Apelação Cível Nº 5025727-96.2020.4.04.9999/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: WANDELI DIESEL
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença de improcedência do pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade rural (
).A recorrente sustenta, em síntese, ter apresentado início de prova material, que foi corroborado pela prova testemunhal, comprovando o exercício de atividade rural no período de carência. Acrescenta que o exercício de atividade urbana pelo esposo não desqualifica a condição de segurada especial. Pede a concessão de aposentadoria por idade rural desde a DER 24/08/2018 (
).Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Aposentadoria por Idade Rural
O art. 201, II, § 7º da Constituição Federal assegura a aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal, aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher. (Redação dada pela Emenda Constitucional 103/2019).
A concessão de aposentadoria por idade rural, pressupõe (art. 48, § 1º, da Lei 8.213/1991): (a) idade [60 anos para homens e 55 anos para mulher] e (b) atividade desenvolvida exclusivamente como trabalhador rural [como segurado especial, empregado rural ou contribuinte individual rural], exigindo-se, tal qual para a aposentadoria por idade urbana anterior à EC 103/2019, período de carência de 180 meses, observada também a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Para esta espécie de aposentadoria a carência deve ser cumprida no período imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário ou imediatamente anterior à DER.
A exigência do preenchimento do requisito carência imediatamente antes da idade/DER decorre de expressa previsão do § 2º do art. 48 da Lei 8.213/1991, assim como da lógica do sistema. A aposentadoria com redução etária [de no mínimo cinco anos] visa proteger o trabalhador rural que, em razão da idade, perde o vigor físico, dificultando a realização das atividades habituais que garantem a sua subsistência. Não se pode perder de vista, igualmente, que a benesse ao segurado especial [ausência de contribuição mensal] foi concebida pelo constituinte originário fulcrada na dificuldade de essa gama de segurados efetuarem contribuições diretas ao sistema, e, especialmente, na importância social e econômica da permanência desses trabalhadores no campo.
O art. 39, I da Lei de Benefícios prevê que, para os segurados especiais referidos no inciso VII do caput do art. 11, fica garantida a concessão de aposentadoria por idade no valor de 1 (um) salário-mínimo.
Do Tempo de Serviço Rural
Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material (documental):
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
[...]
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento.
A jurisprudência a respeito da matéria encontra-se pacificada, retratada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que possui o seguinte enunciado: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de benefício previdenciário.
O reconhecimento do tempo de serviço rural exercido em regime de economia familiar aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da Lei 8.213/1991 (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU 10/11/2003).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei 8.213/1991 para comprovação do tempo rural é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental." (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).
Ainda sobre a extensão do início de prova material em nome de membro do mesmo grupo familiar, “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar”, mas, “em exceção à regra geral (...) a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana” (Temas nº 532 e 533, respectivamente, do Superior Tribunal de Justiça, de 19/12/2012).
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011; TRF4, EINF 0016396-93.2011.4.04.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).
No mesmo sentido, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Do Caso Concreto
A parte autora, nascida em 24/08/1963, completou 55 anos de idade na data de 24/08/2018. Assim, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural precisa comprovar o exercício de atividade rural pelo período de 180 meses, contados de forma imediatamente anterior ao cumprimento do requisito etário ou ao requerimento administrativo, formulado em 24/08/2018, ou seja, de 2003 a 2018.
De acordo com o processo administrativo, foram reconhecidos os seguintes períodos de tempo rural: 01/01/1997 a 31/12/1997, 01/01/1999 a 31/12/2002, 01/01/2004 a 31/12/2004 e de 01/01/2006 a 31/07/2006 (
, pp. 6).A sentença não reconheceu o direito à aposentadoria por idade rural pelas seguintes razões (
):Com a finalidade de corroborar o início de prova material apresentada, foram ouvidas 3 testemunhas.
