APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001995-60.2014.4.04.7004/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | CELIA DA SILVA HOINOSKI |
ADVOGADO | : | ROSEMAR CRISTINA LORCA MARQUES VALONE |
: | Rejane Mizue Shirabayashi |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. BOIA-FRIA. PROVA MATERIAL. MITIGAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. DIFERIMENTO PARA A FASE DE EXECUÇÃO. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. Procede o pedido de aposentadoria rural por idade quando atendidos os requisitos dos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/91, ou seja, comprovado o implemento da idade mínima (60 anos para o homem, e de 55 anos para a mulher), e o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência.
2. A qualificação da mulher como "doméstica" ou "do lar" na certidão de casamento não desconfigura sua condição de segurada especial, seja porque na maioria das vezes acumula tal responsabilidade com o trabalho no campo, seja porque, em se tratando de labor rural desenvolvido em regime de economia familiar, a condição de agricultor do marido contida no documento estende-se à esposa.
3. Tratando-se de atividade rural de boia-fria, a exigência de prova documental, embora subsistente, deve ser mitigada. Precedentes.
4. É possível diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11960/2009.
5. Ainda que ausente menção expressa a dispositivos legais, se a matéria ventilada no recurso foi devidamente examinada Corte a quo, resta caracterizado o prequestionamento implícito. Precedentes do STJ.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 19 de setembro de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9148135v7 e, se solicitado, do código CRC 33DC4F8F. | |
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RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional de Seguridade Social - INSS em face da sentença que julgou parcial procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural formulado por Célia da Silva Hoinoski.
Sustenta o INSS, em síntese, que a parte autora não comprovou o exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, pelo período exigido na Lei nº. 8.213/91. Alega que a autora não preenche os requisitos necessários à prestação previdenciária, por não ter comprovado a atividade rural no período de 96 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima, ou à entrada do requerimento administrativo. Defende que existem apenas documentos extemporâneos hábeis a comprovar labor rural em certos períodos, uma vez que os demais documentos apresentados não devem ser considerados para fins comprobatórios.
Com as contrarrazões, bem como por força do reexame necessário, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Peço dia.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9148133v5 e, se solicitado, do código CRC 155529C. | |
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: | Rejane Mizue Shirabayashi |
VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Da aposentadoria por idade rural
Trata-se de demanda previdenciária pela qual é postulada a concessão de aposentadoria por idade rural. No caso do trabalhador rural, qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/1991), deve ser aplicado o disposto nos artigos 48, parágrafos 1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei nº 8.213/1991. Dessa forma, é necessária a comprovação do implemento da idade mínima (60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher) e do exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, sendo dispensável o recolhimento de contribuições.
O artigo 143, da Lei nº 8.213/1991, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei nº 8.213/1991 estabeleceu que, para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Em relação ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei nº 8.213/1991, como regra, deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que, até então, já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido, conforme disposto na Constituição Federal, art. 5º, inciso XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º. Nesse sentido, tese firmada no Superior Tribunal de Justiça (Tema 642):
(...) o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade. (REsp 1.354.908-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe 10/2/2016).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/1991. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subsequentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142, da Lei de Benefícios.
Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, § 1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, RExt. nº. 631240/MG, Rel. Ministro Roberto Barroso, Plenário, julgado em 03/09/2014).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia) e Súmula nº 149 do STJ:
A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Cabe salientar, outrossim, que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Por outro lado, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar. Quanto aos meios de comprovação do tempo de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1348633 SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014, firmou a seguinte tese (Tema 638):
Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.
Ademais, tal entendimento restou sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016):
É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Aquela Egrégia Corte também consolidou entendimento no sentido de atribuir efeitos prospectivos ao início de prova material, reconhecendo-lhe "(...) eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal" (AgInt no REsp 1606371/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 20/04/2017, DJe 08/05/2017).
No que tange aos documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, saliento que consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais da entidade respectiva serão formalizados não individualmente, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Importante, ainda, destacar que não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural, pois, o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991 estipula que é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, somente será descaracterizado o regime de economia familiar caso reste comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Cumpre ressaltar que, seguidamente, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Deve-se considerar as conclusões a que chegou o INSS, em âmbito administrativo, de modo a serem corroboradas pelo conjunto probatório produzido no feito judicial. Na existência de conflito entre as provas colhidas na via administrativa e aquelas produzidas em juízo, devem preponderar as últimas, uma vez que produzidas com todas as cautelas legais, diante da garantia do contraditório. Trata-se de situação na qual se deve prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, a fim de que seja examinada no conjunto do acervo probatório constante dos autos.
