| D.E. Publicado em 19/06/2015 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0019670-60.2014.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | SHIRLEI SILVA GASPAR |
ADVOGADO | : | Jaqueline Luiz |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 2A VARA DA COMARCA DE CIANORTE/PR |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL NÃO COMPROVADA NO PERÍODO EQUIVALENTE À CARÊNCIA. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. AVERBAÇÃO DOS PERÍODOS RECONHECIDOS. TUTELA ESPECÍFICA.
1. O tempo de serviço rural pode ser demonstrado mediante a produção de início de prova material, desde que complementada por prova testemunhal idônea. 2. Não tendo a parte autora logrado comprovar o efetivo exercício de atividades rurais, na condição de segurada especial, durante o período equivalente à carência necessária à concessão da aposentadoria por idade rural, é inviável que esta lhe seja outorgada, devendo ser averbados os períodos reconhecidos para fins de futura concessão de benefício previdenciário. 3. Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido (CPF 609.690.089-53), a ser efetivada em 45 dias.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, e manter a decisão do juízo "a quo", determinando o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de junho de 2015.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7501740v7 e, se solicitado, do código CRC D187918A. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 12/06/2015 16:15 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0019670-60.2014.404.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | SHIRLEI SILVA GASPAR |
ADVOGADO | : | Jaqueline Luiz |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 2A VARA DA COMARCA DE CIANORTE/PR |
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário e de apelação interposta da sentença que assim dispôs:
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido contido nesta ação, resolvendo-se o mérito nos termos do artigo 269, inciso I, Código de Processo Civil, para o fim de reconhecer a atividade rural exercida pela autora a partir de seus 12 (doze) anos de idade (05/08/1967) até a competência 06/1992, devendo o réu averbá-lo administrativamente, observando-se a ressalva retro apresentada. Nos termos dos artigos 20, §4º e 21, do Código de Processo Civil, arcarão ambas as partes com a sucumbência, suportando o réu 50% das despesas processuais e 50% dos honorários advocatícios ora fixados em R$ 1.500,00, atendendo-se ao trabalho dos procuradores das partes, complexidade da matéria e o tempo decorrido desde a propositura da ação. O autor suportará 50% desses mesmos encargos, compensando-se os honorários nos termos da Súmula 306, Superior Tribunal de Justiça. Frise-se que a autarquia ré não goza da isenção legal sobre as custas processuais quando demandada perante a Justiça Estadual (Súmula 178 do STJ). Defiro os benefícios da assistência judiciária gratuita à parte autora, devendo ser observado o artigo 12, da Lei nº 1.060/50. Nos termos do artigo 475, inciso I, Código de Processo Civil, submeto a presente sentença ao duplo grau de jurisdição, eis que ilíquida.
O INSS recorre, postulando a reforma da sentença, pois a mesma reconheceu o período rural de 05/08/1967 a 06/1992. Sendo assim, alega que período rural posterior à Lei 8.213/91 somente poderá ser averbado mediante o recolhimento de contribuições previdenciárias, ou seja, a partir de 31/10/1991 (Lei 8.213/91), a parte autora deveria comprovar não somente o trabalho rural, mas também o recolhimento das contribuições previdenciárias que não foram comprovadas no período de 01/11/1991 a 06/1992.
Oportunizadas contrarrazões, a parte autora requereu seja negado provimento ao apelo do INSS e a manutenção da sentença proferida.
Diante disso, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do reexame necessário
É caso de reexame necessário, porque não há condenação em valor certo, de modo que não incide a exceção do art. 475, § 2.º do CPC. Aplica-se a Súmula n.º 490 do STJ.
A questão controversa nos autos cinge-se ao direito da parte autora à concessão de Aposentadoria por Idade Rural, desde a data do requerimento administrativo (15/02/2012).
Da atividade rural
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5.º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB, e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos fatos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
Aos trabalhadores rurais, filiados à Previdência à época da edição da Lei n.º 8.213/91, que implementarem os requisitos da aposentadoria por idade no prazo de até quinze anos após a sua vigência (ou seja, até 24-07-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, inciso II, mas a regra de transição prevista no art. 143, ambos da Lei de Benefícios.
