Apelação Cível Nº 5001242-29.2016.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
APELANTE: ISABEL NARCISA SOARES (AUTOR)
ADVOGADO: JAIR WEBER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelo interposto pela autora, de sentença proferida em 16/03/2017, que julgou improcedentes os pedidos restabelecimento de benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural (NB 41/136.503.022-6) e de danos morais.
Sustenta que na entrevista realizada junto ao INSS a autora informou claramente que residiu temporariamente com o filho em São João Batista por pouco mais de três meses por motivo de saúde, e que nesta data labutava em terras de comodato em Santo Antônio Sudoeste/PR onde o proprietário era Adolfo Samuel Fritche e onde plantavam feijão, milho, soja, etc trabalhando em forma de regime de economia familiar. Afirma que a recorrente é pessoa humilde, “da roça” e buscando orientação junto ao sindicato da categoria, lá recebeu a informação de que poderia realizar o requerimento através daquele órgão, bastando amealhar os documentos devidos. E que, ademais, instaurado contra si inquérito, o Delegado e o Representante do Parquet, entenderam que a Recorrente efetivamente exerceu atividade rural, sendo que este último requereu o seu arquivamento por entender que: “Como se percebe, os fatos realmente existiram, a atividade rural existiu, só que formalmente apresentada de forma incorreta". No tocante ao pedido de dano moral, defende que a aposentadoria tem caráter eminentemente alimentar e isto somente já seria suficiente para caracterizar o abalo moral, e que ademais, teve o infortúnio de ter um inquérito policial instaurado contra si, o que ultrapassa em muito um mero aborrecimento cotidiano. REquer seja provido o apelo para reformar a sentença recorrida, no sentido de acolher o pedido inicial, qual seja, o restabelecimento do benefício previdenciário c/c pedido de indenização por danos morais, por ter cancelado o benefício da Recorrente de forma indevida.
Com as contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
A autora ajuizou a presente ação com o objetivo de ver restabelecido o benefício de aposentadoria por idade rural (NB 41/136.503.022-6), que foi suspenso em 22 de setembro de 2010, por terem sido identificadas irregularidades na sua concessão.
Aduz ter ocorrido erro exclusivo do INSS. Pleiteou, também, a condenação da Autarquia em danos morais.
Restabelecimento do benefício/Legalidade do ato administrativo de cancelamento
Observo que, embora a autora contasse 55 anos na DER, restou evidenciado das testemunhas inquiridas e do próprio depoimento da autora, que esta já se encontrava afastada há anos da atividade rural em razão de doença incapacitante, com seguidas internações hospitalares no período, chegando a apresentar um quadro de paralisia.
A autora afirma que trabalhou desde pequena na roça que parou quando ficou muito doente, quando deu a paralisia, que passou mais de vinte anos muito doente, quase toda a semana era internada. Nasceu em Tenente Portela, depois veio para Santa Catarina, para a localidade de Dourados, em Itapiranga, quando já estava casada. Ficou lá uns 9 anos e depois foi para Belmonte, onde continuou trabalhando na roça com o marido e os filhos. Trocavam dias com os vizinhos. Vendiam parte da produção. Ficou quase vinte anos em Belmonte e depois veio para Tijucas para fazer tratamento de saúde. Trabalhou até 2003, aproximadamente. Em Tijucas só morava com o filho, fazendo tratamento de saúde. O marido continuou na roça. Que quando completou a idade foi no Sindicato, porque onde moravam todos os agricultores iam no Sindicato encaminhar a aposentadoria, onde lhe disseram que tinha os documentos para se aposentar, mas que só faltava vir as notas de onde o marido estava trabalhando para completar a documentação. Que eles mesmos fizeram o pedido das notas pro Sindicato da localidade o marido estava trabalhando. Que o marido se aposentou por invalidez. Sempre foi agricultor.
De outra parte, nenhumas das 3 (três) testemunhas inquiridas em juízo, vizinhas da autora no município de Belmonte/SC (evento 37 - VIDEO3/5), foram capazes de esclarecer por quanto tempo a autora laborou na agricultura em regime de economia familiar.