Por fim, restou pacificado pela jurisprudência o entendimento de que "(...) é assegurada a condição de segurado especial ao trabalhador rural denominado 'boia-fria'" (REsp 1674064/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017). Além disso, dada a peculiar circunstância e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de trabalhador rural diarista, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1.321.493/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012) fixou a seguinte tese (Tema 554), relativamente ao trabalhador rural boia-fria:
Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Do caso concreto
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário, 55 (cinquenta e cinco) anos, em 07/11/1997, porquanto nascida em 07/11/1942 (evento 1 - RG3). O requerimento administrativo foi efetuado em 15/03/2010 (evento 1 - PROCADM7, fl. 02). Dessa forma, a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 96 meses imediatamente anteriores ao implemento do requisito etário ou imediatamente anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos:
- Certidão de casamento da autora, constando a profissão de seu esposo como "lavrador" e a desta como "do lar", do ano de 1959 (evento 1 - PROCADM7, fl. 05);
- Certidão de casamento da filha da autora, na qual consta a profissão do genro como campeiro, do ano de 1987 (evento 1 - PROCADM7, fl. 07);
- Ficha geral de adulto da Secretaria Municipal de Saúde, em nome da Autora, constando sua profissão como boia-fria, do ano de 1996 a 2003 (evento 1 - PROCADM7, fl. 09);
- Extrato de aposentadoria por invalidez de natureza rural, em nome do esposo da autora, com percebimento no período de 11.01.1995 a 21.05.1995 (evento 1 - PROCADM7, fl. 12);
- Extrato de percebimento de pensão por morte em nome da autora, de natureza rural, desde 12.02.1995 (evento 1 - PROCADM7, fl. 13);
- Cadastro de loja em nome da autora, constando sua profissão como bóia-fria, dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 (evento 1 - OUT4).
Por ocasião da audiência de instrução, em 26/01/2015 (evento 28), foi colhido o depoimento pessoal da parte autora, assim como foram inquiridas as testemunhas Maria Aparecida de Lima Silva e Camilo Mandoti, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pela parte demandante.
Em seu depoimento pessoal, a demandante informou que:
Mora em Santa Elisa há 33 anos; foi casada com Adão, faleceu faz uns 20 anos; sempre morou com ele, mas uns 3 anos antes de falecer ele saiu de casa; quando ele foi embora a autora sobreviveu trabalhando como boia-fria, a autora ficou morando com os filhos, teve 13 filhos, dois deles estão mortos, hoje mora sozinha; trabalhou na roça toda vida, quebrando milho, catando algodão, roçando pasto, carpindo, etc; a última vez que trabalhou na roça faz uns 5 anos, trabalhou para o filho do Seu Camilo que vai ser testemunha, trabalhou para o Zé, para o Cesário; depois que o Seu Adão morreu, passou a ganhar pensão, mas como gasta muito com remédio, até fez um empréstimo, está recebendo só metade do salário; a pensão é pouca, a autora tem leishmaniose dentro do nariz e tem que tomar injeção direto e pagar consulta; antes de ficar doente e mesmo com a pensão trabalhava na roça ainda, não dava, tinha muitos filhos; sempre trabalhou direto, só parou de trabalhar porque pegou a tremura na mão, quando ficou muito doente; a autora trabalhou em Umuarama colhendo café, trabalhou mais em Santa Elisa.
A testemunha Maria Aparecida de Lima Silva afirmou:
Que conhecera a autora há 30 anos, em Santa Elisa; a depoente mora lá há mais de 30 anos e a autora também mora lá desde aquela época; quando conheceu a autora ela morava com os filhos dela, teve 13 filhos; a autora foi casada, não se lembra do nome do marido; ele foi embora da casa e depois de uns tempos ele faleceu; o marido trabalhava na roça e a autora também, toda vida ela foi boia-fria; a depoente trabalhou com a autora como boia-fria; hoje a depoente trabalha na roça registrada, por conta a última vez que trabalhou foi em 1988; trabalhou junto com a autora para o Seu Gentil, Cesário e o Zé Gibi; a autora parou de trabalhar há uns 15 anos, por volta do ano 2000, porque ela ficou doente; ela ganha a pensão do marido, mesmo depois disso a autora continuou trabalhando na roça, os filhos também ajudaram ela; a autora mora sozinha, próxima ao filho; mesmo depois que a depoente foi trabalhar registrada via a autora indo trabalhar na roça pois pegava o mesmo ponto; a autora trabalhava perto de Santa Elisa, mas ia de carro ou caminhonete; a autora sempre foi trabalhadora rural.