Os requisitos para a aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição da Lei n.º 8.213/91 são, pois, os seguintes: (a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (Lei n.º 8.213, art. 48, § 1º); e (b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício (Lei n.º 8.213, art. 143). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo que é necessário comprovar como de efetivo exercício do labor rural, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei de Benefícios, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos 142 e 143 da Lei de Benefícios, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural (direito adquirido ou DER); b) termo inicial e final do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício (DIB).
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de labor rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso XXXVI; Lei de Benefícios, art. 102, § 1º).
Nada obsta, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994 (data da publicação da Medida Provisória n.º 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, independentemente de recolhimento de contribuições previdenciárias, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, RExt nº 631240/MG, Rel. Ministro Roberto Barroso, Plenário, julgado em 03-09-2014), ou, inexistente este, da data da citação (STJ, REsp n. 1450119-MT, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves c/c o art. 219, § 1º, do CPC), o que não afasta o direito às parcelas anteriores aos cinco anos desde o ajuizamento. Interpretação em conformidade com o precedente desta Turma (APELRE nº 0020438-83.2014.404.9999), onde consignado que: "A interrupção da prescrição deve ser contada de forma retroativa à data do ajuizamento da ação, não da citação, nos termos do art. 219, § 1º, do CPC, que não foi revogado tacitamente pelo art. 202, inc. I, do CC/02" (Relatoria Desembargador Federal Celso Kipper, DJe de 11/02/2015).
Da demonstração da atividade rural
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas.
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (integrantes do grupo familiar, proprietários de terras, arrendatários).
Assim, não se exige prova documental plena da atividade rural de todo período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas início de prova material (v.g. certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, ficha de atendimento no SUS, comprovante de matrícula em escola situada na zona rural, cadastros, etc.), que juntamente com a prova oral crie um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilitando um juízo de valor seguro acerca dos fatos a comprovar.
No caso de exercício de trabalho rural caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal.
Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp n. 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes a respeito do boia-fria":
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
Saliente-se que, no referido julgamento, o STJ manteve decisão deste Regional que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua CTPS, constando vínculo rural no intervalo de 01-06-1981 a 24-10-1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando pai ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Assim, as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural, o que não afasta a possibilidade de que sejam considerados documentos de períodos mais remotos.
Cumpre salientar, também, que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante.
Registro, por oportuno, que o Superior Tribunal de Justiça e esta Corte já pacificaram o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. Nesse Sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. BOIA-FRIA. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A questão do recurso especial gira em torno do reconhecimento do direito à aposentadoria por idade, na condição de segurado especial boia-fria.
2. O Tribunal a quo ao afirmar ao afirmar que não há início razoável de prova material devidamente corroborada pela prova testemunhal, aplicou a jurisprudência do STJ consolidada no sentido de que: 1) a prova testemunhal deve ser conjugada com início de prova material; 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo art. 143 da Lei 8.213/91, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória.
3. A revisão do entendimento firmado pelo Tribunal a quo, que afirmou a inexistência de conjunto probatório harmônico acerca do efetivo exercício de atividade rural, encontra óbice na Súmula 7/STJ.
4. Agravo regimental não provido. (STJ, Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 390.932. Relator Ministro Mauro Campbell Marques. DJE: 22-10-2013, grifo nosso)
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. SALÁRIO-MATERNIDADE. PRESCRIÇÃO. SEGURADA BOIA-FRIA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES.
1. Não deve ser acolhida a prejudicial de prescrição se entre o nascimento e o ajuizamento da ação, uma vez que não havendo prévio requerimento administrativo, não se passaram cinco anos.
2. Demonstrada a maternidade e a qualidade de segurada especial, mediante início razoável de prova testemunhal, durante período equivalente ao da carência, é devido o salário-maternidade.
3. Esta Corte já pacificou o entendimento de que o trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. (TRF4, Apelação Cível nº 0017780-28.2010.404.9999. Relatora: Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida. DJE: 21-05-2014, grifo nosso)
Do caso concreto, o juízo "a quo" fundamentou sua decisão da seguinte maneira:
"(...) Na espécie, tem-se que a autora alcançou o requisito etário em 05/08/2010, quando completou 55 anos, razão pela qual deveria comprovar o labor rural equivalente à carência nos 174 meses imediatamente anteriores, ou seja, de 1996 a 2010, ou mesmo de 1998 a 2012 (requerimento administrativo).
Contudo, conforme documento de seq. 27.2 (p. 207), a autora exerceu atividade urbana devidamente registrada de 03/03/2003 a 28/11/2009, o que impede a concessão do benefício pretendido diante do não preechimento de seus requisitos.
