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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. TRABALHO URBANO DO CÔNJUGE. DESCONTINUIDADE. TRF4. 5006641-42.2020.4.04.9999

Data da publicação: 06/12/2022, 11:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. TRABALHO URBANO DO CÔNJUGE. DESCONTINUIDADE. 1. Tem direito à aposentadoria por idade rural a contar da data de entrada do requerimento administrativo, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que implementa os requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias. 2. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. 3. A extensão da propriedade é aspecto a ser considerado juntamente com o restante do conjunto probatório, não constituindo, individualmente, óbice ao reconhecimento da condição de segurado especial. 4. O fato de a esposa do autor ter exercido atividade urbana, com rendimento inferior a dois salários mínimos, não descaracteriza a sua condição de segurado especial. Precedentes desta Corte. 5. Havendo prova da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento por tempo significativo, que comprove que a parte autora passou a sobreviver da agricultura, deve ser admitido o direito à aposentadoria rural por idade com o cômputo de períodos anteriores descontínuos (artigos 24 e 143 da Lei n.º 8.213/91) para fins de implemento de carência. (TRF4, AC 5006641-42.2020.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 28/11/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006641-42.2020.4.04.9999/SC

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: NEREU DORVAL EGER

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

NEREU DORVAL EGER propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 04/04/2016, postulando a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural, a contar da data de entrada do requerimento administrativo (07/10/2015), mediante o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 1967 a 1985 e de 2001 a 2015.

Em 11/10/2019 sobreveio sentença (evento 36, OUT1), que julgou o pedido formulado na inicial nos seguintes termos:

Diante do exposto, julgo improcedente o pedido formulado na inicial, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código deProcesso Civil.

Não são devidos honorários advocatícios aos membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e da Advocacia Pública, haja vista que atuam em missão constitucional e são remunerados exclusivamente por subsídio, fixado de acordo com os critérios constitucionais, consoante arts. 37, 39, § 1º, I a III, e § 4º, 128, § 5º, II, ‘a’, 131, 134 e 135 da CRFB. De outro lado, tal importe não pode ser absorvido pelo ente público respectivo, porquanto se trata de parcela destinada apenas à remuneração de advogado particular, não remunerado pelos cofres públicos para tal atividade. No ponto, cabe declarar a inconstitucionalidade incidenter tantum do art. 85, § 19º, do CPC, porquanto tal preceito legal contém vício formal, considerando que só o Chefe do Executivo de cada esfera de governo pode disciplinar a remuneração de seus agentes, conforme art. 61, § 1º, II, 'a', da CRFB, bem como máculas materiais, notadamente, a uma, a remuneração honorária adicional a advogados públicos vem em contrariedade à mentalidade de preservação de interesse coletivo inerente à atuação dos agentes públicos, em ofensa aos princípios da moralidade e da eficiência estabelecidos do art. 37 da CRFB; a duas, implica desequilíbrio na fixação das remunerações das funções estatais, porquanto receberiam subsídio e parcela adicional não devida às demais carreiras jurídicas (inclusive membros do Poder Judiciário), em desrespeito ao art. 39, § 1º, I a III, da CRFB, e, a três, acarreta dupla remuneração, mediante subsídio estatal em parcela única e também indenização sucumbencial de fonte privada, em contrariedade ao art. 39, § 4º, e 135 da CRFB (cf. SCHULZE, Clenio Jair. ZANON JR, Orlando Luiz. Apontamentos sobre honorários advocatícios. In REDP. V. 16. Julho a dezembro de 2015, pp. 416-435, disponível em: http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/index).

A exigibilidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios está suspensa com relação à parte ativa, durante o prazo extintivo de 5 (cinco) anos, em face da concessão dos benefícios da Gratuidade da Justiça, nos termos dos arts. 98 a 102 do CPC e da Lei 1.060/1950.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Inconformada a parte autora interpôs recurso de apelação (evento 42, APELAÇÃO1), reiterando o pedido inicial. Subsidiariamente, pediu a concessão de benefício assistencial.

Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O(s) apelo(s) preenche(m) os requisitos legais de admissibilidade.

Da aposentadoria rural por idade

São requisitos para a concessão de aposentadoria rural por idade, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.

Quanto à carência, há regra de transição para os segurados obrigatórios previstos no art. 11, I,"a", IV ou VII: (a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".

Na aplicação da aludida tabela do art. 142, a quantidade de meses de exercício de atividade rural exigida é a correspondente ao ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).

Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.

Caso o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 05 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.

A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.

Atividade Rural em Regime de Economia Familiar

O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a apresentação de início de prova material, complementado por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas -, não sendo esta admitida exclusivamente, salvo caso fortuito ou força maior. Tudo conforme o art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91 e reafirmado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).

Nesse contexto probatório: (a) a lista dos meios de comprovação do exercício da atividade rural (art. 106 da Lei de Benefícios) é exemplificativa, em face do princípio da proteção social adequada, decorrente do art. 194 da Constituição da República de 1988; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral - ou com a autodeclaração rural -, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido; (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural (REsp. n.º 980.065/SP, DJU, Seção 1, 17/12/2007; REsp. n.º 637.437/PB, DJU, Seção 1, de 13/09/2004; REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19/12/2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).

Consideradas, contudo, as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental que abranja todo o período postulado, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal - ou, como já dito, pela autodeclaração rural -, nada impedindo que sejam contemplados documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem à conclusão pela existência e/ou continuidade da atividade rural.

Ademais, restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".

