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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. LABOR URBANO DO CÔNJUGE COM PERCEPÇÃO DE RENDA CONSIDERADA SUFICIENTE PARA A MANUTENÇÃO DO GRUPO FAMILIAR. ...

Data da publicação: 28/06/2020, 20:52:50

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. LABOR URBANO DO CÔNJUGE COM PERCEPÇÃO DE RENDA CONSIDERADA SUFICIENTE PARA A MANUTENÇÃO DO GRUPO FAMILIAR. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL DA AUTORA DESCARACTERIZADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Se o valor da remuneração obtida pelo cônjuge no exercício de atividade urbana for considerado suficiente para a manutenção do grupo familiar, resta descaracteriza a condição de segurado especial da postulante, já que ausente o caráter da essencialidade dos rendimentos auferidos por ela no trabalho rural. 3. Não restando comprovado nos autos por início de prova material o exercício da atividade rural na condição de segurado especial, no período equivalente à carência, não há como ser concedida a aposentadoria rural por idade. (TRF4, AC 5011000-06.2014.4.04.7005, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 13/11/2017)


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011000-06.2014.4.04.7005/PR
RELATOR
:
JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE
:
GISELA WUST VIEIRA
PROCURADOR
:
GEORGIO ENDRIGO CARNEIRO DA ROSA (DPU) DPU128
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. LABOR URBANO DO CÔNJUGE COM PERCEPÇÃO DE RENDA CONSIDERADA SUFICIENTE PARA A MANUTENÇÃO DO GRUPO FAMILIAR. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL DA AUTORA DESCARACTERIZADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Se o valor da remuneração obtida pelo cônjuge no exercício de atividade urbana for considerado suficiente para a manutenção do grupo familiar, resta descaracteriza a condição de segurado especial da postulante, já que ausente o caráter da essencialidade dos rendimentos auferidos por ela no trabalho rural. 3. Não restando comprovado nos autos por início de prova material o exercício da atividade rural na condição de segurado especial, no período equivalente à carência, não há como ser concedida a aposentadoria rural por idade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 08 de novembro de 2017.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator


Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9197372v4 e, se solicitado, do código CRC FB2ECDA1.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): João Batista Pinto Silveira
Data e Hora: 13/11/2017 11:23




APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011000-06.2014.4.04.7005/PR
RELATOR
:
JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE
:
GISELA WUST VIEIRA
PROCURADOR
:
GEORGIO ENDRIGO CARNEIRO DA ROSA (DPU) DPU128
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta da sentença que assim dispôs:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos deduzidos na inicial, resolvendo o mérito, com fundamento no art. 487, I, do NCPC.
Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa devidamente atualizado, à luz do art. 85, § 2º, do CPC.
Entretanto, tendo em vista o deferimento da gratuidade da justiça (evento 3), as verbas sucumbenciais devidas pela parte autora permanecerão com a sua exigibilidade suspensa, na forma do art. 98, §3º, do NCPC.
Havendo recurso(s) de apelação desta sentença, intime-se o recorrido para apresentar as contrarrazões, no prazo legal (art. 1.010, § 1º, do NCPC). Após, remetam-se ao eg. TRF4.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

Tempestivamente a parte autora recorre, postulando a reforma da decisão recorrida. Sustenta, em síntese: (a) que o exercício de atividade urbana pelo cônjuge, como "operador de niveladora", do Município de Cascavel, não descaracteriza, de forma automática a qualidade de segurada especial de quem postula o benefício; (b) que a renda obtida do labor campesino sempre foi imprescindível para o sustento do lar, complementado pela renda proveniente da atividade urbana desempenhada pelo cônjuge; (c) que faz jus à concessão da Aposentadoria por Idade Rural, desde a data do requerimento administrativo (11-09-2009), uma vez que preenchidos todos os requisitos estabelecidos pela legislação de regência. Requer, afinal, a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 20 % (vinte por cento) sobre o valor da condenação.

Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
A questão controversa nos autos cinge-se ao direito da parte autora à concessão de Aposentadoria por Idade Rural, desde a data do requerimento administrativo (11-09-2009).
Da aposentadoria por idade rural
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5.º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB, e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos fatos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 277 do CPC/2015.
Aos trabalhadores rurais, filiados à Previdência à época da edição da Lei n.º 8.213/91, que implementarem os requisitos da aposentadoria por idade no prazo de até quinze anos após a sua vigência (ou seja, até 24-07-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, inciso II, mas a regra de transição prevista no art. 143, ambos da Lei de Benefícios.
Os requisitos para a aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição da Lei n.º 8.213/91 são, pois, os seguintes: (a) idade mínima de 60 anos para o homem e de 55 anos para a mulher (Lei n.º 8.213, art. 48, § 1º); e (b) efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao período correspondente à carência do benefício (Lei n.º 8.213, art. 143). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo que é necessário comprovar como de efetivo exercício do labor rural, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei de Benefícios, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos 142 e 143 da Lei de Benefícios, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural (direito adquirido ou DER); b) termo inicial e final do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício (DIB).
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de labor rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso XXXVI; Lei de Benefícios, art. 102, § 1º).
Nada obsta, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994 (data da publicação da Medida Provisória n.º 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91.
Não é possível, em caso de aposentadoria por idade rural, dispensar a necessidade de implementação simultânea dos requisitos de idade e trabalho durante o interregno correspondente à carência, uma vez que o benefício, no caso, não tem caráter atuarial, e não se pode criar regime híbrido que comporte a ausência de contribuições e a dispensa do preenchimento concomitante das exigências legais.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, RExt nº 631240/MG, Rel. Ministro Roberto Barroso, Plenário, julgado em 03-09-2014), ou, inexistente este, da data da citação (STJ, REsp n. 1450119-MT, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves c/c o art. 219, § 1º, do CPC), o que não afasta o direito às parcelas anteriores aos cinco anos desde o ajuizamento ação. Interpretação em conformidade com o precedente desta Turma (APELRE nº 0020438-83.2014.404.9999), onde consignado que: "A interrupção da prescrição deve ser contada de forma retroativa à data do ajuizamento da ação, não da citação, nos termos do art. 219, § 1º, do CPC, que não foi revogado tacitamente pelo art. 202, inc. I, do CC/02". (Relatoria Desembargador Federal Celso Kipper, DJe de 11/02/2015). Conforme disposto no art. 240, § 1º, do CPC/2015: "A interrupção da prescrição, operada pelo despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data da propositura da ação."
Da demonstração da atividade rural
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, considerando-se como tal os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, Súmula nº 149 do STJ e REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural de todo período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.), que juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016) que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório."
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a Súmula n° 73, desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa. Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo certo, repita-se, que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Assim, as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).

Quando se trata de mulheres, a prova se torna ainda mais difícil, pois se sabe que quando existiam documentos, estes eram lançados em nome do chefe da família onde, há certo tempo, era o único membro familiar a possuir direito à aposentadoria, de modo que deixar de atribuir-lhe a qualidade de trabalhadora rural em face da inexistência de documento em nome próprio, qualificando-a como tal, redunda em grande injustiça com as mulheres ativas neste tipo de trabalho árduo em que trabalham tanto quanto ou muitas vezes ainda mais que os homens.
Importante, ainda, ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Somente será descaracterizado o regime de economia familiar se restar comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Acerca do exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, cumpre referir o entendimento do STJ, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1.354.908/SP, vinculado ao Tema nº 642, representativo de controvérsia, assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil (REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016. (Grifou-se.)

Cumpre salientar também que muitas vezes a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante.
A respeito do "boia-fria", o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp n. 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
Saliente-se que, no referido julgamento, o STJ manteve decisão deste Regional que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua CTPS, constando vínculo rural no intervalo de 01-06-1981 a 24-10-1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Com efeito, sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Portanto, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de se admitir como início de prova material documento extemporâneo ao período correspondente à carência do benefício, conforme sedimentado no Resp nº 1.321.493-PR.
Do caso concreto
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 22-01-2007, porquanto nascida em 22-01-1952, e requereu o benefício na via administrativa em 11-09-2009. Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural no período de 156 meses anteriores ao implemento do requisito etário, ou nos 168 meses que antecedem o requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
No que respeita à comprovação da atividade rural, a fim de evitar tautologia, passo a transcrever excerto da sentença (Evento 61 - SENT1):

A parte autora alega ter desempenhado atividade rural desde o ano de 1980 até 2009, apresentando as seguintes provas documentais:

(a) Contrato de arrendamento de um 1 alqueire do Lote Rural 2-C da Fazenda São Domingos, em Cascavel/PR, celebrado em 11/07/2005, pelo prazo de 5 (cinco) anos (evento 1, OUT2).
(b) Certidão de Casamento datada de 1977 onde constava sua profissão sendo lavrador (PROCADM1, fls. 5);
(c) Cadastro do Produtor Rural (CAD/PRO) nº 95478156-93, em nome a autora, emitido em 24/08/2009, com validade até 30/06/2010 (evento 1, OUT4).
(d) Matrícula nº 17035 referente ao Quinhão E, desmembrado do Lote Rural nº 32 da Gleba 001, da Colônia Tormenta, com área de 224.000 m2, constando averbação, em 15/12/1993, de Formal de Partilha, por meio do qual coube à autora a propriedade de uma área de 48.400 m2, em comum com seus irmãos (evento 1, OUT6).
(e) Notas fiscais de venda de produto rural (milho em grãos) pela autora, emitidas nos anos de 2001 a 2009 (evento 1, OUT7).
(f) Certidão de casamento da autora, contando sua profissão como "do lar" e do seu marido como "lavrador" (evento 11, PROCADM2, fls. 4).
(g) Certificado de "Curso de Agroindustrialização de Mandioca", realizado em Rio do Salto - Cascavel, em 22.10.1997, expedido pela EMATER-PARANÁ, em nome da autora (evento 11, PROCADM3, fls. 26).
(h) Certificado de participação no "Curso para Trabalhadores na Transformação Caseira de Produtos - Conservas Vegetais", realizado nos dias 10 e 11/05/1995, pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, em nome da autora (evento 11, PROCADM3, fls. 27/28).
(i) Certificado dos Trabalhadores Rurais de Cascavel, expedido em 1980, no nome do marido da autora (evento 11, PROCADM3, fls. 29).
(j) Históricos escolares atestando que os filhos da autora estudaram em uma escola municipal/estadual no Distrito de Rio do Salto, Cascavel/PR, desde 1988 a 1977.

Os documentos são aptos como início de prova material, conforme exige o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91.

A par da extensa prova documental carreada aos autos, cumpre avaliar os depoimentos constantes da justificação administrativa (evento 34).

Na entrevista rural (evento 1, PROCADM9, fls. 2), a autora disse "que o pai possuía uma terra na Linha Santa Lurdes - Cascavel/PR, sendo que o pai possuía 7 alqueires em duas escrituras, sendo que trabalhou com os pais até os 28 anos, quando se casou e foi trabalhar como bóia-fria para o Sr. Jorge Rigo (2 anos), depois mudaram-se para Rio do Salto e o marido passou a trabalhar na Prefeituar de Cascavel, sendo que é operador de niveladora e trabalha na região de Rio do Salto. A segurada informou que continuou a trabalhar como bóia-fria para proprietários da região. Disse que quando a mãe faleceu há cerca de 8 anos herdou 3 quartas onde cultivava produtos para venda e consumo até que no ano de 2003 venderam a terra e a segurada foi trabalhar como arrendatária em 1 alqueire de terra, disse que a terra fica a 8 quilômetros da sua casa e vai de carona no ônibus dos estudantes [...] informou que jamais fez uso de mão de obra assalariada, sendo que trabalha sozinha. Disse que na época que trabalha com os pais trabalhava a segurada, os pais e os irmãos sem auxílio de empregados e que a renda provinha apenas da agricultura".

A testemunha LUZIA COSTA CARDOSO (evento 34, PROCADM1, fls. 11) afirmou "que conheceu a interessada no ano de 1978, ainda solteira, na Linha Nossa Senhora de Lourdes, Distrito de Rio do Salto, município de Cascavel-PR, pois moram e trabalham na mesma comunidade. Que presenciou a Interessada atuando na lida rural inicialmente com os pais, e depois de casar-se com o Sr. Lucilio Vieira, no ano de 1980, continuou na lida rurícola, onde está até hoje. Que logo após o casamento a Justificante foi trabalhar nas terras do Sr. Paulino Baranzelli, onde atuou uns 2 anos, depois explorou terras do Sr. Jorge Rigor, mais uns 5 anos, e na sequência, trabalhou nas terras do Sr. Bento Schoffer, por mais uns 5 anos, e depois trabalhar nas terras do Sr. Egidio Rabuski, onde permanece trabalhando. Que a Justificante sempre trabalhou em terras arrendadas, mas só elaborou contrato físico com o Sr. Efidio Rabuski, com os demais proprietários rurais o contrato era verbal. Que os trabalhos executados pela Justificante são todos braçais [...] Que os serviços rurículas são desenvolvidos pela Requerente, sem contratar empregados, mas já contou com a ajuda dos filhos, mas estes depois de casarem foram para outros endereços e o esposo é empregado da Prefeitura de Cascavel-PR e poucos dias trabalhava na lida rural. Que a produção rurícula, pela Interessada, é para o consumo próprio e vende o que sobra no comércio e para particulares do Distrito de Rio do Salto prinicpalmente e sempre foi a fonte de renda da requerente.