A testemunha Liria Schlosser, agricultora residente no Bairro Bagatini, disse conhecer a autora desde criança quando morava na localidade de Seis de Setembro com os pais que eram agricultores; que desde então a autora ajudava os genitores na lavoura e após o casamento continuou na mesma localidade laborando na agricultura; sabe onde estão as terras, acreditando que possui 12 a 15 hectares que são cultivados; que a autora trabalha sozinha e eventualmente com ajuda do marido quando este não tem serviços na oficina fazendo o cultivo de milho e feijão e criação de gado mencionando que possuem 12 a 15 cabeças; que a autora faz silagem e vende o excedente de feijão e milho e trabalha sem ajuda de empregados; que a oficina do marido está localizada na Sede Oldemburg com quem reside e que podduim pequeno porte, eis que realiza conserto de motores e carros pequenos; que a autora tem 3 filhos casados que auxiliavam na lavoura; que a autora precisa trabalhar na roça para sustentar a casa e planta para comer; que planta batata, mandioca e outras miudezas. Adiante afirmou que a autora casou e continuou na lavoura com o esposo após o casamento, sendo que os filhos nasceram ainda quando moravam na lavoura; que na Sede Oldemburg os filhos foram estudar e a autora continuou na lavoura, não sabendo se o trabalho de preparação da terra era feito pela própria autora, acreditando que sim e que o fazia sozinha; que vendiam a produção para a Cooper e Tombini; acha que a autora emitia notas de produtor; que o genro morava na Sede Oldemburg também e atualmente não sabe se faz roça ou potreiro mas é ligado ao campo e não ajuda no cultivo das terras da autora.
Adiante, Paulo Mueller, agricultor aposentado residente na Sede Oldemburg, também compromissado, afirmou conhecer a autora desde criança quando morava na Seis de Setembro com os pais que eram agricultores e depois do casamento continuou na lavoura onde persiste até os dias atuais; que o casal possui propriedade na Seis de Setembro e mora na Sede Oldemburg, sendo que os locais distam de 4 a 5 km; que conhece a propriedade rural e tem por volta de 12 hectares; que o esposo tem uma oficina pequena na Sede Oldemburg e conserta veículos pequenos, motosserra, motores, carroça e auxilia a esposa em momentos de folga; que plantam feijão, milho, tem 15 a 20 animais, talvez 25 e vendem o excedente da produção; que a autora tem 3 filhos adultos e quando eram crianças ajudavam no trabalho; que a autora somente trabalhou na lavoura ao longo da vida e precisa desse trabalho para sobreviver porque a renda da oficina é insuficiente para a manutenção. Disse também que a distância da casa para as terras é de 4 a 5 km, pois moram na Sede Oldemburg desde 2006 ou 2007 mas a esposa continua trabalhando nas terras, sendo que vai com o genro ou com o marido que leva e busca; que prepara as terras mediante plantio direto com ajuda do genro e por volta de 2006 o genro é quem aravas as terras; que o genro trabalha fazendo cercas, possui gado e as propriedades são próximas.
Por fim, Lelio José Bohn, residente na Sede Oldemburg, compromissado afirmou que conhece a autora desde quando era criança e trabalhava como agricultora com os pais; que depois do casamento continuou na lavoura onde continua se dedicando ao labor; que as terras ficam na localidade de Seis de Setembro, próximas à Sede Oldemburg; que atualmente trabalha sozinha e tem ajuda do esposo quando este tem folgas na oficina em que faz consertos de veículos pequenos antigos e motores diesel; que também ajuda a esposa na lavoura e possuem 10 ou 15 hectares de terras; que possuem 3 filhos adultos que ajudavam também na lavoura; que a autora nunca desenvolveu atividade diversa da lavoura, sendo que planta feijão, milho e faz silagem vendendo o excedente; que cria gado, mencionando 15 a 20 cabeças e trabalha sem ajuda de empregados; que a autora precisa trabalhar na lavoura para se manter segundo entendimento da testemunha. Mencionou que a casa dista das terras de 3 a 5 km e na casa que fica nas terras não sabe se mora alguém; que não possuem maquinário para o cultivo e usam bois e arado, sendo que a autora faz o trabalho e o esposo ajuda; adiante reafirmou que o esposo faz a aragem das terras ou o genro, mas que a autora planta sozinha; que as terras do depoente distam 4 a 5 km da lavoura; que antigamente vendiam leite sem saber até quando; que moraram no interior até 1996 e o esposo foi pra Sede para trabalhar na oficina mas as terras continuaram com a família.