O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios, por sua vez, define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade familiar respectiva, via de regra, são formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros, ou seja, em nome daquele considerado o arrimo de família. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam-se em início de prova material do labor rural de outro, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".

Ainda, necessário salientar que a existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente, de modo a que se possa extrair do conjunto probatório a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não). Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica, por si só, a condição de empregador rural e consequentemente a descaracterização do regime de economia familiar, como se pode observar da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15/04/1971.

Importante ainda ressaltar que o fato de um dos membros do grupo familiar exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" à descaracterização da condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII, do art. 11, da Lei n.º 8.213/91 (na redação anterior à vigência da Lei nº 11.718/2008), é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido.

No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12/03/2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo recentemente a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11/03/2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo tal questão maiores digressões.

Períodos rurais controvertidos

O autor NEREU DORVAL EGER, nascido em 23/03/1955, filho de Edelberto Eger e Horendina Schiestl Eger (evento 1, CERT4), pleiteia o reconhecimento do exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 23/03/1967 a 12/01/1985 e de 01/01/2001 a 07/10/2015.

Para comprovar o efetivo trabalho agrícola, foram trazidos aos autos alguns documentos, dentre os quais se destacam:

- registro de imóvel rural em nome do genitor do demandante, qualificado como agricultor, datado de 16/08/1977, com data de aquisição em 11/10/1954 (evento 1, DEC5, fls. 5/6);

- registro de imóvel rural constando o pai do autor, qualificado como fruticultor, como adquirente em 03/07/1991 (evento 1, DEC6, fls. 1/3);

- notas e contranotas fiscais de produtor rural em nome do pai do autor, referentes aos anos de 1972, 1978, 1984 e 1990 (evento 1, DEC7, fls. 5-7; evento 1, DEC8);

- ficha de inscrição no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bom Retiro/SC, em nome do autor, constando data de admissão em 09/10/1973 e registro de pagamento de mensalidades nos anos de 1973 a 1982 (evento 1, DEC7, fls. 1/2);

- recibos de pagamentos feitos pelo autor ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bom Retiro/SC nos anos de 1977, 1978, 1980 e 1982 (evento 1, DEC7, fls. 3/4);

- nota promissória rural assinada pelo demandante, datada de 20/11/1986 (evento 8, DEC6, fl. 6);

- certidões de nascimento dos filhos, lavradas em 25/10/1995 e 25/04/2000, nas quais o autor foi qualificado como agricultor (evento 8, DEC4, fls. 4/5);

- contrato de parceria agrícola entre o autor e seu pai para exploração de 5 hectares no intevalo de 28/08/2007 a 28/08/2017 (evento 1, DEC10, fl. 6);

- carteira social emitida pelo STR de Bom Retiro/SC, em nome do demandante, com data de admissão em 16/01/2009 (evento 1, DEC12, fl. 2);

- contrato de arrendamento rural firmado em 01/08/2012 pelo prazo de 12 meses, constando o demandante e sua esposa, qualificados como agricultores, como arrendatários de área com 5 hectares (evento 1, DEC10, fls. 5 e 7);

- escritura pública de inventário e partilha, onde consta a cota-parte do autor na herança deixada por seus genitores, datada de 13/02/2014 (evento 8, DEC8, fls. 1/3);

- declaração de aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF, datada de 29/05/2014 (evento 1, DEC11, fl. 3);

- declaração do ITR relativa ao exercício de 2015, onde consta o autor como condômino de imóvel rural, com área total de 14 hectares, localizado no município de Bom Retiro (evento 1, DEC11, fl. 1);

- notas fiscais de produtor em nome da esposa e/ou do autor referentes aos anos de 2005, 2007, 2009, 2011, 2012, 2014 e 2015 (evento 1, DEC9 e evento 1, DEC10, fls. 1-4).

As testemunhas inquiridas em audiência judicial (evento 23, TERMOAUD1), por sua vez, confirmaram o trabalho rural do autor desde a infância, juntamente com os pais e os irmãos, em terras próprias, plantando milho, feijão, batatinha e maçã. Afirmaram que a família não possuía outra fonte de renda, realizando a atividade sem o auxílio de empregados e com o uso de um trator. Aduziram que, após seu casamento, o demandante permaneceu trabalhando na agricultura com a esposa na localidade de Irapuá, em Bom Retiro, bem como que, recentemente, o autor mudou-se para a cidade, porém continuou trabalhando na lavoura (evento 24, VIDEO2, evento 24, VIDEO3 e evento 24, VIDEO4).

Consoante se vê, portanto, os documentos apresentados constituem início razoável de prova material do labor rural nos períodos indicados porque denotam a vinculação da parte autora e de sua família ao meio rural e, para complementá-los, foram ouvidas testemunhas, cujos depoimentos confirmaram de modo coerente e seguro o desempenho de atividade agrícola, em regime de economia familiar, nos lapsos temporais em questão.

De resto, não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar, tampouco se exige que os documentos apresentados estejam todos em nome do próprio parte autora, vez que a atividade rural pressupõe a idéia de continuidade e não de eventualidade, sendo ilógico exigir um documento para cada ano trabalhado.

