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Apelação Cível Nº 5006298-41.2023.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARLETE MARIA DE MATTOS VALECO
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria por idade híbrida, mediante a averbação de tempo de serviço rural, no período de 15/01/1970 a 30/05/1988, a partir da data do requerimento, em 26/11/2021.
Sentenciando, a MMª. Juíza julgou o pedido procedente, reconhecendo o período de atividade rural requerido pela parte autora, condenando o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por idade híbrida desde a data do requerimento. No tocante à sucumbência, condenou o INSS ao pagamento de custas e de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das prestações vencidas (Súmula 111 do STJ). Ainda, acerca da correção monetária e dos juros de mora, determinou nos seguintes termos:
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação: - IGP-DI de 5/1996 a 3/2006 (artigo 10 da Lei 9.711/1998, combinado com o artigo 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/1994); - INPC a partir de 4/2006 (artigo 41-A da Lei 8.213/1991).
[...]
Quanto aos juros de mora, devem incidir a contar da citação (Súmula 204 do STJ), na taxa de 1% (um por cento) ao mês, até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados, uma única vez (sem capitalização), segundo percentual aplicável à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, considerado constitucional pelo STF (RE 870.947, com repercussão geral).
A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC n.º 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
A parte autora opôs embargos de declaração devido as contradição e omissão da r. sentença no tocante a especificação das datas dos períodos reconhecidos, os quais não foram acolhidos pelo juízo a quo.
Apela o INSS, sustentando, em síntese, a impossibilidade de computar o período rural trabalhado antes da autora completar 12 anos de idade, alegando que uma criança não possui estrutura física para tanto. Assim, requer reformar a r. sentença para que seja afastado o reconhecimento do período rural antes dos 12 anos de idade. Subsidiariamente, requer a adequação dos índices de correção monetária e juros de mora de acordo com a EC 113/2021.
Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA (ART. 48, §3º, DA LEI 8.213/91)
Não implementando, o trabalhador, tempo de serviço exclusivamente rural, mesmo que de forma descontínua, é possível, ainda, verificar-se o direito à aposentadoria por idade com fundamento no §3º do art. 48 da Lei nº 8.213/91, a denominada aposentadoria por idade mista ou híbrida. Referido dispositivo legal possui a seguinte redação:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11 (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008) (grifei)
Portanto, é possibilitado ao trabalhador rural que não se enquadra na previsão do §2º do artigo citado, a aposentadoria por idade com o aproveitamento das contribuições sob outra(s) categoria(s), porém com a elevação da idade mínima.
Com relação à natureza jurídica da denominada aposentadoria mista ou híbrida, por exigir que o segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, é, em última análise, uma aposentadoria de natureza assemelhada à urbana. Com efeito, a Constituição Federal, em seu artigo 201, §7º, II, prevê a redução do requisito etário apenas para os trabalhadores rurais. Exigidos 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a aposentadoria mista, pode-se dizer, constitui praticamente subespécie da aposentadoria urbana, ainda que com possibilidade de agregação de tempo rural sem qualquer restrição.
Nessa linha, conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não é necessário o preenchimento simultâneo da idade e da carência, ou seja, não constitui óbice à concessão do benefício pleiteado a perda da condição de segurado antes de atingida a idade mínima exigida, nos termos do art. 3º, § 1º, da Lei 10.666/2003. Confira-se o seguinte precedente desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE MISTA/HÍBRIDA. ART. 48, § 3º, DA LEI Nº 8.213/1991. BENEFÍCIO EQUIPARADO À APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. CARÊNCIA E IDADE. CONCOMITÂNCIA. IRRELEVÂNCIA. PERDA DA CONDIÇÃO DE SEGURADO. CIRCUNSTÂNCIA DESCONSIDERADA À LUZ DO DISPOSTO NO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 10.666/03. CORREÇÃO CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Da leitura do artigo 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91, depreende-se que sua intenção foi a de possibilitar ao trabalhador rural que não se enquadra na previsão do § 2º do aludido artigo à aposentadoria por idade com o aproveitamento das contribuições sob outra(s) categoria(s), porém com a elevação da idade mínima para 60 (sessenta) anos para mulher e 65 (sessenta e cinco) anos para homem.
