APELAÇÃO CÍVEL Nº 5026683-20.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA LAVRATTI ZATTI |
ADVOGADO | : | MAURICIO FERRON |
: | RAFAEL PLENTZ GONÇALVES |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. LABOR URBANO DE INTEGRANTE DO NÚCLEO FAMILIAR PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PELO MARIDO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
2. Comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinqüenta e cinco anos para a mulher), e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, é devido o benefício de aposentadoria rural por idade à parte autora, a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91.
3. A percepção de aposentadoria urbana pelo cônjuge não desqualifica a condição de segurado especial da esposa, se a indigitada renda não é suficiente para tornar dispensável o labor agrícola desempenhado pela esposa para a subsistência do núcleo familiar.
4. Nos termos do julgamento do RE nº 870.947/SE (Tema 810), pelo STF, em 20/9/2017, a correção monetária dos débitos da Fazenda Pública se dará através do IPCA-E. Os juros moratórios devem atender a disciplina da Lei nº 11.960/2009.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, determinando a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de junho de 2018.
ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Relator
| Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9385879v5 e, se solicitado, do código CRC BE364E39. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Altair Antonio Gregorio |
| Data e Hora: | 06/06/2018 16:20 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5026683-20.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA LAVRATTI ZATTI |
ADVOGADO | : | MAURICIO FERRON |
: | RAFAEL PLENTZ GONÇALVES |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural à parte autora, a contar da data do requerimento administrativo (21/09/2011), em razão do exercício do labor rural em regime de economia familiar. Condenado o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas, a partir da data do requerimento na esfera administrativa, atualizadas no período de 30/06/2009 a 25/03/2015, pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança e, quanto aos valores posteriores a 26/03/2015, deverá ocorrer atualização monetária pelo IPCA-E e juros de mora de 6% ao ano. Condenado, ainda, ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Em suas razões de apelação a Autarquia Previdenciária sustentou, em síntese, que o esposo da autora exerceu atividade urbana no período de 1986 a 1997, sendo que, a partir de 1997, passou a receber aposentadoria por tempo de contribuição com renda atual de R$ 2.323,70, o que torna dispensável a renda proveniente da atividade agrícola. Assevera, ainda, que, diante da descaracterização do regime de economia familiar, torna-se impossível o aproveitamento dos documentos em nome do marido da autora, quais sejam, o registro de imóvel rural e as notas fiscais de produtor rural datadas de 1993/1996. Requer, subsidiariamente, a aplicação integral da Lei nº 11.960/2009 no tocante aos juros e correção monetária.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas, justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a aposentadoria por idade rural: a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (artigo 48, § 1º, da Lei nº 8.213/91); b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício.
Quando implementadas essas condições, aperfeiçoa-se o direito à aposentação, sendo então observado o período equivalente ao da carência na forma do art. 142 da Lei nº 8.213/91 (ou cinco anos, se momento anterior a 31/08/94, data de publicação da MP nº 598, que modificou o artigo 143 da Lei de Benefícios), considerando-se da data da idade mínima, ou, se então não aperfeiçoado o direito, quando isto ocorrer em momento posterior, especialmente na data do requerimento administrativo, tudo em homenagem ao princípio do direito adquirido, resguardado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91.
O benefício de aposentadoria por idade rural será, em todo caso, devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp nº 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. nº 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp nº 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Do trabalho rural como segurado especial
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao boia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Da idade para reconhecimento do labor rural
A idade mínima a ser considerada, no caso de segurado especial, em princípio, dependeria da data da prestação da atividade, conforme a legislação então vigente (nesse sentido: EREsp 329.269/RS, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2002, DJ 23/09/2002, p. 221). Não obstante, cumpre destacar que a limitação constitucional ao trabalho de menor é norma protetiva da infância, não podendo conduzir ao resultado de que, uma vez verificada a prestação laboral, a incidência do preceito legal/constitucional resulte em sua nova espoliação (desta feita, dos direitos decorrentes do exercício do trabalho).
Assim, é de ser admitida a prestação laboral, como regra, a partir dos 12 anos, pois, já com menos responsabilidade escolar e com inegável maior potência física, os menores passam efetivamente a contribuir na força de trabalho do núcleo familiar, motivo pelo qual tanto a doutrina quanto a jurisprudência aceitam esta idade como termo inicial para o cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial (nesse sentido: TRF4, EIAC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, julgado na sessão de 12-03-2003; STF, AI n.º 529694/RS, Relator Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, decisão publicada no DJU de 11-03-05).