Alegou o INSS que, não obstante o demandante afirme ter laborado no meio rural com seus pais no período de 1967 a 1985, seu pai não era segurado especial, mas sim comerciário. Com efeito, observa-se do extrato do Plenus juntado aos autos, que ele foi beneficiário de aposentadoria por idade, na condição de comerciário/contribuinte individual, no período de 22/06/1984 a 24/08/2011, com remuneração de aproximadamente um salário mínimo na competência 08/2011 (evento 1, DEC13, fl. 6). No entanto, por se tratar de uma família numerosa, formada por pai, mãe e dez filhos, é evidente que o pai, somente com os ganhos provenientes do alegado trabalho urbano, não poderia sustentar uma família composta de doze pessoas, ficando claro, por conseguinte, que a maior parte da renda para o sustento dessa família advinha, sem dúvida, do trabalho campesino.

Além disso, a prova testemunhal é firme no sentido de que o autor trabalhava em regime de economia familiar, juntamente com os pais e os irmãos. Depreende-se, ainda, das notas fiscais juntadas aos autos (evento 1, DEC7, fls. 5-7; evento 1, DEC8), que o faturamento não era elevado, a ponto de caracterizar o exercício da agricultura na forma empresarial.

Registre-se, por oportuno, que nos casos em que a forma de exploração for suficientemente esclarecedora, o tamanho da propriedade rural não pode ser utilizado como empecilho ao reconhecimento do labor rural exercido em regime de economia familiar.

No que tange ao período de 2001 a 2015, alegou o INSS que o demandante não pode ser considerado como segurado especial, em razão de possuir empresa, cujo cadastro ainda está aberto junto à Receita Federal (evento 8, DEC4, fl. 10), bem como pelo fato de sua esposa possuir vínculos urbanos (evento 8, DEC3).

Em entrevista rural, realizada na via administrativa em 15/12/2015, o autor afirmou "que trabalhou com os pais desde pequeno até 1985 quando abriu uma empresa de venda de maçãs; (...) que na empresa tinha um empregado direto, e em torno de três diaristas durante uns três meses por ano; que em 2001 fechou a empresa e retornou para a atividade rural; que tentou dar baixa na empresa em 2007, contudo devido a dívida continua em aberto até os dias de hoje" (evento 1, DEC12, fls. 3/4).

Importa referir que no CNIS do autor constam recolhimentos como autônomo no período de 01/06/1993 a 30/06/1993, como empresário/empregador nos períodos de 01/07/1993 a 31/10/1993, 01/12/1993 a 30/04/1994, 01/07/1994 a 31/08/1994, 01/10/1994 a 30/11/1994, 01/02/1995 a 31/03/1995, 01/05/1995 a 31/07/1995, 01/09/1995 a 30/09/1996 e 01/03/1999 a 31/10/1999, e como contribuinte individual no período de 01/04/2003 a 30/04/2003 (evento 1, DEC12, fl. 6), apenas esse último no período em que pede o reconhecimento de atividade rural.

Em consulta ao CNIS da esposa do autor, verifica-se que, após o casamento, ela manteve vínculos como empregada nos períodos de 01/04/2002 a 04/04/2005, na função de agente comunitário de saude, com remuneração de um salário mínimo, e de 17/08/2009 a 04/2016, na função de agente de defesa ambiental, com remuneração inferior a dois salários mínimos.

O fato do cônjuge da parte autora ter vínculo urbano, por si só, não desqualifica o trabalho rural por ela exercido como segurada especial em regime de economia familiar.

Nesse sentido, os seguintes julgados desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. SÚMULA 149 DO STJ. TUTELA ESPECÍFICA. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. (...) O fato de o marido da requerente ter exercido atividade urbana, por si só, não descaracteriza a condição de segurada especial da autora. O fato de a parte autora residir em perímetro urbano não é óbice à concessão de benefício de natureza rural, desde que reste demonstrado o efetivo exercício de atividades agrícolas. (...) (AC 0011453-91.2015.404.9999, 5ª Turma, Rel. Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, D.E. 04/04/2017)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. LABOR URBANO DE INTEGRANTE DO NÚCLEO FAMILIAR. (...). 3. "A circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto". Súmula 41 da TNU (DJ 03/03/2010). (...). (APELREEX 0000535-62.2014.404.9999, 6ª Turma, Rel. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, D.E. 10/10/2016)

Cabe referir que o e. Des. Federal Celso Kipper, na fundamentação do voto que proferiu na AC 5008361-74.2012.404.7202, expõe estar consagrada na jurisprudência desta Casa que são aceitáveis, a título de remuneração percebida pelo cônjuge de segurado especial, sem descaracterizar tal condição, valores equivalentes a dois salários mínimos, in verbis:

(a) reconhece-se a atividade agrícola desempenhada na condição de segurado especial quando os rendimentos do cônjuge não retiram a indispensabilidade daquela para a subsistência da família (normalmente rendimentos que não superem o valor de dois salários mínimos): Apelação Cível Nº 0007819-29.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, sessão de 14-09-2011, D.E. 26-09-2011; Apelação Cível Nº 0006403-26.2011.404.9999, 6ª Turma, Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, por unanimidade, sessão de 10-08-2011, D.E. 22-08-2011; AC 0000314-84.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, sessão de 08-06-2011, D.E. 16-06-2011; AC 0014562-55.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator Luís Alberto D"azevedo Aurvalle, sessão de 09-11-2011, D.E. 21-11-2011; TRF4, AC 0008495-11.2010.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, sessão de 12-07-2011, D.E. 21/07/2011 (6ª T, julgado em 21/05/2014).