A testemunha Abrelino Caliogni afirmou que conhece a autora de Belmonte, onde foi vizinho da autora e do esposo. Que eles trabalhavam na roça. Plantavam milho, fumo, de tudo um pouco. Que ela ficou lá uns 8-9 anos. Que não tinham empregados. O marido da autora pagava algum peão quando precisava.
A testemunha Romilda Steffens Caliogni afirmou que era vizinha da autora em Belmonte. Que eles tinham roça, plantavam fumo. Ajudava a autora nas colheitas de fumo porque a autora era muito doente. Trabalhava apenas a família. Eram cinco filhos. Trocavam dias na época de colheita. Não sabe que idade ela tinha quando foi pra lá, mas que a autora teve uns 2-3 filhos naquela localidade. Que a autora era muito doente. Que a autora tinha um filho que morava em Florianópolis e de vez em quando ia pra lá pra se tratar. Trabalhou na roça até se mudar para Florianópolis. Plantavam milho, fumo, feijão, tinha umas vaquinhas. Tinham 8 alqueires de terra. Quando venderam as terras, venderam para a filha da testemunha.
A testemunha Arciso Anetto Fiori afirmou que a autora trabalhava na roça com a família na roça em Belmonte, plantando soja, milho, feijão e fumo e tinham algumas galinhas. Vendiam soja, o milho que sobrava. Não tinham empregados. Às vezes, na época de colheita trocavam dias. Morou perto deles de 1985 a 2000, e que eles ficaram lá, mas não sabe quando saíram de lá. Que saíram de lá porque os filhos já estavam trabalhando em outros lugares. Acha que ela veio pra Florianópolis.
De modo que, na DER do NB 41/136.503.022-6, a autora não mais era segurada especial, sendo pacífico o entendimento que o exercício da atividade rural pode ser descontínuo, mas que o segurado especial tem de estar trabalhando no campo quando completar a idade mínima para obter a aposentadoria rural por idade, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, já preencheu de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos - carência e idade. (STJ, REsp 1354908, 1ª Seção, Tema 642/recurso repetitivo).
Ademais, teriam sido apuradas as seguintes irregularidades:
a) Que o Sindicato Rural de São João Batista, declarou incorretamente a declaração de exercício da atividade rural entre os anos de 1989 a 2002 na cidade de Belmonte/SC e do período de 2002 a 2005, na cidade de Santo Antônio do Sudeste/PR. Sendo que as localidades não fazem parte da jurisdição de atuação dessa entidade, portanto não produz o efeito esperado;
Ora, o município de São João Batista/SC localiza-se no Vale do Rio Tijucas, distante do município de Belmonte/SC, situado no extremo oeste de Santa Catarina, e igualmente distante do município de Santo Antônio do Sudoeste/PR, localizado no vizinho estado do Paraná.
Desse modo, ambas as declarações de atividade rural, subscritas pelo Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São João Batista com tal conteúdo (evento 1 - PROCADM8 - fls. 2/3) não poderiam ser admitidas como prova do labor rural em regime de economia familiar, porquanto expedidas de forma irregular.
b) No inicio da vigência do contrato de comodato , fls. 05/06 , fixada em 18/10/2004, de acordo com declaração prestada em entrevista as fls. 07, a interessada encontrava-se residindo em São João Batista/SC, distante da cidade Santo Antônio do Sudoeste/PR, localização do imóvel rural objeto do citado contrato;
O contrato em questão, celebrado em 18 de outubro de 2004 na localidade de Santo Antônio do Sudoeste/PR, igualmente foi apresentado pela segurada no momento do requerimento do benefício (evento 1 - PROCADM8 - fls. 5/6), sendo que naquele mesmo ano de 2004, ao ser entrevistada na via administrativa, declarara residir em São João Batista/SC (evento 1 - PROCADM8 - fls. 27/28).
De outro lado, ao prestar seu depoimento pessoal em juízo (evento 37 -VÍDEO2) a autora deixou claro que mudou-se, de forma direta, de Belmonte/SC para São João Batista/SC quando ficou doente, inclusive acometida à época de paralisia, não fazendo qualquer referência a trabalho na lavoura ou a residência no estado do Paraná.