Do caso concreto
Tendo a parte autora implementado o requisito etário (cinquenta e cinco anos) em 26/05/2008, e requerido o benefício em 21/09/2011, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 162 meses anteriores ao implemento do requisito etário (11/1995 - 05/2008) ou nos 180 meses anteriores ao requerimento administrativo (09/1996 - 09/2011), ou nos períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua, na forma que lhes for mais favorável.
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos (evento 3 - ANEXOS PET4):
- CCIR, emissão 2003/2004/2005;
- Matrícula de imóvel rural, datada de 07/1989;
- Escritura pública de compra e venda de imóvel rural, tendo como adquirentes a autora e seu marido, datada de 31/05/1990;
- Notas de produtor rural, em nome do marido da autora, referentes aos anos de 1993, 1994;
- Notas de produtor rural, em nome da autora e seu marido, datadas de 1993, 1994, 1995, 1998, 1999, 2000, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011;
A prova oral produzida em juízo em 09-06-2015, foi precisa e convincente acerca do trabalho rural exercido pela parte autora, em regime de economia familiar, em todo o período correspondente à carência do benefício.
Com efeito, as testemunhas confirmam as alegações contidas na inicial, assegurando, em suma, conhecerem a parte autora há mais de 40 anos; que a autora sempre trabalhou na lavoura, nas terras de propriedade da família; que a propriedade tem cerca de 15ha; que o filho da autora o ajuda; que o marido da autora é aposentado; que antes ele trabalhava num matadouro na cidade; que o matadouro era do pai e de um sobrinho do marido da autora; que depois foi vendido este matadouro; que a autora planta feijão, mandioca, soja, milho, e o que sobra eles vendem; que o bairro Zatti é a mesma localidade que Capela Stª Lúcia; que a autora mora na cidade de Ibiraiaras, que fica a 2km de suas terras; que o trabalho na roça é necessário, pois o salário do marido não é suficiente para o sustento da família.
Em recente decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a
alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp nº 1.348.633 - SP, Relator o Ministro Arnaldo Esteves de Lima, julgado em 28/08/2013).
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material, para o que, consideradas as peculiaridades do trabalho na agricultura, não se pode exigir que sejam apenas por si mesmos conclusivos ou suficientes para a formação de juízo de convicção. É aceitável que a prova contenha ao menos uma indicação segura de que o fato alegado efetivamente ocorreu, vindo daí a necessidade de sua complementação pela prova oral, a qual, como se viu, confirmou de modo coerente e preciso o trabalho rural da parte autora, razão porque a sentença deve ser confirmada.
Ressalta-se que o fato de o cônjuge da autora ter exercido atividade outra que não a rural, entre os anos de 1986 e 1997, bem como o fato de ter recebido benefício de aposentadoria por tempo de contribuição não superior a dois salários mínimos, uma vez que a renda em 01/2017 corresponde a R$ 1.844,03, e o salário mínimo vigente na época correspondia a R$ 937,00, não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurada especial de quem postula o benefício, pois, ainda que considerada como trabalhadora rural individual, sua situação encontra guarida no art. 11, inciso VII, da Lei n.° 8.213/91.
Cabe mencionar o seguinte precedente da 3ª Seção:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO.
1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. Com o advento da Lei 11.718/08, que alterou diversos dispositivos da Lei 8.213/91, restou claro que a existência de fonte de renda diversa da agricultura não descaracteriza, por si só, a condição de segurado especial, haja vista o que estabelecem os arts. 11, §§ 9º e 10º, I, "a", da Lei n.º 8.213/91. Além disso, a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45, de 06/08/10, em seu art. 7º, § 5º, dispõe que não é segurado especial o membro de grupo familiar (somente ele) que possuir outra fonte de rendimento. (EINF n.º 0000833-59.2011.404.9999, Rel. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. em 19-08-2011). (Sublinhei.)
Ademais, a percepção da referida renda não se mostra suficiente para afastar o trabalho da autora na lavoura, considerado "indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar", nos termos dispostos no § 1º do art. 11 da LBPS (Redação dada pela Lei 11.718, de 20-06-2008).
A propósito, assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL.
O fato do marido da Autora ser aposentado e seu filho pedreiro não afasta a qualidade de segurada especial da mesma para obtenção da aposentadoria rural por idade.
Recurso conhecido e provido. (REsp n.º 289.949/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, j. em 13-11-2001, DJU, Seção I, de 04-02-2002).
Desse modo, no ponto não assiste razão ao apelante.
No que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade de extensão da prova material em nome de um membro do núcleo familiar a outro. Contudo, no julgamento do Resp. 1.304.479-SP, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, aquela colenda Corte adotou posicionamento no sentido da impossibilidade de se estender a prova de um membro do núcleo familiar a outro, quando o titular dos documentos passa a exercer trabalho urbano.