Camilo Mandoti, por sua vez, disse:
Que conhecera a autora desde 1995; o depoente trabalha no sítios dos filhos dele e ele tinha que arrumar um pessoal para trabalhar e a autora vinha trabalhar quando precisava; o depoente mora na propriedade rural pertencente a seus filhos, mora com eles nessa propriedade que fica localizada em Santa Elisa, na Estrada Boiadeira; na época, produzia algodão, depois plantou café, e em 2009/2010 eleiminou o café e agora é só leite; a autora começou a trabalhar com o depoente em 1995, era esporádico, era na época do algodão, do café; o depoente pegava a autora em Santa Elisa; o depoente acredita que a autora trabalhou para outras pessoas porque se fosse sobreviver só com o que trabalhou para o depoente a autora não teria sobrevivido; na época tinha bastante trabalho para boia-fria, hoje está complicado, só Usina, não existe mais cultura de algodão e café; a autora fez diária para o depoente até 2008, por aí; da família da autora só ela ia.
No presente caso, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente acerca do exercício de atividade rural pela parte autora no período de carência legalmente exigido, qual seja 96 meses, ou 8 (oito) anos.
Ademais, o apelante não apresenta provas a fim de infirmar o alegado pela autora, pelo contrário, aduz, de forma genérica, que a autora não comprovou o exercício de labor rural no tempo exigido por Lei para fins de carência.
Ainda, a qualificação da mulher como "doméstica" ou "do lar" na certidão de casamento não desconfigura sua condição de segurada especial, seja porque na maioria das vezes acumula tal responsabilidade com o trabalho no campo, seja porque, em se tratando de labor rural desenvolvido em regime de economia familiar, a condição de agricultor do marido contida no documento estende-se à esposa.
Quanto ao caso em tela, ainda ressalto que a exigência de início de prova material, de acordo com a análise do caso concreto, pode (e deve) ser abrandada em relação aos trabalhadores rurais do tipo boia-fria, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, sob pena de frustrar a concessão de um direito fundamental, qual seja o direito de se aposentar.
Tratando-se, no caso dos autos, de trabalhadora rural boia-fria, o entendimento sedimentado pelo E. Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o requisito do início da prova material, embora não seja dispensado, deve ser abrandado, pela informalidade de que se reveste esta espécie de trabalho no meio rural, conforme assentado no item 4, do REsp n.º 1321493/PR, julgado sob o rito dos recursos repetitivos:
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Assim, deve ser mantida a sentença de concessão do benefício de aposentadoria por idade devida ao trabalhador rural desde a data do requerimento administrativo.
Consectários
Correção monetária e juros moratórios
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O art. 491 do CPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014). (grifei)
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, este Regional tem diferido para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Assim, cabe diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Prequestionamento
Conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ainda que ausente menção expressa a dispositivos legais, se a matéria ventilada no recurso foi devidamente examinada pela Corte a quo, resta caracterizado o prequestionamento implícito, o qual viabiliza o conhecimento do recurso especial (Corte Especial, Relator para Acórdão Ministro Ari Pargendler, DJe de 10-11-2008).
Da implantação do benefício
O juízo a quo determinou a implantação imediata do benefício concedido. Recorre, o INSS, também quanto ao ponto.
Vem entendendo esta Corte, com base no art. 497 do CPC/15, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, somando-se este ao fato de que, em princípio, o acórdão não está sujeito a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), pelo cumprimento de pronto da decisão, quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 30 (trinta) dias úteis.
Assim sendo, tendo a sentença analisado os requisitos para a antecipação dos efeitos da tutela coerentemente à luz do caso concreto e das disposições legais, não vejo empeço à imediata implantação do benefício.
Conclusão
Assim, deve ser mantida a sentença de concessão do benefício de aposentadoria por idade devida ao trabalhador rural desde a data do requerimento administrativo. Imperativo, portanto, o parcial provimento à remessa oficial, a fim de diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, bem como a negativa de provimento ao apelo do INSS.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à remessa oficial e negar provimento à apelação.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/09/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001995-60.2014.4.04.7004/PR
ORIGEM: PR 50019956020144047004
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | CELIA DA SILVA HOINOSKI |
ADVOGADO | : | ROSEMAR CRISTINA LORCA MARQUES VALONE |
: | Rejane Mizue Shirabayashi |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/09/2017, na seqüência 207, disponibilizada no DE de 04/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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