A propósito, os seguintes precedentes deste Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. LABOR URBANO DO CÔNJUGE. RENDIMENTO SUPERIOR A DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. NÃO CUMPRIMENTO DO PERÍODO DE CARÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA. 1. O salário maternidade é devido à trabalhadora que comprove o exercício da atividade rural pelo período de 10 meses anteriores ao início do benefício, este considerado do requerimento administrativo (quando ocorrido antes do parto, até o limite de 28 dias), ou desde o dia do parto (quando o requerimento for posterior). 2. Consoante orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Resp n. 1.321.493-PR, aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário"), sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. 3. No caso, a parte autora não demonstrou, através de início de prova material, que exerceu a atividade rurícola, motivo pelo qual não há como conceder o benefício pleiteado. 4. Ademais, descaracterizada a indispensabilidade do labor rural, face ao labor urbano do marido com rendimento superior a dois salários mínimos. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 5040120-65.2016.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, por unanimidade, juntado aos autos em 05/06/2017)

PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. LABOR RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADO. ATIVIDADE URBANA DO COMPANHEIRO. RENDIMENTO SUPERIOR A DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS. 1. O salário maternidade é devido à trabalhadora que comprove o exercício da atividade rural pelo período de 10 meses anteriores ao início do benefício, este considerado do requerimento administrativo (quando ocorrido antes do parto, até o limite de 28 dias), ou desde o dia do parto (quando o requerimento for posterior). 2. O fato de o marido/companheiro da autora ter exercido atividade urbana não constitui óbice, por si só, ao enquadramento da autora como segurada especial, desde que demonstrado nos autos que a indigitada remuneração não era suficiente para tornar dispensável o labor agrícola desempenhado pela esposa ou pelo núcleo familiar. Contudo, no caso dos autos descaracterizada a indispensabilidade do labor rural da autora, em face dos rendimentos provenientes do labor urbano do marido serem superiores a dois salários mínimos. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001091-59.2017.404.9999, 6ª Turma, (Auxílio Vânia) Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR, por unanimidade, D.E. 15/09/2017, publicação em 18/09/2017).

Outrossim, o fato de a esposa do requerente ter exercido atividade urbana não afasta o direito invocado na inicial, nem é relevante para o caso em comento, porque foram apresentados documentos não só no nome do cônjuge, mas também em nome próprio no referido período.

Dessa forma, entendo que restou comprovado o trabalho rural em regime de economia familiar nos períodos de 23/03/1967 (data em que completou 12 anos de idade) a 12/01/1985 (data de abertura da empresa) e de 09/04/2005 (data da primeira nota fiscal de produtor após o encerramento das atividades da empresa) a 07/10/2015.

Quanto à descontinuidade, adoto recente entendimento da 5ª Turma deste Regional:

"(...)

Com relação à descontinuidade da atividade rural, o entendimento adotado pela Terceira Seção deste Regional foi o seguinte:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CARÊNCIA. ATIVIDADE RURAL. DESCONTINUIDADE. VIOLAÇÃO MANIFESTA À NORMA JURÍDICA. INOCORRÊNCIA. SUCEDÂNEO RECURSAL. 1. Em se tratando de ação rescisória, o proveito econômico obtido pela parte autora corresponde, geralmente, ao valor atribuído à causa originária, corrigido monetariamente. Contudo, se o processo já estiver em fase de cumprimento de sentença, é o montante da execução questionado na rescisória que baliza o valor da causa. 2. A descontinuidade permite o aproveitamento de períodos intercalados de atividade rural, com ou sem a perda da qualidade de segurado, para integrar a carência necessária à concessão de aposentadoria por idade dos segurados especiais. Além disso, o afastamento da atividade campesina não é considerado fator determinante, desde que no período imediatamente anterior ao requerimento ostente a condição de segurado especial. 3. É vedado fazer reviver discussão atinente a matéria já enfrentada na decisão combatida, restando desautorizado seu reexame pela via eleita, sob pena de convolar-se essa numa nova apelação, situação sabidamente vedada pelo ordenamento pátrio, que estabelece a inadequação da via rescisória nas hipóteses em que se pretenda substituir recursos que não foram oportunamente interpostos. 4. Não serve a ação rescisória como meio de correção da injustiça na apreciação do conjunto probatório, nem para o reexame desse. (TRF4, ARS 5026650-20.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 04/06/2019) (grifei)

Essa diretriz deve ser prestigiada, não somente pelo fato de ter sido o posicionamento vencedor em julgamento recente da Terceira Seção, mas porque melhor se coaduna aos princípios constitucionais que regem a relação dos segurados com a Administração Pública.

De fato, não se pode restringir a interpretação administrativa, estabelecida na IN 45/2010, invocando a legalidade estrita por força da aplicação analógica do artigo 24, parágrafo único, da LBPS, diante da incidência dos princípios da boa fé e da segurança jurídica, que asseguram ao cidadão, uma vez observado o regramento administrativo, o respeito aos efeitos prometidos pela própria Administração.

Ademais, milita em favor dessa interpretação não somente o artigo 145 da referida IN, como também os artigos 215 e 216 desse instrumento normativo, que admitem até mesmo a possibilidade de requerimento de aposentadoria especial mesmo que o segurado esteja em atividade urbana, desde que dentro de igual período previsto para a graça. Mais ainda, se estiver voltado para as lides rurais.

Transcrevo:

Art. 215. Para fins de aposentadoria por idade prevista no inciso I do art. 39 e art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 dos segurados empregados, contribuintes individuais e especiais, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e no inciso VII do art. 11 do mesmo diploma legal, não será considerada a perda da qualidade de segurado os intervalos entre as atividades rurícolas, devendo, entretanto, estar o segurado exercendo a atividade rural ou em período de graça na DER ou na data em que implementou todas as condições exigidas para o benefício.