Dos depoimentos prestados aliados à documentação juntada aos autos extraio que antigamente a família da autora de fato se dedicou ao labor campesino. Contudo, nos últimos anos, embora ainda possuam área rural, o esposo da autora se dedica ao labor em uma vila e esta, embora as testemunhas tenham relatado necessitar desenvolver o labor rural, na verdade efetua o plantio de alguns alimentos para o consumo próprio e não como fonte de renda necessária e essencial para a subsistência.
Embora não dito de forma direta, possível inferir que as terras atualmente são cultivadas pelo genro da autora, que se dedica à criação de gado e trabalha na confecção de cercas.
Com efeito, o relatório de notas apresentado pelo Município de Palmitos/SC no Evento 41 indica uma movimentação financeira muito baixa, de apenas R$ 13.925,00 para o período de 5 anos, indicando a emissão de notas esporádicas e em valor baixo, não se coadunando com o labor necessário ao próprio sustento e ao do esposo, cujo rendimento na oficina, segundo dito, seria insuficiente para a mantença do casal.
Nessa seara, vejo que a Certidão juntada no Evento 51 pelo Oficial de Justiça bem retrata a situação fática dos autos, no sentido de que a autora apenas planta alguns alimentos próximos à residência localizada na Sede Oldemburg e com a finalidade de complementar a renda familiar obtida pelo esposo na oficina, não realizando o cultivo/criação de animais nas terras localizadas na Seis de Setembro, o que não permite qualificá-la como trabalhadora rural em regime de economia familiar nos termos em que descritos na inicial, confira-se:
"[...] a parte requerente alegou que se afastou das atividades de agricultura há aproximadamente 10 anos, por indicação médica, uma vez que possui problemas na coluna. Assim, alega que continua laborando, apenas em regime familiar, para consumo próprio. Nesse sentido, a parte informou e verifiquei in loco a existência do cultivo de mandioca, milho, batata e feijão, como demonstram as fotografias, salientando que foi encontrada em casa e não no plantio/manejo das culturas. Por fim, informo que a área atual de plantio é de aproximadamente 01 hectare".
Embora a parte autora tenha apresentado documentos novos no Evento 48, destaco que o relatório de movimentação de animais é insuficiente para comprovar o labor rural, não se olvidando que a filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palmitos somente ocorreu no ano de 2016, conforme demonstra a Carteira de Identidade Sindical (Evento 48 - Informação 69 - p. 1), quando não desenvolvia mais o labor rural nos termos em que pretende comprovar.
Adiante, vejo que em resposta ao ofício encaminhado por este Juízo, a Cooperativa A1, principal adquirente de produtos agrícolas do município de Palmitos/SC e que foi mencionada em depoimento como destinatária da venda do excedente da produção da autora informou que "[...] não comercializou nenhum produto a esta Cooperativa até a presente data. Além disso, oportuno mencionar que em verificação ao sistema constatou-se que a autora não possui sequer cadastro junto a Cooperativa A1". (Evento 49)
O Evento 50 indica que a autora possui 13 animais, mas nos termos em que mencionado anteriormente, é insuficiente para comprovar o labor rural da forma em que alegado na inicial e afirmado pelas testemunhas uma vez que do conjunto probatório resta evidenciado que o labor no últimos anos que precedem o pedido administrativo se destina apenas ao plantio de alguns produtos para o consumo familiar em pequena porção de terras na localidade em que possui a residência.
Não comprovado o labor rural em regime de economia familiar pelo período necessário à carência exigida para a concessão do benefício, a improcedência do pedido de aposentadoria por idade de trabalhador rural revela-se medida impositiva.
Contudo, o caso comporta solução diversa.