2. Em função das inovações trazidas pela Lei nº 11.718/08, já não tão recentes, nem mais cabe indagar sobre a natureza jurídica da denominada aposentadoria mista ou híbrida, pois se pode afirmar que se trata de uma modalidade de aposentadoria urbana.
3. A reforçar sua natureza de benefício urbano, o § 4º, para efeitos do § 3º, do aludido artigo, dispõe que o cálculo da renda mensal do benefício será apurado em conformidade com o disposto no inciso II do artigo 29 da mesma Lei.
4. Conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não importa o preenchimento simultâneo da idade e carência. Vale dizer, caso ocorra a implementação da carência exigida antes mesmo do preenchimento do requisito etário, não constitui óbice para o seu deferimento a eventual perda da condição de segurado (§ 1º do artigo 3º da Lei nº 10.666/03).
5. omissis
6. omissis
(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012895-58.2016.404.9999, 5ª TURMA, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, POR UNANIMIDADE, D.E. 09/03/2017, PUBLICAÇÃO EM 10/03/2017) (grifei)
Portanto, o fato de o segurado não estar desempenhando atividade rural, por ocasião do requerimento administrativo ou do implemento do requisito etário, não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. Esse entendimento encontra-se consolidado na Súmula nº 103 deste TRF, in verbis:
Súmula nº 103
"A concessão da aposentadoria híbrida ou mista, prevista no art. 48, §3º, da Lei nº 8.213/91, não está condicionada ao desempenho de atividade rurícola pelo segurado no momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo, sendo, pois, irrelevante a natureza do trabalho exercido neste período."
Admitindo-se, inclusive, que a carência seja preenchida com tempo de serviço rural exercido anteriormente à Lei 8.213/1991. Nesse sentido, os seguintes precedentes do STJ e desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. ART. 48, § 3º, DA LEI N. 8213/91. EXEGESE. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO QUE ANTECEDE O REQUERIMENTO. DESNECESSIDADE. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 8.213/91 PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE.
1. A Lei 11.718/2008, ao alterar o art. 48 da Lei 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade, possibilitando que, na apuração do tempo de serviço, seja realizada a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano.
2. Para fins do aludido benefício, em que é considerado no cálculo tanto o tempo de serviço urbano quanto o de serviço rural, é irrelevante a natureza do trabalho exercido no momento anterior ao requerimento da aposentadoria.
3. O tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições.
4. omissis
5. omissis
6. Recurso especial improvido.
(REsp 1476383/PR, Rel. Min.Sérgio Kukina, 1ª Turma, j. em 01/10/2015, DJe 08/10/2015)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE MISTA OU HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. ART. 48, § 3º, DA LEI Nº 8.213/91, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.718/2008. TRABALHO RURAL E TRABALHO URBANO. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 8.213/91 PARA FINS DE CARÊNCIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO A SEGURADO QUE NÃO ESTÁ DESEMPENHANDO ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. POSSIBILIDADE.
É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a teor do disposto na Lei nº 11.718, de 2008, que acrescentou o § 3º ao art. 48 da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumprido o requisito etário de 60 anos para mulher e de 65 anos para homem. Ao § 3º do artigo 48 da LB não pode ser emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar a contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, para o caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem), o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo no que toca ao período rural. O tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei nº 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria por idade híbrida, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. Não há, à luz dos princípios da universalidade e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, e bem assim do princípio da razoabilidade, como se negar a aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91 ao trabalhador que exerceu atividade rural, mas no momento do implemento do requisito etário (sessenta ou sessenta e cinco anos) está desempenhando atividade urbana. A denominada aposentadoria por idade mista ou híbrida, por exigir que o segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, em rigor, é, em última análise, uma aposentadoria de natureza assemelhada à urbana.
(TRF4, AC 5021331-81.2017.4.04.9999, Turma Regional Suplementar DE SC, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 14/11/2017)
Na mesma linha, decidiu o STJ ao analisar a matéria sob a sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do Tema 1007, verbis: O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
Em suma, o que importa é contar com tempo de serviço/contribuição correspondente à carência exigida na data do requerimento do benefício, além da idade mínima. E esse tempo, tratando-se de aposentadoria híbrida ou mista, poderá ser preenchido com períodos de labor rural e urbano.