Parágrafo único. Os trabalhadores rurais de que trata o caput enquadrados como empregado e contribuinte individual, poderão, até 31 de dezembro de 2010, requerer a aposentadoria por idade prevista no art. 143 da Lei 8.213, de 1991, no valor de um salário mínimo, observando que o enquadrado como segurado especial poderá requerer o respectivo benefício sem observância ao limite de data, conforme o inciso I do art. 39 da Lei nº 8.213, de 1991.

Art. 216. Na hipótese do art. 215, será devido o benefício ao segurado empregado, contribuinte individual e segurado especial, ainda que a atividade exercida na DER seja de natureza urbana, desde que o segurado tenha preenchido todos os requisitos para a concessão do benefício rural previsto no inciso I do art. 39 e no art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991 até a expiração do prazo para manutenção da qualidade, na atividade rural, previsto no art. 15 do mesmo diploma legal e não tenha adquirido a carência necessária na atividade urbana.

Ou seja: a compreensão administrativa do artigo 143 pode ser entendida como interpretação sistemática da LBPS, em que se conjuga a letra do artigo 143 com o artigo 15 da mesma lei, cujo resultado hermenêutico pode ser assim explicitado:

Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no perío]do imediatamente anterior ao requerimento do benefício, (OBSERVADO O PERÍODO DE GRAÇA), em número de meses idêntico à carência do referido benefício.

No caso em tela, o desempenho de atividade rural no último período rural reconhecido, que vai de 2007 a 2018, evidencia que o autor de fato voltou a viver exclusivamente do trabalho rural, na condição de segurado especial. Concretamente demonstrada, pois, a reaquisição da condição de segurado especial, de modo que viável a concessão do benefício, haja vista que, como também comprovado nos autos, em época pretérita (de 1975 a 1979) a demandante desempenhou atividade rural nos termos exigidos. Acrescente-se a isso o fato de que não constam registros de vínculos empregatícios de quaisquer natureza no CNIS da autora. A soma dos interregnos comprovados excede o tempo equivalente à carência, na data do implemento do requisito etário ou da DER.

Da análise do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem início de prova material e que a prova testemunhal é precisa quanto ao exercício da atividade rural nos períodos postulados de carência, razão porque a sentença deve ser reformada pela Turma.

(...)"

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCONTINUIDADE. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Satisfeitos os requisitos legais de idade mínima e prova do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência, é devida a aposentadoria rural por idade. 2. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal. 3. O fato de o marido da autora ter exercido atividades urbanas e perceber aposentadoria por tempo de contribuição, em valor inferior a dois salários mínimos, não descaracteriza a sua condição de segurada especial. Precedentes desta Corte. 4. Havendo prova da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento por tempo significativo, que comprove que a parte autora passou a sobreviver da agricultura, deve ser admitido o direito à aposentadoria rural por idade com o cômputo de períodos anteriores descontínuos (artigos 24 e 143 da Lei n.º 8.213/91) para fins de implemento de carência. 5. Diante do reconhecimento da inconstitucionalidade do uso da TR como índice de correção monetária (Tema 810 do STF), aplicam-se, nas condenações previdenciárias, o IGP-DI de 05/96 a 03/2006 e o INPC a partir de 04/2006. Por outro lado, quanto às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve ser aplicado o IPCA-E. 6. Os juros de mora incidem a contar da citação, no percentual de 1% ao mês até 29/06/2009 e, a partir de então, segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, calculados sem capitalização. 7. Determinada a implantação imediata do benefício. (TRF4, AC 5009962-51.2021.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 16/09/2021)

Dessa forma, deve ser provido em parte o recurso do autor para reconhecer o trabalho rural em regime de economia familiar nos períodos de 23/03/1967 a 12/01/1985 e de 09/04/2005 a 07/10/2015.

Do atendimento dos requisitos para a concessão do benefício

No que concerne ao requisito etário, é possível verificar que a parte autora completou 60 anos em 23/03/2015, de modo que a carência incidente na espécia corresponde a 180 meses.

Nesse quadrante, com o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, nos períodos de 23/03/1967 a 12/01/1985 e de 09/04/2005 a 07/10/2015, constato que parte autora passa a contar com 353 contribuições, para tal fim, até a DER (07/10/2015).

Dessa forma, implementa a parte autora o tempo necessário à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural na DER.

Correção monetária e juros de mora

Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.

Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91).

Os juros de mora devem incidir a contar da citação (Súmula 204 do STJ), exceto no caso de concessão de benefício mediante reafirmação da DER para data após o ajuizamento da ação, hipótese em que, conforme decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 1.727.063/SP, publicação de 21/5/2020), a incidência de juros de mora se dará sobre o montante das parcelas vencidas e não pagas a partir do prazo de 45 dias para a implantação do benefício (TRF4, AC 5048576-34.2017.4.04.7100, Quinta Turma, Relator Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10/8/2021; TRF4, AC 5004167-24.2014.4.04.7117, Sexta Turma, Relatora Juíza Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 6/8/2021).

Até 29 de junho de 2009, a taxa de juros é de 1% (um por cento) ao mês.

A partir de 30 de junho de 2009 serão computados uma única vez, sem capitalização, segundo percentual aplicável à caderneta de poupança (inclusive com a modificação da Lei 12.703/12, a partir de sua vigência), conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, considerado constitucional pelo STF (RE n.º 870947, com repercussão geral).

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC n.º 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.