O Recurso Especial n. 1.304.479-SP, tido como representativo de controvérsia, foi assim ementado:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
A partir da leitura do item "5" da ementa, vê-se que o julgamento do recurso especial repetitivo versou sobre hipótese semelhante ao caso em análise, em que, apesar de terem sido juntados documentos em nome do cônjuge da parte autora, o qual passou a exercer atividade urbana, verifica-se que também foram carreados aos autos documentos em nome da requerente, o que atende a necessidade de apresentação de documentos em nome próprio.
No caso, é possível a formação de uma convicção plena, após a análise do conjunto probatório, no sentido de que, efetivamente, houve o exercício da atividade laborativa rurícola em regime de economia familiar em todo o período correspondente à carência.
Assim, preenchidos os requisitos da idade exigida (completou 55 anos em 26/05/2008) e comprovado o exercício da atividade rural durante o período correspondente à carência, deve ser mantida a sentença de procedência, que concedeu o benefício de Aposentadoria Rural por Idade em favor da parte autora a partir do requerimento administrativo, em 21/09/2011, a teor do disposto no art. 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
Consectários. Juros moratórios e correção monetária.
A partir do julgamento definitivo do Tema 810 pelo egrégio Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, Relator Min. Luiz Fux, julgado em 20/09/2017 e publicado em 20/11/2017), inexiste controvérsia sobre os índices de juros moratórios e correção monetária a serem adotados no cálculo das parcelas previdenciárias pretéritas devidas pela Autarquia Previdenciária.
Em síntese, naquele julgado decidiu a Corte Suprema que nas demandas previdenciárias (relações jurídicas de natureza não-tributária) o índice de correção monetária a ser utilizado para a atualização das condenações impostas à Fazenda Pública deve ser o Índice de Preços ao Consumidor Amplo - Especial (IPCA-E), considerado mais adequado para capturar a variação de preços da economia e recompor o valor do débito desde a data fixada na sentença até o efetivo pagamento final, inclusive para os precatórios. Decidiu ainda o STF que, para a apuração dos juros de mora, deve ser utilizado o índice de remuneração da caderneta de poupança, na forma do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009.
Nestes termos, os consectários da condenação devem ser adequados de ofício, conforme os fatores acima indicados, porquanto trata-se de matéria de ordem pública, podendo ser tratada pelo Tribunal sem necessidade de prévia provocação das partes. Neste sentido RESP 442.979/MG, Ministro João Otávio de Noronha, 2ª Turma, julgado em 15/8/2006, DJ 31/8/2006, p. 301.
Logo, no caso concreto, observar-se-á a sistemática do Manual para Orientação e Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal, até 29/6/2009. E, após essa data, ou seja, a contar de 30/6/2009, coincidente com o início da vigência do artigo 5º da Lei 11.960/2009, pelo qual conferida nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, deverá ser utilizada a metodologia ali prevista para os juros de mora, que são devidos a contar da citação, de forma não capitalizada; e, a título de correção monetária, será aplicado o IPCA-E.
Logo, adequa-se de ofício a correção monetária.
Neste aspecto, não merece acolhida o recurso do INSS no ponto.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios seguem a sistemática prevista no artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Considerando o trabalho adicional em grau de recurso, aplica-se o comando do § 11º do referido artigo, devendo ser observadas, conforme o caso, as disposições dos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º, todos do citado dispositivo legal.
Assim, estabeleço a majoração da verba honorária em 15% sobre o valor das parcelas vencidas (Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC/2015.
Caso o valor da condenação a ser apurada em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual médio da faixa subsequente, e assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III, e 5º do referido dispositivo legal.
Custas
O INSS é isento do pagamento de custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010). Quando demandado perante a Justiça Estadual de Santa Catarina, a autarquia responde pela metade do valor (art. 33, § único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97). Contudo, esta isenção não se aplica quando o demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4).
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo Código de Processo Civil, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à averbação do período reconhecido. Prazo: 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
Mantida a sentença de procedência. Negar provimento à apelação do INSS. Adequar de ofício a correção monetária.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS, determinando a imediata implantação do benefício.
É o voto.
ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/06/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5026683-20.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00052696720128210057
RELATOR | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
PRESIDENTE | : | Osni Cardoso Filho |
PROCURADOR | : | Dr. Marcelo Veiga Beckhausen |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA LAVRATTI ZATTI |
ADVOGADO | : | MAURICIO FERRON |
: | RAFAEL PLENTZ GONÇALVES |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/06/2018, na seqüência 86, disponibilizada no DE de 16/05/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE | |
: | Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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