Por último, a testemunha IRINEU BROCARDO (evento 34, PROCADM1, fls. 12), disse "que conheceu a Justificante no ano de 1978, quando, a Interessada, ainda solteira e junto com os pais se estabeleceram numas terras vizinhando a propriedade do Depoente. Que a Justificante casou com o Sr. Lucilio Vieira, no ano de 1980 e foi trabalhar nas terras do Sr. Jorge Rigo, por 2 anos, depois o esposo começou trabalhar para a Prefeitura de Cascavel-PR e a Requerente foi trabalhar na condição de diarista (boia-fria) para o Sr. Paulo Baranzelli, Bento Schoffer e Egídio Baruski, por mais uns 3 anos, e depois trabalhou para outros proprietários, também na condição de diarista volante boia-fria, desconhe o nome dos donos das terras, por mais uns 2 anos. Que no ano de 2006 a Requerente providenciou contrato de arrendamento de terras com o Sr. Egídio Baruski e lá trabalhou mais uns 3 anos. Que as atividades desenvolvidas pela Requerente sempre foram braçais rurícolas plantando ramas de mandioca e de batata doce - em covas, plantando hortaliças em canteiros, plantando com máquina manual, feijão, arroz e milho. Que depois a Requerente continuou produzindo hortaliças e mandioca para consumo próprio, isto até hoje. Que a Interessada não contrato empregados e sempre da produção e do trabalho rural foram as fontes de renda. Que a Justitificante está residindo na sede do Distrito de Rio do Sato no ano de 1985 ou 1986 e o deslocamento até o local do trabalho era a pé e de carona com ônibus escolar".

A prova testemunhal é harmônica e coerente entre si e coma prova documental que instruiu o pedido inicial."

No caso concreto, embora os documentos carreados aos autos sejam indicativos da ligação da autora com o meio rurícola, penso não ser possível a concessão da aposentadoria por idade rural.

Ocorre que, no extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, juntado aos autos (Evento 34 - PROCADM1), observa-se que o cônjuge da autora exerceu atividade urbana como empregado do Município de Cascavel/PR, vínculo regido pelo regime estatutário, a contar de 04-10-1983. Verifica-se, ainda, que a remuneração auferida pelo consorte, no período de 01/1989 a 12/2008, é superior a dois salários mínimos.

Assim, no caso concreto, depreende-se dos autos que a remuneração obtida pelo cônjuge da requerente do exercício de atividade urbana, ao longo do período aquisitivo do benefício em análise, pode ser considerada suficiente para a manutenção do grupo familiar, o que descaracteriza a condição de segurada especial da postulante, já que ausente o caráter de essencialidade dos rendimentos auferidos por ela com o trabalho rural, tornando-os mero complemento da renda familiar.

Não se reconhece a atividade agrícola na condição de segurado especial quando tal labor não for indispensável para a subsistência da família, em virtude da percepção, pelo cônjuge, de rendimentos considerados suficientes para a subsistência da família (na praxis judicial, geralmente rendimentos superiores a dois salários mínimos): Embargos Infringentes Nº 2005.72.13.003086-0, 3ª Seção, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, sessão de 05-05-2011, D.E. 16-05-2011; Apelação Cível Nº 0002162-09.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal Celso Kipper, por unanimidade, sessão de 19-10-2011, D.E. 27-10-2011; Embargos Infringentes Nº 2008.70.99.005425-2, 3ª Seção, Des. Federal Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, por unanimidade, D.E. 12-05-2011; Apelação Cível Nº 0007446-32.2010.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal João Batista Pinto Silveira, por unanimidade, sessão de 20-10-2010, D.E. 29-10-2010; AC 2008.70.00.004019-9, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, por unanimidade, sessão de 22-03-2011, D.E. 14/04/201; AC 2008.71.99.002978-8, Quinta Turma, Relator João Batista Lazzari, por unanimidade,sessão de 14-07-2009, D.E. 17/08/2009.

Desse modo, na hipótese como a dos autos, em que demonstrado que o labor agrícola não constitui fonte de renda imprescindível à subsistência da autora e de sua unidade familiar, constituindo apenas renda complementar, resta afastada a condição de segurada especial da requerente, sendo inviável tanto a outorga de aposentadoria por idade rural como a averbação do período para qualquer fim.

Portanto, é de ser mantida a sentença de improcedência, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 937,00, suspensa a exigibilidade de tais verbas em razão da concessão da Assistência Judiciária Gratuita.
Assim, conquanto a parte autora tenha preenchido o requisito etário (completou 55 anos em 22-01-2007), o requisito da carência não restou devidamente comprovado, não fazendo jus, pois, ao benefício de Aposentadoria por Idade Rural.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator


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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 08/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011000-06.2014.4.04.7005/PR
ORIGEM: PR 50110000620144047005
RELATOR
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE
:
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR
:
Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva
APELANTE
:
GISELA WUST VIEIRA
PROCURADOR
:
GEORGIO ENDRIGO CARNEIRO DA ROSA (DPU) DPU128
APELADO
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 08/11/2017, na seqüência 143, disponibilizada no DE de 19/10/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
VOTANTE(S)
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:
Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ
:
Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma


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