Por fim, ressalte-se que tanto o período de atividade rural anterior a 31/10/1991, quanto o posterior, pode ser computado para efeito de carência, sem a necessidade de recolhimento de contribuições ou indenização, em se tratando de aposentadoria por idade híbrida. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE MISTA OU HÍBRIDA. ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA. atividade urbana não constante no cnis. Reconhecimento. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS. MAJORAÇÃO. custas.
1. O parágrafo 3º do artigo 48 da Lei 8.213/1991 possibilita ao trabalhador rural que não se enquadre na previsão do parágrafo 2º do mesmo dispositivo haver aposentadoria por idade com o aproveitamento das contribuições em outra categoria, mas com a elevação da idade mínima para sessenta anos para mulher e sessenta e cinco anos para homem.
2. Preenchido o requisito etário, e comprovada a carência exigida ainda que de forma não simultânea, é devido o benefício.
3. No caso de aposentadoria mista ou híbrida o tempo de atividade rural comprovado anterior e posterior à 31/10/1991 deve ser reconhecido como tempo de serviço computável para fins de carência sem a necessidade de recolhimento da contribuição, não havendo a necessidade da indenização prevista no artigo 96 da Lei 8.213/1991. Tampouco há a necessidade de o postulante do benefício estar exercendo a atividade rural no momento do cumprimento do requisito etário ou do requerimento administrativo. (negritei)
4. Período urbano não constante no CNIS. Extravio da CTPS que comprovaria o vínculo empregatício. Comprovação da atividade por meio do livro de registro de empregados da empresa em que trabalhou o requerente. Confirmação da atividade pelas testemunhas ouvidas em juízo. Reconhecimento do período.
5. Correção monetária desde cada vencimento pelo INPC a partir de abril de 2006. Juros de mora desde a citação, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/1997.
6. Sendo a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se a majoração prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. 7. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014).
(TRF4, AC 0002279-87.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, D.E. 06/11/2018)
TEMPO DE SERVIÇO RURAL
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia).
Ainda, quanto à questão da prova, cabe ressaltar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); e (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
CASO CONCRETO
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário em 15/01/2020 e formulou o requerimento administrativo em 26/11/2021. Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural e/ou urbana no período de 180 meses anteriores ao requerimento administrativo.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, no período de 15/01/1970 a 30/05/1988, a parte autora instruiu o processo com, dentre outros, os seguintes documentos:
- Certidão de Nascimento de Lisabete Aparecida de Mattos, irmã da autora, na qual seus genitores são qualificados como “lavradores”, datada de 1957;
- Certidão de Nascimento de Leodete Henrique de Mattos, irmã da autora, na qual seu genitor é qualificado como “lavrador”, datada de 1962;
- Certidão de Nascimento de Lourisete Salvador Henrique de Mattos, irmã da autora, na qual seu genitor é qualificado como “lavrador”, datada de 1964;
- Certidão de Nascimento de Edson José Henrique de Mattos, irmão da autora, na qual seu genitor é qualificado como “lavrador”, datada de 1967;
- Certidão de Casamento da autora, na qual seu cônjuge é qualificado como “lavrador”, datada de 1976;
- Certidão de Nascimento de Marta Valeco de Mattos, filha da autora e de seu cônjuge, na qual este é qualificado como “lavrador”, datada de 1977;
- Certidão de Nascimento de Marilda Valeco de Mattos, filha da autora e de seu cônjuge, na qual este é qualificado como “lavrador”, datada de 1981;
- Escritura Pública de compra e venda, na qual o genitor da autora consta como vendedor e é qualificado como “lavrador”, datada de 1979;
- Ficha do sindicato dos trabalhadores rurais, em nome do genitor da autora, constando o pagamento de mensalidades referentes aos anos de 1986, 1987 e 1988;
- Autodeclaração do segurado especial rural, em nome da autora, referente a atividades rurais realizadas em regime de economia familiar, durante o período de 1970 a 1988.