Ônus sucumbenciais

Em face da inversão da sucumbência, o INSS deverá arcar com o pagamento dos honorários advocatícios no patamar mínimo de cada uma das faixas de valor, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e § 3º do artigo 85 do CPC/2015, incidente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença ou do acórdão (Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Caso o valor da condenação/atualizado da causa apurado em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual mínimo da faixa subsequente, assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III e 5º do referido dispositivo legal.

Anoto que nos casos de inversão da sucumbência, inaplicável a majoração recursal prevista no §11º do art. 85 do CPC, pois tal acréscimo só é permitido sobre verba anteriormente fixada, consoante definiu o STJ (AgInt no AResp nº 829.107).

Custas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (artigo 4, inciso I, da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADIN 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (artigo 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual 156/1997), a autarquia responde pela metade do valor até 17 de dezembro de 2018, data de entrada em vigor da LCE nº 729/2018, que isentou as autarquias federais.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Implantação imediata do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB nº 153.967.879-0), a contar da competência da publicação do acórdão, a ser efetivada em quarenta e cinco dias.

Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, impende esclarecer que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.

Conclusão

Dar parcial provimento ao apelo da parte autora para reconhecer o trabalho rural em regime de economia familiar nos períodos de 23/03/1967 a 12/01/1985 e de 09/04/2005 a 07/10/2015, bem como para conceder o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da data do requerimento administrativo, invertidos os ônus de sucumbência.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB, com comprovação nos autos.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003479799v53 e do código CRC 9cf78595.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 6/10/2022, às 11:30:16


5006641-42.2020.4.04.9999
40003479799.V53


Conferência de autenticidade emitida em 06/12/2022 08:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006641-42.2020.4.04.9999/SC

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: NEREU DORVAL EGER

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

VOTO DIVERGENTE

Pela Juíza Federal Convocada Eliana Paggiarin Marinho:

Peço vênia para divergir do e. Relator.

Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de reconhecimento do exercício de atividade rural, nos períodos de 1967 a 1985 e de 2001 a 2015, e de concessão de aposentadoria por idade rural a partir do requerimento administrativo, formulado em 07/10/2015.

O voto proferido pelo e. Relator reconhece o tempo rural, nos intervalos de 23/03/1967 a 12/01/1985 e de 09/04/2005 a 07/10/2015, e o direito à aposentadoria por idade rural desde a DER.

Minha divergência diz respeito ao cômputo de período de trabalho rural remoto para fins de concessão da aposentadoria por idade rural.

A concessão de aposentadoria por idade rural, pressupõe (art. 48, § 1º, da Lei 8.213/1991): (a) idade [60 anos para homens e 55 anos para mulher] e (b) atividade desenvolvida exclusivamente como trabalhador rural [como segurado especial, empregado rural ou contribuinte individual rural], exigindo-se, tal qual para a aposentadoria por idade urbana anterior à EC 103/2019, período de carência de 180 meses, observada também a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Para esta espécie de aposentadoria a carência deve ser cumprida no período imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário ou imediatamente anterior à DER.

A exigência do preenchimento do requisito carência imediatamente antes da idade/DER decorre de expressa previsão do § 2º do art. 48 da Lei 8.213/1991, assim como da lógica do sistema. A aposentadoria com redução etária [de no mínimo cinco anos] visa a proteger o trabalhador rural que, em razão da idade, perde o vigor físico, dificultando a realização das atividades habituais que garantem a sua subsistência.

Não se pode perder de vista, igualmente, que a benesse ao segurado especial [ausência de contribuição mensal] foi concebida pelo constituinte originário fulcrada na dificuldade de essa gama de segurados efetuarem contribuições diretas ao sistema, e, especialmente, na importância social e econômica da permanência desses trabalhadores no campo.

De outro lado, o fato de o artigo 48, § 2º, da Lei 8.213/1991, assegurar o benefício ao trabalhador que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de modo descontínuo, no período anterior ao requerimento, não implica a possibilidade de cômputo de tempo rural remoto para cumprimento do requisito carência.

A propósito cito parte do voto recentemente proferido pelo Desembargador Federal Celso Kipper no julgamento da AC 5015559-69.2019.4.04.9999 (Nona Turma do TRF4, juntado aos autos em 10/08/2022, unânime):

[...]

Isso porque, conforme jurisprudência consolidada, para a concessão de aposentadoria rural por idade (Lei n. 8.213/91, art. 48, §§ 1º e 2º), o trabalhador deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, por tempo equivalente ao da carência, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (STJ, Pet n. 7476, Rel. para o acórdão Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, DJ 29-07-2011; Ag n. 1424137, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 24-04-2012; RESP n. 1264614, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJ 03-08-2011; TRF - 4ª Região, EIAC n. 0010573-75.2010.404.9999, Rel. Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, Terceira Seção, DE 17-08-2011; AR n. 2009.04.00.008358-9, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, DE 18-06-2010), ressalvando-se, de um lado, por aplicação do art. 102, § 1º, da mesma Lei, a possibilidade de ser considerada como marco inicial da contagem retroativa do período de labor rural a data do implemento da idade necessária, ainda que bastante anterior à do requerimento, ou mesmo datas intermediárias entre esta e aquela, haja vista que, desde então, o segurado já teria o direito de pleitear o benefício, e, de outro, a descontinuidade da prestação laboral, entendida como um período ou períodos não muito longos sem atividade rural (TRF - 4ª Região, EIAC n. 0016359-66.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, DE 15-05-2012; TRF - 4ª Região, AC n. 2006.71.99.001397-8, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Quinta Turma, DE 26-08-2008). Dentro dessa perspectiva, não tem direito ao benefício o trabalhador que não desempenhou a atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento ou ao cumprimento do requisito etário, ainda que perfaça tempo de atividade equivalente à carência se considerado o trabalho rural desempenhado em épocas pretéritas (STJ, AgRg no RESP n. 1.242.720, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 15-02-2012; AgRg no RESP n. 1.242.430, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJ 09-05-2012; AgRg no RESP n. 1.298.063, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 25-04-2012; e, ainda, TRF - 4ª Região, EIAC n. 2004.70.03.002671-0, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. de 28-07-2008).