Consigne-se a impossibilidade de avaliação de aposentadoria no forma do artigo 48, §3°, Lei de Benefícios, conhecida como híbrida ou mista, já que não implementado o requisito etário, que é de 65 anos para homem e 60 para mulher.
Nesse sentido:
ART. 48, § 3º, DA LBPS. IMPOSSIBILIDADE. FALTA DE IDADE MÍNIMA.
1. Não é possível, em caso de aposentadoria por idade rural, dispensar a necessidade de implementação simultânea dos requisitos de idade e trabalho durante o interregno correspondente à carência, uma vez que o benefício, no caso, não tem caráter atuarial, e não se pode criar regime híbrido que comporte a ausência de contribuições e a dispensa do preenchimento concomitante das exigências legais.
2. A descontinuidade prevista no § 2º do art. 48 da LBPS não abarca as situações em que o trabalhador rural para com a atividade rural por muito tempo e depois retorna ao trabalho agrícola, uma vez que dispõe expressamente que a comprovação do labor rural deve-se dar no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
3. Não contando a parte autora com 65 anos ao tempo do ajuizamento da demanda, descabe averiguar a possibilidade de aplicação do caput ou do § 3º do art. 48 da LBPS."
Não obstante, tendo em vista que o reconhecimento do labor rural constitui condição necessária ao deferimento da aposentaria possível, tem-se que a declaração de atividade rural e a consequente determinação de sua averbação administrativa, não configuram julgamento extra petita.
Veja-se:
"[...] 4. Não alcançando o requisito carencial, não faz jus, a demandante, à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, sendo mister, entretanto, a averbação do labor rural certificado, não havendo falar em decisão extra-petita, uma vez que minus daquele pedido. 5. Tendo em vista a sucumbência recíproca e equivalente, ficam os honorários advocatícios compensados entre as partes. [...]"
Assim, considerando que o pedido objetiva o reconhecimento do período de 1967 a 1976, 1977 a 1992, 2000 a 2002 e 2010 a 2012, e diante das premissas acima elencadas, imperioso o reconhecimento de labor rural pela autora a partir de seus 12 (doze) anos de idade (05/08/1967) até a competência 06/1992.
Isto ocorre porque laborou a autora em regime de economia familiar, visto que trabalhou primeiramente com seu pai e posteriormente com seu marido, apresentando início de prova material suficiente a tanto, especialmente pelos seguintes documentos: i) Contrato de Parceria Agrícola entre Irineu Trevisan e Arlindo Ortiz, com prazo de 2 anos e início em 01/10/1971 (p. 44); ii) Certidão de Casamento, datada de 04/06/1977, constando a profissão do marido da autora como agricultor (p. 24); iii) Certidão de Nascimento de filho, datada de 16/05/1978, na qual consta a profissão do cônjuge da autora como agricultor (p. 51); iv) Certidão de Nascimento de filho, datada de 07/12/1981, na qual consta a profissão do cônjuge da autora como lavrador (p. 52); v) Contrato de Parceria Agrícola entre firmado entre o sogro, Januário Gaspar, e o esposo, Moacir Gaspar, com prazo de 03 (três) anos, a partir de 30/09/1983 (p. 53); vi) diversas notas fiscais/ recibos de venda de café de 1985 a 1991.
Deixa-se de elencar todos os documentos apresentados, eis que já convencido o juízo, evitando-se, dessa forma, repetição desnecessária.
Assevere-se que o diminuto início de prova documental com relação ao primeiro período foi perfeitamente corroborado pela prova oral, inclusive pessoal, sendo que a autora disse que trabalhava com seu pai no sítio da "Perobinha", pertencente ao seu tio, e que depois disso foi trabalhar no sítio de Irineu Trevisan, ficando até 1977, quando casou e se mudou para o sítio do sogro.
A testemunha do autor, Izidório, afirmou que conheceu a autora no sítio da "Perovinha", há muito tempo, que ficava perto de Japurá, em 1962 "por aí" não se lembrando até quando, mas que foi até se mudar para o sítio do Irineu Trevisan, indo morar, posteriormente, com o sogro e que a via trabalhando na roça.