Outrossim, por ocasião da audiência de instrução, foram ouvidos um informante e uma testemunha, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pela parte autora.
Dos depoimentos transcritos na r. sentença, destaco:
O informante, ORLANDO ABREU DE LIMA (mov. 49.2), em sede judicial, narrou: “(...) conhecer a autora desde os seus sete anos de idade, quando a mesma residia na localidade de Rio Cavernoso, Zona Rural do Município de Cantagalo-PR, onde a mesma laborava na agricultura, em terreno de propriedade do genitor da autora, com cerca de seis alqueires. Relatou que a via plantando e colhendo feijão e capinando, sem uso de maquinários agrícolas ou funcionários, somente com auxílio de cavalos e arado manual. Na propriedade, trabalhavam a autora, seus genitores e seus irmãos. Entre a propriedade onde a mesma laborava, e a propriedade onde o depoente residia, a distância era de aproximadamente 500 metros. Contou, que mesmo após o matrimonio a autora continuou residindo no local juntamente com seu cônjuge e filhos, de onde saiu após os trinta anos de idade, sobrevivendo apenas da agricultura”.
A testemunha JUVENAL MENDES FERREIRA (mov. 49.3), em Juízo, relatou: “(...) conhecer a autora desde aproximadamente seus vinte anos de idade, onde a mesma laborava na lavoura juntamente com seus genitores, em uma propriedade de cerca de seis alqueires, onde a mesma plantava milho, feijão, batata, sem uso de maquinários ou funcionários. Relatou que a autora laborava antes mesmo de contrair matrimonio, após, o cônjuge e a autora continuaram laborando no local”.
Nas razões recursais, sustenta a Autarquia que a autora era menor de 12 anos de idade na data de 15/01/1970, portanto, alega a impossibilidade de cômputo do labor rural no período anterior ao implemento dos 12 anos de idade.
No que tange ao reconhecimento do trabalho rural realizado antes dos 12 anos de idade, importa ressaltar que não se desconhece a decisão proferida por esta Corte, na Apelação Cível nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, possibilitando, em tese, a contagem do referido tempo de atividade rural para fins previdenciários.
Entretanto, a possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior aos 12 anos de idade não desonera a parte autora de efetivamente comprovar que as atividades desenvolvidas ainda criança transcendiam um mero auxílio cotidiano e sem significado em relação à produtividade do grupo familiar.
Isto posto, cabe à parte demonstrar, de forma robusta, que o exercício da atividade rural na infância era indispensável para a subsistência da família, bem como era exercido em condições de mútua dependência e colaboração entre os seus membros, como exige a Lei nº 8.213/91 para o reconhecimento do trabalho rural exercido em regime de economia familiar. Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. TEMPO RURAL. CÔMPUTO PERÍODO ANTERIOR A 12 ANOS DE IDADE [...] 3. Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal. A admissão de trabalho rural antes dos doze anos exige, de acordo com a jurisprudência dos tribunais superiores, prova robusta e detalhada acerca da efetiva contribuição do menor para a subsistência da família e especificada quanto à(s) tarefa(s) desenvolvida(s) por ele, além do período de tempo diário despendido no trabalho. [...] (TRF4, AC nº 5023385-20.2017.4.04.9999, Turma Regional Suplementar do Paraná, Rel. Des. Federal Márcio Antonio Rocha, 21/05/2020). - Grifei.
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. IDADE MÍNIMA PARA O TRABALHO RURAL. REQUISITOS LEGAIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. 1. Relativamente à idade mínima, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade. Entretanto, essa atividade deve ir além de um mero auxílio, ou seja, o menor deve exercer um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei da previdência. [...] (AC nº 5060204-92.2018.4.04.7000, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, un., juntado aos autos em 16/03/2022). - Grifei.
No caso dos autos, contudo, não restou comprovado que, de fato, havia o efetivo trabalho rurícola pela parte no período que antecede seus 12 anos de idade. Inclusive, cumpre salientar que apenas o informante conheceu a autora na época em que ela ainda era criança, vez que a testemunha afirmou ter conhecido a autora quando esta possuía 20 anos de idade. Desta forma, os depoimentos carecem de detalhes desse labor desempenhado quando criança, portando, não demonstrou-se que a atividade rural não passava de um mero auxílio eventual à sua família.