Diante de tal realidade, também o contrato de comodato em referência não poderia ser admitido como prova do labor rural em regime de economia familiar, já que não existem evidências nos autos indicando que em alguma fase de sua vida a autora tenha, efetivamente, mantido vínculo residencial ou de trabalho com o município de Santo Antônio do Sudoeste/PR.
c) O documento de fls. 08, nota fiscal n. 1375, emitido em 12.01.2005, no mínimo é suspeita , conforme declaração da própria interessada, nesta data já residia em São João Batista/SC, e o endereço constante no corpo da nota é Santo Antonio do Sudeste/PR;
A nota fiscal em destaque encontra-se juntada no processo administrativo (evento 1 - PROCADM8 - fl. 8), sendo emitida em Santo Antônio do Sudoeste/PR no ano de 2005, quando a autora, como aludido no item anterior, residia em Santa Catarina, no município de São João Batista, onde fazia tratamento de saúde.
Aliás, no que concerne às demais notas fiscais e documentos oriundos do estado do Paraná, a autora alega em seu depoimento pessoal em juízo (evento 37 -VIDEO2) que lhe foram encaminhadas para a sua residência em Santa Catarina, aparentemente por orientação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São João Batista, de maneira que identicamente não poderiam ser tomadas como prova do labor rural em regime de economia familiar.
Em conclusão nesse ponto, tenho por caracterizada a irregularidade na concessão do benefício de aposentadoria por idade à autora, porquanto deferido com base em prova documental que não retratava a realidade do labor rural em regime de economia familiar na forma então reconhecida, não havendo como ser proclamada a nulidade do ato administrativo que cessou o benefício em destaque.
Assim, ainda que todas as testemunhas tenham sido inequívocas quanto ao exercício da atividade rural em regime de economia familiar, pela autora, resta evidente a irregularidade na concessão do benefício, porquanto à época do implemento do requisito etário, em 2005, não mais exercia a atividade rural (conforme reconheceu a própria autora), não sendo o caso de restabelecimento do mesmo.
Dano moral
Não merece acolhimento o pedido da parte autora, também, no tocante à condenação da Autarquia em indenização compensatória de danos morais. A cessação de sua aposentadoria ocorreu em sede de regular processo administrativo, no qual o INSS exerceu nada mais do que seu poder-dever de controle dos atos administrativos nos quais entenda ter havido ocorrência de ilegalidade. Outrossim, foram observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa, não havendo qualquer indício de que a segurada tenha sido desrespeitada nesse procedimento. Não se deve, enfim, confundir um parecer contrário aos seus interesses com uma humilhação caracterizadora de danos morais.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, restando suspensa a sua exigibilidade face à concessão da AJG (evento 4).
Ante o exposto, nos termos da fundamentação, voto por negar provimento ao apelo da autora.
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Apelação Cível Nº 5001242-29.2016.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
APELANTE: ISABEL NARCISA SOARES (AUTOR)
ADVOGADO: JAIR WEBER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CANCELAMENTO DEVIDO. dano moral. não caracterização.
1. Embora não se discuta que a autora tenha, por longa data exercido atividade rural, tendo restado comprovado que a autora não estava trabalhando no campo quando completou a idade mínima para obter a aposentadoria rural por idade ou quando do requerimento, correto o cancelamento do benefício. 2. A cessação da aposentadoria ocorreu em sede de regular processo administrativo, no qual o INSS exerceu nada mais do que seu poder-dever de controle dos atos administrativos nos quais entenda ter havido ocorrência de ilegalidade, tendo sido observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa. Não se deve, enfim, confundir um parecer contrário aos seus interesses com uma humilhação caracterizadora de danos morais.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 15 de agosto de 2018.
Documento eletrônico assinado por JORGE ANTONIO MAURIQUE, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000580596v4 e do código CRC 2bf51eaa.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/08/2018
Apelação Cível Nº 5001242-29.2016.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: ISABEL NARCISA SOARES (AUTOR)
ADVOGADO: JAIR WEBER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 15/08/2018, na seqüência 197, disponibilizada no DE de 27/07/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, por unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo da autora.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Votante: Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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