (OAB RS046917)
ADVOGADO: LUCAS KADES BURALDE (OAB RS115283)
ADVOGADO: FERNANDA DA SILVA DUTRA (OAB RS075340)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/04/2020, às 00:00, a 05/05/2020, às 14:00, na sequência 368, disponibilizada no DE de 15/04/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, FIXAR O ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 00:33:58.