Se o objetivo da lei fosse permitir que a descontinuidade da atividade agrícola pudesse consistir em um longo período de tempo - muitos anos ou até décadas -, o parágrafo 2º do art. 48 da LBPS não determinaria que o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mas sim disporia acerca da aposentadoria para os trabalhadores rurais que comprovassem a atividade agrícola exercida a qualquer tempo. A locução "descontinuidade" não pode abarcar as situações em que o segurado deixa de desempenhar a atividade rural por muito tempo.

O argumento da desnecessidade de concomitância dos requisitos aplica-se à aposentadoria por idade urbana, consagrada pelo art. 48, caput, da Lei n. 8.213/91. Afinal, em tal tipo de benefício por idade, fala-se em carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício pretendido) e se leva em conta a quantidade de contribuições vertidas pelo segurado ao sistema (art. 50 da LBPS). É diante dessas características que este Regional e o Superior Tribunal de Justiça vêm admitindo, de forma reiterada, o preenchimento não simultâneo dos requisitos etário e de carência para a concessão de benefício do gênero, haja vista que a condição essencial para o deferimento é o suporte contributivo correspondente, posição que restou consagrada pelo art. 3º, § 1º, da Lei n. 10.666/03. Nesse sentido: STJ, ERESP n. 502420, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, DJ de 23-05-2005, p. 147; STJ, ERESP n. 551997, Rel. Min. Gilson Dipp, Terceira Seção, DJ de 11-05-2005, p. 162; TRF - 4ª Região, EDAC n. 2003.04.01.000839-2, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, Sexta Turma, DJU de 30-06-2004; TRF - 4ª Região, AC n. 2005.04.01.008807-4, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, Quinta Turma, DJU de 13-07-2005; TRF - 4ª Região, AC n. 2004.04.01.017461-2, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Sexta turma, DJU de 01-12-2004; TRF - 4ª Região, EIAC n. 1999.04.01.007365-2, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, Terceira Seção, DJU de 17-07-2002.

No caso, contudo, da aposentadoria rural por idade, devida independentemente do aporte contributivo (arts. 26, inciso III, e 39, inciso I, ambos da Lei de Benefícios) e garantida com uma idade reduzida, releva justamente a prestação do serviço agrícola no período imediatamente anterior à época da aquisição do direito à aposentação, em número de meses idêntico ao período equivalente à carência. Em situações tais, pretender a concessão do benefício previdenciário sem o preenchimento simultâneo das exigências legais, consistiria, em verdade, na combinação de dois sistemas distintos de outorga de aposentadoria, o que não é possível, porquanto acarretaria um benefício não previsto em lei. Essa, aliás, foi a posição adotada pela Terceira Seção deste Tribunal por ocasião do julgamento dos EIAC n. 2004.70.03.002671-0, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. de 28-07-2008 e, ainda, dos EIAC n. 2007.71.99.010262-1, Rel. Juiz Federal Alcides Vettorazzi, D.E. de 29-06-2009.

Acerca do exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, cumpre referir o entendimento do STJ, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1.354.908/SP, vinculado ao Tema nº 642, representativo de controvérsia, assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil (REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016. (Grifo nosso)

Assim, restou assentada a tese de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.

Ademais, nas hipóteses em que a ausência de efetivo trabalho rural, por um período considerável, for decorrente do exercício de trabalho urbano, este só pode ser considerado para a concessão da aposentadoria por idade mista (Lei de Benefícios, art. 48, §3º), que exige o implemento da idade de 65 anos, se homem, ou 62 anos se mulher, (respeitada a regra de transição da EC 103/2019). O deferimento de aposentadoria rural por idade, em casos de expressiva interrupção da atividade campesina no período equivalente à carência, período no qual houve trabalho urbano, consubstanciaria, na verdade, a concessão da aposentadoria por idade mista com idade reduzida (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), em afronta ao parágrafo terceiro do art. 48, acima mencionado.

De outro lado, se a larga interrupção no trabalho rural consistir em simples e pura inatividade, a não concessão da aposentadoria rural por idade decorrerá justamente do não cumprimento de um dos dois únicos requisitos para a concessão do benefício, a saber, o efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade (ou do requerimento) em número de meses idêntico à carência.