Para comprovar o exercício de atividade rural, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais cito:
a) certidão de casamento, em que o esposo, Wilson Carlos Diesel, está qualificado como agricultor (
, p. 1);b) matrícula nº 6.949 do Cartório de Registro de Imóveis de Palmitos/SC, referente à aquisição de imóvel rural no ano de 1989 - lotes 65 e 66 da Segunda Seção Ilha Redonda - com área de 6ha (
);c) matrícula nº 6.950 do Cartório de Registro de Imóveis de Palmitos/SC, relativa à aquisição da parte leste do imóvel rural - lote 65 da Segunda Seção Ilha Redonda - com área de cerca de 5ha, em setembro de 1999 (
);d) notas fiscais de produtor rural, em nome da autora e/ou de seu esposo, emitidas nos anos de 1997, 1999, 2000 a 2002, 2004, 2006, 2007 e 2009, 2011, 2012 a 2018, referente à comercialização de feijão, milho e gado de abate (
, , , , , , , , , , e );Deprende-se dos depoimentos transcritos na sentença que a autora e o esposo passaram a residir em outra localidade, próxima do terreno rural da família, a partir de 2006, data que coincide com o início das contribuições urbanas do marido (
), decorrentes do trabalho como mecânico em pequena oficina de sua propriedade, na qual faz reparos em motosserras, carroças e carros de passeio.Apesar de não residir na propriedade rural, as testemunhas são unânimes em afirmar que a autora sempre trabalhou na lavoura e deu continuidade ao trabalho rural após o início da atividade urbana do esposo (
, , ).É certo que não basta o trabalho campesino para configurar a condição de segurada especial da Previdência Social. Para tanto, tal labor deve ser imprescindível e preponderante para o sustento familiar, mesmo existente outra fonte de renda.
A respeito, decidiu o Superior Tribunal de Justiça no Julgamento do Tema 532 (REsp 1304479/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012):
O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
A contrario sensu, demonstrada a dispensabilidade do trabalho rural para o sustento da família, não é possível reconhecer a condição de segurado especial - categoria que é legalmente dispensada do recolhimento das contribuições previdenciárias para a concessão de benefícios, em face das dificuldades inerentes à vida do pequeno produtor rural.
Neste sentido, cabe referir que o Desembargador Federal Celso Kipper, na fundamentação do voto que proferiu na AC 5008361-74.2012.404.7202, expõe estar consagrada na jurisprudência desta Casa que são aceitáveis, a título de remuneração percebida pelo cônjuge de segurado especial, sem descaracterizar tal condição, valores equivalentes a dois salários mínimos:
(a) reconhece-se a atividade agrícola desempenhada na condição de segurado especial quando os rendimentos do cônjuge não retiram a indispensabilidade daquela para a subsistência da família (normalmente rendimentos que não superem o valor de dois salários mínimos): Apelação Cível Nº 0007819-29.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, sessão de 14-09-2011, D.E. 26-09-2011; Apelação Cível Nº 0006403-26.2011.404.9999, 6ª Turma, Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, por unanimidade, sessão de 10-08-2011, D.E. 22-08-2011; AC 0000314-84.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, sessão de 08-06-2011, D.E. 16-06-2011; AC 0014562-55.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator Luís Alberto D"azevedo Aurvalle, sessão de 09-11-2011, D.E. 21-11-2011; TRF4, AC 0008495-11.2010.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, sessão de 12-07-2011, D.E. 21/07/2011 (6ª T, julgado em 21/05/2014).
Nesse contexto, considerando que os registros de remunerações do esposo da autora ao longo da quase totalidade do seu histórico contributivo não ultrapassam o valor de um salário-mínimo (
), é certo que a atividade rural desempenhada pela autora constitui parcela essencial para a subsistência familiar.Atualmente o esposo é titular de aposentadoria por incapacidade permanente - NB 633.257.113-0 - DIB 20/05/2020, com renda mensal equivalente a um salário-mínimo (
). Assim, a renda urbana do marido não descaracteriza a qualidade de segurada especial da autora.É importante destacar que os elementos de prova material coligidos indicam que a autora sempre esteve vinculada à lavoura. A sentença afastou o direito à aposentadoria por idade rural porque as respostas aos oficios enviados ao Município de Palmitos, à CIDASC e à cooperativa local indicaram pouca comercialização da produção rural nos últimos anos (
, , ).Atualmente a autora tem 60 anos de idade e é esperada a diminuição da produção rural com o decorrer do tempo. Inclusive, o oficial de justiça esteve na residência da autora, na Sede Oldemburg, interior do Município de Palmitos, em 30/03/2020, e verificou ainda haver o plantio de mandioca, milho, batata e feijão em uma área de aproximadamente um hectare (
).Desta forma, o conjunto probatório coligido permite reconhecer o exercício de atividade rural, como segurada especial, durante o período de carência, sendo possível a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural desde a DER, em 24/08/2018.