A Magistrada julgou procedente o pedido da parte autora, reconhecendo e averbando o período de atividade rural de 15/01/1970 a 30/05/1988.
Entretanto, a data que, de fato, demonstra o início do exercício de atividade rural é aquela compreendida de 15/01/1972, data em que a autora completou 12 anos de idade, merecendo ser reconhecido o período de atividade rural a partir desta data.
Desta forma, mesmo com a redução do período rural reconhecido, nota-se que somados os períodos de atividade urbana já averbado pelo INSS no CNIS da autora (3 anos e 23 dias, ev. 1.5) ao período de atividade rural reconhecido nesta ação, isto é, de 15/01/1972 a 30/05/1988, verifica-se que a parte autora atingiu o tempo de contribuição necessário para a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Assim, restando comprovado o exercício de atividas rurícolas pela parte autora no período de 15/01/1972 a 30/05/1988, deve ser reformada a sentença proferida, apenas a fim de modificar a data inicial do período reconhecido, mantendo-se o julgamento de procedência do pedido.
CONSECTÁRIOS LEGAIS
No tocante aos índices de correção monetária e juros de mora, observa-se que, no apelo da Autarquia, é requerido exatamente aquilo que ficou estabelecido em sentença, portanto, não merece alteração o ponto, mantendo-se a decisão da sentença acerca dos consectários legais.
Assim, não conheço do apelo do INSS, no ponto.
TUTELA ESPECÍFICA - IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO
Em face da ausência de efeito suspensivo de qualquer outro recurso, é determinado ao INSS (obrigação de fazer) que implante ao segurado, a partir da competência atual, o benefício abaixo descrito, no prazo máximo de vinte (20) dias para cumprimento.
TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
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CUMPRIMENTO | Implantar Benefício |
NB | 2036003375 |
ESPÉCIE | Aposentadoria por Idade |
DIB | 26/11/2021 |
DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
DCB | |
RMI | A apurar |
OBSERVAÇÕES | Híbrida |
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Apelação do INSS conhecida em parte e parcialmente provida, a fim de reformar o período reconhecido de exercício de atividades rurais para 15/01/1972 a 30/05/1988, mantendo-se a procedência do pedido.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por conhecer em parte da apelação do INSS e nessa extensão dar-lhe parcial provimento e determinar a implantação do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por MARCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004195012v18 e do código CRC dd26b46f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
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Apelação Cível Nº 5006298-41.2023.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARLETE MARIA DE MATTOS VALECO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE híbrida. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR A 12 ANOS DE IDADE. COMPROVAÇÃO. averbação. tutela específica.
1. É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a teor do disposto na Lei nº 11.718, de 2008, que acrescentou o § 3º ao art. 48 da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumprido o requisito etário de 60 anos para mulher e de 65 anos para homem.
2. O tempo de serviço rural anterior aos 12 anos de idade deve ser reconhecido somente quando houver robusta prova material e testemunhal do seu exercício, demonstrando que não se tratava apenas de um auxílio eventual à família.
3. Comprovado o exercício da atividade em regime de economia familiar no período de 15/01/1972 a 30/05/1988, procede o pedido de reconhecimento de tempo de serviço rural.
4. Reconhecido o direito da parte autora, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer em parte da apelação do INSS e nessa extensão dar-lhe parcial provimento e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 19 de dezembro de 2023.
Documento eletrônico assinado por MARCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004195013v5 e do código CRC 41580cd8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
Data e Hora: 19/12/2023, às 19:17:8
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/12/2023 A 19/12/2023
Apelação Cível Nº 5006298-41.2023.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ARLETE MARIA DE MATTOS VALECO
ADVOGADO(A): GISELE APARECIDA SPANCERSKI (OAB PR048364)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/12/2023, às 00:00, a 19/12/2023, às 16:00, na sequência 56, disponibilizada no DE de 30/11/2023.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DA APELAÇÃO DO INSS E NESSA EXTENSÃO DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
Votante: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
MARIANA DO PRADO GROCHOSKI BARONE
Secretária
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