A outra testemunha, Joana, afirmou que conheceu a autora no sítio do Irineu Trevisan, a qual trabalhava com sua família e que isso foi na década de 70. Ainda, aduziu que depois a autora se mudou para o sítio do sogro, tendo perdido contato após nova mudança.
Ademais, não seria crível que a autora tivesse laborado por tanto tempo em meio rural após seu casamento, período farto de provas documentais, mas não o fizesse anteriormente, quando morava com seus pais.
Dessa forma, diante da riqueza da prova testemunhal, a qual se coaduna com o depoimento pessoal da autora, deve a eficácia probante do contrato de 1971 ser estendida para menos, até 1967, e para mais, até 1977, a partir de quando existentes mais documentos.
Quanto ao termo final, partindo-se da afirmação da autora de que mudou para Umuarama em 1992, do registro de seu marido na Viação Umuarama em 24/07/1992 (p. 206) e do recibo de venda de café datado de 10/12/1991 (p. 124), deve ser fixado como 06/1992 (competência imediatamente anterior ao registro do marido), preenchendo-se essa pequena lacuna com aplicação do princípio do in dubio pro misero, já que presumível a continuidade do trabalho rural desempenhado até dezembro no começo do ano posterior.
Por fim, não se reconhecem os períodos de 2000 a 2002 e 2010 a 2012 por completa falta de prova, tanto documental quanto testemunhal. No primeiro, supondo-se que a autora ainda morava em Umuarama com seu marido, o qual somente se desligou em 14/11/2011, constata-se uma incongruência com o contido na inicial de que laborou, nesse período, na propriedade do sogro em Japurá. No segundo, as testemunhas afirmaram que vêem a autora colhendo acerola, mas isso quando passam por ali (pelo sítio), não havendo, portanto, prova da periodicidade com que o labor é exercido.
De qualquer forma, à ausência de início de prova material, impossível a admissão de prova exclusivamente testemunhal, a qual, inclusive, inocorreu com relação a esses períodos.
No tocante aos efeitos do reconhecimento, ressalve-se que o tempo de serviço anterior a novembro de 1991 será computado independentemente do recolhimento de contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência (art. 55, § 2°, Lei 8.213/1991 combinado com os art. 60, X e art. 123, ambos do Decreto 3.048/1999), ao passo que os períodos posteriores somente serão aproveitados para os benefícios elencados no artigo 39, inciso I, da Lei nº 8.213/1991 (aposentadoria por idade ou por invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão ou pensão e auxílio-acidente), sendo vedado o aproveitamento para os demais casos, notadamente aposentadoria por tempo de serviço, sem o recolhimento das contribuições facultativas (art. 39, II).
Confira-se o teor da Súmula 272, STJ: "O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas."
De rigor, pois, a procedência parcial da demanda. (...)"
Assim, no ponto de a parte autora não ter apelado da referida decisão de 1ª instância, sendo devidamente intimada, e logo após, apresentando contrarrazões ao recurso de apelação do INSS (confirmando que seja mantida a sentença do juízo "a quo"), o caso em questão nos autos não pode ter solução diversa da conferida pelo magistrado singular.
Em suma, não sendo devida a aposentadoria pleiteada, fica reconhecido, em razão da prova dos autos, o tempo rural de 08/1967 a 06/1992.
Tal período, pois, deve ser averbado, para fins de futura concessão de benefício previdenciário.
Sendo recíproca e proporcional a sucumbência, devem os honorários advocatícios, ora fixados em R$ 788,00, ser suportados de forma equivalente pelas partes, e compensados.
As custas devem ser suportadas na mesma proporção, estando suspensa, contudo, a parte concernente à autora, por ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido (CPF 609.690.089-53), a ser efetivada em 45 dias.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, e manter a decisão do juízo "a quo", determinando o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do tempo reconhecido.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7501738v6 e, se solicitado, do código CRC 442AB73. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 12/06/2015 16:15 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/06/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0019670-60.2014.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00099585920128160069
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | SHIRLEI SILVA GASPAR |
ADVOGADO | : | Jaqueline Luiz |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 2A VARA DA COMARCA DE CIANORTE/PR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/06/2015, na seqüência 180, disponibilizada no DE de 27/05/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, E MANTER A DECISÃO DO JUÍZO "A QUO", DETERMINANDO O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À AVERBAÇÃO DO TEMPO RECONHECIDO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7614606v1 e, se solicitado, do código CRC 4FD40D83. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 11/06/2015 06:49 |