Correção Monetária e Juros
A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período compreendido entre 11/08/2006 e 08/12/2021, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02/03/2018), inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Quanto aos juros de mora, entre 29/06/2009 e 08/12/2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, por força da Lei 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei 9.494/97, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE 870.947 (Tema STF 810).
A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, impõe-se a observância do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, segundo o qual, "nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente".
Honorários Sucumbenciais
Modificada a solução da lide, pagará o INSS honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, conforme tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 1.105.
Da Tutela Específica
Tendo em vista o disposto no art. 497 do CPC e a circunstância de que os recursos excepcionais, em regra, não possuem efeito suspensivo, fica determinado ao INSS o imediato cumprimento deste julgado, mediante implantação do benefício previdenciário.
Requisite a Secretaria desta Turma, à Central Especializada de Análise de Benefícios - Demandas Judiciais (CEAB-DJ-INSS-SR3), o cumprimento desta decisão e a comprovação nos presentes autos, de acordo com os prazos estabelecidos na Resolução 357/2023 deste Tribunal:
TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
---|---|
CUMPRIMENTO | Implantar Benefício |
NB | |
ESPÉCIE | Aposentadoria por Idade |
DIB | 24/08/2018 |
DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
DCB | |
RMI | A apurar |
OBSERVAÇÕES | aposentadoria por idade rural |
Prequestionamento
No que concerne ao pedido de prequestionamento, observe-se que, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Conclusão
Dado provimento ao apelo da parte autora para conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, a partir da DER em 24/08/2018.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso da autora e determinar a imediata implantação do benefício via CEAB/DJ.
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTAção POR PROVA TESTEMUNHAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA pelo esposo. VALOR INFERIOR A DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS. indispensabilidade dO LABOR RURAL PARA O SUSTENTO FAMILIAR. qualidade de segurada especial configurada.
1. A concessão de aposentadoria por idade rural, pressupõe (art. 48, § 1º, da Lei 8.213/1991): (a) idade [60 anos para homens e 55 anos para mulher] e (b) atividade desenvolvida exclusivamente como trabalhador rural [como segurado especial, empregado rural ou contribuinte individual rural], exigindo-se, tal qual para a aposentadoria por idade urbana anterior à EC 103/2019, período de carência de 180 meses, observada também a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Para esta espécie de aposentadoria a carência deve ser cumprida no período imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário ou imediatamente anterior à DER.
2. Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material, o qual não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar.
4. Está consagrada na jurisprudência desta Casa que são aceitáveis, a título de remuneração percebida pelo cônjuge de segurado especial, sem descaracterizar tal condição, valores equivalentes a dois salários-mínimos.
5. Hipótese em que o conjunto probatório coligido comprova o exercício de atividade rural pela parte autora, indispensável ao sustento familiar, durante o período de carência, sendo devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, desde a data do requerimento administrativo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso da autora e determinar a imediata implantação do benefício via CEAB/DJ, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de março de 2024.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004364455v6 e do código CRC 7a8144d9.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 06/03/2024 A 13/03/2024
Apelação Cível Nº 5025727-96.2020.4.04.9999/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO
APELANTE: WANDELI DIESEL
ADVOGADO(A): CLAUDÉRIO VALMOR FERREIRA (OAB SC015575)
ADVOGADO(A): PATRICIA FERREIRA (OAB SC033471)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 06/03/2024, às 00:00, a 13/03/2024, às 16:00, na sequência 998, disponibilizada no DE de 26/02/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO VIA CEAB/DJ.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 21/03/2024 04:02:34.