Há de se lembrar que, em regra, nosso sistema previdenciário tem caráter contributivo (Constituição Federal, art. 201, caput), sendo razoável, no entanto, excepcioná-lo no caso de aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais, dadas as condições de trabalho normalmente desfavoráveis, a depender das condições do solo e das intempéries, e a exigir, muitas vezes, esforço desmedido e jornada estafante, isso sem falar do descaso, em termos de proteção social, a que aqueles foram relegados por décadas, em contraposição à sua relevante contribuição para o desenvolvimento nacional. Entretanto, razoável também que a legislação exija, para o deferimento do benefício - que é garantido, repito, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias e com o implemento de uma idade reduzida - que no período equivalente ao da carência, imediatamente anterior ao cumprimento da idade, haja o efetivo desempenho das lides rurícolas, salvo descontinuidade consistente em curto ou curtos períodos de inatividade ou de trabalho não rural, que não afasta a condição de segurado especial do lavrador (STJ, Primeira Turma, AgRg no Agravo em Recurso Especial n. 167.141/MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 25-06-2013). Não vislumbro, portanto, inconstitucionalidade na lei que daquela forma dispôs, nem desvalorização do trabalho rural desempenhado em tempo pretérito, desvinculado e não simultâneo com o período equivalente ao da carência, na mesma medida em que não é desvalorizado, por exemplo, o trabalho (urbano) de um pedreiro autônomo pelo fato de lhe ser recusada a aposentadoria em razão de ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias. São dois regimes distintos, com pressupostos e requisitos próprios: neste último (urbano), privilegia-se o recolhimento de contribuições e se exige o cumprimento de uma idade maior; no primeiro (rural), desobriga-se o segurado do recolhimento de contribuições e garante-se a aposentadoria com uma idade reduzida, mas, em contrapartida, exige-se o efetivo exercício de atividade rural em período (equivalente ao da carência) imediatamente anterior à época da aquisição do direito à aposentação.

O cômputo de atividade rural descontínua por um período maior de tempo, a meu ver, só é possível em hipóteses pontuais e específicas, nas quais resta devidamente comprovado, no caso concreto, que, apesar do desempenho de outra atividade pelo autor ou seu cônjuge (descaracterizando a condição de segurado especial), não houve o afastamento completo da região e da lide rural no período.

Contudo, na situação em apreço o intervalo entre um período de trabalho rural (23/03/1967 a 12/01/1985) e outro (09/04/2005 a 07/10/2015) é excessivamente longo para se enquadrar no conceito de descontinuidade para fins de concessão da aposentadoria por idade rural.

Reitero. Houve a desvinculação do trabalho rural e o exercício de atividade urbana por tempo considerável. Logo, não é possível o cômputo dos períodos rurais comprovados para fins de carência (atividade rural por 180 meses anteriores à DER) nem a concessão do benefício pretendido.

Honorários de Sucumbência

Modificada a solução da lide e diante do fato de que só houve o reconhecimento de tempo rural, entendo se tratar da hipótese de sucumbência recíproca e equivalente entre as partes.

Desse modo, condeno o INSS ao pagamento de 50% dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Condeno também a parte autora ao pagamento de 50% dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exibilidade em razão do benefício da gratuidade de justiça.

Assinalo ainda que, sendo caso de sentença prolatada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, é vedada a compensação, a teor do disposto no art. 85, §14.

Conclusão

Deve ser reconhecido o exercício de atividade rural nos intervalos de 23/03/1967 a 12/01/1985 e de 09/04/2005 a 07/10/2015, nos termos do voto do e. Relator.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003586345v2 e do código CRC 2bb519a5.Informações adicionais da assinatura:
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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006641-42.2020.4.04.9999/SC

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: NEREU DORVAL EGER

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. TRABALHO URBANO DO CÔNJUGE. DESCONTINUIDADE.

1. Tem direito à aposentadoria por idade rural a contar da data de entrada do requerimento administrativo, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que implementa os requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.

2. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.

3. A extensão da propriedade é aspecto a ser considerado juntamente com o restante do conjunto probatório, não constituindo, individualmente, óbice ao reconhecimento da condição de segurado especial.

4. O fato de a esposa do autor ter exercido atividade urbana, com rendimento inferior a dois salários mínimos, não descaracteriza a sua condição de segurado especial. Precedentes desta Corte.

5. Havendo prova da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento por tempo significativo, que comprove que a parte autora passou a sobreviver da agricultura, deve ser admitido o direito à aposentadoria rural por idade com o cômputo de períodos anteriores descontínuos (artigos 24 e 143 da Lei n.º 8.213/91) para fins de implemento de carência.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencida a Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO, dar parcial provimento à apelação da parte autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB, com comprovação nos autos, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 24 de novembro de 2022.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003479800v10 e do código CRC 61e228c7.Informações adicionais da assinatura:
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Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 18/10/2022 A 25/10/2022

Apelação Cível Nº 5006641-42.2020.4.04.9999/SC

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: NEREU DORVAL EGER

ADVOGADO: SILVANA VARELA LEPKALN (OAB SC039386)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 18/10/2022, às 00:00, a 25/10/2022, às 16:00, na sequência 68, disponibilizada no DE de 06/10/2022.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DO JUIZ FEDERAL FRANCISCO DONIZETE GOMES NO SENTIDO DE DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB, COM COMPROVAÇÃO NOS AUTOS, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELO JUIZ FEDERAL HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR E A DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELA JUÍZA FEDERAL ELIANA PAGGIARIN MARINHO NO SENTIDO DE DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.

Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Divergência - GAB. 112 (Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO) - Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO.

Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 111 (Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR) - Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR.

Acompanho o(a) Relator(a)



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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/11/2022 A 24/11/2022

Apelação Cível Nº 5006641-42.2020.4.04.9999/SC

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: NEREU DORVAL EGER

ADVOGADO(A): SILVANA VARELA LEPKALN (OAB SC039386)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/11/2022, às 00:00, a 24/11/2022, às 16:00, na sequência 122, disponibilizada no DE de 07/11/2022.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DOS DESEMBARGADORES FEDERAIS PAULO AFONSO BRUM VAZ E JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA ACOMPANHANDO O RELATOR, A 11ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDA A JUÍZA FEDERAL ELIANA PAGGIARIN MARINHO, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB, COM COMPROVAÇÃO NOS AUTOS, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



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